O
antigo secretário de Estado dos Assuntos Fiscais Paulo Núncio assumiu hoje a
"responsabilidade política" pela não publicação de dados relativos às
transferências de dinheiro para offshore, pedindo o abandono das suas funções
atuais no CDS-PP.
"Tendo
em conta o tempo que decorreu entre os factos e o presente e tendo tido agora a
oportunidade de revisitar os documentos que têm sido noticiados, nomeadamente
os apresentados pelos serviços para publicação de informação estatística das
transferências transfronteiriças, considero legitima a interpretação dos
serviços que levou à não publicação das estatísticas no portal das Finanças.
Assumo, por isso, a responsabilidade política pela não publicação das referidas
estatísticas", sublinha Núncio, em texto enviado à agência Lusa.
E
continua: "Querendo libertar o partido a que pertenço [CDS-PP] de
quaisquer controvérsias ou polémicas nesta matéria, solicitei à presidente do
partido que aceitasse a cessação das minhas funções nos órgãos nacionais".
Na
noite de sexta-feira, o antigo diretor-geral do fisco Azevedo Pereira garantiu
ter solicitado, por duas vezes, ao ex-secretário de Estado Paulo Núncio
autorização para publicar dados relativos às transferências dinheiro para
'offshore', mas "em nenhum dos casos" esta lhe foi concedida.
Em
causa estão transferências de dinheiro para paraísos fiscais concretizadas
entre 2011 e 2014, durante a governação PSD-CDS/PP, sem qualquer controlo
estatístico por parte da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT), como a lei
obriga, e que levaram já os partidos com assento parlamentar a solicitar uma
audição urgente do atual e do anterior secretário de Estado dos Assuntos
Fiscais.
Paulo
Núncio, no texto endereçado à Lusa, lembra que a AT "tem, desde 2012, a
possibilidade de liquidar todos os impostos devidos nestas situações no prazo
alargado de 12 anos (anteriormente este prazo era de 4 anos)" e,
"nestes termos, quaisquer impostos que sejam devidos nestas situações
poderão ser cobrados pela AT até 2024, evitando-se assim o risco de perda da receita
do Estado".
"Reafirmo
o meu total desconhecimento, à data e até hoje, relativamente à noticiada
discrepância entre os dados entregues pelas instituições financeiras e os dados
processados pela AT. Tenho confiança, no entanto, que a inspeção não deixará de
realizar todos os cruzamentos e procedimentos inspetivos necessários para o
apuramento da verdade", diz também o antigo governante centrista.
A
publicação estatística de dados no portal das Finanças, adverte ainda Núncio,
"não interfere com a ação efetiva da inspeção tributária no tratamento,
análise e fiscalização das referidas transferências".
"O
reforço do combate à fraude e à evasão fiscais foi um objetivo prioritário nos
últimos anos, com resultados muito significativos. Tenho confiança que a AT irá
continuar a desenvolver todos os esforços para combater de forma eficaz a
utilização de paraísos fiscais", concretiza Paulo Núncio, que garante que
irá no parlamento, na quarta-feira, prestar os "esclarecimentos
complementares" tidos como "necessários" sobre o tema.
Na
nota com nove pontos enviada na sexta-feira às redações, o antigo diretor do
Fisco Azevedo Pereira admitiu poderem ter existido "erros de
perceção" na troca de informação com o secretário de Estado dos Assuntos
Fiscais do governo PSD-CDS, com vista à publicitação dos dados das
transferências para as 'offshore'.
No
entanto, considera que esses "erros de perceção" "nunca demoram
quatro anos a resolver" e conclui que, se Paulo Núncio tivesse a intenção
de os fazer publicar, teria tido oportunidade de o fazer ao longo dos quatro
anos seguintes, até à sua saída do governo, em novembro de 2015.
Na
justificação enviada aos jornais, Azevedo Pereira começa por esclarecer que,
"em tempo", a AT propôs ao secretário de Estado a publicitação dos
dados das transferências para paraísos fiscais.
"Tal
proposta de publicação foi solicitada por duas vezes (na prática, como veremos,
três vezes), através do envio de processos contendo, no primeiro caso, a
informação relativa 2010 (reportada pelas instituições financeiras em meados de
2011) e, no segundo, a informação relativa a 2011 (reportada pelas instituições
financeiras em meados de 2012)", afiança.
Só
que - prossegue -, "em nenhum dos casos, a correspondente autorização foi
concedida".
"No
primeiro caso, o despacho do SEAF [secretário de Estado dos Assuntos Fiscais]
solicitou uma alteração na estrutura da informação a divulgar. Tal alteração
foi levada a cabo tendo a proposta de publicação sido apresentado de novo à
Secretaria de Estado dos Assuntos Fiscais. Tanto quanto me é dado lembrar -
encontramo-nos neste momento a mais de cinco anos de distância destes factos -
tal solicitação nunca terá merecido resposta da Secretaria de Estado dos
Assuntos Fiscais", justifica.
Quanto
ao segundo caso, Azevedo Pereira diz que "a informação em causa foi
preparada de raiz para acomodar a solicitação efetuada pelo SEAF na resposta ao
primeiro pedido de publicação, tendo sido remetida à Secretaria de Estado no
início de novembro de 2012".
Lusa,
em Notícias ao Minuto
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