Manuel Carvalho da Silva* | Jornal
de Notícias | opinião
No passado dia 8, Dia da
Segurança Social, a secretária de Estado Cláudia Joaquim afirmou: "À
cabeça dos direitos sociais, colocaria... o direito constitucional à segurança
social e solidariedade: o direito dos cidadãos à proteção na doença, na velhice,
na invalidez, na sobrevivência, bem como no desemprego e em todas as outras
situações de falta ou diminuição de meios de subsistência ou de capacidade para
o trabalho". Mesmo que seja necessária uma prévia clarificação sobre os
regimes contributivos e não contributivos e sobre as políticas de solidariedade
que não se podem situar apenas na Segurança Social, aquela afirmação é muito
ajustada e confirma o sistema de Segurança Social público e universal que
temos, como um dos mais importantes pilares da democracia.
O sistema tem insuficiências,
fragilidades e problemas para os quais é preciso encontrar respostas
inovadoras. Contudo, se tivermos em conta os milhões de portugueses a quem
permanentemente dá respostas, e o número muito reduzido (em termos relativos) de
cidadãos que têm de se queixar por desconfiança ou objetiva constatação de
erros, teremos de concluir que, no plano do relacionamento com as pessoas, o
sistema é de confiança. Sabemos bem que isso não chega para que mereça
confiança plena dos portugueses. O sistema precisa que a sociedade esteja
sensibilizada para precaver riscos ao longo da vida e para consolidar valores
de solidariedade, nomeadamente entre gerações. O sistema tem de se apresentar
viável, de cuidar sempre do seu financiamento, de assegurar a recolha das
receitas que lhe pertencem, de transmitir segurança, de ser fiável para as
pessoas quando elas projetam os seus planos de vida.
O Governo atual, com forte
contributo das forças políticas de Esquerda que o apoiam, abandonou a política
de cortes nas pensões e prestações sociais. E a equipa ministerial desta área
tem feito valorização do sistema e ajudado na adoção de novas políticas de
reparação de injustiças. Mas o lastro que vem detrás - em particular em
resultado da ação do anterior Governo - é pesado e há grandes engulhos a serem
gerados pelas dinâmicas neoliberais que varrem este tempo que vivemos.
É preciso um travão mais forte às
contínuas campanhas de desvalorização do sistema, hoje debaixo de enorme
pressão vinda de duas vias. Uma, a ação estratégica do setor financeiro que
tudo fará para fazer colapsar o sistema público e se alcandora a ser "o
dono disto tudo", apesar de ser evidente que as suas propostas são bem
menos seguras que as do sistema público e os seus produtos poupança/reforma
jamais seriam acessíveis aos mais vulneráveis, parte significativa da nossa
população. A outra, os desafios resultantes das complexas questões demográficas
(realce para o aumento da esperança de vida conjugado com os efeitos da
emigração de centenas de milhares de jovens), das precariedades, dos baixos
salários e qualidade do emprego, de novos riscos que resultam de opções erradas
em outras políticas sociais ou da alteração de condições de prestação do
trabalho, do modelo de regulação económica e, ainda, da urgência de maior
capacitação dos trabalhadores e da gestão do sistema.
O rigor e a exigência não podem
ser uma abstração para o comum das pessoas: eles precisam de se concretizar na
qualidade dos direitos e na sua prestação eficaz e atempada. Por outro lado, a
justa preocupação de proteger mais quem mais precisa tem de ser acompanhada
pela atualização das pensões de todos, tendo em conta as suas contribuições e o
objetivo de mobilização geral da sociedade.
A mobilização far-se-á
construindo redes em que participem associações de reformados e pensionistas,
sindicatos e empresas, equipas de investigação, a academia em geral e outras
entidades, para produzir e afirmar propostas que municiem e qualifiquem o
debate político e as políticas públicas. Nessa tarefa pode convergir a ação de
organizações da economia social e solidária, evitando também o seu
aprisionamento pelo setor financeiro. Entretanto, é imperiosa a qualificação e
mobilização dos trabalhadores e dirigentes do sistema, muitos deles com conhecimentos
e capacidades imprescindíveis para a sua defesa.
*Investigador e professor
universitário
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