domingo, 20 de maio de 2018

Visões em choque sobre a desnuclearização - Cimeira EUA-Coreia do Norte está em risco


Gregory Elich [*]

As esperanças crescentes geradas pela recente Cimeira Inter-Coreana são agora suplantadas pela incerteza, devido à suspensão pela Coreia do Norte de uma reunião planeada com o Sul. 

Nas semanas a seguir à cimeira da Declaração de Panmunjon, a Coreia do Norte efectuou acções para demonstrar sua boa vontade e desejo de resolução pacífica de diferenças.

A República Democrática e Popular da Coreia (RDPC, o nome formal da Coreia do Norte) anunciou que desmantelaria seu sítio subterrâneo de testes nucleares, o que culminaria em explosões para destruir túneis, no bloqueio de entradas e na remoção de instalações acima do solo.

Progressos substanciais já haviam sido feitos quanto à desactivação do sítio . A RDPC poderia ter esperado e feito disto uma questão negociável em conversações com os Estados Unidos. Ao invés disso, ela ofereceu este passo aos Estados Unidos antes da cimeira, como uma medida de construção de confiança. Também antes, a Coreia do Norte comprometeu-se a uma suspensão de testes nucleares e de mísseis . E como gesto adicional de boas intenções, a Coreia do Norte libertou todos os três prisioneiros americanos.

Os sinais iniciais das reuniões do secretário de Estado Mike Pompeo com o presidente Kim Jong Us foram bastante encorajadores, indicando um não característico grau de flexibilidade da parte da administração Trump. Os media norte-coreanos informaram que as conversações indicavam que Trump "tem uma nova alternativa" e uma "atitude proactiva" e que Kim e Pompeo haviam alcançado "um entendimento satisfatório".

Enquanto isso, quando Pompeo e Kim faziam aparentes progressos, o processo começou a descarrilar de um lado diferente. Houve muitos na administração Trump que não estavam entusiasmados com a ideia da reciprocidade. A visão dominante era que prémios, quaisquer que fossem, só podiam vir após a desnuclearização.

O Conselheiro de Segurança Nacional John Bolton saiu-se com uma série de entrevistas para elucidar a posição dos EUA. A desnuclearização permanente, verificável e irreversível teria de verificar-se antes de "os benefícios começarem a fluir", disse ele. A expectativa é que a RDPC deveria abandonar sua dissuasão nuclear sem receber qualquer coisa mais em retorno além da promessa de prémios futuros. Nem tão pouco Bolton considera que o desarmamento nuclear será suficiente. As negociações ainda não começaram e os EUA já estão a amontoar novas exigências. As conversações, Bolton insistiu, também precisariam considerar o programa de mísseis balísticos da RDPC e preocupações com direitos humanos. Armas químicas e biológicas também estarão na agenda, disse ele, apesar do facto de a sua existência ser puramente especulativa. Negociações sobre desnuclearização serão só por si bastante desafiadoras. Sobrecarregar as conversações com questões adicionais é provável que seja uma receita para o fracasso.

Mesmo quando a Coreia do Norte se esforça para atender exigências americanas, ela não pode esperar qualquer alívio quanto a sanções e ameaças. Bolton assevera que os EUA precisam ver a Coreia do Norte a implementar adesnuclearização e a política da máxima pressão não esmorecerá até que isso aconteça.

Que espécie de benefícios pode a Coreia do Norte esperar como retorno pelo cumprimento das exigências dos EUA? "Eu encararia a nossa ajuda económica", declarou Bolton sem rodeios . Presumivelmente, uma vez que a Coreia do Norte tenha satisfeito todas as exigências da administração Trump, as sanções começariam a ser reduzidas ou eliminadas. Isso não é um prémio. Se alguém está a punir outro, e então promete reduzir o montante da punição, certamente se pode dizer que a vítima não encarará isso como um "prémio".

Na frente económica, Mike Pompeo concorda com Bolton. Nenhuns fundos do contribuinte serão direccionados paraassistir a Coreia do Norte , disse ele. O que os Estados Unidos estão desejosos de fazer é enviar vorazes investidores corporativos à Coreia do Norte em busca de oportunidades para fazer lucros. Uma vez tendo sido completada a desnuclearização e levantadas as sanções, Pompeo diz que o presidente Kim "obterá da América o que ela tem de melhor – nossos empresários, nossos tomadores de risco, nossos fornecedores de capital... Eles obterão entradas de capital privado". Uma forte argumentação poderia ser feita de que estes são realmente o que há de pior na América e não são desejáveis para a Coreia do Norte nem para qualquer outra nação.

Pompeo prosseguiu a falar acerca das necessidades da Coreia do Norte em energia, agricultura, equipamento e tecnologia. As necessidade existem. Mas por que? Durante décadas os Estados Unidos sujeitaram a RDPC a enormes danos económicos por meio das sanções. O povo norte-coreano não é incapaz de melhorar sua sorte. Ele só precisa que lhe seja permitido fazê-lo, sem embaraços e punições. O que a RDPC precisa e ao que apela sistematicamente é à normalização de relações.

Certamente a Coreia do Norte não procura privatizar firmas estatais ou contratar firmas dos EUA para trabalhos que ela é capaz de fazer por si mesma, uma vez libertada do fardo das sanções.

Está claro que a administração Trump não está desejosa de dar o que quer que seja à Coreia do Norte. Não custa nada levantar sanções ou alimentar a esperança de que oportunidades lucrativas na Coreia do Norte florescerão para investidores estado-unidenses. Assinar um pedaço de papel prometendo uma garantia de segurança não impõe qualquer fardo sobre os Estados Unidos. A administração Trump, ou aliás qualquer futura administração, é livre para ignorar aquela garantia e disparar os mísseis de cruzeiro sempre que achar conveniente.

Nem tão pouco a retirada da administração Trump do acordo nuclear com o Irão inspira confiança na confiabilidade dos Estados Unidos como parceiro negocial.

Os pronunciamentos de Bolton, ajudado talvez por manobras de bastidores, parecem ter levado Pompeo a recuar das suas declarações anteriores acerca de ter sido feito progresso e ter sido alcançado um entendimento mútuo com o presidente Kim. Ele agora está a informar que resta muito trabalho a fazer e que os EUA e a Coreia do Norte não estão " nada próximos ".

"Temos muito em mente o modelo da Líbia de 2003, 2004", disse Bolton recentemente à Fox News. Naquele modelo a Coreia do Norte teria de despachar suas armas nucleares para Oak Ridge, Tennessee, para destruição. À RDPC seria exigido completar o desarmamento antes e receber alívio em relação às sanções depois.

Então como é que esse modelo funcionou para a Líbia ? Aquele país começou por desnuclearizar no princípio de 2004 e, ao longo do processo, cumpriu plenamente as exigências dos EUA de desnuclearização unilateral. Mas os Estados Unidos foram vagarosos quanto à compensação e os líbios muitas vezes queixaram-se a diplomatas americanos de não terem sido premiados pelo seu cumprimento. Só em 2006 éM que os EUA restabeleceram relações diplomáticas e removeram a Líbia da lista de estados patrocinadores de terrorismo.

Embora os EUA fossem morosos em dar alívio à Líbia, estavam ansiosos por emitir mais exigências. John Bolton, que foi sub-secretário de Estado na administração George W. Bush naquela altura, disse a responsáveis líbios que eles tinham de cortar a cooperação militar com o Irão a fim de completar o acordo de desnuclearização. Em pelo menos uma ocasião, um responsável dos EUA pressionou a Líbia a cortar o comércio militar com a Coreia do Norte, o Irão e a Síria.

Responsáveis americanos também exigiram que a Líbia reconhecesse a independência do Kosovo , uma posição a que a Líbia se opôs sistematicamente. A isto seguiu-se uma nota diplomática dos EUA para a Líbia, ordenando que votasse contra a [proposta de] resolução do governo sérvio nas Nações Unidas, a qual pedia uma sentença do Tribunal Internacional de Justiça sobre a legalidade da independência do Kosovo. Nessas circunstâncias, a Líbia preferiu ausentar-se da votação ao invés de juntar-se aos Estados Unidos e aos outros três países que se opuseram à medida.

Os EUA tiveram mais êxito ao obter o voto da Líbia em favor de sanções da ONU contra o Irão . Sob pressão dos EUA, a Líbia também lançou um programa de privatização e abriu oportunidades para negócios dos EUA.

A Coreia do Norte pode esperar o mesmo tratamento se seguir este modelo. Os Estados Unidos começarão a tratá-la como um estado vassalo, esperando que cumpra ordens sobre uma miríade de questões que nada têm a ver com desnuclearização.

Todos nós sabemos como o modelo terminou, com os Estados Unidos e seus parceiros da NATO a bombardearem a Líbia e com o assassinato brutal de Muammar al-Qaddafi. Os norte-coreanos também sabem.

Em 2006 a Grã-Bretanha e a Líbia assinaram uma Carta Conjunta sobre Paz e Segurança. O documento declarava que as duas nações "comprometiam-se nas suas relações internacionais a absterem-se da ameaça ou da utilização de força contra a integridade territorial ou independência política um do outro". Ela ainda obrigava as partes aabsterem-se de intervir nos assuntos internos um do outro. Cinco anos depois a Grã-Bretanha estava a ajudar jihadistas a combaterem para derrubar o governo e juntou-se à NATO no bombardeamento da Líbia. Isso é o modelo líbio, também, no qual está provado que uma "garantia" de segurança ocidental não tem valor.

A RDPC tem em mente uma abordagem mais crível, acção-por-acção, para as negociações. Nesta há uma abordagem faseada e cada lado ganha alguma coisa à medida que o progresso continua rumo ao objectivo final da desnuclearização e da normalização de relações.

Continuando a estabelecer um quadro de respeito mútuo pelas negociações, este mês a Coreia do Norte reduziu drasticamente a escala de seus exercícios anuais com veículos blindados.

Contudo, Washington está a enviar sinais de uma natureza diferente. Em 11 de Maio arrancaram os exercícios aéreos Max Thunder EUA-Coreia do Sul, mobilizando mais de 100 aviões de combate, incluindo o avançado Stealth F-22 Raptor. O exercício deste ano é o maior já efectuado, numa aparente tentativa de aplicar pressão adicional à Coreia do Norte.

Em resposta, a Coreia do Norte anunciou que suspendia sua reunião de 16 de Maio com responsáveis sul-coreanos. A KCNA, agência de notícias da Coreia do Norte, destacou que os exercícios ampliados constituíam "um desafio sem disfarce à Declaração de Panmunjon", na qual ambas as Coreias se comprometiam a cessar todos os actos hostis. A notícia acrescentava que a Declaração de Panmunjon não pode ser implementada apenas por uma das partes.

Seguiu-se o primeiro vice-ministro dos Negócios Estrangeiros da RDPC, Kim Kye Gwan, anunciando que a melhoria nas relações com os Estados Unidos arriscava-se a ser desfeita por responsáveis americanos apelarem ao desarmamento unilateral e a aderência ao modelo líbio. A Coreia do Norte já declarou sua intenção de desnuclearizar em troca de um fim à política hostil dos EUA, continuou ele. "Mas agora os EUA estão a avaliar mal a magnanimidade e as iniciativas com abertura de espírito da RDPC como sinais de fraqueza".

A Coreia do Norte deixou a porta aberta para os EUA e a Coreia do Sul. A reunião de 16 de Maio com responsáveis sul-coreanos foi suspensa, não cancelada. E os norte-coreanos estão a dizer que observarão de perto o comportamento dos EUA e de responsáveis sul-coreanos. Retratado nos media ocidentais como um acto de inexplicável petulância, a suspensão da reunião inter-coreana é um alerta para os Estados Unidos e a Coreia do Sul. O modelo da capitulação não é uma abordagem viável. A reciprocidade é essencial.

Os norte-coreanos não estão em vias de renunciar à sua dissuasão nuclear por nada mais do que uma promessa vazia de segurança e pela sugestão de que sanções podem ser levantadas se cumprirem uma multidão de exigências adicionais.

Durante a administração Obama o programa de armas nucleares da Coreia do Norte estava numa etapa de desenvolvimento suficientemente imatura que os Estados Unidos sentiram poder exigir que a Coreia do Norte desnuclearizasse plenamente como condição prévia para conversações.

Depois de a RDPC ter completado seus programas acelerados de armas nucleares e mísseis balísticos, ela agora tem alguma coisa de substancial para negociar. Ela espera que os Estados Unidos se empenhem nas negociações diplomáticas normais das concessões mútuas. O antigo representante do Departamento de Estado para a Coreia do Norte, Joseph Yun , observa: "O preço subiu. Você tem de tratar do que eles querem. Se acredita que eles deveriam tratar só do que nós queremos penso que é um caminho muito, muito errado". 

17/Maio/2018

Ver também: 
  Tentará John Bolton repetir o seu feito?

[*] Director do Jasenovac Research Institute e associado do Korea Policy Institute, membro do Comité de Solidariedade para a Democracia e a Paz na Coreia e membro da Task Force to Stop THAAD in Korea and Militarism in Asia and the Pacific. Seu sítio web é https://gregoryelich.org

O original encontra-se em www.zoominkorea.org/...

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

ANGOLA DO MEDO

Raul Diniz | opinião

O parlamento angolano decidiu protelar e acabar com o combate aos corruptos e corruptores. Ao contrario do que afirmava a pés juntos o “corajoso” João Lourenço, nas suas delongadas peregrinações populistas país a fora, em que afirmava ser o salvador da pátria, que prenderia e iria mesma confrontar e prender os corruptos e ladrões, debalde. João Lourenço decidiu-se pela defesa dos bandidos. O PR fugiu ao confronto e nega-se a enfrenta-los. Isso prova que o presidente foi pescado com anzol apropriado e fechada foi a sua boca.

Hoje, cabisbaixo, amedrontado como qualquer peixinho que não deseja ficar fora do seu habitat, aquietou-se e decidiu que quer ser presidente do MPLA com a mesma facilidade que fora catapultado a presidência da república.

MPLA CONNECTION (V)

A elite angolana proveniente do MPLA é de todo cafona e é provida de uma consciência colonialista medíocre, carente de princípios éticos e morais, enfim, trata-se de uma elite totalmente apodrecida por dentro. Na verdade, trata-se de uma elite vitima dos tropeços de sua própria demência medieval.

 Igreja de Cristo está à deriva

A igreja cristã angolana, por seu turno é amorfa, e por acumulo encontrasse adormecida no seu próprio vomito. Ao contrario do que deveria ser, a igreja despojou-se do mais importante que é o ministério da presença. Quero dizer que ao invés de ser presença firme entre os pobres, a igreja escolheu constituir-se no templo dos poderosos infiéis.

Por onde andas oh oposição?

É preciso entender muito bem as múltiplas carências que angola sofre do ponto de vista de lideranças fortes, que hoje o país não dispõe. Desde a Morte de Jonas malheiro Savimbi, Angola não produziu nenhuma outra figura icónica de relevo, como garante do surgimento de uma oposição idónea, forte e coesa.

Após a morte de Jonas malheiro Savimbi, a UNITA ficou aprisionada em si mesma, por outro lado, as demais oposições convivem com o poder numa situação de total subserviência. Assim sendo, sobra apenas o capital político que pode ser usado pela sociedade civil ativa organizada, como solução de levar o país a uma eventual mudança de vida.

Angola precisa de renovar energias cívicas, não é mais possível conviver com a mediocridade prevalecente no país, Angola precisa sair da mesmice, terá que ser aberto um novo capítulo que ajude a retirar da miséria endémica a maioria do povo que é explorado pela minoria das minorias que somam apenas 6% da população composta de ladrões milionários e bilionários corruptos a mistura.

Está muito claro que a sociedade civil activa organizada deverá energizar-se para entrar definitivamente na contenda política, apoiar incondicionalmente o povo a exercitar a sua cidadania sem medo e sem temor. Tem que haver um choque térmico de intenções que desperte o povo e o ajude a defender-se desse regime caduco, preguiçoso e vagabundo.

Será que o povo deve crer nas oposições cobardes que empurraram a enterrar o povo para o precipício profundo? Depois de 1992 não foi a oposição que ajudou o povo, quem ajudou os partidos a ser oposição foi o povo e não o contrario.

A pergunta de um milhão de dólares que corre a pequena boca, será que chegaremos ao fim dessa legislatura inteiros? A ver vamos, quem viver verá.

TODOS DIZEM QUE FAZEM, POUCOS SÃO OS QUE FAZEM


Eugénio Costa Almeida acaba de publicar o livro “África Colonial no Centenário da Guerra 1914-1918”, especialmente vocacionado para a análise da participação de Angola e Moçambique neste conflito. É uma obra de leitura obrigatória, não só pelo exímio conhecimento deste autor angolano como pela necessidade pedagógica de explicar aos mais novos o papel dos africanos no contexto mundial.

Orlando Castro*

De uma forma geral e desde sempre os africanos foram (em alguns casos continuam a ser) instrumentos descartáveis nas mãos dos colonizadores. Ontem uns, hoje outros. Entre escravos, carne para canhão e voluntários devidamente amarrados, foram um pouco de tudo. Muitas vezes foram tudo ao mesmo tempo. Na I Guerra Mundial, como eximiamente explica Eugénio Costa Almeida, deram (pudera!) o corpo às balas, a alma ao Diabo e a dignidade às valas comuns.

Neste conflito alheio, mais de um milhão estiveram na frente de combate, morreram mais de 100 mil. Alguém se recorda hoje deles, ou os recorda, com a dignidade histórica que merecem? Se ser soldado desconhecido é só por si um drama, ser um soldado desconhecido… africano é obra desenganada. Infelizmente.

De uma forma geral, como 100 anos depois continua a ser verificado, os africanos são um povo (lato sensu) ingénuo que, mesmo depois de ter poder de decisão, acredita em milagres, sobretudo quando estes não são feitos por santos da casa. Não admira, por isso, como refere o Eugénio Costa Almeida, que muitos dos seus dirigentes da época (tal como os de hoje) “esperavam que a sua participação, em pé de igualdade com os seus companheiros de armas europeus e americanos, numa guerra que não lhes dizia respeito, mas que lhes foi imposta”, lhes trouxesse “melhorias constitucionais, económicas e sociais nos seus territórios de origem”.

Enganaram-se. O máximo que conseguiram como reconhecimento ao seu esforço e dedicação foi mudarem de donos. Ficou, contudo, a semente da rebelião que germinaria no deserto de injustiças que os europeus foram, do alto da sua suposta superioridade, regando.

Suposta superioridade que levou os europeus a pensarem que, regando essa semente, acabariam por a afogar. É claro que, mesmo no próprio continente africano, muita dessa rega foi feita com sangue e não com água. Denominador comum em todas as guerras em África entre africanos: a ambição ocidental em dominar as riquezas autóctones.

Em Angola (tal como noutras colónias) recorda o autor com oportunidade e conhecimento de causa, as consequências, o acerto de contas, surgiram meio século depois, contra as potências coloniais. Embora banidas pelo uso da razão da força conseguiram que a força da razão se mantivesse viva e, com a ajuda dos europeus africanos, gerasse um imparável nacionalismo.

A tudo isto acresce, como aponta Eugénio Costa Almeida, a megalómana tese europeia de que a História só é válida quando são os europeus a contá-la. Daí a tendência de, por regra, esquecer o contributo da participação de africanos. Até mesmo nos meios académicos, supostamente mais equidistantes de interesses rácicos, os africanos eram vistos como seres menores, auxiliares, sem direito a figurar como combatentes em pé de igualdade com os europeus juntos dos quais mataram e morrem por, corrobore-se, uma causa que não era sua.

”Recentes documentos, entretanto, disponibilizados, mostram que a presença dos africanos foi muito maior do que parecia expectável”, assinala o autor, acrescentando que (…) “a participação de expedicionários africanos (soldados e carregadores) junto das forças anglo-francesas se elevou a mais de 500.000 indivíduos; (…) entre os mais de 1.186.000 tropas francófonas mortas em combate, cerca de 71.100 eram provenientes das colónias francesas da Argélia, Madagáscar, Marrocos, Senegal e Tunísia”.

Ao longo dos tempos, milhares de africanos morreram para ajudar os europeus. Quantos europeus morreram para ajudar os africanos? Pois. Essa é outra história da nossa História comum que, contudo, não é o tema deste excelente livro do Eugénio Costa Almeida.

"Quem diria que seria a China a defender o comércio livre face aos EUA?!" - Éric Vuillard



Leia ou releia a entrevista ao escritor Éric Vuillard, vencedor do prémio literário mais importante de França, o Goncourt

Poucos dias antes da atribuição do prémio literário mais importante de França, o Goncourt, ao livro A Ordem do Dia, correu o boato de que muitos livreiros estariam descontentes com essa possibilidade, dado o livro custar apenas €16 (€13,90 em Portugal, na edição da D. Quixote). O caso, nunca confirmado nem desmentido, provoca um sorriso no laureado, Éric Vuillard, 50 anos, uma das mais singulares vozes francesas da atualidade. “Voilà, fake news...”, diz a brincar. Não frequenta as redes sociais, mas está a par da desinformação de que tanto se fala. Para ele, no entanto, o grande exemplo das “fake news do século” é a invasão do Iraque; um político, George W. Bush, a dizer que existem armas que não existem. São essas encenações que lhe interessam e que ele tenta recriar nos seus livros: a social e a cultural, e, sobretudo, a económica e a política. Já o fez a propósito da Revolução Francesa, da questão colonial, do genocídio dos índios americanos e da Primeira Guerra Mundial.

Volta, agora, a essas encenações a propósito da Segunda Guerra Mundial. A Ordem do Dia, Prémio Goncourt e sucesso de vendas em França, é um espantoso fresco sobre os antecedentes daquele conflito: jogos de bastidores, pactos entre empresários e ditadores, planos megalómanos e nunca concretizados; e, ainda, as muitas danças sociais entre um mundo antigo e aristocrático e uma nova desordem liderada por demagogos e gangsters. De Paris, ao telefone, Éric Vuillard revela à VISÃO a “verdade” que encontrou, através da ficção, sobre o que nos levou à Segunda Guerra Mundial.

Um estudo recente de uma associação judia concluiu que muitos jovens norte-americanos não sabem o que foi o Holocausto. Fica surpreendido com esses resultados?

Completamente. O cenário em França e na Europa é muito diferente. A nossa cultura ficou muito marcada pelo Holocausto, com imensos livros e filmes, alguns integrados nos programas escolares. Claro que o conhecimento do passado, e também da Segunda Guerra Mundial, é reconfigurado a cada geração.

Em que sentido?

Com o passar do tempo surgiram mais testemunhos, foi possível ter uma noção concreta do que aconteceu. Além disso, cada tempo tem a sua ideologia, a sua conjuntura, o que influencia a maneira como vemos o passado e determina o que valorizamos. Ninguém faz nada, hoje em dia, ao nível da criação e do pensamento, sobretudo na Europa, sem ter o Holocausto no horizonte, mesmo que isso seja inconsciente.

No seu livro chega a falar numa falsa consciência.

É um tema central. A negação ou o falso conhecimento. De que forma esta se manifesta em nós, enquanto indivíduos e coletivo, a ignorância de alguma coisa que devíamos saber ou ter sabido? O que sabiam os franceses, durante a ocupação, sobre as deportações para os campos de concentração? Esta pergunta determina todas as outras. Quando não enfrentada, pode levar a uma falsa consciência.

E tornar-se um tema esquecido?

Não diria esquecido, porque é assunto muito estudado. Mas escrever livros ou ensaios sobre este assunto, ou outro, nunca tem nada de neutro. Imagino que não se escreva da mesma forma em Portugal desde a crise económica, que foi muito mais dura do que noutros países europeus. Certamente que os leitores criaram uma nova relação com os livros, mudando talvez os seus interesses e a perceção que tinham do país e da atualidade. Eu próprio, ao escrever este livro, não fui indiferente ao tempo em que estamos a viver.

Vê paralelismos entre a atualidade e a Segunda Guerra Mundial?

Vejo este meu interesse pela Segunda Guerra Mundial como um sintoma do nosso tempo, das nossas preocupações, mas não cheguei a conclusões. Em cada época, o futuro é incerto, numa mais do que noutra. Hoje, ninguém sabe o que vai acontecer nos próximos dez anos. Vemos formas autoritárias a emergir por todo o lado e uma intensificação das desigualdades sociais entre continentes, Estados e classes sociais. No período que mediou as duas guerras mundiais não foi assim.

Mas ninguém foi capaz de prever o que aconteceu...

Num certo sentido, ninguém foi. Porém, quando se viam grupos armados na rua, era possível intuir o que ia acontecer: um golpe de Estado. E, ao dar-se um em Itália, era possível prever outro na Alemanha. Nada disso se vê hoje. A incerteza é maior, porque as causas que levam a determinadas consequências estão escondidas. Até algumas decisões de grande importância se tornaram invisíveis. Marcaram-me muito os comentários de Yanis Varoufakis quando era ministro das Finanças da Grécia.

Sobre a opacidade da Europa?

Mais: sobre a proibição de se tomar notas nas reuniões. “Salvar a Grécia” era uma expressão consagrada e à conta dela não se podia contestar nada. Do que lá se passou não haverá rasto. Se não podemos tomar nota ou ninguém redige tudo o que se disse numa comissão, como é norma nos parlamentos, não podemos confiar no que se diz à saída. Somos contemporâneos de instituições que tomam decisões que não podem ser escrutinadas.

Temos falado de temas atuais e históricos que também são abordados no seu livro. Por que razão os tratou ficcionalmente e não num ensaio?

No sentido mais corrente, o meu livro não é de ficção. Chamam-lhe uma “narrativa”. Não inventei personagens nem acontecimentos. Mesmo as palavras de Hitler são retiradas das memórias de quem se cruzou com ele. No entanto, acredito que a verdade tem sempre uma estrutura ficcional, de montagem e de composição.

É uma construção?

Não nesse sentido pejorativo. A ficção é intrínseca ao Saber. Os acontecimentos que descrevo, e que são anteriores ao início da Segunda Guerra Mundial, adquirem no seu conjunto um significado maior, exterior ao livro. É a montagem que cria o efeito de ficção e está profundamente ligada à busca da verdade que sempre move a literatura.

Um exemplo no livro que pode ilustrar esse efeito?

Não contar as atrocidades cometidas nos campos de concentração teve dois efeitos. O primeiro foi o de libertar-me da falsidade da testemunha: nasci depois da Segunda Guerra Mundial, não sou filho ou neto de um sobrevivente. Falar como se tivesse conhecimento direto seria indecente. Não nos podemos apropriar da dor dos outros. O segundo foi o de poder tratar o assunto de outra forma. No penúltimo capítulo cito quatro necrologias de judeus que se suicidaram. O jornalista que as assina diz que se ignoravam os motivos dos seus atos.

Uma frase feita.

E uma falsidade. Todos conheciam a perseguição aos judeus. Ao falar desses suicídios já estou a falar do Holocausto que, na verdade, começa aí. Estou a colar, em alguns casos apenas a sugerir, as causas e as consequências. Isso permite-me sublinhar que na História existem fios. Podemos seguir uns ou outros. E isso é ficção. Uma ficção que estrutura a minha relação com a verdade.

A ficção toca o coração do leitor?

Sem uma tonalidade afetiva não há literatura. Até um escritor como Flaubert, aparentemente neutro, se revela extremamente irónico nesse distanciamento. A forma como se escreve é tão importante como a investigação que se faz. Pelos tons da escrita, as personagens tornam-se verdadeiras, e o leitor sente o livro.

Como chegou à sequência inicial dos 24 empresários que se reúnem com Hitler e acabam por financiar a campanha eleitoral de 1933?

Essa sequência é um bom exemplo de como escrever indica caminhos. No início, queria mostrar o meu choque com essa colaboração tão precoce dos empresários. Escrevi-a a frio, no registo da surpresa. O bom da escrita é que te diz quando não funciona.

Como?

Começamos a ouvir um ruído desagradável, de panelas a bater ou de papel amachucado, o que significa que nos enganámos. Deitei tudo fora e recomecei. Pois, o que surpreende na vassalagem daquele poder económico é, precisamente, não ser uma surpresa. É banal e constante. Todos os patrões pactuaram e continuam a pactuar com ditaduras. E, quando há embargos, encontram vias para os contornar.

Apesar das atrocidades que cometeram, dos trabalhos forçados de que beneficiaram, das magras indemnizações que pagaram, os produtos dessas grandes empresas continuam à venda. O que podemos fazer?

Às vezes mais, outras menos. As determinações sociais, como sabemos, são muito potentes. Definem--nos. Felizmente, há quem consiga libertar-se e desobedecer à ideologia da sua classe ou do seu tempo. Quanto aos produtos, não deixa de ser curioso sermos representados por marcas. Já não somos artesanais, mas estandardizados. O mundo económico paga-nos, mas também nos vende.

A ocupação da Áustria é central no seu livro. Que significado tem na sua procura de uma verdade superior aos factos?

É o primeiro grande momento da expansão nazi. Pode ser resumida em três frases: as autoridades foram pressionadas; depois vieram os ultimatos; finalmente a Áustria foi ocupada sem resistência. Se tivermos três parágrafos, como nos manuais escolares, podemos dar o contexto. E se tivermos ainda mas espaço, conseguimos surpreender o balbuciar da História.

O balbuciar da História?

Não podemos cair em discursos grandiosos ou mitificados. A Áustria também tinha o seu ditador. A diferença é que, ao contrário de Hitler, pertencia a uma classe social elevada.
Os nazis eram uma amálgama de antigos políticos, de fervorosos prussianos e de gangsters.

Quando esse grupo tão diverso se confrontou com o Velho Mundo, aristocrata, o que aconteceu?

Os primeiros ganharam e os segundos, que fizeram frente a comunistas, sindicatos e outras organizações, cederam. O I Conde de Halifax, que liderou os negócios estrangeiros do Reino Unido, confundiu Hitler com um empregado, quando este lhe abriu a porta do carro. Calças e sapatos daqueles só podiam ser de um campónio, pensou. A sua cegueira era social.

Na ocupação da Áustria, sobressaem ainda a manipulação de líderes fracos, a diplomacia enganosa e a realidade longe dos planos megalómanos. Com as devidas diferenças, parece que estamos a comentar... o presente. Vivemos tempos estranhos?

Todas as épocas são perigosas. A maior dificuldade, hoje, talvez seja a de libertarmo-nos de um discurso único, o económico, que se tornou a cantiga moderna. Quem diria que seria a China a defender o comércio livre face aos EUA? Isso, sim, parece-me problemático.

E políticos imprevisíveis, como Trump?

É preciso desconfiar da imprevisibilidade. Hitler, por exemplo, foi muito previsível na sua ação, mas a elite, com algumas exceções, não antecipou a ameaça. Devemos temer tanto uns quanto outros. As políticas atuais são perfeitamente previsíveis, por exemplo. Em França, vota-se à direita, ao centro ou à esquerda, e o resultado é o mesmo. As variações são ridículas. É como se uma corrente mais forte passasse por cima de todas as alternativas. Tenho consciência política há pelo menos 30 anos. Desde então, só tenho visto, sob a proteção da lei, crescer a desigualdade e a autoridade. A segurança sobrepõe-se à liberdade. O que mais conta é a eficácia.

Nasceu em maio de 1968. Antecipa uma revolução?

Apenas sei que vivemos num mundo que se apresenta como definitivo. E isso não existe, como a História nos ensina. Os povos levantarem-se contra as desigualdades, isso parece-me uma inevitabilidade. Será amanhã? Daqui a dez ou a 100 anos? Não sei. Mas as revoluções surgem regularmente. Será diferente no futuro? Não vejo quem possa afirmá-lo.

As eleições não bastam para a Democracia

Thierry Meyssan*

Visto do Ocidente, acabam de se desenrolar três eleições democráticas na Tunísia, no Líbano e no Iraque. Mas para esses povos, estes escrutínios não tinham grande coisa a ver com o ideal democrático porque as instituições, que os Ocidentais lhes impuseram, foram concebidas para os impedir de escolher livremente os seus dirigentes.

A abstenção maciça aquando das eleições legislativas libanesas (50 %), iraquianas (65 %), e municipais tunisinas (77 %) foi interpretada pelos Ocidentais como a prova da imaturidade destes povos. Não interessa que disponham de Democracia há 7 ou há 75 anos, são irresponsáveis e têm, por conseguinte, de ser colocados sob tutela.

Esquecendo que no Ocidente também algumas consultas nacionais foram marcadas por taxas de abstenção similares, os Ocidentais explicam as da Tunísia, do Líbano e do Iraque pelos maus resultados económicos dos seus governos. Como se os Árabes não entendessem que podem discutir projectos e escolher o seu futuro, antes imaginando que eles deviam aprovar os resultados dos seus anteriores governantes.

Com pressa de restaurar um mandato sobre o Levante, os Ocidentais interpretaram, assim, a libertação de Saad Hariri da sua prisão saudita como uma vitória de Emmanuel Macron, o Magnífico. Não viram nem a afronta infligida pelo Príncipe-herdeiro saudita ao Presidente francês no aeroporto de Riade, nem a eficácia das iniciativas do Presidente Michel Aoun nas Nações Unidas. A seus olhos, os Libaneses não eram supostos defender-se sozinhos. Só poderiam obter resultados se enquadrados por eles.

Os média (mídia-br) ocidentais abordam as irreais instituições libanesas qualificando-as de «complicadas», mas sem explicar que o sistema comunitário foi concebido pela antiga potência colonial para que nada, jamais, mude. A França é laica em casa, mas nem um pouco mais ou menos nas suas antigas colónias. E os arranjos da lei eleitoral com a introdução da representação proporcional no seio das comunidades, não apenas mantêm a camisa-de-forças colonial como ainda tornam a malha mais apertada.

Sim, é ridículo ver a Tunísia eleger pela primeira vez os seus vereadores, o Líbano eleger, ao fim de nove anos, deputados hereditários, e o Iraque dividido em 37 partidos políticos. Mas é, precisamente, porque é ridículo que muitos eleitores recusaram vergar-se a este jogo humilhante.

Contrariamente à interpretação ocidental, estas taxas de abstenção, se indicam uma rejeição dos procedimentos democráticos, não significam em absoluto a rejeição da democracia, mas, antes a sua deturpação.

Os Tunisinos, que viram o Ennahdha e o Nidaâ Tounès aliarem-se depois de se terem guerreado, tinham todas as razões para antecipar que os dois grandes Partidos se entenderiam entre si para repartir os postos locais, como tinham feito com as funções nacionais. Os Libaneses, que sabem não ter outra escolha senão a do «senhor de guerra» da sua comunidade, e dos seus vassalos, para se defenderem de outras comunidades, rejeitaram também essa prisão. Os Iraquianos, cujo Primeiro-ministro eleito fora derrubado há quatro anos pelas potências estrangeiras, sabem que o seu voto não será tomado em conta se contrariar os desejos da auto-proclamada «comunidade internacional».

Só o Hezbolla libanês, oriundo da Resistência contra a ocupação israelita, e a Coligação (Coalizão-br) iraquiana de Moqtada al-Sadr, que emergiu da Resistência à ocupação norte-americana, conseguiram o pleno dos votos junto com seus aliados.

Que ninguém se engane, os Ocidentais implicitamente felicitam-se pela abstenção porque encontram nela a justificação para a sua agressão ao «Médio-Oriente Alargado», desde há 17 anos. Toda a expressão de uma vontade organizada dos povos é para eles um pesadelo, uma vez sendo seu único objectivo derrubar os Estados e destruir as sociedades para melhor as dominar.

Assim, quando os Sírios, em plena guerra, se precipitaram para as secções de voto para eleger o seu Presidente, os Ocidentais ficaram petrificados. Foram forçados a remeter para mais tarde o seu plano de derrube (derrubada-br) da República Árabe Síria.

Os Árabes, tal como todos os outros homens, aspiram a determinar por si mesmos o seu próprio destino.

Thierry Meyssan | Voltaire.net.org | Tradução Alva | Fonte Al-Watan (Síria)

* Intelectual francês, presidente-fundador da Rede Voltaire e da conferência Axis for Peace. As suas análises sobre política externa publicam-se na imprensa árabe, latino-americana e russa. Última obra em francês: Sous nos yeux. Du 11-Septembre à Donald Trump. Outra obras : L’Effroyable imposture: Tome 2, Manipulations et désinformations (ed. JP Bertrand, 2007). Última obra publicada em Castelhano (espanhol): La gran impostura II. Manipulación y desinformación en los medios de comunicación(Monte Ávila Editores, 2008).

Portugal | Coveiros do Interior prometem salvá-lo da desertificação


Um movimento que reúne o bloco central, cujas políticas criaram condições para a desertificação do Interior, apresenta propostas para o contrariar a António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa.

O «Movimento pelo Interior» reúne autarcas do PS e do PSD, José Silva Peneda, ex-ministro do Trabalho de Cavaco Silva e assessor do presidente da Comissão Europeia, empresários da Delta e da Visabeira e representantes de reitores e presidentes dos politécnicos.

A apresentação das propostas está agendada para esta tarde (18.05) no Museu dos Coches, em Lisboa, com a presença do primeiro-ministro e do Presidente da República.

Depois do acordo entre o PS e o PSD sobre a transferência de competências do Estado central para os municípios, o bloco central parece estar mais uma vez reunido com propostas para resolver problemas criados nas décadas em que ambos os partidos governaram o País.

Aos promotores da iniciativa associaram-se também figuras destacadas dos últimos governos, como Jorge Coelho, Pedro Lourtie (PS) ou Miguel Cadilhe (PSD).

Para além da proposta de deslocalização de serviços do Estado que actualmente estão instalados em Lisboa para regiões do Interior, noticiada esta manhã, pouco se conhece do documento, nomeadamente em matéria de apoio a sectores económicos com peso muito significativo, como para a agricultura familiar, tão fustigada pelos governos que aplicaram as imposições da União Europeia relativamente ao sector.

Também sobre a reabertura dos serviços públicos, como escolas, unidades de saúde, repartições das Finanças ou da Segurança Social, que vários executivos integrados pelos promotores deste movimento encerraram, não se conhecem propostas. Nem sobre as freguesias extintas pelo anterior governo, a regra e esquadro a partir de Lisboa, e cuja reposição continua a ser uma luta travada pelas populações locais.

Por fim, o discurso deste movimento promove uma dicotomia entre Litoral e Interior. É essa a lógica das propostas já conhecidas, pretendendo deslocalizar funcionários públicos e criar regimes fiscais privilegiados para as empresas que se fixem no Interior, sem mexer nas causas das assimetrias regionais, que também afectam largas regiões do Litoral.

No meio de tudo isto, entre movimentos e acordos (sempre com o PS e o PSD de braço dado), a discussão pública passa ao lado de um facto que devia ser incontornável: a regionalização, consagrada constitucionalmente, está por fazer – com a responsabilidade dos dois partidos, que mexeram na Constituição para a fazerem depender de uma dupla aprovação por referendo.

AbrilAbril | editorial

Foto: O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, recebeu uma delegação do «Movimento para o Interior», integrada pelos presidentes das associações de autarcas do PS e do PSD, pelo ex-ministro Silva Peneda e pelos presidentes dos conselhos de reitores e presidentes dos politécnicos, no Palácio de Belém, em Lisboa. 4 de Novembro de 2017 Créditos: António Cotrim / Agência LUSA

Portugal | Confiar na Segurança Social


Manuel Carvalho da Silva* | Jornal de Notícias | opinião

No passado dia 8, Dia da Segurança Social, a secretária de Estado Cláudia Joaquim afirmou: "À cabeça dos direitos sociais, colocaria... o direito constitucional à segurança social e solidariedade: o direito dos cidadãos à proteção na doença, na velhice, na invalidez, na sobrevivência, bem como no desemprego e em todas as outras situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para o trabalho". Mesmo que seja necessária uma prévia clarificação sobre os regimes contributivos e não contributivos e sobre as políticas de solidariedade que não se podem situar apenas na Segurança Social, aquela afirmação é muito ajustada e confirma o sistema de Segurança Social público e universal que temos, como um dos mais importantes pilares da democracia.

O sistema tem insuficiências, fragilidades e problemas para os quais é preciso encontrar respostas inovadoras. Contudo, se tivermos em conta os milhões de portugueses a quem permanentemente dá respostas, e o número muito reduzido (em termos relativos) de cidadãos que têm de se queixar por desconfiança ou objetiva constatação de erros, teremos de concluir que, no plano do relacionamento com as pessoas, o sistema é de confiança. Sabemos bem que isso não chega para que mereça confiança plena dos portugueses. O sistema precisa que a sociedade esteja sensibilizada para precaver riscos ao longo da vida e para consolidar valores de solidariedade, nomeadamente entre gerações. O sistema tem de se apresentar viável, de cuidar sempre do seu financiamento, de assegurar a recolha das receitas que lhe pertencem, de transmitir segurança, de ser fiável para as pessoas quando elas projetam os seus planos de vida.

O Governo atual, com forte contributo das forças políticas de Esquerda que o apoiam, abandonou a política de cortes nas pensões e prestações sociais. E a equipa ministerial desta área tem feito valorização do sistema e ajudado na adoção de novas políticas de reparação de injustiças. Mas o lastro que vem detrás - em particular em resultado da ação do anterior Governo - é pesado e há grandes engulhos a serem gerados pelas dinâmicas neoliberais que varrem este tempo que vivemos.

É preciso um travão mais forte às contínuas campanhas de desvalorização do sistema, hoje debaixo de enorme pressão vinda de duas vias. Uma, a ação estratégica do setor financeiro que tudo fará para fazer colapsar o sistema público e se alcandora a ser "o dono disto tudo", apesar de ser evidente que as suas propostas são bem menos seguras que as do sistema público e os seus produtos poupança/reforma jamais seriam acessíveis aos mais vulneráveis, parte significativa da nossa população. A outra, os desafios resultantes das complexas questões demográficas (realce para o aumento da esperança de vida conjugado com os efeitos da emigração de centenas de milhares de jovens), das precariedades, dos baixos salários e qualidade do emprego, de novos riscos que resultam de opções erradas em outras políticas sociais ou da alteração de condições de prestação do trabalho, do modelo de regulação económica e, ainda, da urgência de maior capacitação dos trabalhadores e da gestão do sistema.

O rigor e a exigência não podem ser uma abstração para o comum das pessoas: eles precisam de se concretizar na qualidade dos direitos e na sua prestação eficaz e atempada. Por outro lado, a justa preocupação de proteger mais quem mais precisa tem de ser acompanhada pela atualização das pensões de todos, tendo em conta as suas contribuições e o objetivo de mobilização geral da sociedade.

A mobilização far-se-á construindo redes em que participem associações de reformados e pensionistas, sindicatos e empresas, equipas de investigação, a academia em geral e outras entidades, para produzir e afirmar propostas que municiem e qualifiquem o debate político e as políticas públicas. Nessa tarefa pode convergir a ação de organizações da economia social e solidária, evitando também o seu aprisionamento pelo setor financeiro. Entretanto, é imperiosa a qualificação e mobilização dos trabalhadores e dirigentes do sistema, muitos deles com conhecimentos e capacidades imprescindíveis para a sua defesa.

*Investigador e professor universitário

Sporting | Pacto de Sangue? Ao estilo da máfia?



Mário Motta, Lisboa

Há termos que ao serem usados por “notáveis” têm um peso incomum que pode desvirtuar as eventuais boas intenções de quem os usa. No caso de políticos pode ser confundido com termos usados em organizações nada respeitáveis e prejudiciais aos países, aos cidadãos.

Pacto de sangue confunde-se com a máfia, o que leva detratores (ou não) a apontar para “notáveis políticos” como mafiosos. A sorrirem e a propalarem opiniões que em nada são abonatórias desses políticos. Há mesmo os que aproveitam e comentam que “eles são mesmo uma máfia”. Sob o pretexto da “carta aberta” ao jogadores do Sporting – notícia mais em baixo – o termo usado, “pacto de sangue”, já é alvo de chacota, de ditos veiculados popularmente e de más interpretações que levam a dizerem que “eles são mesmo uma máfia e já nem se preocupam em ocultar”. Por favor, não se ponham tão a jeito. Não é bonito. Se desajustado, ou não, serão eles que o sabem melhor que ninguém.

Portugal foi invadido por algo estranhamente muito pernicioso para o país: o “caso Sporting”. Curiosamente, em outras invasões de centros de estágio (do Guimarães, dos árbitros) nunca correu tanta tinta nos jornais, nem tantas vozes no éter, nem tantas imagens nas televisões. Estamos perante uma gigantesca manipulação de mentes.

Que o caso ocorrido no centro de estágio em Alcochete foi grave (como outros) é facto, mas daí a ser tão empolado não deixa de ser estranho. Assim como não deixa de desviar as atenções dos portugueses para o que se passa no país da vida real no que se refere ao que realmente mais interessa para a melhoria de condições de vida dos cidadãos, para a aniquilação do enorme fosso entre ricos e pobres ou “remediados”. Na injustiça entre o que recebem os gestores e aqueles que realmente produzem riqueza, os trabalhadores. E mais, e mais, e mais… Tanto.

Pacto de sangue? Isso não é algo ao estilo da máfia? (MM)
  
"Notáveis" do Sporting pedem pacto de sangue em carta aberta ao plantel

Santana Lopes, Paulo Portas, Jorge Coelho e Pires de Lima são alguns dos mais de 30 signatários de uma carta aberta aos futebolistas do Sporting.

"A nossa história precisa e merece o vosso contributo e responsabilidade. Dentro, mas também fora das quatro linhas. O futuro desta grande instituição centenária não está nos vossos pés, está nas vossas e nas nossas mãos. Juntas, unidas e coesas. Ajudem-nos a ajudar-vos para iniciarmos, juntos, um novo ciclo, um novo caminho de sucesso para que possamos construir um novo futuro para o Sporting", lê-se na carta, a que a Lusa teve acesso este sábado.

Estes "notáveis" pedem aos jogadores que "não virem as costas ao clube" e "demonstrem uma vez mais que têm o "Sporting no sangue", na sequência de "vários e sucessivos acontecimentos de enorme gravidade", que os deixaram "profundamente chocados".

"Sabemos que viveram um momento único e talvez o mais difícil das vossas vidas, certamente extensível a todos quantos vos são queridos, e que este é um momento ingrato, injusto e muito doloroso. É por isso que estamos aqui, solidários com todos vocês mas também empenhados em agir de imediato, deixando uma mensagem de confiança no futuro", prossegue a missiva.

Considerando a existência de "um presente triste e negro", apontam ao futuro, evocando os "sócios, adeptos e simpatizantes espalhados pelo mundo, dos mais humildes aos mais bem posicionados", com "Sporting no sangue", que "tudo farão para salvar o Sporting Clube de Portugal desta situação".

Nesse sentido, deixam um apelo ao coração, à responsabilidade, ao reconhecimento e respeito pelos sportinguistas: "Uma família que nunca vos deixou nem nunca vos deixará sozinhos. O Clube que representam, e o leão que trazem ao peito, precisa hoje, mais do que nunca, de todos".

"Não virem as costas ao nosso clube. Demonstrem uma vez mais que têm o "Sporting no sangue". Porque este é um sangue de força, de energia, de rejuvenescimento, de vontade de ganhar. É um sangue de valores éticos, morais e sociais que voltarão a fazer do Sporting o grande Sporting Clube de Portugal", remata a carta assinada por antigos governantes como António Pires de Lima, Bernardo Trindade, Carmona Rodrigues, José Vera Jardim, Nuno Fernandes Thomaz, Paulo Núncio, Paulo Portas e Pedro Santana Lopes, um dos dois antigos presidentes do clube signatários, juntamente com Filipe Soares Franco.

Na terça-feira, antes do primeiro treino para a final da Taça de Portugal, a equipa de futebol do Sporting foi atacada na academia do clube, em Alcochete, por um grupo de cerca de 50 alegados adeptos encapuzados, que agrediram técnicos e jogadores. A GNR deteve 23 dos atacantes.

Paralelamente, a Polícia Judiciária deteve na quarta-feira quatro pessoas na sequência de denúncias de alegada corrupção em jogos de andebol, incluindo o diretor desportivo do futebol, André Geraldes, que foi libertado sob caução e impedido de exercer funções desportivas.

O cenário agravou-se com as demissões na quinta-feira da Mesa da Assembleia Geral, em bloco, da maioria dos membros do Conselho Fiscal e Disciplinar, instando o presidente do Sporting a seguir o seu exemplo, mas Bruno de Carvalho anunciou que se irá manter no cargo, apesar das seis demissões no Conselho Diretivo.

Jornal de Notícias | Foto: Miguel A. Lopes/Lusa

Sporting | O diabo que escolha entre Sobrinho, Ricciardi e outros “notáveis”


Do Expresso em pesquisa dos mundos e fundos sobre Álvaro Sobrinho retirámos alguns apontamentos que convidamos a lerem se acaso estão interessados em quem é este “notável” que faz de Bruno Carvalho gato-sapato quando na realidade não parece que mereça a credibilidade que agora, contra Bruno, a comunicação social usa como arma de arremesso. Há ainda Ricciardi (banqueiro) e outros mais que para os portugueses atentos estão repletos de falta de credibilidade e que são os que mais são usados pelos jornais, rádios e televisões em Portugal neste “caso do Sporting”. O que se passa? Como acreditar em comunicação social desonesta, em jornalistas mentirosos e/ou manipuladores, em senhores de milhões que popularmente são denominados vigaristas, em políticos que para os portugueses estão manchados em opacidades?

É facto que Bruno Carvalho espalhou-se ao comprido ao não saber conduzir o processo com que pretendia “limpar” o desporto, que usa verve desaconselhável ao não querer ser hipócrita, que tem defeitos como qualquer mortal, mas não se pode dizer que Bruno enferma dos casos escabrosos que têm vindo a público acerca de Sobrinho ou de Ricciardi e outros “notáveis” dos cambalachos BES, BESA e similares. Bruno tem essa vantagem sobre eles e vergonha é o que não falta a esses tais “sobrinhos” e “companheiros” em que a comunicação social chafurda à falta da posse de argumentos transparentes para “deitar ainda mais a baixo” o presidente do Sporting. Jornalistas desonestos e maus profissionais, assim como interesses escabrosos estão a revelar-se neste “caso Sporting”. É lamentável o mau caminho por que certos e incertos da comunicação social enveredaram. E se assim está à vista neste caso ficamos a saber que em outros o método será semelhante. Já não dá para acreditar neles, nesses ditos “jornalistas”, como não dá para acreditar nos políticos. Muito menos em Sobrinho, Ricciardi e quejandos que por aí aparecem em bicos dos pés em autopromoções espúrias, doentias, dignas de esgoto.

O tempo e as ações futuras que acontecerem talvez nos permitam perceber melhor este caso Bruno Carvalho/Sporting/Políticos/Outros “Notáveis”. E ainda outros que representam cambalachos e opacidades de madraços de bancos e de dinheiros (milhões) que são por natureza sujos quando certos e incertos lhes põem as mãos.

Bruno pode não ser “santo” como quer mostrar-nos, mas entre Bruno e esses tais “notáveis” venha o diabo e escolha.

Não é compreensível que entretanto cidadãos notáveis (ou não) que temos por honestos se imiscuam nesta grande “caldeirada” com insistência, emprestando credibilidade a autênticos vigaristas da política, da banca e dos milhões. (MM | PG)

Fortuna, Família e Futebol: o que queremos saber de Álvaro Sobrinho

No dia em que revela os contornos de um esquema suspeito de retirar centenas de milhões de euros do BES em Angola, o Expresso explica quem é Álvaro Sobrinho. E responde às perguntas mais procuradas sobre ele

Há um truque fácil para ter uma indicação do que as pessoas mais querem sabem sobre uma personalidade: escrever o seu nome no Google e esperar uns segundos. Porque logo o Google sugere pesquisas associadas, que decorrem de muitas outras pessoas fazerem, precisamente, aquelas associações nas suas pesquisas. Digitando “Álvaro Sobrinho” no Google, percebe-se entre as pesquisas mais comuns sobre este antigo presidente executivo do Banco Espírito Santo Angola estão as que sugerem que os utilizadores querem saber a sua relação com o Sporting, quem é a sua família e… qual é a sua fortuna.

As três perguntas têm pontos de resposta na edição deste sábado do Expresso, na versão digital ou nas bancas. O semanário faz manchete do primeiro caderno com a notícia “Tudo sobre o esquema que tirou 615 milhões de euros do BES em Angola”, num longo trabalho de investigação, e capa da revista E com um perfil do gestor que revela a sua evolução profissional e ligações familiares em Angola. O título da capa da revista E é, precisamente, “O milagre da multiplicação, ou como enriqueceu Álvaro Sobrinho”.

Álvaro Sobrinho só começou a trabalhar com 28 anos, mas aos 39 foi convidado para presidente executivo de um banco português em Luanda e em pouco tempo, aos 50, quando foi forçado a sair do BESA, já era multimilionário.

Documentos obtidos pela “Der Spiegel”, que foram partilhados com o consórcio de jornalistas de investigação EIC, de que o Expresso faz parte, ajudam a explicar como. Eles expõem os métodos que Álvaro Sobrinho delineou para alegadamente desviar dinheiro do BESA, incluindo 277 milhões de depósitos de dinheiro vivo numa só conta.

Recorde-se que, em 2014, o Expresso revelou um “buraco” de 5,7 mil milhões de dólares no BESA, que haveria de ser uma das razões essenciais para a queda do Grupo Espírito Santo e do banco que controlava, o BES. Em Portugal, o homem da família Madaleno, e que detém na sua carteira de participações quase 30% da SAD do Sporting, está a ser investigado judicialmente. A polémica não reside apenas no nosso país. Esta sexta feira, soube-se também que as ligações entre o empresário luso-angolano e a presidente das Maurícias estão na mira da oposição do país, depois de a imprensa local denunciar gastos com cartão de crédito de associação de Sobrinho.

Para saber mais sobre Álvaro Sobrinho, ou mais sobre as pesquisas mais repetidas no Google sobre ele, procure as respostas:

No Expresso tem AQUI muito para ler e ainda mais para pesquisar

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