quarta-feira, 13 de julho de 2016

O NETO DA AVÓ RICARDINA É ACLAMADO NAS RUAS DA GUINÉ-BISSAU – Éder



Até a avó Ricardina aplaude Portugal, o neto Éder é o novo orgulho da Guiné-Bissau

Ricardina Lopes ficou levantada até tarde, mas valeu a pena: nas ruas, o neto que criou é aclamado como o novo orgulho da Guiné-Bissau.

Na avenida há buzinas e grita-se por Portugal e ela, amparada por familiares, vem à porta de casa - a mesma casa onde criou Éder até aos quatro anos. As origens do jogador da seleção portuguesa estão no Bairro da Ajuda, em Bissau.

A idade já não permite a Ricardina falar muito, mas percebe-se o que quer dizer: "Fiquei contente e é um grande orgulho para mim", sussurra para os vizinhos e bate palmas quando lhe dizem que criou um herói do futebol, aquele que marcou o golo que fez de Portugal o novo campeão europeu, na final com a França, no domingo.

Ao lado, Dírcia Lopes, prima de Éder, chora a cada duas ou três frases: "É muita emoção".

Dois anos mais nova do que Éder, foram criados juntos por Ricardina, enquanto os pais procuravam melhores vidas no estrangeiro.

"Corria com ele neste corredor. Depois ele foi, eu fiquei", recorda. E chora mais um pouco, comovida com a festa e com as recordações.

Garante que o jogador guineense naturalizado português já naquela altura tinha "um dom" para dar pontapés na bola.

Puxou o jeito precoce a um tio mais velho, recorda o vizinho Mamudo Djao, um "tio" emprestado de Éder, dada a afinidade com a família.

A mercearia do bairro - paredes meias com a casa de Ricardina - tem uma pequena televisão que serviu para toda a gente das redondezas ver os jogos de Portugal no Euro 2016.

"Hoje por um triz isto não veio abaixo. Quando foi golo, toda a gente gritou muito. Este é o golo crucial da vida do Éder", conclui Djao.

A noite já vai longa e nas ruas de Bissau o nome continua a ser entoado por grupos que festejam a vitória de Portugal.

E uma expressão surge quase sempre colada: "És o nosso orgulho".

Éder marcou no domingo, em Paris, o 49.º e mais importante golo de Portugal em campeonatos europeus de futebol, o que valeu o triunfo na final da edição de 2016, face à França, após prolongamento, aos 109 minutos.

Lusa, em Diário de Notícias

Guiné-Bissau arrecada 16,7 ME com negociação de obrigações do tesouro



A Guiné-Bissau vendeu na segunda-feira todas as obrigações do tesouro público colocadas à negociação, no valor de 11 mil milhões de francos CFA (cerca de 16,7 milhões de euros), anunciou hoje o Ministério da Economia e Finanças em comunicado.

"Esta operação inscreve-se no quadro da execução do programa de emissão de títulos públicos da Guiné-Bissau, em conformidade com a estratégia de gestão da dívida a médio e longo prazo, visando honrar compromissos nos prazos acordados", refere-se no documento.

Trata-se de mais uma das "iniciativas de financiamento do Orçamento Geral do Estado (OGE)", acrescenta - apesar de a instabilidade política no país ter impedido até hoje a aprovação de um OGE para 2016.

A procura pela emissão de segunda-feira correspondeu a 100% da oferta e os cupões têm uma maturidade de três anos com o Estado guineense a remunerar os seis investidores que participaram na negociação com uma taxa de juro de 5,5%.

A operação foi feita em parceria com a União Monetária Oeste-Africana (UMOA) e o Banco Central dos Estados da África Ocidental (BCEAO).

A próxima emissão de dívida será anunciada "oportunamente", conclui o comunicado.

Foi a segunda vez que a Guiné-Bissau se financiou com a emissão de títulos em 2016.

A primeira operação, no valor de 12 mil milhões de francos CFA (cerca de 18,2 milhões de euros), decorreu em abril e, na altura, a procura foi de quase o dobro da oferta, anunciou na altura a UMOA.

Em 2015, o país emitiu também títulos do tesouro por duas vezes.

LFO // VM - Lusa

ONU cria Rede de Mulheres Mediadoras da Guiné-Bissau para resolver conflitos



As Nações Unidas vão criar uma Rede de Mulheres Mediadoras da Guiné-Bissau para resolver conflitos, anunciou a missão política no país.

A rede pretende cobrir sobretudo o mundo rural e contará mais de 100 pessoas já formadas nas regiões e com outras 36 que participam numa ação de formação que decorre a partir de hoje e até sexta-feira, em Bissau.

A iniciativa vai servir para treinar "o exercício da participação política, social e económica, no seio familiar e nas comunidades", refere a ONU em comunicado.

O objetivo passa por "melhorar a capacidade de resposta no domínio da prevenção, gestão, resolução e mediação eficaz de conflitos sobretudo nas zonas mais remotas".

A primeira fase deste processo de capacitação decorreu em junho em Gabu, Cacine e Canchungo, em ações que contaram com a participação de mais de 100 pessoas, maioritariamente mulheres.

Naquelas localidades afastadas da capital foram "criadas as respetivas redes provinciais de mulheres mediadoras".

A atividade faz parte da resolução 1325 do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre as Mulheres, Paz e Segurança.

A resolução, aprovada há 16 anos, reconhece as mulheres como "agentes de mudança capazes de fazer muito mais se tiverem a oportunidade de se manifestar".

LFO // APN - Lusa

Antigo PGR da Guiné-Bissau junta-se a advogados do Tribunal Penal Internacional



O advogado e antigo procurador-geral da República (PGR) da Guiné-Bissau, Amine Saad, foi admitido no grupo de 683 causídicos que vão passar a representar pessoas em julgamento no Tribunal Penal Internacional (TPI).

Em declarações à Lusa, o advogado e professor de Direito Constitucional explicou que o "processo é simples", na medida em que defensores de todo mundo apresentaram a documentação exigida junto do TPI e o seu nome acabou por ser escolhido como tendo reunido as condições necessárias.

Amine Saad, de 61 anos, natural de Mansoa, região centro da Guiné-Bissau, vai figurar numa lista de advogados cuja missão será a de assistir suspeitos, acusados ou vitimas que estejam em processo no TPI.

Licenciado em Direito e mestre em Ciência Jurídica e Política pela Universidade Paris VIII, em França, Amine Saad exerceu advocacia em Portugal entre 1987 a 1991.

Com a abertura politica na Guiné-Bissau, regressou ao país para, entre outras ações, retomar a atividade partidária, tendo liderado várias formações políticas.

Amine Saad foi Procurador-Geral da Republica em duas ocasiões, entre 1999 e 2000 e entre 2009 e 2011.

MB// APN - Lusa

Portugal. EDERZÃO E DURÃOZITO



Miguel Guedes – Jornal de Notícias, opinião

Pretendia limitar-me ao cherne mas sinto-me perto do Éden. Portugal confunde-nos os nomes e as prioridades, sendo que há quem troque as cores de Portugal pela lixeira onde se movem os seus interesses particulares. Familiarmente reconhecido como Éderzito, não há já forma de não recordar o nome para sempre. No seu prolongamento particular de carreira, quando já tantos haviam traçado o fim do seu tempo de jogo, (ar)rematou o Euro"16 e costurou, lá dentro, as redes de uma enorme felicidade colectiva. Éder, o mal-amado que faz do "coaching"- coração, atinge o topo da sua iconografia desportiva, dias depois de um ex-presidente da Comissão Europeia ter atingido o "topo da carreira empresarial". Se Éder foi condecorado em alvará por Marcelo, foi do presidente que Durão Barroso ouviu a frase assassina. Na realidade, há muito que Durão deixou de ser um político na política para dar lugar a um comissário dos seus próprios interesses.

Que ninguém se admire porque é o movimento padrão. Mas não deixa de ser notável que toda a Europa tenha rugido de indignação e espanto perante a medalha de lata que Durão Barroso resolveu comprar para o seu próprio pescoço. Draghi, Monti, Prodi, Borges ou Papademos, todos eles políticos europeus que se apresentaram ao serviço da Goldman Sachs (GS). Mas Durão foi presidente da Comissão Europeia durante uma década e nem dois anos esperou para a servir cadáver. O homem que cozinha na cimeira das Lajes e apoia a invasão do Iraque em 2003 é o homem que pede aos portugueses para vestirem a camisola e, acto contínuo, abandona o barco em 2004. O homem que transita de extremo a extremo - como se fugisse dentro da sua viagem de sonho - é um dos coveiros do projecto europeu e salta, feliz, para dançar dentro da cova que abriu.

Ao accionar o botão da porta giratória para exercer influências num banco de agiotagem que está na origem da crise de 2008, Durão elegeu um pretexto anedótico: minorar os efeitos do Brexit. Acredito, então, que a GS também possa acolher em breve o demissionário David Cameron. Espantar-me-á (desta vez) que Durão mude de opinião sobre o ainda primeiro-ministro britânico de quem disse, bem recentemente, ter andado "20 anos a desvalorizar o trabalho da UE". Feitas as contas, Durão só o faz há uma década e não admitirá semelhante concorrência.

O estigma da comparação. Concorrência era algo que Éder, o nosso herói improvável, não tinha. Sem mais pontas de lança, a selecção navegava num deserto. Mas tinha a competência que poucos sabiam ou adivinhavam, superando o seu conflito de interesse com os golos. Já Durão não ousa ter conflitos, só interesses. E só se superou desta vez porque é verdadeiramente capaz de tudo.

O autor escreve segundo a antiga ortografia

* Músico e advogado

Goldman Sachs. GOVERNANTE FRANCÊS PEDE A BARROSO QUE REJEITE CARGO



O secretário de Estado dos Assuntos Europeus francês pediu solenemente ao antigo presidente da Comissão Europeia Durão Barroso para não aceitar trabalhar na Goldman Sachs.

"O senhor Barroso fez a cama dos antieuropeus. Apelo, pois, solenemente, a que abandone esse cargo", disse Harlem Désir perante os deputados franceses, referindo-se ao cargo de presidente não executivo e conselheiro da Goldman Sachs no seguimento da decisão britânica de sair da União Europeia.

Para o governante francês, esta contratação "é particularmente escandalosa tendo em conta o papel desempenhado pelo banco durante a crise financeira de 2008, mas também o papel na camuflagem das contas públicas da Grécia".

Defendendo alterações às regras sobre as incompatibilidades dos líderes europeus quando saem dos cargos, Harlem Désir considerou que "moralmente, politicamente, eticamente, é uma falha por parte do senhor Barroso" e acrescentou que "este é o pior serviço que um ex-presidente de uma instituição europeia poderá dar ao projeto europeu num momento da história em que, pelo contrário, precisa de ser sustentado, mantido e reforçado".

O banco norte-americano Goldman Sachs anunciou na na semana passada a contratação de Durão Barroso como presidente não-executivo da instituição e de consultor, num momento em que o setor financeiro foi abalado pelas dúvidas sobre a saída do Reino Unido da União Europeia.

"Evidentemente, que conheço a União Europeia e o contexto britânico relativamente bem. Se o meu conselho for útil em tais circunstâncias, estou pronto a ajudar", comentou Durão Barroso, em declarações ao "Financial Times".

Durão Barroso não violou qualquer regra, uma vez que, 18 meses depois de ter terminado o seu mandato, nada obriga os ex-membros da Comissão Europeia a prestar contas à instituição.

"Os ex-comissários, obviamente, têm o direito de prosseguir a sua carreia profissional ou política", disse um porta-voz da Comissão Europeia, acrescentando que é legítimo as pessoas com grande experiência e qualificações desempenhar funções de liderança no setor público ou privado.

Jornal de Notícias - Foto: Global Imagens

“MULHER DIFÍCIL” - Theresa May traz promessa de união ao Reino Unido pós-Brexit



Camila Alvarenga, São Paulo – Opera Mundi

'Não sou sua típica política', diz ministra do Interior pelo Partido Conservador, que substituirá David Cameron nesta quarta e já é comparada a Margaret Thatcher

“Eu não sou sua típica política”. É assim que Theresa May, atual ministra do Interior e futura líder do Partido Conservador e primeira-ministra do Reino Unido se define. Paralelamente, seus colegas a consideram uma profissional experiente e uma “forte liderança”, e parte da imprensa a tem comparado com a ex-premiê Margaret Thatcher, chamando-a de “nova Dama de Ferro”. 

May assumirá a liderança do governo britânico na quarta-feira (13/07) e seu principal desafio será levar a cabo a saída do Reino Unido da União Europeia, decisão votada em referendo realizado em 23 de junho. Apesar de ter se posicionado contra a saída, chamada de “Brexit”, a ministra já afirmou que não realizará outro referendo: “Brexit significa Brexit”.

“É muito importante que reconheçamos que o Brexit irá acontecer, mas não podemos deixar isto nos consumir. Existem muitas outras coisas que o governo também precisa fazer”, disse ela em uma entrevista ao jornal britânico The Telegraph. A ministra já afirmou que pretende criar um departamento para a “Brexit” que será comandado por algum político que fez parte da campanha pela saída do bloco.

Entretanto, ela ainda não abordou como realizará esta saída e não comentou os temas que circundam a “Brexit”, como a questão da imigração e dos refugiados, por exemplo. A desistência da secretária de Estado e Energia e Mudança Climática, Andrea Leadsom, da corrida pela liderança conservadora e britânica, fez com que May não precisasse abordar estas questões, visto que a disputa se encerrou antecipadamente.

Ainda que May não tenha se posicionado, seu histórico político mostra certa convergência com os “brexiters”, que defendiam a saída da UE como uma forma de conter a imigração para o Reino Unido.

Durante a convenção conservadora de outubro do ano passado, May afirmou em discurso que refugiados precisavam, de fato, de ajuda, “mas esta ajuda deverá ser na forma de auxílio enviado àqueles que ficaram em campos de refugiados na Jordânia, Líbano e Turquia, e não àqueles que fugiram para a Europa”.

Na ocasião, ela também defendeu a decisão do governo de aceitar apenas cinco mil refugiados sírios por ano, criticando a chanceler alemã, Angela Merkel, por ter aceitado receber 800 mil anualmente.

Além disso, em 2013, May apoiou um pacote de medidas contra imigrantes sem documentação no Reino Unido. A legislação foi descrita pela então ministra do Interior como tendo o objetivo de “criar um ambiente hostil aos imigrantes ilegais” e visava dificultar o acesso destas pessoas a serviços públicos, a empregos, a contas bancárias e a propriedades, além de tornar mais difícil para estrangeiros sem documentos recorrer contra decisoes de deportação.

O projeto ainda tramita no Parlamento britânico, mas, em 2015, foi aprovada uma lei que permite prender durante seis meses e confiscar os salários de estrangeiros que estejam trabalhando no Reino Unido sem documentação.

May, por outro lado, afirmou que, como primeira-ministra, buscará trabalhar e ajudar a classe trabalhadora britânica. “Precisamos de uma nova, positiva e forte visão para o futuro de nosso país. A visão de um país que funciona, não para os privilegiados, mas para todos nós”, disse ela em discurso nesta segunda-feira (11/07).

“Se você nasce pobre hoje no Reino Unido, você morrerá em média nove anos mais cedo que os outros. Se você é negro, você é tratado mais duramente pela Justiça criminal do que se você fosse branco. Se você é um rapaz branco da classe trabalhadora, você tem menos chance do que qualquer um de entrar em uma universidade. Se você estuda em uma escola pública, você tem menos chances de chegar a uma profissão privilegiada do que se estivesse em uma escola privada. Se você é uma mulher, você ganhará menos do que um homem. Se você sofre de doenças mentais, geralmente não terá ajuda. Se você é jovem, achará mais difícil do que nunca ter uma casa própria. Estas são injustiças grotescas e eu estou determinada a lutar contra elas”, escreveu May em seu projeto para o Reino Unido, divulgado pelo jornal britânico The Sun.

Margaret Thatcher e Theresa May

May será a segunda mulher na história do Reino Unido a ocupar o cargo de premiê. A primeira mulher a assumir o cargo foi Margaret Thatcher, também do Partido Conservador, que liderou a região entre 1979 e 1990.

“Eu acho que só pode existir uma Margaret Thatcher. Eu não sou uma pessoa que naturalmente busca modelos a serem seguidos. Eu sempre, independentemente do trabalho que eu esteja fazendo, dou o meu melhor. Dou tudo de mim e tento fazer o melhor trabalho possível”, disse May em entrevista recente ao jornal britânico The Independent.

A comparação entre May e a “Dama de Ferro” — apelido dado a Thatcher por um militar russo de maneira pejorativa, mas que passou a fazer referência à personalidade forte e supostamente inflexível da então premiê — é praticamente inevitável, visto que May é conhecida no Parlamento britânico como uma mulher “extremamente difícil”, “com muita força de caráter” e que não cede sob pressão, assim como Thatcher.

“No Parlamento, eu sou criticada às vezes por fazer política do meu jeito. Como [o ex-chanceler] Ken Clarke disse sobre mim nesta semana, posso ser uma ‘mulher extremamente difícil’. Mas como eu disse posteriormente, ‘Sim [sou extremamente difícil], e a Comissão Europeia está prestes a descobrir isso’, porque eu não sou sua típica política”, escreveu May em sua “Visão para o Reino Unido”. A ministra também já havia dito que a política “poderia se aproveitar de mulheres ‘extremamente difíceis'”.

Além disso, assim como a ex-primeira-ministra, May é criticada por ser uma mulher com posição de destaque na política, sendo julgada até mesmo por suas roupas e sapatos coloridos.

“Eu gosto de roupas e gosto de sapatos. Um dos desafios das mulheres no local de trabalho é o de sermos nós mesmas e dizer que somos inteligentes e gostamos de roupas. Você pode ter uma carreira e gostar de roupas”, afirmou ela, que se considera feminista.

“Eu sempre digo às mulheres ‘vocês devem ser vocês mesmas, não pressuponham que devem se encaixar em algum estereótipo’, e se sua personalidade é mostrada por meio de suas roupas ou sapatos então que seja”, reforçou em outra ocasião.

RELATÓRIO MOSTRA QUEM LUCRA COM AS GUERRAS



Traficantes enchem o Oriente Médio com armas e depois pressionam a UE para militarizar as fronteiras contra os refugiados - lucrando com os dois conflitos.

Nika Knight, Common Dreams – Carta Maior

Enquanto a Europa se conforma com a votação do Brexit alimentada em grande parte por um ódio xenofóbico, um novo relatório expõe como os especuladores das guerras estão influenciando políticas da União Européia para lucrar com os conflitos intermináveis no Oriente Médio bem como a onda de refugiados criada pela mesma instabilidade e violência.

O relatório Guerras nas Fronteiras: Os traficantes de armas lucrando com a tragédia dos refugiados na Europa, divulgado em conjunto pelo Instituto Transnacional (TNI) e pelo European Stop Wapenhandel na segunda-feira, destaca a busca dos comerciantes de armas pelo lucro nos conflitos intermináveis do século 21.

“Há um grupo de interesse que tem se beneficiado somente pela crise dos refugiados, e em particular do investimento da União Européia (UE) em ‘proteger’ suas fronteiras”, diz o relatório. “São as companhias militares e de segurança que fornecem o equipamento aos guardas de fronteiras, a tecnologia de vigilância para monitorar fronteiras, e a infraestrutura da tecnologia da informação (TI) para rastrear os movimentos das pessoas”.

O relatório mostra que “essas companhias estão longe de serem beneficiárias passivas da generosidade da UE e que estão encorajando ativamente uma securitização crescente das fronteiras européias, e estão dispostas a fornecer cada vez mais tecnologias draconianas para fazer isso”.

Na década passada, o relatório mostra, os agentes corporativos viram a guerra difícil no Oriente Médio como um lucro inesperado: “muitas companhias internacionais grandes de armas se referiram à instabilidade no Oriente Médio para assegurar aos investidores sobre perspectivas de futuro em seus negócios. As companhias de armas são auxiliadas pelos governos europeus, os quais promovem ativamente armas européias na região e são muito relutantes em impor políticas de exportação de armas mais rígidas”.

De fato, “de 2005 a 2014, os estados membros da UE garantiram licenças de exportação de armas ao Oriente Médio e para o norte da África com o equivalente de mais de 82 bilhões de euros”, de acordo com o relatório.

Ele detalha como um fluxo consistente de armas de fora do Oriente Médio supre todos os agentes em conflitos múltiplos, como a guerra civil na Síria, com um fornecimento interminável de armamentos de alta tecnologia – garantindo, assim, a duração longa desses conflitos.

E, enquanto essas guerras criam mais e mais refugiados que procuram asilo na Europa, as mesmas corporações estão pressionando a UE para securitizar suas fronteiras contra eles – criando assim lucro adicional para aqueles nos negócios da militarização.

Além do mais, o TNI e o Stop Wapenhandel descobriram que “representantes de indústrias, oficiais de governo e exército e equipes de segurança, se encontram ao longo do ano em conferências, feiras e mesas redondas”.

O relatório parafraseia Nick Vaughan-Williams, professor de segurança internacional da Universidade de Warwick, dizendo: “Nesses eventos, é possível identificar uma cultura cíclica na qual a apresentação de novas tecnologias não somente responde, mas também permite e avança na formulação de novas políticas e práticas no campo da segurança de fronteiras e gerenciamento de migração”.

E essas “feiras especiais e congressos sobre segurança de fronteiras são relativamente novos”, nota o relatório. “Todos começaram dentro da ultima década”.

“Eu acredito que a influência do exército e da indústria de segurança na formação das políticas de segurança de fronteiras da UE é muito grande, especialmente na securitização e militarização dessas e no uso expansivo de tecnologia de vigilância e troca de dados”,  disse Mark Akkerman da Stop Wapenhandel ao Common Dreams. “Os esforços da indústria incluem interações regulares com instituições das fronteiras da UE ( incluindo políticos e representantes de alto escalão), onde idéias são discutidas e que se tornam depois novas políticas da UE”.

“Por exemplo, a indústria tem pressionado por anos por uma atualização da [agência de fronteira da UE] Frontex para uma agência de segurança de travessias de fronteira”, disse Akkerman. “A nova Agência Européia de Guarda Costeira e Fronteiras proposta pela Comissão Européia, que tem muito mais poderes (tem seu próprio equipamento, intervenções diretas nos estados membros, decisões ligadas à pressões aos estados membros para fortalecer a segurança nas fronteiras) do que a Frontex tem agora, é exatamente isso”.

“Se o establishment da Agência Européia de Guarda Costeira e Fronteiras proceder”, nota o relatório, “significaria uma mudança fundamental para um sistema de segurança de fronteiras controlado pela UE, com a possibilidade de evitar os estados membros e forçá-los a fortalecer os controles e adquirir ou atualizar o equipamento”.

“Não é difícil prever que isso levará a um uso de rotas mais perigosas pelos refugiados, fortalecendo os negócios para os traficantes. Para as indústrias do exército e de segurança, no entanto, significa mais ordens da agência e dos estados membros”, continua o relatório.

Akkerman apontou a negligência da UE com os direitos humanos nesse processo motivado pelo lucro:

Os direitos humanos dos refugiados não têm papel importante nesse pensamento, exceto por motivos de promoção. Ambos os responsáveis pelas políticas e pela indústria às vezes tentam vender o aumento da militarização na segurança das fronteiras como um esforço humanitário, em termos de fortalecimento de pesquisa e resgate. A UE tem repetidamente tentado botar toda a culpa pelas mortes dos refugiados nos traficantes. Isso resultou no estreitamento da resposta para: “devemos retirar o modelo de negócio do tráfico” - com ainda mais meios militares para tentarem realizar isso.

Isso cria uma espiral descendente: quanto maiores os controles, maior a repressão e maiores os riscos que os refugiados são obrigados a tomar e que resultam em mais mortes. Experts e organizações de direitos humanos têm alertado sobre isso por anos, mas têm sido ignorados.

Enquanto sobe o número de mortes e um número record de pessoas deslocadas pelo conflito, parece que o lucro e o abuso aos direitos humanos irão prevalecer.

Créditos da foto: Fotomovimiento

Zeitgeist: A RÚSSIA E A EXPANSÃO DA OTAN PARA LESTE



Provocação do ponto de vista dos russos, imperativo de segurança na argumentação de antigos países satélites da União Soviética: expansão da Otan para o leste é polêmica e muito criticada. Confira na coluna desta semana.

Para os russos, talvez seja mais uma provocação que o recente encontro de cúpula da Otan tenha acontecido justamente em Varsóvia. Afinal, a aliança militar liderada pela antiga União Soviética, contraponto à Otan, carregava justamente o nome da capital polonesa.

O Pacto de Varsóvia é história, e boa parte dos membros de então ingressou na Otan. A expansão da Aliança Atlântica para o leste começou em 1999, com os ingressos da Polônia, da República Tcheca e da Hungria. Em 2004, seguiram-se Bulgária, Estônia, Letônia, Lituânia, Romênia, Eslováquia e Eslovênia. Em 2009, a Albânia e a Croácia.

Esse processo, ainda em andamento, incomoda a Rússia, que o encara como provocação. Pelo artigo 5 da Otan, o ataque a um país-membro é um ataque a todos. Se a Ucrânia fosse membro da Otan, a presença de tropas russas em território ucraniano seria automaticamente uma afronta a toda a aliança militar.

A proteção é o principal argumento de países do Leste Europeu para o ingresso na Otan. Eles temem a Rússia e citam os recentes conflitos na Geórgia e na Ucrânia como exemplos.

Já a Rússia vê a expansão da Otan como provocação, se não ameaça, e invoca um argumento controverso: durante as negociações que levaram à reunificação da Alemanha, em 1990, políticos ocidentais teriam prometido que a Otan não ampliaria sua fronteira oriental.

Não existe um acordo conhecido que sustente essa afirmação, mas transcrições de conversas da época (por alguns anos secretas, mas hoje de livre acesso) mostram que diplomatas ocidentais de fato fizeram promessas nesse sentido para conquistar a anuência russa à reunificação alemã.

Em 2009, a revista alemã Der Spiegel publicou trechos de uma conversa entre o ministro alemão do Exterior, Hans-Dietrich Genscher, e o seu colega soviético, Eduard Shevardnadze, na qual o diplomata alemão fala claramente que a Otan não vai se expandir para o leste. Promessa semelhante teria sido feita pelo então secretário de Estado dos EUA, James Baker.

A questão de por que a União Soviética não exigiu esse compromisso por escrito pode ser encontrada numa declaração de Shevardnadze, citado pela revista alemã: "No início dos anos 1990 ainda existia o Pacto de Varsóvia. A possibilidade de que a Otan iria se expandir para países dessa aliança soava então absurda".

Controvérsia à parte, vários historiadores, diplomatas e políticos americanos consideram a política de expansão oriental da Otan um erro, argumentando que ela serve para acirrar tendências nacionalistas, antiocidentais e militaristas na Rússia.

A coluna Zeitgeist oferece informações de fundo com o objetivo de contextualizar temas da atualidade, permitindo ao leitor uma compreensão mais aprofundada das notícias que ele recebe no dia a dia.

Alexandre Schossler – Deutsche Welle 

A PROPÓSITO DOS FUTEBÓIS!




PONTO:

Em nada simpatizo com a indústria do futebol e com as alienações que se prendem a ele, que fazem parte dos expedientes correntes de domínio de 1% sobre o resto da humanidade!...

Por isso o futebol deve medrar enquanto cultura e se possível, cultura de resistência, pelo que em Portugal o futebol pode ser interpretado como factor de vitalidade, em contraposição à sua manipulação!...

Nesse sentido em Portugal há expressões de cultura que se vão tornando excelentes nos seguintes âmbitos: turismo, sol, praias, restauração, azeite, cortiça, vinhos, hospitalidade...

Esta selecção operária (como as elites têm medo de utilizar este termo), é expoente de cultura de resistência e uma nova "imagem de marca" que honra (e desonra) o povo e a cultura portuguesa neste século XXI!...

PONTO INTERMÉDIO:

Alguém se terá preocupado em estudar o significado sócio-político do "ranking" da FIFA, em plena época das batotas capitalistas neoliberais?...

Quanto dos primeiros lugares desse "ranking" se afirmam à custa do afundamento de outros?...

A título de exemplo: por que razão William de Carvalho foi absorvido pela selecção portuguesa, quando com o contributo dele (e de outros como tal), Angola teria provavelmente outro lugar nesse "ranking"?...

Até quando isso vai continuar?...

Afinal a quem pertence o "planeta futebol"?
  
CONTRAPONTO:

Agora, para além da tradicional "fuga de cérebros", também há a fuga de futebolistas aproveitando as oportunidades da assimilação, de que a Europa não se pode livrar!...

Livram-se dos migrantes que fogem aos banhos de sangue provocados pelas alianças das elites europeias, mas escancaram as portas a todas as aptidões que estejam de acordo com seus interesses e conveniências!...

Necessário é lembrar quanto as alienações abrem as portas ao neocolonialismo! 

Foto: Crianças sírias e o único futebol que lhes é possível – futebol de matraquilhos na cidade mártir de Alepo!


XANANA GUSMÃO CONVIDA SELEÇÃO A VISITAR TIMOR-LESTE - FPF QUE DESEMBOLSE!




As sanções na baila, ainda. O tema promete arrastar-se até ao fim de semana ou até ao mês que vem. Provavelmente ainda vai continuar na atualidade mesmo depois do Costa já nem estar no governo e no seu lugar estar o Passos Coelho, a Luís Albuquerque, a senhora das vacas e das couves que é a grande patroa do CDS. Enfim, estará por lá o governo da União Europeia dos neoliberais-fascistas que com mentiras e mais mentiras iludem e vigarizam os eleitores. Vê-se disso um pouco por toda a Europa e pelo mundo. Os criminosos voltam ao local do crime. Novamente PM, Passos dirá que Costa foi tão mau PM que a EU penalizou Portugal. O salafrário é capaz de mentir com a maior das canduras das virgens (da tanga). Sanções, depois há mais. Agora chega.

Assunto que ainda não saiu a público em português foi o da seleção nacional de futebol, campeã da Europa. Mais futebol. O tema é esse mas a notícia (que ainda não vimos em português, só em tétum) é sobre o convite de Xanana Gusmão à visita a Timor-Leste dos da seleção. Não deixa impressionar que um país tão distante tenha para com Portugal e os portugueses algo que muitos outros da lusofonia não têm: estima, carinho, amizade, talvez amor. Indiscutivelmente são patriotas mas num cantinho do coração mora lá Portugal. Merecidamente por algumas coisas boas, imerecidamente por muitas coisas más. Como mandavam as regras do colonialismo fascista de Salazar-Caetano. Outros tempos. Tempos de muito sofrer que ainda se carregariam mais de sofrimento e de centenas de milhares de assassinatos, prisões e torturas com a ocupação da Indonésia durante 24 anos. Anos de luta pela Pátria, até à vitória final. E assim, em nome de um povo tão grande, de um país que é metade de uma pequena ilha mas cuja Pátria é enorme, os grandes do futebol português são convidados a os visitarem. Vão, e a Federação Portuguesa de Futebol que pague todas as despesas da deslocação e da estadia. Será uma forma de agradecer o apoio que os timorenses deram em modo de avalanche à seleção, a Portugal, aos portugueses em Timor-Leste e pelo mundo. Já agora não esqueçam Macau e Malaca. A Federação que pague, que não seja sovina.

Este curto Expresso, através do teclar de uma senhora jornalista nada dada a futebóis (imagina-se), também não inclui a notícia do convite de Timor-Leste à seleção. A pesquisa realizada também deixa a Lusa e todos os outros fora da atualidade do tema. Mas não deve tardar a depararmos com o título que se impõe: Xanana convida seleção a visitar Timor-Leste. Ou, Timor-Leste convida a seleção portuguesa a visitar o país.

Título no prelo. Julgamos que assim seja. Oxalá.

A seguir o Expresso Curto, que esta introdução já vai longa. Bom dia e sejam felizes. Benzam-se. Ai…

Mário Motta / PG

Bom dia, este é o seu Expresso Curto 

Luísa Meireles – Expresso

Eles disseram “sim”

E deram-nos uma tampa. A Europa dos números (não da bola) não se deixou convencer pelos argumentos portugueses. Falo das sanções, claro, ou, explicitando melhor, da confirmação pelo Conselho de ministros das Finanças da União Europeia da recomendação da Comissão Europeia que vai dar início ao referido processo. A “decisão é injustificada”, diz o Primeiro-ministro, e isso foi o mínimo que ele disse.

Em boa verdade, António Costa não poupou nas palavras e até apelou ao bom senso do Presidente Juncker (“coisa que outros presidentes não têm revelado”, disse, no limite da linguagem diplomática). Portugal tem agora 10 dias para contestar e vai fazê-lo, a Comissão tem 20 dias para propor as sanções.

Mas não vai haver Plano B, nem medidas adicionais, repete o ministro das Finanças e o Primeiro-ministroa chave pode estar no Orçamento para 2017. Espanha, essa, já entregou o seu plano a Bruxelas: 6000 milhões em impostos sobre as empresas. Em vésperas de constituir Governo, é dose.

Nós, por cá, depois de, por dois dias, termos acreditado que éramos os melhores da Europa, eis que apanhamos em cheio um banho de realidade. “Temos mais razões para acreditar em Portugal”, disse oPresidente Marcelo, mas, pelos vistos, os homens que cumprimentaram Centeno não acreditam. E um, acima de todos, não acredita mesmo. O todo-poderoso ministro alemão Wolfgang Schauble (o mesmo que há três semanas dizia que Portugal iria precisar de um resgate) pensa até que “as sanções não servem para castigar, mas para incentivar”. Não sei em que país tal máxima funciona (e a História tem-se encarregado de o provar em variadíssimas situações), seguramente não se ensina em nenhuma escola de educação.

Esta é, pois, a Europa que temos e nós, pobres mortais portugueses, “passada a euforia da vitória do Euro, lá regressámos à malfadada história das contas que nos atormentam”, como diz um cético Henrique Monteiro. A festa durou pouco. “É o mundo depois de Éder (d.E.)”, afirma Ricardo Costa. Assim é, estamos em plena lei da irracionalidade, como muito bem diz o editorial do Público: é muito difícil encontrar alguma base de racionalidade neste afã das instituições europeias em aplicar sanções. “E assim se vai acumulando o capital de queixa de que são feitos os eurocéticos”.

Portugal tem bons argumentos para contestar, nós aqui contámos sete. A ver se pegam ou, dito de outro modo, se convencem quem até agora não se deixou convencer. Joana Mortágua, do Bloco de Esquerda, disse na SIC que há duas lições a tirar, uma é que “todas as medidas de austeridade não nos salvaram afinal nem das sanções nem do castigo; a outra é que a Europa está a condicionar o atual governo para impor mais medidas de austeridade”. Que a Europa quer garantias sobre o orçamento deste ano ninguém duvida. “Jogo de pressões, um alerta para que se cumpra a execução orçamental deste ano”, afirmou António Vitorino, também na SIC, no seu habitual comentário com Santana Lopes, o qual por sua vez considerou todo o assunto “uma anedota”. Quanto ao Presidente da República, comentou que a Europa podia ser salomónia, "aplicar uma sanção e a sanção ser zero". Uma boa solução, mas que não nos livra do chamado efeito reputacional nos mercados.

O PSD e o CDS também discordam e lamentam a decisão, mas lançam as culpas sobre o Governo, que não defendeu como devia “o legado que recebeu do esforço dos portugueses”, o que o PS contesta. Parece sina: é sempre pelos maus motivos que os partidos discutem a política interna. O ministro Santos Silva pediu "união em nome do interesse nacional", mas o PSD acusou-o de cinismo.

OUTRAS NOTÍCIAS

Ainda o Euro bom, que esse pelo menos dá-nos alegria (e cliques – que tudo o que diz respeito ao euro tem leitura assegurada). A história do menino Éder, o "melhor trambolho que há”, é uma delícia aqui contada por um seu antigo colega (a propósito, sabia que havia um clube chamado Adémia? Eu não, tive que ler para saber que foi lá que o nosso génio desengonçado da bola começou a jogar – e se duvida, veja o próprio do golo em câmara lenta); já esta outra é um vómito (e não falo em sentido figurado), mas sabe que foi a notícia mais lida ontem no site no Expresso? As coisas de que os leitores gostam são para mim até hoje um mistério insondável.

A propósito, sabia que o Turismo de Portugal convidou o adepto francês consolado pelo menino luso-descendente, num vídeo que estourou nas redes sociais, a visitar o nosso país? E até lançou um apelo para o identificar! É nas oportunidaes que está o ganho, dir-se-ia.

E por falar em bola, que tal nos lembrarmos que também somos bons no atletismo? Corrijo, somos boas, porque são elas que estão a dominar. Deu conta que as atletas portuguesas ganharam cinco das seis medalhas que o país trouxe para casa no Campeonato Europeu de Atletismo? A propósito, é hoje que o Presidente da República as condecora, corrigindo uma ausência que já estava a ser notada: “Também gostava de ser comendadora, mas pelo andar vai ser difícil”, lançou Jéssica Augusto, que ganhou a medalha de bronze na meia-maratona. “A ver se o nosso Presidente repara em nós”. Pois bem, reparou.

No meio de tanta alegria, ocorreu uma tragédia e nem todos se deram conta. O acidente com um avião C-130 em treinos, que provocou a morte a três militares, ensombrou os festejos da chegada da seleção a Portugal. A história de como o co-piloto e o mecânico morreram ao tentar salvar o piloto está contada no Diário de Notícias,o filme do acidente na SIC. Agora, a Força Aérea investiga como é que foi possível tal acontecer. Uma falha de potência dos motores estará na origem do acidente, diz o Correio da Manhã.

Falando de outros assuntos, não menos sérios – daqueles que nos chegam ao bolso – ontem soube-se que o Governo de Passos/Portas deixou um buraco de 50 milhões na eletricidade, ao reter as verbas provenientes da contribuição extraordinária do setor energético. Agora tente adivinhar quem se arrisca a ter de o pagar. Acertou, somos mesmo nós, eventualmente na conta da luz, como aqui explica o Miguel Prado.

Outro dia grande para António Guterres, ontem nas Nações Unidas. O ex- Primeiro-ministro defendeu num novo debate entre candidatos que o mundo precisa de liderança e valores e não se esqueceu de dizer que, se for eleito, aplicará a paridade em todos os níveis da organização. É a circunstância que o diminui, num momento em que entrou na corrida mais uma mulher, a costa-riquenha Christiana Figueres.

Na frente parlamentar, duas notícias: a Esquerda chama Paulo Portas, Durão Barroso e Martins da Cruz para depor sobre a guerra do Iraque, o PSD Jorge Sampaio. O ex-Primeiro-ministro e novo CEO não executivo da Goldman Sachs já disse que "se, fosse hoje, não teria tomado a mesma decisão". A sua versão de que tinha avisado previamente Sampaio foi desmentida pelo ex-Presidente da República. Por outro lado, a apresentação quinzenal dos desempregados deve acabar em Outubro, em função de um projeto-lei acordado entre o BE e o PS que deverá ser votado ainda na próxima semana, a última deste ano parlamentar.

E não é que no Conselho de Estado de segunda-feira, o ex-Presidente Cavaco Silva estragou a unanimidade sobre as sanções? A história vem no Público.

Lá fora

REINO UNIDO. A Grã-Bretanha vai ter a segunda Primeiro-ministra na sua história, conservadora como a pioneira Margareth Thatcher. Theresa May, a filha do vigário, toma hoje posse. Leiaaqui um breve perfil desta eurocética, que votou pela permanência do país na UE, e tem a tarefa hercúlea de unir o partido e ao mesmo tempo negociar aquilo que não quis. Quatro milhões de britânicos assinaram uma petição para repetir o referendo sobre o Brexit e a Câmara dos Comuns vai debater o assunto. Sem grande esperança, diga-se de passagem. A nova primeira-ministra já disse que "Brexit significa Brexit".

EUA. Já se previa, mas foi ontem que aconteceu. Bernie Sanders, o candidato democrata às presidenciais americanas de novembro,desistiu e apoia a rival Hillary Clinton, que tem assim a via aberta para a nomeação. “Nestes tempos desafiantes para o nosso país, esta eleição deve unir-nos, não dividir-nos, tenho a intenção de fazer tudo o que for possível para ter a certeza de que (ela) será a próxima presidente dos EUA”, disse Sanders. Do outro lado da barricada, o candidato Donald Trump não perdeu tempo em acusá-lo de “se ter vendido”. À Trump.

ITÁLIA. Um choque frontal de comboios provocou pelo menos 20 mortos. Foi perto de Bari, no sul de Itália, numa das linhas mais frequentadas do país. A outra notícia tem igual poder destruidor e a nível europeu: os bancos italianos têm dois PIB de Portugal em crédito mal parado, um alerta e uma situação bem mais preocupante, diz o DN. O resgate pode custar 40 mil milhões de euros.

ANGOLA. A subida do preço do petróleo levou o Governo a prescindir dos serviços do FMI, mas nem por isso a situação económica melhorou. Os preços dispararam nos últimos 12 meses 31,2%, triplicando as previsões do Executivo. Só. A seca, entretanto, já fez o país perder 500 mil cabeças de gado e agora são as Nações Unidas que estão a procurar ajudar.

IRLANDA. Para mim, é a notícia espantosa do ano: o PIB do país, resgatado pela União em 2010, cresceu 26,3% (sim, leu bem) em 2015. A razão? As empresas com grandes ativos, as multinacionais, mudaram para lá as suas sedes, para beneficiar da baixa taxa de imposto. O ministro das Finanças já veio todavia por água na fervura, dizendo que o crescimento real não é assim tão “dramático” (apesar de tudo 5,5%, segundo diz), mas que não está a gerar emprego nem tem qualquer efeito na economia real. Nem tudo o que luz é ouro. A quem aproveita então tal crescimento?

FRASES

"Não se podem tomar decisões sabendo que existem tensões grandes na Europa", Mário Centeno, ministro das Finanças, à saída do ECOFIN

"A Europa é dos cidadãos, não das regulamentações", Idem

"Foi na apresentação destes argumentos que o Governo falhou, por incompetência ou razões políticas", Maria Luís Albuquerque, ex-ministra das Finanças

"Este processo existe porque Maria Luís Albuquerque foi ministra, não porque já não é ministra", João Galamba, deputado e porta-voz do PS

"Arrepiei-me todo quando ganhámos o Euro e começou a tocar a nossa música", Zé Pedro, dos Xutos e Pontapés, ao I

"A forma de trepar não é indiferente e Durão trepou pelo lado errado", Carlos Zorrinho, eurodeputado do PS, no I

O QUE ANDO A LER E A VER

Li pela primeira vez o “Amor de Perdição”, do grande Camilo Castelo Branco, quando tinha 14 anos, numas férias grandes, no tempo em que o tempo passava tão devagar que se enchiam as malas de livros para o preencher. Acho que não devo ter percebido nada do que lia, porque me lembro que ri às gargalhadas perante o contraste dos tempos e das mentalidades, o enredo ultra-romântico que me era então impossível de entender e usufruir. As trágicas mortes de Simão, Teresa e Mariana eram demasiado intangíveis. Só o tempo me fez compreender a obra maestra e mais conhecida de Camilo, que agora volta a estar na moda. Encantei-me com a edição da Guerra e Paz, que replica a 5ª edição, de 1879, revista pelo próprio autor e que se esgotou ainda em vida do escritor. Na atual edição, publicam-se os prefácios da 2ª e da 5ª e acrescentam-se “Uma quase biografia”, de Manuel Pinheiro Chagas (1910) e uma crítica de Ramalho Ortigão. Uma preciosidade. Se puder, leia – o Expresso começará aliás a publicar obras de Camilo a partir da edição desta semana.

Entretanto, enquanto não o faz, pode parar aqui e regalar-se com este magnífico texto do “The Guardian” sobre um tema mais do que atual:“Como a tecnologia desfaz a verdade” e onde se fala de jornalismo e não só, das redes sociais (é o Facebook que decide o que são as notícias), de como na era digital é mais fácil publicar e difundir falsa informação (“who cares?”), como se torna difícil distinguir os factos verdadeiros dos que não o são e como o leitor acaba por acreditar naquilo em que já acredita. Qual é o papel do jornalismo aqui, interroga-se (e interroga-nos) a autora, Katharine Viner.

Se preferir, faço-lhe outra sugestão, desta vez cinéfila. Há um filme a não perder: “Francofonia, o Louvre sob ocupação”, do genial Alexander Sokurov. Só um russo pode fazer um filme assim, evocando tanto e tanta coisa. A história cruza as vidas de Jacques Jaujard, diretor do Museu do Louvre, e do conde Franz Von Wolff-Metternich, então chefe da Kunstschutz (Comissão Alemã para a Proteção de Obras de Arte em França) durante a ocupação de Paris, na segunda Guerra Mundial, que se unem para preservar as obras de arte do museu. A propósito desta história real, o filme fala da vida, da arte, do poder e da cultura europeia. Uma obra-prima.

E agora, já é tempo de lhe desejar um bom dia!

Nós estamos por cá, a toda a hora, à distância de um clique, ou às 18h, para mais uma edição do Expresso Diário (digital, pois claro, mas onde se conta a verdade do dia).


BREXIT: E DEPOIS DO ADEUS?



Alberto Castro*, Londres

No dia 24 de junho a Europa e o mundo foram tomados de surpresa com o desfecho do referendo britânico onde 52% dos eleitores votaram a favor do Brexit, como ficou conhecido o lado do argumento que defendia a saída do Reino Unido (RU) da União Europeia (UE) após um casamento de 43 anos que, diga-se, nunca sempre foi pacífico. Isso porque o RU, com sua insularidade eurocêntrica e ainda com forte memória dos tempos do império verdadeiramente global, aquele onde "o sol nunca se punha", jamais se entregou de corpo e alma ao ideal europeu. Mais do que incrédulos, acordaram em estado de choque, revolta e descrença os 48% de britânicos que votaram pela permanência do país no bloco. 

''Tomamos de volta o nosso país'', jubilavam os partidários da saída, sobretudo os ultra-nacionalistas e eurocéticos radicais que, embora com sondagens favoráveis, nunca acreditaram ser possível o desfecho dado pelo veredicto popular. ''Uma tragédia'', dizia inconformado o lado oposto que logo clamou por um segundo referendo, ou pelo simples ignorar deste, argumentando, por um lado, que o mesmo não tem carácter vinculativo e, por outro, que a campanha foi feita com base nas mais sórdidas mentiras. O apelo para um novo referendo reuniu mais de 4 milhões de assinaturas logo nos dias seguintes e uma famosa firma de advocacia já se posicionou contra o Brexit dizendo que compete apenas ao Parlamento a decisão sobre a permanência ou não do país no bloco comunitário.

Foi uma campanha intensa onde foram jogadas as mais sujas cartas as do medo, mentira, nacionalismo exacerbado, racismo e da xenofobia, as três últimas principalmente por parte dos defensores mais acérrimos da saída como o populista e independentista Nigel Farage, ex-líder do Partido da Independência do Reino Unido (UKIP, na sigla em inglês), o que mais cresce a cada eleição e que, devido ao sistema de votação não proporcional no Reino Unido conta, por enquanto, com um só  deputado no parlamento de Westminster apesar dos quatro milhões de votos que obteve nas legislativas de 2015. Uma campanha cujo ódio disseminado, suspeita-se, terá causado a morte de Jo Cox, ainda jovem e promissora deputada trabalhista pró-europeísta que se destacou na defesa dos refugiados, assassinada uma semana antes do veredicto por Thomas Mair, um homem alegadamente associado ao ''Britain First'', grupo anti-imigração da extrema direita formado em 2011.       

Os defensores da permanência, com grande vantagem do establishment político, religioso, militar, financeiro e comunicacional, interno e externo, apostaram forte nos receios sobre o declínio e incertezas na economia em caso da prevalência do Brexit. Entre outros, a maioria parlamentar de Westminster, a UE, a City - como é conhecido o centro financeiro de Londres -, a FMI, a OTAN, os líderes máximos das igrejas anglicana e católica locais, o presidente Obama e parte dos pesos-pesados da imprensa escrita britânica como o Guardian, Times, Financial Times, Economist, Independent e New Statesman, todos se posicionaram a favor da permanência.

Conhecido o resultado, alguns dos seus alertas sobre a economia alertas logo se provaram verdadeiros. Os mercados ficaram nervosos, a libra esterlina caiu para valores nunca vistos desde 1985. Economistas preveem desvalorização ainda maior com as incertezas que pairam sobre a economia, empresas gizam planos de mudança dos seus quartéis-generais para a UE. Por exemplo, entre outras, a gigante alemã de energia Siemens congelou novos investimentos no RU até que a situação esteja clarificada e gigantes do setor bancário como JP Morgan e HSBC ponderam mudar as sedes ou transferir significante parte dos funcionários para o continente. Neste mesmo sentido a companhia aérea de low cost Easyjet também sinalizou. Para além da economia, os pró-europeístas jogaram também com a carta do medo. O ex-primeiro ministro David Cameron chegou a sugerir que o chamado Estado Islâmico ficaria feliz com a saída do RU do bloco europeu.

Mas se o lado da permanência jogou cartadas com receios sobre a economia e a segurança nacional, o da saída se valeu, como atrás referido, de cartas do chauvinismo, racismo, xenofobia e mentiras sobre a sobrevivência do serviço nacional de saúde, NHS sigla em ingles, uma instituição cara aos britânicos, ao qual foi prometido uma verba extra de 350 milhões de libras por semana retirados das contribuições do RU para a UE. Promessa agora desmentida pelos brexistas, como ficaram os partidários do Brexit, que sequer tinham um plano  de governo para a eventualidade. Suas estratégias de campanha contaram com o apoio do influente Daily Telegraph, de linha editorial conservadora, de tabloides sensacionalistas e conservadores líderes de audiência como The Sun e Daily Mail, de um dúzia de milionários eurocéticos e, na reta final, com uma forcinha do assustador candidato republicano Donald Trump.

O populista Farage, por exemplo, jogou com a tragédia dos refugiados e foi o que mais centrou seus argumentos numa forte retórica xenófoba, anti-imigração europeia e demonizadora da UE. Uma das suas maiores polêmicas foi ter sugerido que, com as fronteiras abertas ao fluxo migratório e de refugiados, as mulheres britânicas correriam o risco de estupro. Para a posteridade fica o controverso poster com a imagem de milhares de refugiados a caminho da Alemanha e com o slogan Breaking point: the EU has failed us all (Ponto de ruptura: a UE falhou com todos nós), denunciado nas redes sociais como similar à propaganda nazi.

Desde sempre um eurocético radical, Farage, que deixou o Partido Conservador em 1992 para fundar o UKIP em 1993, acabou por ser o grande responsável pelo êxito do Brexit embora a maior parte da mídia britânica e de comentadores políticos tendam a creditar o feito ao excêntrico conservador Boris Johnson, ex-jornalista e ex-prefeito de Londres que, ao longo da sua carreira tanto no jornalismo quanto na politica, manifestara opiniões ambivalentes sobre a presença do RU na UE, umas vezes favoráveis, outras desfavoráveis. Durante a campanha, à qual só declarou apoio em fevereiro, ele chegou ao cúmulo de comparar o bloco à Alemanha de Hitler.

Vários analistas são unânimes em concluir que a participação de Johnson teve mais a ver com suas ambições à liderança dos tories, como são conhecidos os conservadores britânicos, do que propriamente com sua convicção brexista. Alguns, como Polly Toynbee, conceituada colunista do Guardian, o veem como um "sociopata político" que, por ambições desmedidas à chefia do partido, acabou por obter uma vitória pírrica que resultou no ressuscitar de velhos fantasmas e na fratura do país entre regiões, gerações, os mais e os menos escolarizados, amigos, familiares, enfim, mergulhado em preocupantes incertezas quanto ao futuro. 

Cameron, que fez do referendo uma de suas promessas eleitorais para ganhar votos de descontentes com a imigração, demitiu-se como premiê logo no dia seguinte ao veredicto e Johnson, super favorito à liderança, acabou renunciando ao posto, diz-se que traído por Michael Gove, ministro da justiça de Cameron e, a par do ex-prefeito, um dos principais rostos do Brexit. Este se lançou na corrida à chefia dos conservadores depois de repetidas vezes ter jurado a pés juntos que jamais o faria. Foi eliminado da corrida em favor da low profilebrexista Andrea Leadson e da remainer Theresa May, atual ministra do interior cotada como a provável primeiro-ministro em substituição de Cameron em setembro. Uma das duas será a segunda mulher a ocupar o cargo depois de Margareth Thacher.

Entre os trabalhistas, europeístas na esmagadora maioria, a situação não é menos pacífica. Com maioria na bancada parlamentar do partido, os chamados blairistas, deputados apoiantes do ex-premiê Tony Blair, tentam a todo o custo derrubar o líder Jeremy Corbyn, da ala mais à esquerda do partido, um eurocético moderado que, como tal, teve uma participação pouco entusiasta na campanha pela permanência embora defenda a presença do país no bloco como a melhor forma de influenciar e promover mudanças consideradas mais democráticas ao funcionamento do mesmo. 

Como atrás sugerido, no terramoto político que ameaça a desintegração do RU e mesmo da UE e de outras paragens, Farage, ironicamente deputado ao Parlamento Europeu mas que em sete tentativas nunca fora eleito ao Parlamento britânico, acaba por ser a figura mais influente e vitoriosa do Brexit. Em êxtase, ele declarou o 23 de junho como dia da independência do país e propôs que a data fosse doravante comemorada como feriado nacional. Mas, tal como Johnson e Gove, a sua vitória acaba também por ser de Pirro devido a forma como conduziu a campanha, considerada, dentro e fora do partido, demasiado extremista, divisora da da sociedade e da unidade do reino.

Alguns dos principais doadores do UKIP o censuraram publicamente e ameaçaram com a criação de um novo partido caso ele não renunciasse. Acabou por fazê-lo argumentando que "ter o país de volta" foi objetivo principal da sua vida política e que agora era tempo de ''ter a sua vida de volta''. Todavia, muitos o comparam como mais um dos ratos que, cientes do futuro político imediato pouco promissor, abandonam um navio em naufrágio para se salvarem. 

No caos político gerado pelo referendo, uma figura que emerge imaculada como vitoriosa é Nicholas Sturgeon, a líder dos nacionalistas escoceses que, com o resultado da votação, renovou de imediato o apelo para um novo plesbicito sobre a independência da Escócia que, ao contrário da Inglaterra e do País de Gales, votou expressivamente pela permanência na UE. A Irlanda do Norte também votou pela permanência e, em reação, os nacionalistas do Sinn Féin já se manifestaram em defesa de um referendo por uma Irlanda unida.

Não bastassem as confusões do Brexit, foi finalmente publicado na quarta feira (6) o tão esperado relatório Chilcot, assim chamado em nome do relator, Sir John Chilcot, chefe de uma comissão de inquérito há sete anos estabelecida para inquirir sobre a participação do RU na guerra do Iraque.  Com cerca de 2,6 milhões de palavras, quatro vezes mais do que a famosa Guerra e Paz de Leon Tosltoi, o documento foi demolidor para Blair, acusado de ter levado o país a participar ativamente em uma guerra com base em informações e avaliações falhas e de ter um alinhamento incondicional aos EUA.

O relatório confirma que, oito meses antes da invasão, ele se comprometeu a estar de "qualquer jeito" com o ex-presidente Bush filho na determinação deste em invadir o país árabe sem que se esgotassem todos os esforços diplomáticos e sem que estivesse concluído o trabalho dos inspetores da ONU sobre a questão das alegadas armas de destruição massiva detidas pelo regime de Saddam Hussein. Vários politicos, analistas e comentadores locais são unanimes na leitura de que as conclusões do relatório são uma tragédia devastadora da reputação internacional do RU. O ex-premiê trabalhista, que na sequência da publicação do documento foi acusado pela irmã de um dos 179 militares britânicos mortos no Iraque de ser o "pior terrorista do mundo", enfrenta agora crescentes pedidos para que responda criminalmente pela sua desastrosa liderança no processo que levou à tragédia do Iraque e sofra um impeachment simbólico que o bana para sempre da vida pública. 

Cumprindo uma promessa que havia feito quando assumiu a liderança trabalhista, Jeremy Corbyn, forte opositor da intervenção no Iraque enquanto deputado e à época um dos líderes da organização anti-guerra "Stop the War Coalition", pediu de imediato, em nome do Partido Trabalhista, "sinceras desculpas ao povo do Iraque que pagou o maior preço pela desastrosa decisão" que levou à guerra. A esses desenvolvimentos, somou-se a humilhante eliminação da seleção inglesa afastada da Eurocopa de futebol pela pequena Islândia com apenas cerca de 300 mil habitantes e sem tradições no futebol europeu.  

E depois do adeus?

Se o terramoto político e, com ele, os impactos sísmicos sobre a economia foram as imediatas consequências do voto pelo Brexit, outro e não menos preocupante dos estragos causados pela opção, questionavelmente democrática pela forma como no plano ético a campanha foi conduzida, foi o surto de casos de racismo e xenofobia no país que se orgulha da sua multiculturalidade e de ter uma sociedade aberta e tolerante. Um cenário previsível mas que choca e espanta pelas proporções adquiridas. 

E depois do adeus / quis saber quem sou / o que faço aqui / quem me abandonou. Este trecho da letra de uma musica (E depois do adeus) do português Paulo de Carvalho, vencedora do festival da canção da Rádio Televisão Portuguesa (RTP) em 1974 e que serviu como uma das senhas para a revolução dos cravos em abril do mesmo ano, retrata bem o estado de espírito da grande maioria dos cerca de 3 milhões de cidadãos da UE, na maioria europeus do leste, que escolheram as terras da rainha para residir e trabalhar e dos cerca de 1,2 milhões de britânicos que optaram pelo inverso. De repente uns e outros, separados pelo Canal da Mancha mas partilhando em comum os múltiplos benefícios da cidadania europeia e sentimentos de pertença a um comunidade de todos, se sentem estranhamente estrangeiros nos respectivos espaços que optaram por fazer ou refazer suas vidas. 

Se para ambos foi inesperadamente inaugurado um tempo de incertezas quando ao futuro, ao direito de residir e trabalhar, o que mostra o Brexit às minorias étnicas nacionais e estrangeiras em terras de Sua Majestade após uma campanha de inflamatórias retóricas política anti-UE e xenófoba contra a imigração usadas por boa parte defensores da saída?

Tais retóricas se tornaram em uma ameaça real tanto para os imigrantes europeus como para as minorias étnicas nacionais e extracomunitárias em terras de Sua Majestade. Nove das doze regiões e nações que compõem o RU votaram pela saída, principalmente nas áreas rurais e nas adjacentes à maioria das grandes capitais. Apenas Londres, Escócia e Irlanda do Norte optaram majoritariamente pela permanência.

A antes anunciada crise económica, agravada pelas incertezas do Brexit, e um referendo conduzido na base perigosamente irresponsável do "vale tudo" provocaram um assustador ressurgimento do nacionalismo exacerbado, do racismo e da xenofobia, como já referido. Não significa isso assumir que a maioria dos que votaram pela saída seja racista e xenófoba mas, como notou Trevor Philips, ex-Alto Comissário para a Igualdade Racial, em entrevista à BBC, ''a maioria dos racistas estava no lado do Brexit''.

A título de exemplo note-se que, logo nos dias seguintes ao referendo, a polícia britânica reportou um aumento de 57% nas queixas de incidentes racistas e xenófobos. A comunidade polaca, a maior de origem europeia no país, com cerca de 1 milhão de residentes, foi a mais visada. Além de ter a fachada da sua associação cultural em Hammersmith, zona oeste de Londres, pixada com a frase ''Go Home'', foram também reportados casos de incidentes físicos e verbais envolvendo os seus cidadãos.

Para além de europeus, cidadãos negros, asiáticos, árabes e de outras paragens nascidos e criados no país, alguns deles figuras públicas e britânicos há várias gerações, não escaparam à onda de intolerância racista e xenófoba dos que de repente se sentiram empoderados e legitimados para exercerem seus ódios há muito adormecidos ou reprimidos pela lei.

O conhecido deputado trabalhista David Lammy, negro londrino de origem jamaicana, que foi ministro júnior nos governos de Tony Blair e Gordon Brown, foi vítima de centenas de abusos racistas e ameaças de morte por ter defendido no parlamento a necessidade de um segundo referendo.  

Durante a campanha, a baronesa Sayeeda Warsi, filha de imigrantes paquistaneses, que de 2010-12 foi co-presidente dos tories e se tornou na primeira mulher muçulmana a ser ministra do primeiro escalão em um governo (Cameron) de Sua Majestade, que inicialmente apoiava o voto pela saída, mudou de lado ao sentir que o racismo e a xenofobia cresciam assustadoramente entre os defensores da saída. 

No País de Gales, Shazia Awan, uma ex-política conservadora e empresária muçulmana de origem asiática e africana nascida em Cardife que fez campanha pela permanência, disse ter recebido uma série de injúrias raciais. Ela fez questão de, em programa da BBC, ler um email que a preocupou com a seguinte mensagem: ''Nem agora, nem nunca você será galesa. Tendo nascido em Gales nada tem a ver com ser galesa. Não posso esperar pelo dia de enviar você e o seu lixo anti-branco de volta à lixeira do terceiro mundo de onde vieram''.

Em entrevista ao New Statesment ela disse que havia abandonado o Partido Conservador em razão do racismo de alguns dos seus membros, manifestado durante a campanha do partido contra o trabalhista Sadiq Khan, britânico muçulmano de origem paquistanesa que acabou eleito prefeito de Londres. Ainda em Gales, Ali Ahmed, vereador trabalhista de Butetown, Cardife, originário do Bangladesh disse que ficou em estado de choque quando foi abordado por um homem que o mandou sair do país. ''Eu votei pela saída. Quando você vai sair? Este é o nosso país, saia'', contou ele à rede de televisão ITV.

Em Manchester um cidadão negro norte-americano foi abordado no comboio por um trio de jovens que o convidaram a sair do país. Em resposta perguntou aos jovens que idade tinham e, perante a resposta de um deles (19 anos), revelou estar no país muito antes deles terem nascido. O homem, que depois se identificou como ex-militar, só não entrou em confrontos físicos com o trio devido à pronta intervenção de outros passageiros que os repreenderam e caracterizaram suas atitudes como vergonha para o RU.  

Imriel Morgan, uma jovem negra escritora, blogueira e co-autora de um podcast sobre diversidade escreveu no Guardian que estava indecisa sobre o lado a seguir até ter participado em um debate na ITV com a participação de Nigel Farage. Ela o questionou sobre como os defensores da saída iriam proteger os cidadãos britânicos não-brancos, suas identidade e nacionalidade, em resultado da forte retórica anti-imigração. Ignorando que ela era inglesa e julgando-a apenas pela cor da pele, o então líder do UKIP respondeu: ''Sou pró-Commonwealth... africanos, caribenhos e indianos podem vir para aqui". Ficou esclarecida ao saber que Farage apenas a considerava britânica por seus laços históricos e familiares à Commonwealth. ''A UE tem feito um trabalho fantástico na proteção dos meus direitos e não posso me arriscar a perdê-los na vã esperança de que teremos melhores acordos comerciais com a Commonwealth se sairmos'', disse.  

Todavia note-se que houve também um substancial número de votos garantidos ao Brexit por parte de minorias étnicas nacionais de origens africana, afrocaribenha e asiática oriundas de ex-colónias britânicas, manipuladas no discurso que apontava para os imigrantes como estranhos ao espírito da britanicidade, que só estariam no país por causa de haver trabalho e benefícios sociais, que seriam os responsáveis pelo aumento do desemprego e pelos constrangimentos verificados na educação, saúde e habitação. Foram manifestamente usadas pelos que não escondem o saudosismo dos tempos globalmente dominantes do Império Britânico, aquele onde "o sol nunca se punha" pela sua expansão nos quatro cantos do mundo e que a ele sonham voltar usando Commonwealth como instrumento político de seus desígnios.

Em entrevista ao The Voice, um jornal centrado em assuntos da comunidade negra britânica, Steven Woolfe, porta-voz do UKIP para a migração não hesitou em puxar pela carta de dividir para reinar, colocando imigrantes oriundos da Commonwealth contra os da UE. Ele disse ter evidências de que eram as comunidades negra e asiática as que mais tinham a recear com a permanência do RU na UE porque se sentiam em desvantagem perante a concorrência dos seus pares comunitários vistos como os responsáveis pela precariedade dos salários de trabalhadores com pouca ou baixa qualificação. Um argumento falacioso e preconceituoso que, por um lado não reconhece os salários baixos como resultado de um sistema capitalista explorador e, por outro, sugere que a população daqueles segmentos étnicos deveriam se contentar em estar um degrau acima dos imigrantes europeus.

Quem acompanha a vida política britânica sabe muito bem que o partido de Farage não é conhecido pela suas simpatia e preocupação para com minorias étnicas, sejam elas nacionais ou estrangeiras. Winston McKenzie, por exemplo, um antigo boxeador londrino de origem jamaicana, ex-empresário da noite e figura pública pela participação em realities shows é um exemplo de manipulação política de minorias. Ele se tornou ativista político e passou por todos os principais partidos britânicos antes de ser atraído e se filiar ao UKIP em 2009. Em 2014 foi nomeado porta-voz do partido para a Commonwealth claramente com velados objetivos políticos. Por um lado atrair a comunidade negra local e por outro, através dela, passar a mensagem de que o partido priorizaria cidadãos oriundos da comunidade britânica em detrimento dos da UE. Em 2015 desvinculou-se da legenda alegando racismo interno. Portanto, só muita ingenuidade para acreditar que o britanismo privilegiaria jamaicanos, ugandeses ou paquistaneses em detrimento de franceses, espanhóis ou italianos. 

Políticos vaidosos, egoístas, arrivistas, demagogos, de caráter duvidoso acabaram, com a cumplicidade de parte da mídia, por colocar em causa a unidade de um reino e de um bloco comunitário agora ameaçados de desintegração. Está incerta a paz do reino e da comunidade, como incerto está o futuro de mais de 3 milhões de europeus a residir e trabalhar no RU e dos cerca de 1,2 milhões de britânicos que escolheram a UE com o mesmo fim. Tendo em conta o assustador surto de racismo e xenofobia que resultou do processo, o futuro das minorias étnicas nacionais ou residentes no RU, europeias ou oriundas de países fora da UE, não parece no imediato risonho. Dúbias mensagens quanto ao seu novo estatuto não ajudam a esclarecer, pese embora os constantes apelos de políticos condenando a intolerância e urgindo por tolerância zero ao seu combate.

Em suma, com uma campanha suja em nome da soberania nacional, por um lado, e da integração europeia, por outro. O primeiro soube usar e capitalizar com sucesso a diabolização da UE, culpando-a por todos os problemas domésticos e apelando para os mais profundos, mas nem sempre melhores, sentimentos do nacionalismo, o que não deixa de ser preocupante. Não tanto pelo Brexit em si mas pelo modelo de sociedade assente em algumas ideias e valores nele defendidos, ressuscitadores comportamentos e fantasmas que se julgavam grandemente erradicados ou exorcizados. 

O segundo, com todo o aparato ao seu dispôr, foi incapaz de defender as múltiplas vantagens e benefícios da imigração para o país, as virtudes e a generosidade do projeto europeu, ao longo do tempo minado por narrativas de políticos e governos nacionais que nele viam o bode expiatório para suas falhas e para ganhos políticos internos. Não foi capaz de assumir a cota de responsabilidades por não ter provido para os inevitáveis impactos que o crescente fluxo migratório causariam no mercado laboral mas acima de tudo nas infraestruturas em áreas como saúde, habitação e educação. Distanciou-se das preocupações e aspirações de segmentos mais humildes da população que se sentiram abandonados e culpam os imigrantes por todos os seus males.

A UE pode não ser democraticamente perfeita, como não o são vários estados e organizações. O próprio RU com um chefe de estado não eleito, não é exemplo de democracia. Mas ela é, sem dúvida, o melhor projeto civilizacional edificado no pós-guerra. Isso é traduzido no que o bloco representa como projeto inspirador de integração política, econômica e social, de paz regional, eliminação de barreiras geográficas, livre circulação de pessoas, serviços e bens, fortes investimentos na educação e investigação cientifica e tecnológica, observação dos direitos humanos dentro e fora do bloco, defesa do meio ambiente, abertura e tolerância para com imigrantes e refugiados, entre muitos outros avanços para a humanidade.

O Brexit representa para uns a vitória da mentira sobre a verdade, da demagogia sobre a moderação, do populismo sobre o establishment político e da intolerância sobre a tolerância. Para outros ele representa a vitória da democracia, a abertura de uma nova janela de oportunidades do RU fora da UE, a prevalência do nacionalismo e da soberania do estado-nação sobre o globalismo assente no idealismo de um mundo sem fronteiras. Para a maioria, em ambos lados, o referendo representou a vergonha dos britânicos com a generalidade da sua classe.

Seja como for, falou a vontade popular. Mas a palavra final sobre esse controverso referendo, consultivo e não vinculativo, cabe aos representantes democraticamente eleitos por essa mesma vontade. Compete ao parlamento de Westminster decidir pela invocação, ou não, do artigo 50 do Tratado de Lisboa que prevê a possibilidade de qualquer Estado-membro sair de forma voluntária e unilateral da União. Até lá uma imensidão de águas turvas e turbulentas continuarão a agitar o Canal da Mancha.

*Alberto Castro é correspondente de Afropress em Londres e colabora em Página Global

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