domingo, 25 de fevereiro de 2018

Portugal | UM HOMEM SÓ


Domingos de Andrade* | Jornal de Notícias | opinião

Até Luís Filipe Menezes, no seu curto mandato de oito meses à frente do PSD, teve direito a estado de graça. A votação humilhante de Fernando Negrão para a liderança parlamentar dos sociais-democratas foi esse último sinal de que Rui Rio está sozinho na Oposição, com oposição na Assembleia da República dos seus próprios deputados.

O candidato que teve o aval do líder para substituir Hugo Soares não só não conquistou a maioria dos deputados, como reuniu menos votos do que os nomes que constavam da lista de candidatura, no que foi encarado por Negrão como um caso grave de falta de ética dos deputados, ou golpe palaciano, como nomeia nestas páginas André Coelho Lima, da Comissão Política Nacional.

Um filho único de quem os pais não gostam, portanto. Mas que não é mais do que um sinal da profunda divisão ideológica, geográfica e de tomada de poder que alimenta ruturas profundas num partido também ele com um fosso cavado entre a elite e os militantes rurais.

Sem palco quinzenal para confrontar o primeiro-ministro, sem preparação para a realidade frenética das redes sociais e da urgência mediática, Rio só pode dedicar-se a fazer o que sabe fazer melhor. Arrumar a casa, escolher lideranças para as eleições nas distritais - a do Porto, a maior do país, é um saco de gatos, mas não é a única -, fazer a lista dos nomes a riscar. São muitos. A limpeza vai ser grande. E subestimá-lo é um erro.

Os deputados sabem disso. Que o lugar está dependente da disciplina de voto. E que ir contra os poderes estabelecidos é a arma que o novo líder do PSD mais gosta de brandir. Hostilizar a máquina instalada vai ser o passatempo preferido do homem que coleciona inimigos e que, como o próprio assumiu, vive bem em ambientes de tensão. Alimenta-se deles. Na hora da verdade estarão ao lado de quem mandar, o que também dirá muito da classe política que o país tem.

O desafio de Rio não está, portanto, em unir os cacos que o próprio se encarrega também de fazer, por muitas juras levadas ao congresso do último fim de semana. Está em saber abrir o partido à sociedade civil e saber atrair os melhores. Mas isso é uma refundação. Sem o tempo que ele tanto gosta de gerir.

Ele é um homem só, mas estará sozinho?

*Diretor-executivo do JN

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