Mariana
Mortágua – Jornal de Notícias, opinião
O
mundo offshore é um sistema paralelo que tem, ao longo dos anos, funcionado com
a complacência e cumplicidade do resto do Mundo.
O
sigilo bancário, os benefícios fiscais e a benevolência regulatória favorecem
os negócios e as transações mais variadas: do planeamento fiscal agressivo à
evasão fiscal, da contabilidade criativa à fraude contabilística, tudo é mais
fácil, e tudo se confunde. No limite, o sigilo que protege o verdadeiro
beneficiário de um negócio de compra e venda de ações é o mesmo que permite o
branqueamento de capitais do tráfico de droga, ou que financia o terrorismo.
A
possibilidade de fuga e fraude fiscal é, provavelmente, um dos maiores fatores
de atração destes territórios. E para isso não é preciso sequer recorrer aos
offshore do tipo mais "agressivo". A Amazon UK, por exemplo, manteve
a sua sede no Luxemburgo, por onde passavam todas as vendas de forma a
minimizar a fatura de impostos. Em 2011, a Google transferiu 4/5 do seu lucro
para uma subsidiária nas Bermudas, reduzindo assim o imposto médio a pagar para
metade. Em 2012, o presidente da empresa referiu-se a esta operação nos
seguintes termos: "Estamos muito orgulhosos na estrutura que que
montámos... chama-se capitalismo". É também conhecido o caso da Apple, que
transferiu 74 biliões de dólares para subsidiárias constituídas para o efeito
na Irlanda, onde pagou 2% de impostos.
A
receita que se perde por esta via prejudica todos os países, que perdem
recursos essenciais para o seu desenvolvimento, mas, além disso, agrava as
desigualdades. Quem não foge porque não quer, ou não pode, tem não só de
sustentar o Orçamento do Estado, como suportar os cortes e a austeridade que
poderiam ser pagas por quem utiliza estes esquemas para fugir.
Não
tapamos o sol com a peneira: o fim das offshore só será possível com um inaudito
esforço supranacional. No entanto, sabendo que essa coordenação é praticamente
impossível no atual contexto, cabe a cada Estado fazer os possíveis para impor
garantias de transparência e de limitação de acesso a estas jurisdições. É com
este objetivo que o Bloco apresentará na Assembleia da República várias
propostas legislativas.
As
offshore são um privilégio de poucos contra uma imensa maioria, e os tempos não
podem estar para privilégios.
Sem comentários:
Enviar um comentário