Académicos moçambicanos defendem
que apoio da SADC no combate aos grupos armados em Cabo Delgado
limitar-se-á à dimensão político-diplomática, mas destacam a sua importância
para evitar que "terrorismo" afete a região.
"A Comunidade de
Desenvolvimento da África Austral [SADC] não tem forças armadas nem um quartel.
Portanto, esse posicionamento é, na verdade, um aval para que os países da
região possam cooperar com Moçambique, mas não os obriga a fazer isso. Não é um
indicativo de que teremos apoio", disse à Lusa o académico moçambicano
Paulo Wache.
Em causa está uma reunião na
terça-feira passada (19.05) da 'troika' do órgão de Política, Defesa e
Segurança da comunidade sub-regional, em Harare, capital do Zimbabué,
onde o
órgão se "comprometeu e instou os Estados-membros da SADC a apoiar o
Governo de Moçambique na luta contra os grupos terroristas e armados" que
já provocaram a morte de 550 pessoas em Cabo Delgado , norte de Moçambique, desde 2017.
Para Paulo Wache, o
posicionamento do órgão é importante de ponto de vista político e
institucional, mas não passa de uma "plataforma para que os países que
decidirem apoiar Moçambique não entrem em choque com a instituição".
"O apoio dos países da
região dependerá dos contatos bilaterais que Moçambique vai fazer e nem todos
os países da SADC vão apoiar. Aparentemente Angola e Zimbabué estão mais
dispostos a prosseguir com este apoio, além da Tanzânia [país vizinho e que
também tem sido afetado pelos ataques]", frisou.
Terrorismo na África Austral
Por outro lado, prosseguiu o
académico, ao declarar os ataques armados em Cabo Delgado uma ação
"terrorista", Moçambique lança um alerta para a região da África
Austral, que não tem o histórico deste tipo de ameaças.
"Ficou claro nos últimos
tempos que estamos perante um ameaça terrorista, que não é só uma ameaça ao
país, mas também à região. Portanto, a SADC pode operacionalizar os acordos de
proteção da costa e fornecer meios tecnológicos de interceção de informações,
na medida em que o êxito das ações militares depende também do que vai
acontecer de ponto de vista diplomático", frisou Paulo Wache.
Também o académico Calton Cadeado
entende que a violência em
Cabo Delgado deve ser vista como uma ameaça à região,
considerando que Moçambique já devia ter recorrido à SADC.
"Parece-me que Moçambique
não mostrou muita abertura para intervenção de outros países da região na
questão de Cabo Delgado. Mais do que isso, Moçambique foi procurar uma solução
pujante longe da SADC. Houve informações sobre forças russas em Cabo Delgado que
acabaram fracassando. Parece-me que agora Moçambique percebeu que é preciso
voltar para a SADC", afirmou Calton Cadeado.
Apesar de admitir que o
"terrorismo" é um fenómeno novo na região, o académico defende que a
SADC deve ser vista como o principal interessado, tendo em conta que se está
perante um problema que ameaça todos os países-membros.
"A SADC tem um histórico de
solidariedade político-militar e, antes de outras opções, devia Moçambique ter
privilegiado o paradigma de que problemas internos precisam de soluções
internas", frisou o académico.
Ataques em Cabo Delgado
Cabo Delgado, região onde avançam
megaprojetos para a extração de gás natural, vê-se a braços com ataques de
grupos armados classificados como uma ameaça terrorista desde outubro de 2017.
As autoridades moçambicanas
contabilizam um total de 162 mil pessoas afetadas pela violência armada.
No final de março, as vilas de
Mocímboa da Praia e Quissanga foram invadidas por um grupo, que destruiu várias
infraestruturas e içou a sua bandeira num quartel das Forças de Defesa e
Segurança.
Na ocasião, num vídeo distribuído
na Internet, um alegado militante 'jihadista' justificou os ataques de grupos
armados no norte de Moçambique com o objetivo de impor uma lei islâmica na
região.
Foi a primeira mensagem divulgada
por supostos autores dos ataques que ocorrem desde outubro de 2017 na província
de Cabo Delgado, gravada numa das povoações que invadiram.
Deutsche Welle | Lusa
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