Miguel Guedes | Jornal de Notícias
| opinião
Na campanha para as eleições
autárquicas de 2017, Santana Lopes assegurava, a alto e bom som, o quanto
estava na moda bater no PSD. Menos de um ano depois, prefere fragmentá-lo em
pedaços, batendo bolas por fora depois de malhar contra o muro interno, mas sem
arrastar (ainda) alguns dos seus principais batedores. Enquanto a recolha de
assinaturas para a constituição da "Aliança" decorre a bom ritmo, não
há nomes sonantes do PSD que prefiram correr na pista individual de Santana,
fora do trilho de sempre. Talvez porque seja unânime a percepção de que a
"Aliança" é tão-só a concretização do projecto pessoal de um homem
viciado em eleições, incapaz de abdicar do teste de aceitação popular que o seu
partido já não lhe proporcionará. No momento em que Rui Rio é a última
esperança do PSD para purgar o partido da lógica dos interesses que a deriva
neoliberal de Pedro Passos Coelho petrificou, convém a muitos adversários
internos de Rio que alguém navegue à vista, impedindo aquilo que mesmo uma
vitória do PS nas próximas legislativas não impedirá face à aproximação de Rui
Rio a António Costa: o regresso do PSD aos arredores da sua matriz
social-democrata para ressuscitar, mais cedo do que tarde, o bloco central.
Na lógica dos interesses, é
natural que Santana Lopes já não tenha interesse no PSD. Outros protagonistas
esperam, com natural ansiedade e pérfida estima, pelo fim precoce do actual
líder. Nessa fila laranja de sucessão, não há lugar para Santana. Na ausência
de reflexo, prefere a Oposição. E, perante a sua história política, percebe-se
bem a preocupação de muitos sectores à Direita: Santana é um especialista em
segundos lugares. O ataque ao ceptro de líder da Oposição far-se-á tão mais
forte quanto mais Rio se encostar ao PS e Cristas se afastar do eleitorado ao
centro só porque a "Aliança" existe. Esse "lugar de
ninguém" da Direita portuguesa está, finalmente, prestes a ser ocupado por
uma inequívoca vontade de fragmentação, curiosamente em contraciclo com uma
histórica e inusitada união das esquerdas. A Direita pode querer mas já nunca
será capaz de uma geringonça. Como os tempos mudam.
Não haverá outro partido que
Santana Lopes possa criar caso não ganhe as eleições ou, pés à terra, a
liderança da Oposição. Nesse sentido, será bom contar com ele por muito tempo,
enquanto aguarda pelo fenómeno de arrastamento no PSD que um eventual desastre eleitoral
do partido ditará como inevitável. Sobra a pergunta: se o partido dos
interesses sair do PSD para abraçar a "Aliança" e Rui Rio definhar
pela purga libertária dentro de portas à espera do abraço do bloco central, o
que restará do PSD?
(O autor escreve segundo a antiga
ortografia)
* Músico e jurista
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