segunda-feira, 20 de junho de 2016

O BREXIT E A PAZ NA EUROPA



Para a UE, esta semana é decisiva. Os britânicos votam, enquanto os alemães enfrentam um dilema. E decisões erradas podem ter consequências fatídicas e duradouras, opina Dagmar Engel, chefe da sucursal de Berlim da DW.

Dagmar Engel *

Guerra e paz na Europa: isso é o que está em questão no referendo desta quinta-feira (23/06), sobre a eventual saída do Reino Unido da União Europeia. No governo alemão, em que europeus convictos e experientes são maioria, sabe-se disso – só que não se pode dizê-lo em voz alta. Uma amarga amostra do que espera os alemães e os demais europeus: numa questão de importância existencial para todos, só os habitantes do Reino Unido votam, os demais nada têm a dizer.

O governo Angela Merkel sente esse dilema de forma especialmente pronunciada. Ele sabe ter o apoio da maioria dos alemães, de forma como raramente se vê. Mas não importa o que os ministros alemães e a própria chanceler federal digam: é praticamente certo que será usado contra eles e contra a UE no Reino Unido germanófobo.

O ministro alemão das Finanças, Wolfgang Schäuble, tido como linha-dura – basta perguntar aos gregos – resumiu esse dilema numa triste frase. Quando indagado, em março, em Londres, sobre o que a Alemanha faria, se os britânicos se retirassem da UE, disse: "A gente choraria."

Angela Merkel se impôs um voto de silêncio público na questão do Brexit. Ouve-se pouco mais do que a formulaica asseveração de que todos em Berlim concordam que o Reino Unido é parte da União Europeia – sempre acompanhada da observação que cabe aos britânicos decidir.

Mas, num momento em que não há nenhum microfone por perto, escapam à chefe de governo palavras mais claras: seria "um horror", se houvesse um Brexit.

De chorar e um horror. Não só no aspecto econômico, os custos da saída seriam elevados para todos, de Londres e Manchester até Paris, Berlim e Varsóvia – sobretudo dentro o Reino Unido.

Que o Brexit é uma idiotice econômica, disso já desconfiam até mesmo os seus defensores. Por isso, no momento seus argumentos visam, acima de tudo, as emoções, o retorno ao que é nacional, por supostamente ser autárquico e mais simples. E nesse ponto eles se encontram com os populistas de direita da Europa, seus irmãos e irmãs em espírito. Nacionalistas de todos os países, uni-vos – para separar-vos.

Horror mesmo poderiam ser as consequências políticas de um Brexit. A Europa da CECA, da CEE, da CE e da UE foi e é – apesar de todo o papo da historicamente amnésica geração dos voos baratos – um projeto de paz. Em última linha, não se trata de carvão, mas sim de canhões.

O difícil equilíbrio só é possível se todos os grandes Estados europeus participam no quotidiano, com todas as grandes questões e os muitos pequenos detalhes que ele traz. Uma Europa da UE sem Londres geraria um descompasso: Berlim seria colocado numa posição de dominância que não quer e com que não é capaz de arcar. O ministro alemão das Finanças já vivenciou em que isso pode resultar. Pergunte-se novamente aos gregos: a Alemanha está desacreditada de agir no interesse da Europa.

Na primeira metade do século 20, as questões europeias primeiro trouxeram guerra. Na segunda – também graças aos acordos de Roma, Maastricht e Lisboa – elas trouxeram tanta paz, que ela já parecia coisa garantida. Mas não é: soluções militares voltaram a ser socialmente aceitáveis, ocorrendo por todo o Leste Europeu.

Não em três, nem em cinco, mas talvez dentro de 30 anos pode ser que navios de guerra inimigos estejam novamente cruzando o Canal da Mancha. Isso porque, lá em 2016, sem necessidade, as perguntas erradas receberam a resposta errada. E ninguém no governo alemão pode dizer isso em voz alta, agora.

*Deutsche Welle

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