quinta-feira, 5 de abril de 2018

Neutralidade colaborante conveniente no caso Skripal



Desde há umas semanas que se regista um litígio entre o Reino Unido e a Rússia por causa de um eventual envenenamento de um antigo espião russo, de nome Sergueï Skripal, em terras de Sua Majestade, com um produto muito neurotóxico.

Nada demais, até habitual este bate-bocas entre dois países da antiga «Guerra-fria» de concepções políticas e económicas diferente, não fosse, em princípio, esta dita guerra-fria parecia estar ultrapassada no tempo.

O problema é que a coisa ressecou entre os dois países com a acusação, pelo Reino Unido, de terem sido russos a envenenar o antigo espião num bar ou botequim e, com ele a sua filha e um polícia que os terá socorrido.

A Rússia e o governo do senhor Putin refutaram, liminarmente, as acusações e devolveu-as à Senhora Theresa May, líder do governo britânico, por serem de uma “desfaçatez inaudita, sem precedentes” e roçar o “banditismo”.

Bate-bocas normais e naturais, se…

Se o Reino Unido não tivesse expulsado diplomatas russos – leia-se, espiões, – como represália por Moscovo não ter assumido a origem do envenenamento e continuar a negá-lo; e se, como solidariedade, os países ocidentais, nomeadamente – porque ainda é Estado–membro – a União Europeia, e mais tarde, os EUA e a Austrália, procederam da mesma maneira, com a previsível retaliação, na mesma moeda – com ingleses já aconteceu –, por parte dos russos; ou seja, expulsão de diplomatas ocidentais.

Só que um país da União Europeia, e por acaso o mais velho aliado do Reino Unido, não seguiu essa linha e pensamento e atitude. Refiro-me a Portugal.

O MNE português Santos Silva – similar ao nosso MIREX – apesar de se solidarizar com os actos da UE e NATO – de que é Estado-membro fundador, e que também expulsou diplomatas russos –,não vê necessidade de o fazer, de imediato, ainda que não tire essa hipótese da equação. A única coisa que o MNE fez foi chamar o Embaixador português em Moscovo, a Lisboa, considerado pelo Ti Celito, como um constitui “um aviso” e “uma decisão forte por parte do Estado português”.

Também, se Portugal expulsasse algum diplomata russo e tivesse a retaliação similar, como ficaria a representação lusa nas terras frias de Moscovo. Segundo o que soube a representação portuguesa será composta por 3 diplomatas. Além disso, a já penalizada economia portuguesa pelas sanções que vigoram, contra a Rússia, por causa da Crimeia já é indício suficiente para a diplomacia portuguesa não ser seguidista de tudo o que lhe impõem, mesmo que seja os amigos a decidirem-no…

Ou seja, a ancien politique internationale portugaise mantêm-se em vigor. Não faz igual, apoia os amigos, mas não ostraciza os “inimigos”. É a conhecida política de

«neutralidade colaborante» criada no tempo de Oliveira Salazar, pela II Guerra Mundial.

Dirão os leitores, e com alguma razão, o que tem isto a ver com Angola e os angolanos? Tudo…

Quando foi da Guerra-fria entre Soviéticos/Russos e o Ocidente, os bate-papos entre eles, situava-se somente ao nível da confrontação oral ou de expulsão de espiões; mas, onde eram, de facto, os palcos de confronto político-militar? Médio Oriente, América Latina e África!

E nós bem que devemos recordar o quanto sofremos com esse confronto entre russos e norte-americanos! Quantas armas não foram testadas nas nossas estepes e anharas? E quantos de nós não morreram por causa dessas “experiências”. Quantas vezes não fomos meros peões descartáveis nos tabuleiros de xadrez e damas nas mãos daqueles dois players?…

Até agora a nossa diplomacia tem estado queda e calada. Hipoteticamente, segue os ensinamentos da diplomacia lusa; ou seja, optamos por uma neutralidade colaborante entre quem sempre apoiou Angola – leia-se, o partido no poder, – e quem é um dos principais parceiros económicos, o Ocidente – não só como importadores e exportadores, mas também como suportes de divisas, onde a China não mostra ser.

Acresce que, afinal, e segundo notícias ora divulgadas pelo britânico The Guardian, Skripal e a filha não terão sido envenenados num bar, mas em casa.

Ora, sem querer defender o novo Czar da Rússia e o seu Governo, isto poderá levantar duas e legítimas dúvidas:

Será que foram envenenado por terceiros, ou terá sido o espião que se envenenou – segundo li há dias a neurotoxina que os envenenou foi realmente criada por cientistas russos, mas nos meados da década de 70 do século XX; por isso, é legítimo pensar que ele poderia tê–la em casa e a ter mal utilizado, por defeito ou por mal acondicionamento, devido ao tempo de idade da neurotoxina;

Ou, será que, por hipótese – a política, por vezes, não olha a meios para atingir os fins –, mesmo sabendo desta situação a senhora May quis aproveitar do facto de estar sobre pressão política, por causa do Brexit, para desviar atenções políticas dos parceiros da UE, e internas? Rebuscada, mas legítima esta suposição e que Putin poderá já ter se aproveitado.

Como um diplomata germânico afirmou há dias, Putin deve estar a rir-se disto tudo…

Não esqueçamos que as verdadeiras Relações Internacionais são meios de guerra, sem verter gotas de sangue…

Por isso, é de bom tom seguir a ancien diplomacia portuguesa de “neutralidade colaborante” e adoptar como base diplomática as Relações Internacionais. É, porque macaco velho…

*Investigador do Centro de Estudos Internacionais do ISCTE-IUL(CEI-IUL) e Pós-Doutorando da Faculdade de Ciências Sociais da Universidade Agostinho Neto**

** Todos os textos por mim escritos só me responsabilizam a mim e não às entidades a que estou agregado


*Eugénio Costa Almeida – Pululu - Página de um lusofónico angolano-português, licenciado e mestre em Relações Internacionais e Doutorado em Ciências Sociais - ramo Relações Internacionais - nele poderão aceder a ensaios académicos e artigos de opinião, relacionados com a actividade académica, social e associativa.

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