domingo, 18 de agosto de 2019

Guiné-Bissau | Artistas juntam-se para combater abandono escolar de raparigas


Na Guiné-Bissau, as raparigas são quem menos frequenta o sistema de ensino. E as raparigas da região de Biombo precisam urgentemente de uma escola digna. Por isso, vários músicos juntaram-se em solidariedade.

A cantora guineense Karina Gomes deu a cara a uma nova iniciativa de solidariedade para angariar fundos para a construção de uma escola para as raparigas de Biombo, uma das regiões mais pequenas da Guiné-Bissau. E vários músicos juntaram-se a ela, incluindo Eneida Marta.

É preciso combater o abandono escolar de raparigas nas escolas guineenses, diz a artista.
"Infelizmente, ainda vivemos na Guiné-Bissau esse flagelo das meninas que não vão para a escola, porque, por uma questão cultural, acham que elas não precisam da escola e que só precisam de saber os deveres de casa para o casamento e essas coisas", afirma Eneida Marta em entrevista à DW África.

Estima-se que 23% das crianças guineenses não vão à escola. As meninas são as que menos frequentam o sistema de ensino na Guiné-Bissau. A taxa de abandono escolar ronda os 18%.

E é "claro, como uma mulher, uma menina tem tanto direito como um rapaz, um homem. Então, estamos a batalhar todos os dias", acrescenta a cantora.


Por um futuro melhor

A jovem artista Charline Vaz, de 20 anos, também se associou à causa "Música por Npili". Conta que nasceu numa família que teve condições para zelar pela sua educação e formação.

"Tive o privilégio ou a sorte de nascer numa família que me pode sustentar e que não me fez ter que trabalhar, deixar de estudar, para ajudar a família. E saber que posso estar a ajudar jovens que estão nessa situação para mim já é muito bom", diz.

Depois de concluir a escola em Bissau, Charline Vaz está agora em Lisboa para estudar Ciências da Comunicação. Como rapariga, reconhece que poderia estar na situação das meninas de Biombo ou das que via nas ruas de Bissau.

"Vivendo na Guiné, deparei com muitas situações [mas] sentia-me atada, porque não posso ajudar toda a gente", confessa. "Eu passava na rua e via raparigas com tigelas, baldes na cabeça a vender frutas, amendoim, e eu parava às vezes para pensar: 'estas meninas não vão para a escola, estas meninas só ajudam os pais. Estas meninas não vão ter a mesma educação que eu tive ou a mesma oportunidade que eu tive'."

Por isso, decidiu contribuir para que as raparigas do seu país possam ter um futuro melhor.

Contra os casamentos precoces

Eneida Marta, quando era embaixadora do Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), trabalhava na temática da proteção e valorização educacional das raparigas. Hoje, como refere, começa a haver mudanças positivas. Mas a Guiné-Bissau ainda enfrenta muitas outras carências e problemas que afetam a vida das raparigas, entre os quais a mutilação genital feminina e o casamento precoce.

"Eram tantas causas, tantas necessidades, que era um bocadinho difícil uma embaixadora optar por uma causa. Acabei por optar pelo casamento precoce, porque acaba por englobar as outras causas. Se uma menina vai ao casamento muito cedo, claro que não vai à escola. E se tem uma criança numa idade tão tenra também corre risco de vida", explica Eneida Marta.

Para Kemna, filho de José Carlos Schwarz, um dos mais notáveis músicos da Guiné-Bissau, cada ajuda de um guineense é uma gota de água que pode multiplicar-se e crescer, para fazer face às dificuldades que o país atravessa: "O mais importante é fazer. Não é ficar de braços cruzados, mesmo se [for] uma gota de água", refere.

João Carlos (Lisboa) | Deutsche Welle

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