terça-feira, 7 de abril de 2020

Portugal | Marcelo põe a banca a exigir mais do Governo (e vice-versa)


Rio foi duro com a banca. Marcelo escolheu ser diplomata: elogiou os banqueiros com quem conversou duas horas e jogou em duas frentes - quer a banca a puxar mais pelo Governo e o Governo a puxar mais pela banca. “Complementam-se.” De medidas concretas, nada. O Presidente preferiu confiar na “mobilização unânime” dos senhores do dinheiro

Marcelo Rebelo de Sousa fez da reunião com a banca um sofisticado exercício de diplomacia política. No dia em que o líder do PSD foi duro com o sistema financeiro e pediu ao Presidente da República que lhes desse "um abanão", Marcelo escolheu outra via, pelo menos a medir pelo que disse em público.

O Presidente mostrou-se confiante "na mobilização" dos banqueiros para ajudarem empresas e famílias. E aproveitou-os para passar a mensagem de que o Governo tem de ir mais longe nos apoios à economia.

Reunido por videoconferência com os presidentes dos cinco maiores bancos portugueses - CGD, BCP, Novo Banco, BPI e Santander -, Marcelo Rebelo de Sousa disse ter retirado "imensos comportamentos e sugestões concretas para a vida dos portugueses", assentes em duas linhas essenciais.

Por um lado, "pôr no terreno as medidas de apoio já anunciadas pelo Governo" (que incluem linhas de crédito e moratórias); mas também "tomar (a própria banca) iniciativas próprias". E algumas delas, anunciou o Presidente, são "propostas que a banca vai fazer ao Governo", num quadro de ação que inclui a "recapitalização de empresas".


Marcelo diz que vai agora "sistematizá-las" e que o próprio Governo já está a falar com a banca. Num esforço de "complementaridade" que o Presidente tentou claramente promover e aprofundar com este encontro e que admitiu ser extensível aos "parceiros sociais".

E que contributos pediu à banca, senhor Presidente? E que compromissos assumiram os banqueiros?, quis saber um jornalista. Mas Marcelo foi vago. Este foi, sobretudo, o dia de puxar a banca para o campo de batalha. E o Presidente assumiu pelos banqueiros um compromisso: "Foram unânimes. Tomaram a iniciativa de estar mesmo presentes nas vidas dos portugueses. E isto é a banca a dizer 'nós fomos apoiados pelos portugueses, e além de termos pago o que nos emprestaram e os juros, sentimos que devemos empenhar-nos nesta luta nacional'".

"Saio com a sensação de que os banqueiros estão a acompanhar de forma muito atenta o que se vive nas empresas e nas famílias, quer a nível nacional, quer internacional." Mais: o Presidente diz ter ficado impressionado com o espírito "de mobilização" da banca nesta empreitada. E voltou ao mantra de duas faces.

"Os bancos tomaram iniciativas próprias além da aplicação das medidas do Governo, completando as medidas do Governo." E "quanto às medidas do Governo já começou o processo de colocação no terreno dos financiamentos previstos nessas medidas". Aqui Marcelo foi complacente: "Demora tempo". E paciente: "Ou já chegaram os apoios. Ou estão a chegar. Ou vão chegar".

Apostado em colar os estragos provocados pela crise financeira dos últimos anos entre a opinião pública e a banca, Marcelo Rebelo de Sousa tornou público o elogio que os banqueiros terão deixado aos seus clientes pela forma como geriram as poupanças no mês de março, já sob a crise covid: "Elogiaram a maturidade revelada pelos portugueses, que recorreram às moratórias nalguns casos para fazerem um pé de meia". E Marcelo voltava a aproveitar para a diplomacia política: "Ou seja, os portugueses estão a fazer contas à vida".

Sobre as medidas do Governo para apoiar empresas e famílias, o Presidente da República nada disse. Mas aproveitou o dia da banca para o dizer de outra forma: dialoguem, complementem-se. E melhorem os apoios no terreno.

Ângela Silva | Expresso

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