A
operação "Papéis de Panamá", que revelou um alegado esquema
gigantesco de evasão fiscal, evidenciou Hong Kong como um centro de criação de
empresas "offshore", utilizadas por chineses do continente para
transferir capital além-fronteiras.
Segundo
novos dados revelados hoje pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de
Investigação (ICIJ, na sigla inglesa), os escritórios na China da Mossack
Fonseca, a firma de advogados panamiana no centro do furacão, criaram 16.300
empresas de fachada.
O
caso reacendeu o debate sobre os meios utilizados pelas classes abastadas da
China para salvaguardar as suas fortunas e fugir às restrições cambiais
impostas por Pequim.
Devido
à proximidade ao continente chinês e à liberdade que caracteriza o seu sistema
financeiro, a ex-colónia britânica funcionará mesmo como uma plataforma.
"Os
chineses estão a transferir o seu dinheiro para fora devido ao abrandamento da
economia", disse à agência France Presse Andrew Collier, diretor do centro
de investigação Orient Capital Research, com sede em Hong Kong.
"O
mercado imobiliário está em declínio em muitas zonas do país e existe apreensão
com a campanha anticorrupção e o impacto que poderá ter na segurança do capital
na China", explicou.
Através
da subfaturação de bens exportados a partir de Hong Kong ou da subvalorização
das importações para a cidade, é possível gerar dinheiro extra, que é depois
colocado em contas "offshore", explica Collier.
"Muita
gente refere que existem imensas faturas falsas de produtos transacionados
entre a China e Hong Kong, e que Hong Kong está a ser utilizado como uma via
para retirar capital do país", descreve.
As
empresas chinesas podem então obter dinheiro em moedas estrangeiras junto dos
bancos chineses, destinado a pagar produtos importados, mas sobrestimando o
montante necessário, que é depois movimentando para contas na cidade.
"É
muito difícil para um banco distinguir quais faturas são verdadeiras ou
falsas", considera Collier.
Pequim
limita o montante de capital que pode ser transferido por pessoa
além-fronteiras a 50.000 dólares (43.896 euros) por ano, mas através de contas
secretas em Hong Kong é possível superar esses valores, explica à AFP o
investidor David Webb.
Webb
argumenta que a cidade carece de transparência no seu mercado de capitais e nas
empresas que aí se registam, em parte porque não quer afastar o negócio
alimentado pela China.
"Adotaram
a política do 'não perguntes, nem digas nada', sabendo que a epidémica
corrupção no continente é a origem de muitos dos negócios", refere.
"Estão
preocupados que [mais regulação] reduza a quantidade de negócios e a
atratividade de listar empresas em Hong Kong".
A
China limita a quantidade de dinheiro que cada turista pode levar para fora do
país a um máximo de 20.000 yuan (2.712 euros) e o equivalente a 5.000 dólares
(4,387 euros) em moedas estrangeiras.
As
restrições geram, entretanto, o fenómeno designado de "mulas do
dinheiro": contrabandistas que carregam cintas de notas coladas ao corpo
ou em malas através das alfândegas.
Outro
esquema envolve a emissão de cheques em moeda estrangeira por bancos ilegais na
China em troca de yuan, a moeda chinesa.
Lojas
de câmbio em Hong Kong servem também de facilitadores para transferir dinheiro
para fora.
"Enquanto
maiores são as restrições impostas pelo Estado, em qualquer país, à
movimentação de capital, maiores são os fluxos financeiros ilegais",
conclui Webb.
JOYP
// PJA - Lusa
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