O processo de saída do Reino
Unido da UE se provou ser um desafio político muito maior do que parecia,
dividindo população e classe política. A PM se perdeu em meio a isso. E não
lhe restou saída, senão a própria
Barbara Wesel, Bruxelas
(Bélgica)| Opera Mundi | opinião
Quem observou Theresa May nos
últimos meses ficou especialmente surpreso com seu poder de resistência sem
limites. Nenhuma humilhação na Câmara dos Comuns ou demissão de ministro
parecia impressioná-la. Como um "João-bobo" político, ela era vista
novamente na próxima reunião no Parlamento ou na cúpula do Brexit, em Bruxelas.
Por vezes, ela até perdeu a voz devido ao grande stress. E até mesmo seus
opositores tiveram pena dela por causa de seu trabalho difícil. Mas, agora,
chegou o fim para a primeira-ministra que parecia, como um gato, ter sete
vidas.
No final, na verdade, parece que
seu próprio partido está retirando-a do cargo. Durante a semana, todos os
críticos afirmaram que esta sexta-feira (24/05) seria a última data em que ela
poderia partir com dignidade. Já que, na próxima segunda-feira, assim que os
resultados devastadores esperados para os conservadores nas eleições europeias
estivessem disponíveis, ela acabaria sendo derrubada por caciques do partido.
O previsível desastre nas
eleições europeias é uma das razões da ira dos conservadores contra a líder do
seu partido. Dependendo do seu espectro político, os apoiantes do Brexit
culpam-na por ter participado deste martírio, já que o Reino Unido já deveria
estar fora do bloco europeu desde 29 de março. E os moderados estão zangados
porque eles não tinham procurado anteriormente uma solução não partidária para
a disputa do Brexit e tinham sempre cedido aos adeptos da linha dura até que um
compromisso já não fosse mais possível.
Além disso, não houve uma
campanha eleitoral adequada para as eleições europeias, e os conservadores
deixaram Nigel Farage e seu recém-formado partido durante o Brexit no terreno
político sem oferecer qualquer resistência. O resultado foi uma raiva em todas
as frentes políticas.
O que finalmente aumentou a ira
para proporções incomensuráveis foi a tentativa de May de aprovar no
Parlamento, no último momento, mais uma vez um acordo modificado para o Brexit.
Ela acrescentou algumas concessões à legislação de saída da UE para garantir
votos suficientes da oposição feita pelo Partido Trabalhista. O elemento-chave
era a permanência temporária na união aduaneira e a promessa de um segundo
referendo.
Foi nesta altura que os próprios
membros do gabinete de Theresa May finalmente arrebentaram a corda. O ministro
do Interior, Sajid Javid, se queixou que isto era muito mais do que tinha sido
acordado na reunião conjunta de terça-feira. Como protesto, a líder da bancada
Andrea Leadsom finalmente renunciou na quarta-feira à noite. Ela não queria
ajudar a aprovar esta lei na Câmara dos Comuns, dizia a declaração. Depois
disso, ela se jogou, como uma dúzia de seus colegas, diretamente na luta pela
sucessão de May em Downing Street.
Enquanto a chefe de governo ainda
defendia a votação do Brexit na Câmara dos Comuns perante bancos meio vazios, a
chamada "conexão da pizza" dos defensores do Brexit já estava se
reunindo nas salas dos fundos para catapultar a primeira-ministra para fora do
cargo o mais rápido possível.
Luta pela sucessão
Com a decisão de May de deixar o
cargo de líder do Partido Conservador em 7 de junho e, consequentemente, perder
o cargo de primeira-ministra do Reino Unido, ela abre caminho para a luta por
sua sucessão. Os candidatos são propostos pelos cerca de 120 mil membros do
Partido Conservador, dos quais os dois primeiros colocados devem, sem seguida,
tentar angariar o apoio dos deputados conservadores na Câmara dos Comuns.
A decisão final sobre a questão
de quem se tornará inicialmente líder do partido e, assim, adquirirá também o
direito ao cargo de primeiro-ministro, é tomada pelos membros da legenda. De
acordo com pesquisas, o ex-ministro do Exterior Boris Johnson tem atualmente as
melhores chances, porque é popular entre os conservadores da base.
Na Câmara dos Comuns, por outro
lado, ele tem numerosos inimigos, muitos dos quais conhecem muito bem as suas
fraquezas. Os conservadores moderados também temem que ele possa desencadear um
Brexit duro - ou seja, uma ruptura drástica e sem acordo com a UE. No entanto,
ele parece estar à frente, por ser considerado o nome que teria mais chances de
se impor perante o Partido Trabalhista.
Enquanto a disputa pela sucessão
continua, Theresa May permanece no cargo. De qualquer forma, como
primeira-ministra, ela ainda será responsável pela visita de Donald Trump e
pela reunião dos chefes de governo e Estado europeus no aniversário do Dia D,
na Normandia, no início de junho. Além disso, o sistema britânico não prevê um
período transitório sem um chefe de governo designado: se um deixar o cargo, o
próximo deve estar pronto para ocupá-lo.
A sua própria teimosia, os erros
de cálculo na implementação do Brexit e a falta de intuição política acabaram
por provocar a queda de Theresa May. O deputado conservador Ian Duncan Smith
afirma que May teria colocado o sofá na frente da porta e se entrincheirado em
Downing Street.
A primeira-ministra tinha tentado
diversas manobras, feito vários ziguezagues - e se arruinado por todos os
lados. Primeiro, ela traiu os defensores da UE perante os apoiadores do Brexit
e estabeleceu um corte duro nas relações com a UE. Porém, ela não conseguiu
cumprir as condições deles como a questão do controle aduaneiro entre as duas
Irlandas. No final, a situação era tal que o seu pedido de ajuda ao Partido
Trabalhista só recebeu um encolher de ombros. Quem faria acordos com uma
primeira-ministra que só ficaria durante dias no cargo?
Nos últimos meses, May deve ter
prometido mil vezes realizar o Brexit. No final, ela não foi capaz de fazer
isso porque a situação estava perdida e porque, na verdade, ela não tinha
qualquer apoio em nenhum lugar. E, além disso, May não deixa nenhum legado
político. O seu sucessor deverá, de alguma forma, encontrar uma solução para a
profunda divisão que o Brexit criou entre a população e na classe política. O
Brexit provou ser um puro veneno político, muito para além de qualquer
expectativa.
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