Enorme
capacidade de manipulação dos poderosos faz com que segmentos menos favorecidos
da sociedade encampem, como suas, teses que na verdade contrariam seus
interesses e só beneficiam os mais abastados. É como se o barco dos que têm
muito, e que são poucos, navegasse rebocando o barco dos que têm pouco, e que são
muitos. Todos na mesma onda
A
capacidade de manipulação dos ricos e poderosos é imensa. Contam, para isso,
não só com seus enormes recursos financeiros como ,com o fundamental apoio da
chamada grande imprensa, que, como é natural, é comandada por ricos e
poderosos. Ou seja, estão todos no mesmo barco.
Essa
capacidade de manipulação faz com que os segmentos mais pobres da sociedade e
as classes médias encampem, como suas, teses que na verdade contrariam seus
interesses e só beneficiam ricos e poderosos. É como se o barco dos que têm muito,
e que são poucos, navegasse rebocando o barco dos que têm pouco, e que são
muitos. Todos na mesma onda.
Um
bom exemplo dessa capacidade de manipulação e cooptação dos que têm menos pelos
que têm muito é a tão falada carga tributária brasileira. Os ricos e poderosos
disseminam uma gigantesca operação de manipulação de informações para confundir
as pessoas e fazer com que todos acreditem na mentira que é a “enorme carga
tributária brasileira”.
Claro
que ninguém gosta de pagar impostos. Isso é um dado histórico, basta nos
lembrarmos de Tiradentes e dos revoltosos de Minas Gerais, entre outros. Mas,
diferentemente do que alardeiam os ricos e poderosos, o problema não é o
tamanho da carga tributária brasileira. O problema é a injustiça do sistema tributário brasileiro, em que os mais pobres e
as classes médias pagam muito mais impostos do que esses ricos e poderosos que
fazem tanto barulho.
O sistema tributário brasileiro é injusto socialmente,
beneficia os mais ricos e prejudica os mais pobres. Essa é a questão
central. Pobres pagam muito mais impostos, pois as decisões sobre tributos são
tomadas por governantes e tecnocratas ansiosos por agradar aos ricos e
poderosos (e que volta e meia trabalham para eles) e pelos representantes que
esses ricos e poderosos têm no Congresso Nacional— e que impedem e boicotam qualquer
reforma desse sistema tributário que venha a implantar a justiça social no pagamento
dos impostos.
A
favor dos manipuladores há outro fator: a incapacidade de sucessivos governos,
nas três esferas da Federação, de aplicar bem e corretamente os recursos
arrecadados com os impostos. É natural, diante da precariedade total dos serviços
públicos e dos reiterados casos de desvios de dinheiro público, que as pessoas,
independentemente de classe social, rebelem-se contra qualquer aumento de
imposto ou da carga tributária.
Os
manipuladores impedem que as informações corretas sejam disseminadas e que haja
um debate sério e qualificado sobre a questão tributária. Fazem isso para
defender seus interesses e continuar pagando impostos irrisórios e sonegando à
vontade e impunemente.
Não
dizem os manipuladores, por exemplo, que estudos do Fundo Monetário
Internacional e da Heritage Foundation, citados por Grazielle Custódio David,
especialista em Orçamento Público e assessora do Inesc – Instituto de Estudos
Socioeconômicos – mostram que entre as 20 maiores economias do mundo, o Brasil
tem a quinta mais baixa carga tributária. A carga tributária brasileira não é
alta como pintam: os problemas são que recai sobre os mais pobres e isenta os
ricos, e os impostos arrecadados são mal aplicados e desviados.
Grazielle,
em matéria de Joana Rozowykwiat publicada no portal Vermelho, mostra que os
impostos indiretos, sobre consumo de produtos e serviços, recaem mais sobre os
que ganham menos. No Brasil, 51,28% dos impostos vêm do consumo. Os salários
contribuem com 24,08% dos impostos, a renda com 18,1% e a propriedade com
apenas 3,93%. A média internacional de imposto sobre propriedade é de 8% a 12%.
Impostos sobre consumo, quando aumentam, se refletem no aumento dos preços.
Empresários jamais aceitam reduzir suas margens de lucro.
No
Brasil, os assalariados têm seus impostos descontados na fonte. Já os
empresários que recebem lucros e dividendos não pagam imposto de renda desde
1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso. Nos Estados Unidos, lucros e
dividendos são taxados em 21,2%, na França em 38,5%. A maior alíquota de
imposto de renda no Brasil, para os que ganham mais, é de 27,5%. Nos Estados
Unidos, é de 39,6%, na Alemanha é de 45% e na Suécia é de 56,7%.
No Congresso, os ricos e poderosos asseguram suas vantagens.
Recentemente o governo propôs um aumento de 30% no imposto de renda sobre
ganhos de capital. O senador tucano Tasso Jereissati, que é empresário, baixou
para 22,5% e ainda aumentou o piso de R$ 20 milhões para R$ 30 milhões.
Legislou em causa própria e a imprensa apresentou o resultado como “derrota do
governo”, omitindo o sentido real da proposta e da derrota.
A sonegação de impostos no Brasil é avaliada, por
Grazielle, em R$ 500 bilhões. A sonegação é
um jogo financeiro do empresariado, que não paga os impostos, aplica o dinheiro
que deveria ter ido para os cofres públicos e depois se beneficia dos programas
de refinanciamento de dívidas, com longo prazo para pagamento e perdão de
juros. Um grande negócio, não permitido às pessoas físicas. E o Congresso
Nacional tem evitado que sonegadores sejam punidos. Quando pagam ou renegociam
as dívidas, são perdoados.
Sem
arrecadar, o Estado não tem como funcionar adequadamente, aqui ou em qualquer
país. Sem impostos, um país não tem recursos para prestar serviços à população.
E quem mais precisa desses serviços são os mais pobres, que mais dependem do
Estado, porque precisam de benefícios sociais, educação e saúde públicas,
segurança e transporte. Os ricos e poderosos que se voltam contra a justiça
tributária e não querem pagar impostos não precisam desses serviços.
A
manipulação desses ricos e poderosos se volta agora contra a CPMF. Na verdade,
o que eles mais temem é que com a CPMF fica muito mais difícil sonegar
impostos. E aí entra também a questão política: são contra a CPMF os que ainda
apostam no agravamento da crise econômica para desgastar e, se possível,
derrubar o governo.
O
povo tem razão de cobrar a correta aplicação dos impostos e não querer que mais
um seja criado. Mas, em vez de se aliar as ricos e poderosos, o que deve fazer
é lutar por uma reforma tributária que leve quem tem mais a pagar mais
impostos, e quem tem menos a pagar menos ou não pagar impostos. E que, de
quebra, simplifique e desburocratize o sistema, reduzindo os custos do Estado e
das empresas para cobrar e pagar impostos.
O
governo federal deveria estar fazendo este debate, e enfrentá-lo com coragem.
Só defender a CPMF, diante da enorme capacidade de manipulação de ricos e
poderosos, aliada à estratégia de desgaste político, é muito pouco.
Hélio
Doyle, Brasil 247 – Pragmatismo Político
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