Ana
Sá Lopes – jornal i, opinião
A
possibilidade cada vez mais confirmada pelas sondagens (que, diga-se de
passagem, têm um historial de pouca fiabilidade no país) de o Reino Unido poder
sair da União Europeia é um assunto apaixonante porque nada está “no seu
lugar”.
Ou
seja, a divisão tradicional esquerda/direita não cabe aqui. Ou, pelo menos, os
argumentos apresentados pelos vários protagonistas são um manancial de
contradições internas. Pode dizer-se que isto acontece porque a Europa vive a
maior crise desde a sua fundação, sem conseguir responder à crise dos
refugiados, por exemplo. Acontece também porque a xenofobia e a ascensão da
extrema-direita estão a regressar devagarinho a níveis só outrora vistos no
“século xx esquecido” de que fala o genial historiador inglês Tony Judt. É verdade
que o euroceticismo inglês vem desde o início – quando profetizou a existência
dos “Estados Unidos da Europa”, num discurso em 1951, Churchill não colocava a
sua ilha lá dentro.
Mas
com a Europa de rastos, com níveis elevados de desemprego jovem, crescimento
anémico e tomada de assalto pelo capital financeiro, é curioso verificar como
um eurocético de sempre como o líder trabalhista Jeremy Corbyn se arrasta em
campanha pelo “ficar”, limitando-se a utilizar os argumentos dos “direitos dos
trabalhadores” que existem na carta social da Europa. Em contraposição, Boris
Johnson, o antigo presidente da Câmara de Londres e candidato mais do que certo
a substituir David Cameron na liderança do Partido Conservador, consegue
argumentar pela saída invetivando a City – e utilizar os números habitualmente
apresentados pela esquerda sobre o fosso salarial entre os muito ricos e os
muito pobres que se abriu a partir dos anos 80 e nunca mais regrediu. Foi num
artigo no “Guardian” que Boris acusou os financeiros de se saberem servir da
Europa, ao contrário do trabalhador inglês comum. O mundo ao contrário. Should
they stay or should they go? Falta uma semana para perceber.
*Tradução
PG
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