O Diário de Notícias apresenta uma peça de Paulo Pena que é leve e de simples entendimento do que é a EDP no que toca à sua definição de razão social e sombreados se a encararmos como fornecedora de eletricidade e outros.
O mesmo não se pode dizer sobre a associação nada abonatória daquela marca EDP - Estado De Podridão. É que aí tudo se relaciona com a descarada arregimentação de políticos e/ou ex-políticos - que junto a outros em circunstâncias semelhantes militam nos gigantes empresariais - cujas contratações suscitam sérias dúvidas relativamente à transparência e honestidade das empresas e dos contratados, ex-governantes, ex-deputados, etc.
Que em Portugal existe um Estado de Podridão relativamente ao que ocorre nesta miscelânia entre políticos e grandes empresas, grandes empresários e grandes interesses é dito à boca-cheia pelos cidadãos. Mas então assim sendo é atual a já muito antiga expressão É Fartar Vilanagem (EFV). O que vem demonstrar que nem as moscas mudaram apesar de a merda ser a mesma. CDS, PSD e PS, que em cerca de 40 anos têm partilhado os governos e os poderes, são os que agora fazem parte da vilanagem que não se farta, do mesmo modo que alguns vilões do salazarismo também nunca se fartaram e na atualidade delegaram em descendentes e outros de sua confiança, para compor a vilanagem. Eles estão por aí, muito ativos. Vivos da Costa. De mãos dadas, contra Portugal e contra os portugueses. (MM | PG)
Governo-sombra da EDP vai ao
Parlamento
Há, na cúpula da EDP, ministros
de cada um dos quatro governos que decidiram sobre as polémicas
"rendas" que o Estado paga à empresa
O conflito de interesses entre
público e privado é um tema central da comissão de inquérito no Parlamento.
1- A novidade de António Vitorino
Já se sabia que quando António
Vitorino saiu do governo, em 1997, fora contratado como assessor jurídico da
EDP. Em 2012, após ter sido comissário europeu e deputado, foi nomeado para
cargos dirigentes da empresa. A um trajeto destes, chama-se, na gíria,
"porta giratória". E funciona assim: um legislador que é contratado
por uma empresa torna a ser decisor público e regressa uma vez mais à empresa.
Até agora, o que não se conhecia,
no caso de António Vitorino, era qualquer intervenção, enquanto deputado,
ministro, comissário ou conselheiro político que tivesse afetado, de forma
direta, a EDP. Mas um e-mail de 19 de janeiro de 2007, a que o Bloco de
Esquerda teve acesso, enviado por Manuel Pinho, então ministro da Economia,
para a comissária europeia da Concorrência, Neelie Kroes, mostra que Vitorino
interveio no mais decisivo tema da relação do Estado com a EDP: a definição dos
Custos de Manutenção do Equilíbrio Contratual (CMEC). Aquilo a que a troika
chamou "renda excessiva" paga pelo Estado à EDP.
O mail é parte de uma conversa
antiga e complexa: qual o valor da "renda" que o Estado se
comprometia a pagar à EDP a partir de então. Pinho sugeria dois valores, no
mail. Mas se a comissária considerasse "útil", o governo podia ir a Bruxelas
debater o assunto presencialmente. A representar o Estado estariam, escreveu
Pinho, Rui Cartaxo, o seu "conselheiro pessoal", e "António
Vitorino". Esta informação fez que António Vitorino figurasse na lista do
BE das pessoas a prestar depoimento na comissão de inquérito das rendas da EDP
- que começa hoje.
Vitorino não precisava de
apresentações. Tinha sido comissário europeu da Justiça e dos Assuntos
Internos, entre 1999 e 2004. Fora deputado, entre fevereiro de 2005 e setembro
de 2006 - quatro meses antes. Tinha sido também, segundo a declaração de
interesses, "consultor jurídico da EDP", entre 1998 e 1999, antes de
ser comissário.
Em resposta ao DN, António
Vitorino esclareceu que participou, com Manuel Pinho, numa reunião sobre a lei
dos CMEC, mas nega ter alguma vez participado em reuniões com Neelie Kroes a
este respeito. "Em 2007 participei numa reunião interna no Ministério da
Economia com o objetivo de detalhar as razões que haviam levado a Comissão de
que fiz parte a considerar os CAE contrários à legislação europeia. E a dar
opinião sobre se a legislação então em preparação respondia aos motivos
invocados pela Comissão. Não me foi dado nenhum mandato nessa reunião nem fiz
qualquer contacto seja com a comissária Kroes, seja com qualquer funcionário da
Comissão, sobre o modelo dos CMEC como podem facilmente verificar junto de quem
tratou desse assunto quer do lado português quer do lado da Comissão",
escreveu.
Terá sido de forma informal que
Vitorino foi chamado pelo ministro a dar o seu parecer sobre uma lei complexa
que ditou um lucro excecional à EDP - e que está agora envolta em polémica.
Segundo as contas da Entidade Reguladora do Setor Energético, a EDP recebeu do
Estado 510 milhões de euros a mais do que devia, entre a publicação da lei de
Manuel Pinho (sobre a qual Vitorino foi ouvido), em 2007, e o ano passado. Dito
de outra forma, e por outro regulador, a Autoridade da Concorrência, esta
"renda" representou, nos últimos anos cerca de um terço dos lucros da
empresa.
A Procuradoria-Geral da República
(PGR), que investiga alegadas suspeitas de corrupção neste processo dos CMEC,
já se pronunciou sobre a legalidade do processo. O Conselho Consultivo da PGR
emitiu os Pareceres 23/2018 e 24/2018 onde se lê que o processo de fixação dos
montantes dos CMEC "pode ser declarado nulo" e que os atos do governo
sobre esta matéria indicam uma "usurpação de poder".
Jorge Costa é o deputado do BE
que propôs a atual comissão de inquérito. Na sua opinião, "deve ser bem
esclarecido o estatuto e funções de António Vitorino em 2007, no momento em que
foram introduzidas, de rajada, alterações decisivas no regime dos CMEC com
impactos milionários na fatura elétrica". Para Jorge Costa, a comissão de
inquérito deve esclarecer "quais foram e como foram tomadas as decisões que
instalaram estas rendas garantidas no sistema elétrico e que colocam Portugal
na posição de recordista em custos energéticos das famílias". Este
esclarecimento público pode ajudar a definir políticas corretivas e "levar
à recuperação de pagamentos excessivos".
2- E os conflitos de interesse?
O nome de António Vitorino será
uma das novidades da comissão de inquérito, mas a lista de governantes que
passaram, ou estão, na EDP é longa. Mesmo hoje, há vários ex-ministros,
ex-secretários de Estado e ex-assessores na sede da principal companhia
elétrica.
No Conselho Geral, que tem 21
membros, dos quais 11 são portugueses, sete deles são ex-governantes. Os
ex-ministros e secretários de Estado estão em maioria na Comissão de
Estratégia: quatro em cinco. Na Comissão de Auditoria são metade: dois em
quatro. Na Comissão de Sustentabilidade e na Mesa da Assembleia Geral todos os
membros portugueses são ex-governantes.
A uma série de perguntas
detalhadas do DN, a EDP respondeu com uma resposta genérica. Nomeadamente não explica
as razões concretas para a contratação de tantos ex-governantes. Nem refere em
profundidade quais são os critérios de prevenção de conflito de interesses: se
não há impedimento legal, a contratação é possível.
"A escolha dos membros dos
órgãos sociais da EDP, nomeadamente do Conselho de Administração Executivo e do
Conselho Geral de Supervisão, é da competência dos acionistas, não existindo
qualquer incompatibilidade ou impedimento legal relativos às funções que
exerceram anteriormente a essa nomeação. No que se refere ao recrutamento de
trabalhadores, a EDP segue todos os preceitos legais e políticas internas, que
privilegiam naturalmente as competências e adequação dos perfis. A política de
recursos humanos do Grupo tem, aliás, vindo a ser reconhecida nacional e
internacionalmente, em particular pela estratégia de Diversidade e
Inclusão", diz a empresa.
Para a OCDE, há uma definição que
explica melhor o problema: "Um conflito de interesses envolve uma oposição
entre o dever público e o interesse privado de um servidor público, no qual o
interesse privado pode influenciar negativamente o desempenho de deveres e
responsabilidades públicas."
3- Lóbi que condiciona governos
"Se você precisar de mim
para eu dar aí alguns entendimentos... Eu disponho--me a isso. Porque eu tenho
essa visão da política que não é partidária." Esta frase ficou registada
por uma câmara que Eduardo Catroga não sabia estar a gravar, em abril de 2016,
e deixou António Costa aparentemente incomodado. A completar a sugestão, Catroga
pedia também uma reunião entre o atual governo e a EDP.
Eduardo Catroga era chairman
(presidente não executivo) da EDP desde 2012. Estava nos quadros superiores da
empresa desde 2006. Tinha sido ministro das Finanças de Cavaco Silva mas, na
realidade, nunca abandonou a política. Foi ele, por exemplo, que liderou - a
pedido de Pedro Passos Coelho - as negociações com o governo de Sócrates para
que o Orçamento de 2011 fosse aprovado. Uns meses depois, foi também ele que
encabeçou as negociações do PSD com a troika para a assinatura do memorando de
entendimento (que no ponto 5.6 se referia diretamente aos CMEC pagos à EDP).
Segundo todas as notícias reveladas na altura, Catroga foi também o coordenador
do programa eleitoral com que Passos Coelho venceu as eleições de 2011.
Nos órgãos sociais da EDP está
também Rui Medeiros, que foi ministro da Modernização Administrativa no governo
de Passos Coelho. Ou Luís Amado, que era colega de Manuel Pinho quando o
governo Sócrates aprovou a referida "renda" a pagar à EDP. Ou Jorge
Braga de Macedo, que era conselheiro de Passos Coelho quando a troika impôs,
sem êxito, o fim desta "renda excessiva". O líder da EDP é António
Mexia, que era ministro de Santana Lopes quando a "renda" foi criada.
4-Críticos e champanhe
Estes são apenas alguns exemplos
da lista. E não é por isso de estranhar que seja um dos ex-responsáveis
políticos pelo setor a assumir que "o lóbi da energia tem condicionado os
governos". Henrique Gomes foi secretário de Estado da Energia na primeira
fase do governo de Passos Coelho e tentou diminuir o valor dos CMEC, sem êxito.
Na sua memória está uma cena que
descreve a sua experiência. "Foi um trabalho interessante, foi entregue ao
ministro Álvaro [Santos Pereira] numa quinta-feira ao fim do dia, em papel, o
sr. ministro leu durante a noite, falou connosco de manhã, fizemos os ajustes
que ele achou por necessários e mandou entregar ao sr. primeiro-ministro ao fim
da manhã. À hora de almoço, estava a almoçar com a minha equipa, começámos a
receber chamadas da EDP a perguntar que relatório era aquele", contou, em
entrevista ao DN.
A experiência de Henrique Gomes
terminou de forma abrupta, com a demissão, após não ter autorização do governo
para dar uma conferência sobre custos excessivos, numa universidade de Lisboa.
"A propaganda e o lóbi dos grandes operadores e o silêncio do governo,
igualmente ensurdecedor, têm assegurado os privilégios do setor elétrico",
escreve no Jornal de Negócios pouco depois de ter deixado a secretaria de
Estado.
Do outro lado, Álvaro Santos
Pereira recordava esse momento numa entrevista DN/TSF: "Quando o meu
anterior secretário de Estado da Energia (Henrique Gomes) saiu, tive um dos
principais presidentes das produtoras de energia elétrica em Portugal a
telefonar para várias pessoas, a celebrar com champanhe."
5- UE, troika e preços altos na
energia
O assunto das rendas excessivas
parece eternizar-se. E por muito que a troika tenha insistido, os CMEC
sobreviveram. "É necessária uma maior determinação para concretizar
reformas que podem atingir interesses instalados sensíveis do ponto de vista
político e económico", escreveram os representantes do FMI, CE e Banco
Central Europeu. Chegada a geringonça, o discurso manteve-se crítico, mas não
houve alterações.
"Acho que há rendas excessivas
na energia", criticou o atual secretário de Estado da Energia, Jorge
Seguro Sanches. Mas a mera possibilidade de al-terar o que foi definido em
2004, pelo governo Santana Lopes, e 2007, pelo governo Sócrates, fez que a EDP
ameaçasse com processos: "Caso esta intenção de correção do ajustamento
final dos CMEC venha a confirmar-se é intenção da EDP iniciar as respetivas
ações legais", garante o relatório e contas da empresa.
Ora, tudo isto tem um reflexo no
dia--a-dia dos portugueses. A eletricidade acaba por se tornar mais cara do que
podia. Já o escrevia o comissário italiano da Concorrência, Mario Monti, quando
deu luz verde à lei dos CMEC: "Os auxílios [do Estado à EDP] serão
financiados através de uma tarifa imposta sobre os consumidores finais de eletricidade."
E assim voltamos ao e-mail de
Manuel Pinho que refere Vitorino. No dia 19 de outubro de 2012, a Direção-Geral
da Concorrência da UE fez forward do mail de Pinho para o diretor-geral da
Energia português. Com uma queixa: "Este é o único contacto das
autoridades portuguesas depois de 2005 que está documentado no nosso
registo." Na verdade, a União Europeia devia ter sido informada da
evolução anual do valor dos CMEC - algo que não aconteceu, assim como não
recebeu do governo português qualquer nota sobre as alterações promovidas neste
complexo dossiê. "Não conseguimos encontrar informações sobre alegadas
trocas de informação entre as autoridades portuguesas e a Comissão
relativamente às variáveis que não foram especificamente definidas no Decreto-Lei
240/2004, de 27 de dezembro, designadamente o valor dos contratos e o custo de
capital considerado para a anuidade correspondente a ser paga aos
produtores", diz o mail de Bruxelas.
O único documento arquivado no
registo de Bruxelas é um curto mail do ministro português, com dois erros, em
que sugere à comissária Neelie Kroes um encontro com o ex-comissário António
Vitorino.
As portas giratórias na EDP
1- António Mexia
(Presidente do Conselho de
Administração Executivo)
Na política: foi adjunto do
secretário de Estado do Comércio Externo (1989/1991, governo Cavaco Silva);
ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações (2004, governo Santana
Lopes).
2 -Rui Medeiros
(Vice-presidente da mesa da
Assembleia Geral)
Na política: ministro da
Modernização Administrativa (2015, governo Passos Coelho).
3 -Joaquim Poças Martins
(Conselho de Ambiente e
Sustentabilidade)
Na política: secretário de Estado
do Ambiente e do Consumidor (1993/95, governo Cavaco), vice-presidente do
Município de Vila Nova de Gaia, vereador do Urbanismo e presidente da empresa
municipal Águas de Gaia.
4 -António Gomes de Pinho
(Conselho de Ambiente e
Sustentabilidade)
Na política: fundador, deputado e
líder parlamentar do CDS, secretário de Estado da Cultura (1981/83, governo
Balsemão), representante do Estado no conselho de administração da Fundação
Arpad Szenes-Vieira da Silva (desde 2013, governo Passos).
5 -Rocha Vieira
(Conselho Geral e de Supervisão,
Comissão de Vencimentos, Comissão de Estratégia e Performance)
Na política: ministro da
República nos Açores (1986/1991) e 112.º e último governador de Macau
(1991/1999, governos Cavaco e Guterres), chanceler do Conselho das Antigas
Ordens Militares (2011/2016, Presidente Cavaco).
6 -Augusto Mateus
(Conselho Geral e de Supervisão,
Comissão de Governo Societário e Sustentabilidade, Comissão de Estratégia e
Performance)
Na política: militante do MES,
diretor do jornal Poder Popular, secretário de Estado da Indústria e ministro
da Economia (1995/1997, governo Guterres).
7 -Braga de Macedo
(Conselho Geral e de Supervisão,
Comissão de Governo Societário e Sustentabilidade, Comissão de Estratégia e
Performance)
Na política: deputado, ministro
das Finanças (1991/1993, governo Cavaco), Conselho de Jurisdição Nacional do
PSD, comissão de relações internacionais do PSD, conselheiro do governo de
Passos Coelho.
8 -Celeste Cardona
(Conselho Geral e de Supervisão,
Comissão de Governo Societário e Sustentabilidade, Comissão para as Matérias
Financeiras / Comissão de Auditoria)
Na política: ministra da Justiça
(2001-2004, governo Durão).
9- Eduardo Catroga
(Conselho Geral e de Supervisão,
presidente da Comissão de Estratégia e Performance)
Na política: ministro das
Finanças (1993/1995, governo Cavaco), chefe da equipa de negociação do PSD do
Orçamento do Estado (2011), coordenador do programa eleitoral do PSD (2011),
chefe da equipa do PSD na negociação do Memorando de Entendimento com a troika.
10 -Luís Amado
(Presidente do Conselho Geral e
de Supervisão, presidente da Comissão de Governo Societário e Sustentabilidade,
presidente da Comissão para as Matérias Financeiras / Comissão de Auditoria)
Na política: deputado à
Assembleia Legislativa Regional da Madeira, deputado à Assembleia da República,
secretário de Estado adjunto do ministro da Administração Interna e dos
Negócios Estrangeiros e da Cooperação (1995/2001, governos Guterres),
secretário nacional para as Relações Internacionais do PS, ministro da Defesa
Nacional e dos Negócios Estrangeiros (2005/2011, governos Sócrates).
11 -António Vitorino
(Presidente da mesa da Assembleia
Geral, Conselho Geral e de Supervisão)
Na política: deputado desde 1980
(primeiro pela UEDS, depois pelo PS), secretário de Estado dos Assuntos
Parlamentares (governo Bloco Central), secretário do governo de Macau, deputado
no Parlamento Europeu, ministro da Defesa e ministro da Presidência (1995/1999,
governo Guterres), comissário europeu (1999/2004), dirigente nacional,
mandatário e coordenador de programas eleitorais do PS.
Paulo Pena | Diário de Notícias
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