Pepe Escobar [*]
A histeria está num tom agudo.
Após a cimeira da NATO em Bruxelas, o declínio definitivo do ocidente foi
declarado como um facto consumado quando o presidente Trump se mostrou pronto
para encontrar o presidente Putin em Helsínquia.
Foi o próprio Trump que estipulou querer conversar com Putin por trás de portas fechadas, cara-a-cara, sem quaisquer ajudantes e, em teoria, espontaneamente, depois de a reunião preparatória entre o secretário de Estado Mike Pompeo e ministro russo dos Negócios Estrangeiros Sergey Lavrov ter sido cancelada. A cimeira terá lugar no velho Palácio Presidencial do século XIX em Helsínquia, uma antiga residência de imperadores russos.
Como um preâmbulo para Helsínquia, a espectacularblitzkrieg da NATO foi um show memorável; vários "líderes" em Bruxelas simplesmente não sabiam o que os atingira. Trump nem se deu ao trabalho de chegar a tempo para as sessões da manhã que lidavam com o possível acesso da Ucrânia e da Geórgia. Diplomatas confirmaram ao Asia Times que após a investida mordaz de Trump de "pagar mais ou não", a Ucrânia e a Geórgia foram convidadas a abandonar a sala porque o que seria discutido era estritamente uma questão interna da NATO.
Antecipando a cimeira, eurocratas entregaram-se a intermináveis lamentações sobre o "iliberalismo", desde Viktor Orban na Hungria ao sultão Erdogan na Turquia, assim como a choradeira pela "destruição da unidade europeia" (sim, é sempre culpa de Putin). Trump contudo não teria nada com isso. O presidente dos EUA confunde a UE com a NATO, interpretando a UE como rival, tal como a China, mas muito mais fraca. Quanto ao "acordo" dos EUA com a NATO, assim como com o NAFTA, isso é um mau negócio.
Foi o próprio Trump que estipulou querer conversar com Putin por trás de portas fechadas, cara-a-cara, sem quaisquer ajudantes e, em teoria, espontaneamente, depois de a reunião preparatória entre o secretário de Estado Mike Pompeo e ministro russo dos Negócios Estrangeiros Sergey Lavrov ter sido cancelada. A cimeira terá lugar no velho Palácio Presidencial do século XIX em Helsínquia, uma antiga residência de imperadores russos.
Como um preâmbulo para Helsínquia, a espectacularblitzkrieg da NATO foi um show memorável; vários "líderes" em Bruxelas simplesmente não sabiam o que os atingira. Trump nem se deu ao trabalho de chegar a tempo para as sessões da manhã que lidavam com o possível acesso da Ucrânia e da Geórgia. Diplomatas confirmaram ao Asia Times que após a investida mordaz de Trump de "pagar mais ou não", a Ucrânia e a Geórgia foram convidadas a abandonar a sala porque o que seria discutido era estritamente uma questão interna da NATO.
Antecipando a cimeira, eurocratas entregaram-se a intermináveis lamentações sobre o "iliberalismo", desde Viktor Orban na Hungria ao sultão Erdogan na Turquia, assim como a choradeira pela "destruição da unidade europeia" (sim, é sempre culpa de Putin). Trump contudo não teria nada com isso. O presidente dos EUA confunde a UE com a NATO, interpretando a UE como rival, tal como a China, mas muito mais fraca. Quanto ao "acordo" dos EUA com a NATO, assim como com o NAFTA, isso é um mau negócio.
A NATO é "obsoleta"
Trump está correcto em que sem os EUA a NATO é "obsoleta" – como se
não existisse. Assim, essencialmente, o que ele fez em Bruxelas foi por a nu o
caso da NATO como um esquema de extorsão, com Washington totalmente no direito
de aumentar as apostas pela "protecção".
Mas "protecção" contra o que?
Desde o desmembramento da Jugoslávia, quando a NATO foi reposicionada no seu
novo papel de imperialista humanitário global estilo Robocop, o registo da
aliança é absolutamente deplorável.
Isso fica miseravelmente caracterizado pela perda de uma guerra sem fim no
Afeganistão contra uns bandos de guerrilheiros pashtuns armados com réplicas de
Kalashnikov; na transformação funcional da Líbia num terreno devastado por
milícias e sede de refugiados destinados à Europa; e ter a NATO-Conselho de
Cooperação Golfo perdido sua aposta numa galáxia de jihadistas e
cripto-jihadistas na Síria, disfarçados como "rebeldes
moderados".
A NATO lançou uma nova missão de treino no Iraque, não combatente, 15 anos após
a operação Pavor e Choque. Sunitas, xiitas, yazidis e mesmo facções curdas não
estão impressionados.
Há então a Iniciativa de Prontidão da NATO, a capacidade de deslocar 30
batalhões, 30 navios de guerra e 30 esquadrões aéreos dentro de 30 dias (ou
menos) em 2020. Se não causar estragos através do Sul Global, esta iniciativa é
supostamente criada para deter a "agressão russa".
Assim, depois de se interessar pela Guerra Global ao Terror, a NATO está
essencialmente de volta à "ameaça" original; a iminente invasão russa
da Europa Ocidental –- uma das noções mais ridículas que já houve. A declaração final em Bruxelas destaca-a, com ênfase
especial nos itens 6 e 7.
O PIB somado de todos os membros da NATO é 12 vezes o da Rússia. E os gastos com defesa da NATO são seis vezes maiores do que os da Rússia. Ao contrário da incessante histeria polonesa e báltica, a Rússia não precisa "invadir" nada; O que preocupa o Kremlin, a longo prazo, é o bem-estar dos russos étnicos que vivem nas antigas repúblicas soviéticas.
A Rússia não pode ser uma ameaça e um parceiro energético
E há a questão da política energética europeia – e isso é uma história
completamente diferente.
Trump descreveu o gasoduto Nord Stream 2 como "inadequado", mas a sua
afirmação de que a Alemanha obtém 70% da sua energia (via importações de gás
natural) da Rússia pode ser facilmente desmascarada. A Alemanha obtém no máximo
9% da sua energia da Rússia. Em termos de fontes de energia da Alemanha, apenas 20% é gás natural.
E menos de 40% do gás natural na Alemanha vem da Rússia. A Alemanha está rapidamente
a transitar rumo à energia eólica, solar, da biomassa e hidráulica, as quais
montam a 41% do total em 2018. E o objectivo é de 50% em 2030.
No entanto, Trump tem um ponto excelente quando, salientando que "a
Alemanha é um país rico", ele quer saber por que os EUA deveriam "protegê-la contra a Rússia" quando os acordos
de energia estão sobre a mesa. "Explique isso! Não pode ser
explicado!", como consta ter dito quarta-feira ao secretário-geral da
NATO, Jens Stoltenberg.
No fim, é claro, é tudo acerca de negócios. O que Trump realmente está a
pretender é que a Alemanha importe shale gás dos EUA, três vezes mais caro do que
o gás russo entregue por pipeline.
O ângulo da energia está ligado directamente à infindável novela dos 2% com
gastos de defesa. A Alemanha actualmente gasta 1,2% do PIB com a NATO. Em 2024
supõe-se que atinja no máximo 1,5%. E isso é tudo. A maioria dos eleitores
alemães, quer de facto que as tropas dos EUA fora do seu país .
Assim, o pedido de Trump de 4% do PIB em gastos de defesa para todos os membros
da NATO nunca levantará voo. O seu tom agudo deveria ser considerado por aquilo
que é: uma tentativa de "convite" para uma jornada de compras
acrescida da UE e da NATO de hardware militar dos EUA.
Em suma, o factor chave é que a blitzkrieg de Trump em Bruxelas apresentou o
seu caso. A Rússia não pode ser uma "ameaça" e um parceiro de energia
confiável ao mesmo tempo. Por mais que os caniches da NATO possam estar
aterrorizados com uma "agressão russa", os factos mostram que não vão
aplicar o seu dinheiro na sua histeria retórica.
Está a ouvir agora?
A "agressão russa" deveria ser um dos tópicos principais discutidos
em Helsínquia. Na possibilidade – remota – de que Trump faça um acordo com
Putin, a absurdo raison d'etre da NATO ficaria ainda mais
desnuda.
Essa não é a agenda "profunda" dos Estados Unidos, é claro, daí a
demonização ininterrupta da cimeira mesmo antes de ela acontecer. Além disso,
para Trump, o jogador que aposta no Make-America-Great-Again, o resultado ideal
seria sempre conseguir mais acordos de armas europeus para o complexo
industrial-militar e de inteligência dos EUA.
Aterrorizados por Trump, nestes últimos dias diplomatas em Bruxelas
transmitiram ao Asia Times temores quanto ao fim da NATO, o fim da
Organização Mundial do Comércio, mesmo o fim da UE. Mas o facto que permanece é
que a Europa é absolutamente periférica no Quadro Global.
Em Losing Military Supremacy , livro recente e inovador, o analista
militar-naval Andrei Martyanov desconstrói em pormenor como "os
Estados Unidos enfrentam duas superpotências nucleares e industriais, uma das
quais dispõe de forças armadas de classe mundial. Se a aliança militar-política,
em oposição à meramente económica, for formalizada entre a Rússia e a China,
isso significará a derrocada final dos Estados Unidos como potência
global".
O estado profundo dos EUA (seus burocratas influentes) pode revolver-se em
perpétua negação, mas Trump – após muitas reuniões a portas fechadas com Henry
Kissinger – pode ter entendido a "estratégia" suicida de Washington
de simultaneamente antagonizar a Rússia e a China.
O discurso memorável de Putin em 1 de
Março , como enfatiza Martyanov, foi um esforço para "coagir as
elites da América se não à paz, pelo menos a alguma forma de sanidade, uma vez
que elas estão completamente afastadas das realidades geopolíticas, militares e
económicas das novas configurações de poder que agora emergiram no mundo".
Estas elites podem não estar a ouvir, mas Trump parece indicar que ele
está.
Quanto aos caniches da NATO, tudo o que podem fazer é assistir.
13/Julho/2018
[*] Jornalista.
O original encontra-se em http://www.atimes.com/article/trump-nato-and-russian-aggression/
O original encontra-se em http://www.atimes.com/article/trump-nato-and-russian-aggression/
Na foto: Jantar de ministros dos
negócios estrangeiros durante a cimeira da NATO em Bruxelas – 11/7/2018. Reuniram-se
para discutir a Rússia, o Iraque e o Afeganistão | Foto AFP / Yves Herman.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/
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