sábado, 1 de setembro de 2018

Itália | Salvini admite ter usado migrantes para chantagear UE


Declaração veio após Ministro do Interior descobrir que é investigado por sequestro de pessoas

O ministro do Interior da Itália, Matteo Salvini, admitiu nesta quinta-feira (30/08) que usou 177 migrantes resgatados no Mediterrâneo para "chantagear" a União Europeia.

A declaração foi dada após o secretário da ultranacionalista Liga ter descoberto que é investigado por outros crimes além de sequestro de pessoas, abuso de poder e prisão ilegal no caso do navio Diciotti, da Guarda Costeira italiana, que ficou bloqueado por cinco dias no Porto de Catânia.

"Percebo que existe um novo crime, a chantagem à União Europeia, não sabia que existia. Estão modificando o código penal. Bem, então reivindico a chantagem à União Europeia", afirmou Salvini, durante uma visita a Veneza. O ministro ainda acrescentou que as suspeitas contra ele são "medalhas".

O Ministério Público de Agrigento abriu um inquérito contra Salvini por sequestro de pessoas, abuso de poder e prisão ilegal, mas, segundo jornais italianos, os procuradores apuram também as hipóteses de "sequestro de pessoas com fim de coação" e "omissão de ato de ofício".

O próprio ministro disse em várias ocasiões que não liberaria os migrantes do Diciotti enquanto a União Europeia não chegasse a um acordo para redistribui-los entre seus Estados-membros. Além disso, ele teria ignorado pedidos da Guarda Costeira para definir um "porto seguro" para o desembarque do navio, indicando Catânia apenas como "escala técnica".

"Arrisco 30 anos na cadeia por ter defendido o direito à segurança dos italianos? Sorrio, trabalho ainda mais e sigo em frente", declarou o secretário da Liga no Twitter. Os menores de idade resgatados pelo Diciotti puderam descer do navio sem pré-condições, mas os adultos só saíram após a Igreja Católica, a Albânia e a Irlanda terem se comprometido a recebê-los.

Também vice-primeiro-ministro, Salvini é o artífice do endurecimento das políticas migratórias da Itália e fechou os portos do país para navios de ONGs que operam no Mediterrâneo. Seu objetivo é impedir a chegada de migrantes pelo mar e forçar a União Europeia a dividir o peso do primeiro acolhimento daqueles que conseguirem concluir a travessia. 


Foto: YouTube/Reprodução

EUA suspendem apoio financeiro a palestinos


Governo americano alega falta de reformas e corta todos os recursos que repassa à Agência da ONU de Assistência aos Refugiados Palestinos; decisão pode afetar serviços oferecidos a milhões de pessoas

O Departamento de Estado dos Estados Unidos anunciou nesta sexta-feira (31/08) que decidiu cortar todos os recursos que repassa à Agência da ONU de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA), o que impactará os serviços oferecidos a milhões de pessoas.

"Os EUA já não dedicarão mais fundos para a operação irremediavelmente defeituosa", afirmou, em comunicado, a porta-voz do Departamento de Estado americano, Heather Nauert.

A porta-voz disse que o governo "analisou minuciosamente o tema e determinou que os EUA não farão contribuições adicionais à UNRWA", embora tenha afirmado que o país está "profundamente preocupado" com o impacto que a medida terá sobre "os palestinos inocentes, especialmente os estudantes".

Os EUA eram o maior doador da UNRWA, cujo financiamento é feito de forma quase exclusiva de contribuições voluntárias dos Estados membros das Nações Unidas. Em janeiro, o governo do presidente americano, Donald Trump, já havia congelado 65 milhões dos 125 milhões de dólares que deveria repassar à agência, alegando a necessidade de reformas, mas sem especificá-las.

Heather destacou que o governo Trump vinha questionando o sistema de financiamento da UNRWA ao considerar que Washington assumia um "peso desproporcional" e, ao não ter visto mudanças "suficientes" em seu funcionamento, decidiu cancelar suas contribuições.

A UNRWA oferece serviços sociais, de saúde e educação a cerca de 5 milhões de refugiados palestinos na Jordânia, Líbano, Síria, Cisjordânia e na Faixa de Gaza. A maioria deles são descendentes de pessoas que fugiram na guerra de 1948, que levou à criação do Estado de Israel.

Um porta-voz do presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP), Mahmoud Abbas, afirmou que a decisão americana é um "ataque flagrante" contra os palestinos e as decisões da ONU. "Tal punição não mudará o fato de que os Estados Unidos não têm mais um papel na região e não fazem parte da solução", destacou Nabil Abu Rdainah.

Os EUA fornecem tradicionalmente cerca de um terço do orçamento da UNRWA, que em 2017 chegou a 1,1 bilhão de dólares, um número que contrasta com os quase 4 bilhões de dólares em ajuda militar anual que Washington proporciona a Israel. Em 2016, os Estados Unidos doaram 355 milhões de dólares à agência.

A UNRWA enfrenta uma crise de caixa desde que o corte feito pelos EUA em janeiro. Antes do anúncio do governo Trump, o ministro alemão do Exterior, Heiko Maas, afirmou nesta sexta-feira que a Alemanha aumentará suas contribuições à agência e disse que a perda desta organização pode desencadear uma reação em cadeia incontrolável.

A relação entre o governo Trump e as autoridades palestinas se deteriorou desde que o presidente americano reconheceu Jerusalém como capital de Israel, em dezembro do ano passado, já que a cidade é reivindicada pela Palestina como sede administrativa e religiosa do seu futuro Estado.

As negociações de paz entre Israel e palestinos entraram em colapso em 2014, em parte devido aos assentamentos israelenses construídos em territórios palestinos ocupados e à oposição israelense a uma tentativa de união entre os movimentos palestinos Fatah e Hamas.

CN/efe/rtr/afp | Deutsche Welle | em Opera Mundi

Aprovação de Trump atinge pior índice


Pesquisa aponta que seis em cada dez americanos desaprovam o desempenho do presidente dos EUA; maioria apoia investigação sobre interferência russa e acredita que republicano tentou interferir na Justiça

O índice de aprovação do presidente americano, Donald Trump, atingiu seu menor nível percentual. A desaprovação de seu desempenho como chefe de Estado é de 60%, de acordo com uma pesquisa do conglomerado midiático ABC/Washington Post divulgada nesta sexta-feira (31/08).

As estatísticas incluem que 53% dos entrevistados disseram desaprovar de forma veemente a atuação de Trump na Casa Branca. A taxa de aprovação do presidente foi de 36% – a mais baixa em pesquisas desde que ele tomou posse, em janeiro de 2017.

A sondagem anterior, realizada em abril, havia contabilizado o resultado de 56% de desaprovação e 40% de aprovação entre os americanos entrevistados.

A pesquisa mostrou ainda que uma grande maioria, 63% dos americanos, apoia a investigação sobre a suposta interferência russa nas eleições presidenciais de 2016 – 52% afirmaram que a apoiam de forma veemente. Além disso, 64% dos entrevistados opinaram que Trump não deve demitir o procurador-geral Jeff Sessions, cujo futuro no governo está sob ameaça.

Com o início das campanhas para as eleições legislativas, a pesquisa constatou que uma maioria da opinião pública se voltou contra Trump e desaprova seus esforços para influenciar o Departamento de Justiça e a ampla investigação sobre a ingerência russa conduzida pelo procurador especial Robert Mueller – 53% disseram acreditar que Trump tentou interferir nesse inquérito.

Quase metade dos americanos (49%) afirmou que o Congresso dos Estados Unidos deveria iniciar um processo de impeachment contra o presidente, enquanto 46% se mostraram contrários.

Em meio a medidas controversas no campo do comércio internacional, 45% dos americanos aprovam a forma de Trump de lidar com a economia americana, e 47% desaprovam.

A pesquisa mostrou uma divergência significativa de opinião entre democratas e republicanos, com estatísticas percentuais de cada classe política. Dos entrevistados, 33% se declararam democratas, e 25% se disseram republicanos. Os independentes formaram 37% dos questionados, enquanto 3% assinalaram "outros" e 3% não opinaram.

A sondagem foi realizada por telefone com 1.003 adultos entre 26 e 29 de agosto. Na semana anterior, Paul Manafort, ex-diretor da campanha de Trump, foi condenado por fraude fiscal e bancária, e Michael Cohen, ex-advogado do presidente, declarou-se culpado e implicou Trump em pagamentos ilícitos para silenciar acusações de supostos encontros sexuais com mulheres.

Opera Mundi com Deutsche Welle

Foto: picture-alliance/dpa/E. Vucc

John McCain: de falso herói a criminoso de guerras em série



Os elogios fúnebres ao falecido senador norte-americano John McCain (incluindo um surpreendente elogio do governo vietnamita) prosseguem na morte o que já fora feito em vida: a mitificação de um “herói” que nada teve de heróico, e a glorificação de belicista insaciável, pessoalmente associado a todos os crimes e agressões imperialistas do seu tempo.

Deixei metade da minha vida nas minhas terras persas, e quando aterrei nesta península de acolhimento, cativante plataforma de reclamação de pão e paz para todos, pus-me a exercer o desconcertante ofício de exilado: conhecer, aprender, admirar, transmitir, revelar e denunciar, estas últimas aproveitando as aulas da Universidade, os meios de comunicação e uma dezena de livros como ‘Rubaiyat de Omar Khayyam’ (DVD edições, 2004), ‘Curdistão, o país inexistente’ (Flor del viento, 2005), ‘Iraque, Afeganistão e Irão, 40 respostas ao conflito do Próximo Oriente’ (Lengua de Trapo, 2007) e ‘O Islão sem véu’ (Bronce, 2009).

“John McCain era um herói estado-unidense, um homem de decência e honra e um amigo meu”. Assim homenageou o senador republicano o suposto “socialista” do Partido Democrata Bernie Sanders, revelando que os estado-unidenses e o mundo inteiro têm um sério problema se até a ala esquerda do Partido Democrata é tão belicista e embusteira como a ala de extrema-direita do Partido Republicano. Na realidade, a maioria das guerras dos EUA contra outras nações foram lançadas por presidentes democratas, quando os republicanos eram “isolacionistas”. O que compartilham é a ideia de que “Deus salve América” e que o resto da humanidade não são mais que Untermensch «sub-humanos» e danos colaterais dos infames interesses das elites governantes.

O sentimentalismo reaccionário pela sua morte que invadiu a imprensa impede que se reconheça McCain como um dos políticos mais sinistros das últimas décadas nos EUA, e isso diz muito dele num país com o culto da guerra, cujos presidentes são valorizados pelo número das suas agressões militares contra outras nações.

Em 1973 outorgaram a John McCain o título de “herói” quando foi entregue aos EUA pelo Vietnam numa troca de prisioneiros. Tinha sido capturado em 1967 quando o seu avião de combate, depois de realizar 23 missões de bombardeamento, foi derrubado pelo exército vietnamita, caindo no lago Truc Bach em Hanói. Foi resgatado pelo senhor On, um guarda de segurança de uma fábrica de lâmpadas [que McCain vinha bombardear]. As mesmas pessoas cujas vidas destroçou sob as suas bombas cuidaram das suas feridas e devolveram-no são e forte ao seu país.

Durante a guerra, os EUA lançaram sete milhões de toneladas de bombas, 100 000 toneladas de substâncias químicas, como o agente laranja, matando cinco milhões de vietnamitas e deixando com graves sequelas outros 3 com os efeitos do napalm. Os heróis eram pessoas como On, não um impiedoso individuo que se converterá com honras em candidato à presidência dos EUA.

O falso herói

Se a superpotência foi derrotada por aquela pequena grande nação ¿que acto heróico tinham realizado militares como McCain? Se ir matar gente desconhecida com o risco de perder a vida é heroísmo, mais heróis foram Hitler ou Gengis Kan pela quantidade de cadáveres que deixaram no seu trajecto. Mas John não era um qualquer militar, mas o filho do almirante no comando da Frota do Pacífico, John S. McCain, e para maior constrangimento tinha sido apanhado a cooperar com o inimigo vietnamita, desonrando a saga heróica: segundo o jornalista estado-unidense Douglas Valentine, três dias depois da sua captura, para além de “cantar” informações, passou segredos militares sensíveis às milícias sob o comando de Ho Chi Minh. Em 4 de Junho de 1969, um telegrama militar concluía que “Songbird is Pilot Son of Admiral” (“o pássaro cantante é o filho piloto do Almirante”), segundo o diário digital Counterpunch em 2008. Como resultado os EUA tiveram que suspender alguns bombardeamentos. Talvez isto tenha sido a única coisa positiva que este personagem fez em toda a sua vida. O redactor do New York Times, galardoado com um Pulitzer, Sydney Schanberg afirmava que John McCain e também John Kerry fizeram todo o possível para bloquear qualquer investigação dos arquivos do Pentágono sobre os prisioneiros de guerra no Vietnam.

O vilão de seis guerras

Passou de militar a político, para a partir do Congresso e depois do Senado atacar os sectores mais pobres do seu país e também o resto do mundo, utilizando as suas medalhas de “herói de guerra”.
Enquanto recebia os melhores cuidados para o cancro de que padecia, lutou contra a Lei de Cuidados de Saúde Acessíveis (Obamacare), privando 22 milhões dos seus compatriotas de acesso a cuidados sanitários mínimos, e encabeçou a campanha a favor das sanções económicas contra a Síria, que incluíam a retenção do fornecimento de medicamentos básicos para a população. As guerras que apoiou mataram centenas de milhares de pessoas e feriram milhões, que não puderam sequer receber um analgésico.

Manipulou os que lhe davam ouvidos com um discurso contra as torturas: opunha-se a essas brutalidades, dizia, se fosse a CIA a realizá-las, mas não se fosse o exército. Em 2009 Obama aceitou a proposta de McCain e recusou a reivindicação de que fossem processados os agentes da CIA implicados no escândalo das torturas (como as de Abu Ghraib e Guantánamo), por terem sido realizadas de acordo com as leis do regime de Bush; tratava-se do afogamento (waterboarding), do “muro” (golpes repetidos contra as paredes), privação de sono, nudez e encerramento em ataúde durante horas, etc. Todos sabiam que um preso torturado proporciona informação falsa para deixar de sofrer mesmo que por uns instantes, pelo que o objectivo das torturas era simplesmente pedagogia do terror por parte de uns sádicos: por isso exibem Guantánamo, e o mantêm aberto.

McCain, em defesa dos interesses da indústria militar que o seu estado natal, Arizona, alberga - como Boeing, Raytheon, Lockheed Martin ou General Dynamics -, fez a apologia da guerra tanto quanto pôde, e participou activamente em desestabilizar Líbano, Granada, Panamá, Nicarágua, Iraque, Somália, Bósnia, Kosovo, Afeganistão, Líbia, Síria, e Irão.

Alguns dos seus crimes de guerra

Em África: Sob o pretexto da “guerra contra o terror” propôs enviar tropas para o Mali, Sudão (onde a sua esposa Cindy teve importantes negócios), derramou lágrimas de crocodilo pelas “meninas sequestradas da Nigéria” até o governo deste país se submeter à chantagem “humanitária” e autorizar uma base militar dos EUA.

Jugoslávia: A sua insistência em atacar um país europeu pela “questão do Kosovo” levantou tanta suspeita que o Washington Post, a 7 de Abril de 1999, a vinculou às suas aspirações presidenciais. Apoiou os “jihadistas” do Exército de Libertação do Kosovo, “estado” que hoje alberga a segunda maior base dos EUA no mundo. Desmantelaram o último governo socialista da Europa.

Afeganistão: McCain, que seguramente sabia quem e o quê estava realmente por detrás do 11S, apoiou o bombardeamento, a invasão e a ocupação do país mais estratégico do mundo, que deixou milhões de mortos, mutilados e refugiados.

Iraque: Sabendo que Saddam Hussein não dispunha de armas de destruição massiva, conspirou, mais ainda que Bush, contra um dos países árabes mais desenvolvidos.

Encabeçou uma campanha a favor das criminosas sanções contra esta nação enquanto incitava a mais bombardeamentos das infra-estruturas do país em 1991 e em 2003, que deixaram cerca de 5 milhões de mortos e mutilados, e 14 milhões de deslocados e refugiados. Apesar de os soldados estado-unidenses também estarem caindo aos milhares, pediu a Bush o envio de mais tropas para o Iraque: 300.000 soldados e dezenas de milhares de contratados pareciam-lhe pouco. A imprensa chamou “Doutrina McCain” à política de aumentar as tropas no Iraque.

Líbia: Em 14 de Agosto de 2009, McCain reuniu-se com Kadhafi em Trípoli para lhe vender armas. Depois da reunião afirmou ter passado “uma tarde interessante com um homem interessante“. Dois anos depois, pediu a sua eliminação do poder, porque tinha “sangue estado-unidense nas mãos“: não é que não se tivesse recordado que o atentado de Lockerbie sucedera em 1988, mas sim que via maiores lucros para as empresas armamentísticas numa grande guerra. Em Abril de 2011 entrou ilegalmente na Líbia para se reunir com os veteranos “jihadistas”, organização internacional de mercenários fundada pela CIA. Propôs a Obama uma invasão terrestre do país e reconhecer um governo no exilio, composto pelos mesmos terroristas que mataram tanto Kadhafi como o próprio embaixador dos EUA, Christopher Stevens. Obama rejeitou: um país em guerra é um negócio mais rentável.

Ucrânia: com o objectivo de provocar tensão com a Rússia e sabotar qualquer política de “coexistência pacífica” com este país – o único com capacidade militar para enfrentar os EUA -, McCain participou na elaboração do golpe de estado de Fevereiro de 2014, organizado pelos neonazis, que derivou na guerra que destruiu a vida de milhões de ucranianos. Nesta linha, foi um firme defensor da integração da Geórgia e Ucrânia na NATO, apesar da reticência dos generais mais belicistas.

Síria: McCain foi o impulsionador da “retirada de Assad do poder”, desintegrar a Síria, desmantelar o terceiro estado árabe e, de caminho, servir os interesses de Israel.

Fonte: https://blogs.publico.es/puntoyseguido/5152/john-mccain-de-falso-heroe-al-criminal-de-guerras-en-serie/

- em O Diário

Portugal | O silêncio de Rui Rio


Domingos de Andrade* | Jornal de Notícias | opinião

Há só dois temas que verdadeiramente importam nesta rentrée. O Orçamento do Estado. E a nomeação do próximo procurador-geral da República, ou a renovação do mandato de Joana Marques Vidal. O primeiro deixa o presidente da República sossegado. O segundo dará provas do braço de ferro mediático entre a Direita e a Esquerda. Entre Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa. E vai ditar o futuro das relações entre ambos.

O espaço de Rui Rio joga-se aí. Na eventual fragilização do chefe de Estado numa matéria em que ele tem uma palavra efetiva e em que uma derrota política o fará recuar, abrindo espaço ao PSD para fazer Oposição. O problema é que não só não se sabe, hoje, o que pensa o crítico do Ministério Público Rui Rio, como não se vislumbra uma estratégia para o país.

O problema de Rio não é o silêncio, nem o estilo, nem pensar que o tempo dos dias não tem qualquer relevância para a sua atuação política. O problema é que não se lhe conhece uma visão, por muito que apresente ideias setoriais na Saúde, na Educação ou na Justiça, que podem ser muito boas mas das quais ninguém se lembra.

Sobra a Rio deixar passar que tem uma obsessão contra o partido, numa moralização que o devia fazer marcar pontos se não parecesse que não dá a cara pelo passado, presente e futuro do PSD. Sobra uma liderança fortemente personalizada que não augura longa vida em Portugal, veja-se o PRD de Eanes. E sobram uns pontas de lança que animam as guerras internas. Pedro Duarte, cujos resultados eleitorais nas últimas autárquicas no Porto foram confrangedores. E o quase novo líder partidário Santana Lopes, que sabe que vai capitalizar nas eleições europeias o descontentamento da Direita.

Quando este sábado discursar na rentrée do PSD, do homem que esteve ausente por um mês só ficará uma certeza. Ele vai ficar até ao fim. Não se sabe é quando será o fim.

* Diretor-executivo

"Portugal é um país com manifestações de racismo e xenofobia"


- diz secretária de Estado da Igualdade

Secretária de Estado da Cidadania e Igualdade, Rosa Monteiro, diz que "não podemos escamotear essa realidade" . Queixas por discriminação aumentaram no último ano. "Muitas foram apresentadas por pessoas ou associações ligadas à comunidade cigana."

ortugal é um país com manifestações racistas e xenófobas, admitiu a secretária de Estado da Cidadania e Igualdade, apontando que continua a haver muito preconceito contra a comunidade cigana e que é preciso conhecer o fenómeno para o combater.

Em declarações à agência Lusa, quando se completa um ano de entrada em vigor da Lei para a Prevenção, Proibição e Combate à Discriminação, Rosa Monteiro afirmou que "Portugal é um país com manifestações de racismo e de xenofobia".

"Obviamente, como são todos [os países], e não podemos escamotear essa realidade", defendeu.

No entender da secretária de Estado, "há um racismo tácito e há um racismo expresso", que se refletem nas queixas apresentadas à Comissão para a Igualdade e Contra a Discriminação Racial (CICDR).

Desde o início do ano e até ao dia 29 de agosto, a CICDR recebeu 206 queixas, mais 27 do que em todo o ano de 2017, o que representa já um aumento de 15%, sendo que as 179 queixas recebidas no ano passado significam também um aumento de cerca de 50% em relação a 2016.

Como a nova lei entrou em vigor a 1 de setembro de 2017, é preciso acrescentar as 59 denúncias que deram entrada até 31 de dezembro do ano passado para constatar que a comissão já recebeu 265 queixas enquadradas pela nova legislação.

Rosa Monteiro defendeu que é preciso conhecer o fenómeno para o conseguir combater e apontou que há estudos do 'European Social Survey' -- uma organização de realização de inquéritos transnacional, de cariz académico, da qual Portugal faz parte -- que mostram que "Portugal apresenta níveis superiores à média europeia em termos de racismo".

Por outro lado, destacou que em Portugal "não há um discurso xenófobo aberto por parte, por exemplo, de agentes políticos", contrariamente ao que se passa noutros países, algo que classificou como "muito positivo", tendo em conta um "consenso alargado na defesa e no combate a essas formas de discriminação".

Muitas queixas de pessoas e associações ligadas à comunidade cigana

Já no que diz respeito às motivações, a secretária de Estado destacou que é interessante perceber que a principal foi a discriminação étnica e racial e que muitas das queixas foram apresentadas por pessoas ou associações ligadas à comunidade cigana.

"Percebemos que há muitos preconceitos e muito desconhecimento relativamente àquilo que é ou são as pessoas ciganas e as suas realidades de vida e como sabemos o desconhecimento gera preconceito e gera segregação", sublinhou.

Os dados provisórios da CICDR, analisados até ao dia 25 de maio, revelam que, entre as 114 queixas recebidas desde o início do ano, as principais motivações são a origem racial e étnica e a cor da pele (ambos com 25,4%), seguindo-se a nacionalidade.

Já entre as expressões que mais se destacam como fundamento para a origem da discriminação estão a "etnia cigana" e a "cor da pele negra", as duas com 24,6%, seguidas da "nacionalidade brasileira" (11,4%).

Olhando para as 173 queixas registadas desde a entrada em vigor da nova lei, ou seja entre 01 de setembro de 2017 e 25 de maio de 2018, 35,3% foram encaminhadas para outras entidades, dependendo da matéria em concreto, enquanto 49,1% estão em fase de tramitação interna, sendo que 13,9% estão em fase de instrução no âmbito dos processos de contraordenação.

Das 173 queixas, 24 deram origem a processos de contraordenação, tendo sido já proferidas duas decisões de condenação em coima em 2018.

A secretária de Estado revelou que tem havido alguns processos em que é difícil fazer prova, mas não se mostrou defensora de mais mecanismos sancionatórios.

"Penso que é importantíssimo fazer a literacia da legislação existente, junto das próprias populações e de profissionais e por isso mesmo a CICDR tem apostado na formação e capacitação, desde as forças de segurança, com protocolos com a PSP e a GNR, e agora também com a direção-geral dos serviços prisionais de forma a que conheçam a própria legislação", explicou.

No balanço de um ano da nova legislação, Rosa Monteiro faz uma avaliação positiva, apontando que "foi fundamental" a revisão e o reforço dos meios da CICDR, que teve como consequência o aumento do número de queixas.

Lusa | em Diário de Notícias

Foto: António Cotrim/Lusa

Máquinas digitais: hora de desconectar?


Douglas Rushkoff, um dos grandes teóricos do mundo digital, adverte: redes sociais mobilizam nosso lado réptil- primitivo, para que troquemos a política pelo consumo

Entrevista a Juan Iñigo Ibánez | Outras Palavras | Tradução: Inês Castilho | Imagem: Steve Cutts

“Para o Facebook somos o produto, não o cliente”, repete o teórico da mídia estadunidense Douglas Rushkoff desde 2011. Embora o episódio Cambridge Analytica e o comparecimento de Mark Zuckerberg perante o Senado norte-americano tenham abalado a opinião pública, o que realmente chamou a atenção deste escritor e documentarista de 57 anos foi “como as pessoas ficaram surpresas”. “O plano de negócios do Facebook – assegura ele, falando do subúrbio novaiorquinho de Hastings-on-Hudson, onde reside – sempre foi extrair dados da atividade das pessoas, para vendê-los em seguida”.

As críticas do professor de Teoria dos Meios e Economia Digital da Universidade do Estado de Nova York à empresa de Mark Zuckerberg podem ser estendidas também à maioria das grandes companhias fundadas em tempos de economia digital. Em seu último livro, Throwing Rocks at the Google Bus: How Growth Became the Enemy of Prosperity [Atirando pedras no ônibus do Google: como o crescimento converteu-se no inimigo da prosperidade], editado pela Penguin Books nos Estados Unidos, o teórico de meios argumenta que empresas como Amazon, Netflix ou iTunes acabando utilizando a rede – que a seu ver prometia ser mais uma ferramenta de utilidade pública que uma plataforma comercial – para reviver as piores práticas do capitalismo industrial — agora, porém, “funcionando com esteroides digitais”.

Pioneiro e entusiasta da cibercultura, participante do movimento Occupy Wall Street e ativista da democracia de código aberto, Rshkoff é doutor em Novos Meios e Cultura Digital pela Universidade de Utrecht (Holanda).

Em 2013, o MIT – Massachusetts Institute of Tecnology, o incluiu – junto com Niall Ferguson e Steven Pinker – entre os dez intelectuais mais influentes do mundo. Considerado por muitos o mais fiel herdeiro das ideias de Marshall McLuhan e Neil Postman, é o responsável por cunhar termos como “nativos digitais”, “meios virais” e “moeda social”. Eis sua entrevista.


Como se explica o mea-culpa realizado por Mark Zuckerberg perante o Senado norte-americano, ao assumir a falta de maior responsabilidade sobre o modelo de negócios do Facebook?

Os jovens desenvolvedores abandonam a escola para iniciar suas empresas, com pouco ou nenhum conhecimento dos impactos políticos e sociais dos produtos que querem construir. Zuckerberg afirmou que não tinha ideia de que sua plataforma afetaria nossa sociedade e nossas eleições da maneira como fizeram. Se ele conhecesse algo sobre a economia política dos meios, não seria tão ignorante. Mas o Facebook é dirigido por alguém que só se formou na escola secundária.

No ano passado, o Facebook revelou os países que mais usaram sua nova modalidade de “interações” e o México se encontrava em primeiro lugar, em nível mundial. Como se relacionam as “interações” e as “curtidas” com o uso que a empresa poderia estar fazendo de nossos dados?

O Facebook usa a “aprendizagem automática” para determinar o que funciona e o que não funciona com você. Quanto mais informação tenham sobre você, maior a precisão com que poderão prever e manipular seu comportamento. Os botões de interação são como um dispositivo de votação instantâneo. São como um “grupo focal” mecânico. Estão fazendo as perguntas que lhe faria um psicólogo que tentasse hipnotizá-la.

No início de 2014 ficamos sabendo que o Facebook havia comprado a patente para desenvolver as lentes de realidade virutal Oculus VR. Em 2016, a empresa lançou seu primeiro protótipo. Qual sua opinião sobre uma empresa acusada de negociar com os dados dos usuários excursionar pelo campo da realidade virtual?

O Facebook quase perdeu a plataforma de telefones inteligentes. Chegaram aos telefones muito tarde, e muitos temiam que a companhia não os alcançasse. Ao comprar a Oculus Rift, asseguram-se de que, se a realidade virtual converter-se num grande negócio (embora eu creia que isso não ocorrerá), então estarão participando da corrida.

Mas eles ainda não sabem o que fazer com isso. Talvez jogos. O que é certo é que criarão um entorno muito mais controlado para manipular as pessoas, e poderão observar muitas dessas decisões insignificantes que tomamos costumeiramente. Obterão muita informação sobre nossas formas de movimentar-nos através desses entornos.

Que tipos de medida os governos devem tomar para controlar o que empresas como o Facebook poderiam fazer, através da realidade virtual, com nossos dados? Ainda dá tempo de regular isso?

A Europa é melhor nisso do que a América do Norte. Nos Estados Unidos acredita-se que impedir uma corporação de fazer algo é como dizer a Deus que se cale. O mercado é a sabedoria do universo, que se expressa nos assuntos humanos. Controlar uma empresa é considerado uma afronta à natureza.
O problema com a regulação é que as empresas que supostamente estão reguladas são com frequência as que terminam escrevendo as regras. E as escrevem de modo a garantir seus próprios monopólios. Creio que o mais fácil é converter as plataformas tecnológicas mais gigantescas – as que todos usam – em bens públicos

Em seu último livro, Throwing Rocks at the Google Bus, você afirma que a Amazon proporciona o exemplo mais claro de como – contrariamente ao sonho da economia colaborativa que muitos imaginaram ser possível no início da internet – os velhos valores corporativos foram amplificados graças à rede. Que tipos de prática as grandes empresas surgidas em tempos de economia digital, como a Amazon, executaram?

Elas destroem as empresas com que trabalham. Exploram seus trabalhadores, conhecidos como os “turcos mecânicos” da Amazon. Pagam uma ninharia para que façam o trabalho com os computadores, inclusive porque não têm como denunciar, se quem os contrata decide não pagar. Exercem o controle do monopsônio [também chamado “monopólio do comprador”] para pagar menos e exigir mais. Não ajudam as pequenas empresas a intercambiar valor entre elas. Convertem-se na única plataforma e aproveitam seu monopólio para expulsar as pequenas empresas do negócio. É uma má estratégia a longo prazo, porque se ninguém tem dinheiro, não podem gastá-lo na Amazon.

Como a Amazon afetou a indústria do livro?

O que a Amazon fez de mais notável foi prejudicar editores e autores. Pagam por livro menos que as livrarias normais. Preferem perder dinheiro com a venda de livros para que as outras livrarias se arruinem. É um conceito difícil de entender: venderão livros abaixo do custo com o objetivo de fazer com que outras livrarias fechem. Não lhes importa o ganho de seus livros. Querem ser um monopólio. E assim, quando forem os livreiros mais importantes do mundo, poderão finalmente impor suas condições aos editores. Podem estabelecer preços, controlar a distribuição e cortar da lista de livros os que não estejam de acordo com eles. É muito assustador, na verdade. O plano, a longo prazo, é que todos os autores trabalhem diretamente para a Amazon. É o que já propõem, de fato, a alguns escritores.

Você mencionou numa entrevista anterior que empresas como a Uber estão realmente usando seus motoristas como “pesquisadores de desenvolvimento”, e assim preparam o terreno para o negócio real: treinar o algoritmo para as viagens que os veículos automatizados farão no futuro…

Ao longo da história da humanidade, e certamente desde a era industrial, as novas tecnologias fazem com que certas habilidades humanas tornem-se obsoletas. Então, as pessoas procuram outro trabalho. Agora mesmo está ocorrendo em múltiplos setores: alimentos, medicamentos, educação, transportes, recursos, energia e inclusive entretenimento e arte.

O importante a ser lembrado, ao analisar esses problemas, é enxergar o que as empresas de fato pretendem ao excluir o trabalho humano. É realmente mais barato? É melhor? Não. Simplesmente elimina os humanos da equação. A longo prazo, a consequência disso é que não sobrarão seres humanos para comprar os bens e serviços.

Em 1988, Isaac Asimov previu, numa entrevista à BBC, que graças aos computadores, em poucos anos, cada pessoa seria capaz de aprender em seu próprio ritmo, de forma autodidata e durante toda a vida. Você crê que, em certa medida, isso se cumpriu?

Sim e não. A rede oferece enormes possibilidades educativas, desde a Wikipedia até o aprendizado a distância. Mas elas certamente não representam a cultura em rede dominante hoje em dia. E em muitos casos está sendo utilizada para minar o impacto mais subversivo e verdadeiramente humano da educação. Uma aula ou uma biblioteca digital online oferece uma grande oportunidade a quem não as teve antes, mas também prescinde do fator humano: o intercâmbio vivo de ideias e valores. Um bibliotecário humano é muito mais que uma base de dados.

Todos tinham os mesmos pensamentos otimistas sobre a televisão logo que ela apareceu. Ia ser a grande educadora. Supunha-se que em particular a televisão a cabo desencadearia uma nova revolução na educação. Contudo, nada disso aconteceu. Nenhuma mídia promoverá valores por si mesma. Ela só pode expressar os valores daqueles que a estão desenvolvendo. Neste momento, esses são os valores dos especuladores, razão pela qual as soluções educativas que vemos se desenvolvendo são as que têm modelos de negócios ampliáveis.

Há alguns dias, o New York Times voltou a publicar um artigo sobre a tendência, entre os executivos do Google, de inscrever seus filhos em escolas Waldorf. Parece que ali aprendem a tecer, interagem com a natureza, mas sobretudo não é permitido que se exponham a monitores e são proibidos de usar gadgets. O que isso revela a você?

Escrevi sobre isso há anos, quando as pessoas sequer acreditavam que fosse verdade. Para mim, significa que são hipócritas. Como os executivos de televisão e publicidade dos anos 1980, que não deixavam seus filhos ver televisão. É porque sabem que esses meios foram intencionalmente desenhados para frustrar a cognição, fazer com que as pessoas tenham medo, sejam burras e sintam-se sós e desesperadas. Isso não é teoria da conspiração. Os designers de interfaces das principais empresas tecnológicas do Vale do Silício estudam “captologia” em Stanford. Leem livros sobre o funcionamento das máquinas caça níqueis de Las Vegas para desenhar algoritmos que viciem.

As tecnologias digitais estão desenhadas especificamente para viciar, criar comportamentos obsessivos e fazer com que as pessoas prefiram as experiências digitais às reais. Os que fazem esse trabalho sabem que muito ruim e insano, e com razão querem proteger suas famílias dos possíveis danos.

Algumas pessoas apontam a simplicidade moralista, a agressividade e a irritação diante de opiniões contrárias que as pessoas demonstram na internet. Há alguma relação entre a forma como essas plataformas foram configuradas e a ascensão online, nos últimos anos, de grupos como ultra-direita [alt-right] nos Estados Unidos?

Essas plataformas foram concebidas para provocar respostas simplistas, impulsivas e primitivas — subreptícias. Estas são menos reflexivas que as reações dos mamíferos, e muito menos que as das comunidades de humanos.

Nossas emoções e condutas mais humanas provêm de uma parte do cérebro chamada neocortex. É a parte que as plataformas digitais tratam de evitar a todo custo. A captologia é a ciência de driblar o neocórtex e chegar diretamente no tronco do encéfalo. Essa é a parte que diz “matar ou morrer”. Se essa é a parte do cérebro que está ativa online, ela fomentará esse tipo de comportamento primitivo.

Você incluiu os efeitos das tecnologias digitais no conceito de “choque de presente”. Como se poderia vincular essa ideia a nossa propensão a crer em fake news e pós-verdade?

Minha ideia de “choque do presente” se referia à ênfase que as tecnologias digitais aplicam ao momento presente. Mas não ao presente real, e sim a uma instantaneidade e avalanche de dados e escolhas que fazem com que pareça que temos de estar alertas o tempo inteiro. É muito desorientador. Isso nos leva a desejar algo familiar. Qualquer coisa com uma forma familiar, seja ou não verdadeira. Odiamos o caos. Preferiríamos que uma pessoa malvada governasse o mundo a que ninguém o governasse. Isso é mais familiar e seguro.

No ano passado, veio a público a notícia de que o governo mexicano estava usando o software Pegasus para espionar jornalistas através de seus telefones celulares. Que potencial têm esses aparatos para intrometer-se em nossa privacidade?

Nossos dispositivos têm capacidade de conseguir acesso total a nossas vidas. Tudo. E não somente as coisas que você sabe sobre si mesmo, que tipo de sexo gosta, como se masturba, que drogas usa, mas também as coisas que não sabe sobre si. Essa é a parte mais perigosa. Podem usar macrodados (Big Data) para saber o que provavelmente fará no futuro. Eles sabem, antes de você, se ficará doente, se se divorciará, se mudará de sexo… qualquer coisa.

A única coisa que impede as empresas de explorar essa capacidade é o medo da lei ou seu sentido ético. Mas até o momento não as vejo preocupadas com nenhum desse aspectos.

Frequentemente nos chegam notícias de novos protótipos robóticos que fazem piruetas e se movem com incrível agilidade por terrenos acidentados. Qual é, na sua opinião, a característica humana que os robôs nunca poderão adquirir ou imitar?

É precisamente esse o tema de dois dos meus livros, de modo que talvez possa responder um pouco mais brevemente. Que significa ser humano? Podemos ver isso da perspectiva da consciência, da inteligência, da biologia, da espiritualidade, da arte ou do amor? Em que diferem os humanos dos animais em cada um desses aspectos, como diferem dos computadores? Como você pode ver, é um grande conjunto de problemas.

Penso haver uma diferença entre informática e pensamento. Creio que os computadores podem resolver muitos dos problemas que um cérebro humano pode resolver, mas não creio que sejam conscientes de que estão resolvendo os problemas, do mesmo modo que uma pá não sabe que está cavando. Então, quando decidimos substituir a humanidade por computadores, temos que perguntar: por que se incomodar, se as máquinas nem sabem que estão lá?

No início dos anos 1990, em São Francisco, você foi testemunha de como surgiu a cultura rave, junto com o otimismo tecno e a espiritualidade psicodélica. A promessa parecia ser de que a tecnologia e os valores do humanismo se uniriam, numa simbiose promissora. Como crê que poderíamos voltar ao ethos original desse renascimento digital, sem que ele implique um retiro perpétuo nas montanhas ou o ingresso numa espécie de idade pré-digital?

O mais provável é que façamos isso por necessidade. Simplesmente seremos pobres demais para participar desta sociedade industrial digital. Precisaremos de casa e comida, e para isso teremos de voltar a aprender os conceitos básicos. Isso nos fará trabalhar com nossas mãos e com as outras pessoas. Aprenderemos a trabalhar juntos. Olharmo-nos nos olhos, tomar decisões juntos e colaborar.
A outra possibilidade é que a geração que cresce agora simplesmente compreenda que os humanos estão à beira da extinção, e que a sobrevivência requer desconectar-se dessas máquinas, acabar com a escravidão adotada para fabricá-las e romper com o controle mental que nos liga a elas.

Que papel teriam os artistas e os humanistas nesse renascimento digital?

Os artistas rompem mitos. Ao admitir que o que fazem é artifício, revelam o artifício à sua volta. Seu papel sempre foi explorar o significado de nossa existência: romper as ilusões que se colocam no caminho, sejam elas o medo, o mercado, a dominação ou as leis. A arte pode ajudar a nos demonstrar que os humanos são especiais, inexplicáveis e dignos de existir. Que há neste mundo algo além do valor utilitário. Que o mundo é mais complexo do que aquilo que nossos cálculos algum dia resolverão. Penso que os humanistas são os que tentam convencer-nos de que nossa arte realmente possui essa capacidade. Essa arte verdadeira é mais que entretenimento ou cuidados paliativos. Essa arte é o caminho a seguir.

Para Lavrov, Guterres não passaria de um pau-mandado à frente da ONU


Thierry Meyssan

Ao receber o ministro libanês dos Negócios Estrangeiros e Imigrantes, Gibran Bassil, o seu homólogo russo, Serguei Lavrov, levantou novamente o véu sobre o funcionamento real das Nações Unidas [1].

Segundo a Carta, a Organização tem por fim regular pacificamente os diferendos entre as nações. No entanto, desde Julho de 2012, o verdadeiro poder já não é detido pelo secretário-geral, mas antes pelo seu "número 2": o Director de Assuntos Políticos, Jeffrey Feltman. Completamente fora de controle, este utiliza os meios da ONU para manter a guerra em todo o "Médio-Oriente Alargado".

Serguei Lavrov revelou que inquieto pela ausência de participação da Unesco, apesar dos seus compromissos, nos restauros de Palmira, acabou por descobrir que esta agência da ONU havia sido proibida por Feltman de cumprir a sua missão.

Acontece que Jeffrey Feltman emitiu, em Outubro de 2017, uma directriz secreta para todas as agências e todos os serviços da Organização proibindo-os de participar fosse em que acção fosse que pudesse ajudar a levantar a economia síria. O Conselho de Segurança não foi informado desta iniciativa.

Antigo embaixador dos EUA em Beirute, depois adjunto de Hillary Clinton para o "Médio-Oriente Alargado", Jeffrey Felman havia já redigido, quando assumiu o cargo em Nova Iorque, em Julho de 2012, um plano de capitulação total e incondicional da República Árabe Síria [2] . Com base nisso, fez frustrar todas as negociações de paz, fossem elas dirigidas por Kofi Annan, ou Lakhdar Brahimi ou Stefan de Mistura.

Lavrov indicou ter questionado o novo secretário-geral da ONU, António Guterres, e ter-lhe pedido para clarificar esta situação.

Esta é a primeira vez que a Rússia se interroga publicamente quanto à real autoridade do secretário-geral da ONU sobre os seus próprios serviços.

Questionado na sede em Nova Iorque pela agência Tass, o porta-voz da Organização, Stephane Dujarric, declarou que, de momento, a ONU se concentrava na busca de uma "solução política" na Síria [3] .

No mesmo encontro com a imprensa em Moscovo, com o seu colega libanês, Serguei Lavrov revelou, igualmente, que os ataques realizados contra as áreas libertadas do Sul da Síria são feitos por combatentes baseados no campo de refugiados de Rukban. Ora, este é protegido pelas forças dos EUA da base ilegal de Al-Tanf (fronteira Jordana) e, portanto, inacessível aos observadores internacionais. 

23/Agosto/2018

[1] Sergey Lavrov news conference with Gebran Bassil , by Sergey Lavrov, Voltaire Network , 20 August 2018.
[2] A Alemanha e a ONU contra a Síria, Thierry Meyssan , Tradução Alva, Al-Watan (Síria) , Rede Voltaire , 28 de Janeiro de 2016.
[3] UN says focused on political process in Syria rather than on reconstruction (ONU diz-se focada no processo político na Síria mais do que na reconstrução, ndT), Tass , August 20, 2018.

Ver também: 
  A Rússia denuncia a diarquia na ONU e nos Estados Unidos , 28/Ago/18

A versão em português encontra-se em www.voltairenet.org/article202581.html  - Tradução de Alva.

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/

Angola | Criança morre atropelada por caravana presidencial no Huambo


Uma criança de cinco anos foi atropelada mortalmente pela escolta presidencial no Huambo. População indignada pede mais prudência e atenção dos condutores das caravanas oficiais.

Depois do atropelamento, ocorrido em 2017 em Cabinda, de uma adolescente de 12 anos, por uma viatura da caravana do Presidente João Lorenço, durante a sua deslocação ao enclave,  desta vez, em Huambo, a pequena Graciana Adriana, de 5 anos de idade, foi vítima mortal nesta quarta-feira (29.08), de um acidente provocado por uma viatura da escolta presidencial.

O caso ocorreu quando Graciana Adriana, caminhava de mãos dadas com a mãe, numa estrada que dá acesso ao aeroporto Albano Machado, no Huambo. Na mesma altura, passava pelo local uma viatura afeta à delegação do Presidente João Lourenço, que esteve em visita à província na terça e quarta-feira (28/29.08).

Descuido terá provocado a morte?

De acordo com o porta-voz do Gabinete de comunicação e imprensa do comando da policia no Huambo, Martinho kavita, tudo aconteceu quando  a menor e a mãe, tentavam atravessar a estrada: Graciana terá escapado das mãos da mãe, tendo sido colhida mortalmente por uma das viaturas da caravana que acompanhava o Presidente João Lourenço
"A mãe e a criança, vinham de uma viagem, e devido à falta de atenção no momento da travessia da estrada, deu-se o atropelamento que infelizmente acabou vitimando mortalmente a menor. O carro da escolta presidencial procurava sair do ponto em que estava em direção ao aeroporto quando aconteceu este acidente".

Mãe conta versão diferente da polícia

A mãe da vitima, Inácia Chilembo, contou que vinha de uma viagem ao municipio do Mungo, onde fora colher milho  e quando estava no "passeio juntamente com a filha", o carro embateu fortemente na adolescente. A versão da mãe contraria, assim, a versão da polícia."Eu vinha da colheita do milho e o transporte deixou-me aqui. Comecei a transportar o milho e levei o primeiro carregamento e vim buscar o segundo, tendo atravessado sem problemas a estrada, até que vi uma viatura, não sei de onde saiu, que subiu diretamente no passeio onde estávamos".

O atropelamento e morte da pequena Graciana, reacendeu o debate sobre o excesso de velocidade, com que circulam normalmente as caravanas governamentais, particularmente as do Presidente da República. Em pouco tempo as caravanas ficaram envolvidas em dois atropelamentos, um deles mortal, primeiro em Cabinda e agora no Huambo.

Apelo para mais prudência e atenção

Para  o ativista civico José Carlos Danie, membro do Concerto das organizações da sociedade civil do Huambo, apesar de ninguém premeditar um acidente rodoviário, é necessário que os serviços de segurança do Presidente observem escrupulosamente as regras do código da estrada, quanto à condução, nomeadamente nas áreas urbanas.

"Penso que se deve trabalhar este aspeto relacionado com os serviços de apoio ao Presidente, para que haja mais prudência e atenção, quando as delegações se deslocam na via pública. A área onde aconteceu a morte da criança é uma localidade onde existem muitas residências e  muita gente a circular de um lado para o outro. Apesar disso, as regras de trânsito são frequentemente ignoradas pelas caravanas oficiais. Daí que apelamos aos condutores para que tenham mais prudência e atenção neste tipo de vias".

José Adalberto (Huambo) | Deutsche Welle

Foto ilustrativa: Trânsito em Luanda

Huambo: Oposição angolana desapontada com visita de João Lourenço


Oposição angolana lamenta que, nos dois dias da visita à província do Huambo, o Presidente João Lourenço não tenha tido tempo para se encontrar com os vários partidos.

Os partidos da oposição angolana ficaram insatisfeitos por não constarem da agenda oficial do Presidente da República na sua visita de dois dias à província central do Huambo.

Daniel Almeida, secretário provincial da Convergência Ampla de Salvação de Angola - Coligação Eleitoral (CASA-CE), gostava que João Lourenço se tivesse encontrado com os opositores.

"O Presidente chegou e nós, como partidos políticos, não fomos convidados, pelo menos para o receber no aeroporto", afirma. "Vimos as autoridades tradicionais e religiosas, mas nós, os partidos políticos, não fomos tidos nem achados."

O secretário do Partido de Renovação Social (PRS) no Huambo, António Soliya, também lamenta o sucedido. Soliya culpa o Governo local por não estar interessado em mostrar ao Presidente angolano a realidade vivida pela população na província.

"Vimos que, à última hora, o Governo provincial ficou preocupado em pintar as principais ruas e edifícios desabitados", comenta. "Estamos tristes, porque um encontro como este [com a oposição], num governo participativo e inclusivo, seria testemunhado por todos."

Oposição espera melhorias

Durante a visita à província do Huambo, o Presidente angolano orientou, na terça-feira (28.08) a 8ª sessão do Conselho de Ministros, em que foram aprovados uma proposta de lei que regula o exercício da atividade religiosa e o Regime Jurídico de Proteção Social Obrigatória. Na quarta-feira, a província acolheu a segunda reunião do Conselho de Governação Local (CGL), onde foram discutidos assuntos relacionados com a gestão das províncias, nomeadamente a construção de estradas ou o processo de recrutamento de professores e médicos no país.

Antes do regressar à capital, o Presidente angolano, inaugurou a nova central térmica de Belém, a 11 quilómetros da cidade do Huambo, que deverá fornecer energia elétrica a cerca de 100 mil moradores das cidades do Huambo e de Caála.

Liberty Chiaka, secretário provincial da União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), espera que a visita do Presidente da República se traduza em resultados económicos e sociais concretos na vida das populações, que enfrentam muitas dificuldades apesar do grande potencial da província.

"Nós gostaríamos que o Presidente constatasse esta dura realidade, para que se tomem medidas no sentido de dinamizar a execução das políticas públicas e, em particular, do orçamento geral da província", afirmou.

No entanto, Dainel Ameida, da CASA-CE, não acredita que a visita de João Lourenço traga melhorias: "O Presidente da República fez várias promessas na campanha eleitoral e até hoje não vimos nada!", conclui.

José Adalberto (Huambo) | Deutsche Welle

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