Alexandre Chiure | O País (mz) | opinião
É
do conhecimento de todos que as autoridades policiais, nomeadamente a Polícia
da República de Moçambique e a polícia municipal, são entidades sobre quem
recai a responsabilidade de zelar pelo cumprimento das medidas restritivas no
âmbito do estado de emergência.
A polícia devia, por isso, encarar todas as medidas em vigor da mesma forma e atribui-las o mesmo peso quando se trata de fiscalizar o seu cumprimento. A higienização das mãos com água, sabão ou cinza, o distanciamento social e o uso da máscara em lugares públicos são inegociáveis.
Infelizmente não é o que está a acontecer no terreno. Na hora de fazer cumprir
com estes protocolos do Ministério da Saúde, a polícia parece mais preocupada
com algumas áreas em detrimento das outras.
Ela
é mais vista a fiscalizar os chapeiros, o que não seria nenhum problema se o
objectivo fosse o de combater os atropelos que se verificam neste sector de
actividade em que alguns operadores transportam para além do número autorizado
de passageiros. Estão mais preocupados em ganhar dinheiro do que proteger os
seus utentes.
Era
suposto que este sector, por ser um dos maís privilegiados na actuação
policial, fosse o que mais cumpre com as medidas do estado de emergência.
Mas, infelizmente, continua a ser o mais problemático. É que alguns excessos ou violações são resolvidos com um simples “refresco”.
Alguns
agentes desonestos envergando a farda da polícia de trânsito e da municipal,
pouco se importam com o risco que as pessoas estejam a correr com o
incumprimento das regras estabelecidas. São capazes de deixarem passar
irregularidades desde que ganhem algum dinheiro com isso.
Enquanto
prevalecer este tipo de comportamento no seio de alguns agentes da polícia, que
consideram o coronavírus como uma oportunidade para ganharem dinheiro,
continuaremos a ter muitas infecções.
No
calar da noite, a polícia tem feito rusgas à caça dos que teimam em vender
bebidas alcoólicas para o consumo no local. Desde que começou o Estado de
Emergência, centenas de pessoas foram detidas nestas operações, um pouco por
todo o país, acusadas de violação do Decreto presidencial e os seus produtos,
apreendidos.
No
lugar de responsabilizar os prevaricadores de acordo com a lei, são, mais
tarde, soltos e tudo fica como se nada tivesse acontecido. São pouquíssimos os
casos que vão parar no tribunal e isso tira seriedade ao processo. É que não
vale a pena prender pessoas se não é para responderem pelo crime cometido.
A
acção da polícia em si está correcta. As rusgas devem ser feitas. Não se deve
permitir a perpetuação deste tipo de situações arriscadas. É correcta sobretudo
quando é para colocar tudo em pratos limpos. Prender e responsabilizar os
infractores sem subornos ou extorsão pelo meio.
O
que causa estranheza nisto tudo é o facto de a polícia fiscalizar o cumprimento
de algumas medidas de prevenção de coronavírus e, aparentemente, ignorar
outras, também de carácter obrigatória, que exigem o mesmo rigor no controlo
por parte das autoridades policiais.
É
quase nulo ou pouco visível o papel da polícia, na via pública, no que se
refere à fiscalização do uso da máscara. As pessoas circulam num à vontade.
Frequentam lugares públicos. Até passam junto à polícia sem máscara e nada lhes
acontece, nem uma chamada de atenção.
Os
agentes policiais encaram esta situação com normalidade. Não usar máscara não
parece para eles um risco ou uma violação do estado de emergência, o que é
errado, muito errado. Se não sabem, informam-se.
É
grave que a polícia não tenha percebido ainda que circular sem máscara é
perigoso quanto não higienização das mãos. Não observância do distanciamento
social e da etiqueta da tosse, promoção de convívios, consumo de bebidas
alcoólicas em grupo e outras situações.
Tudo
isto representa um risco de contaminação com o coronavírus e, por isso, deve
ter igual tratamento por parte de quem tem a responsabilidade de fazer cumprir
estes protocolos: a polícia.
Continuamos
com os mesmos problemas. As mesmas fragilidades na implementação das medidas.
Os mesmos focos de infecção. Defeitos que transitam de um mês para o outro do
Estado de Emergência porque, em alguns casos, não se faz sentir a mão dura da
polícia. A falta de controlo rígido propicia o relaxamento. Infelizmente
algumas pessoas só reagem com uma pressão policial nas costas.
A
polícia tem que se fazer sempre presente. Tem que estar em cima dos
acontecimentos. Informar-se e formar-se para poder fazer leituras correctas
sobre qual deve ser a sua forma de ser e estar em cada momento, sobretudo num
Estado de Emergência como a que nos encontramos. Não se deve admitir o vazio do
poder.
O
que é para cumprir, é para cumprir. O que é obrigatório, é obrigatório para
todos, sem excepção. Tudo aquilo que é um risco, é sempre um risco. É assim
como a polícia deve olhar para o Decreto presidencial. Para as medidas de
prevenção estabelecidas em respeito aos protocolos do Ministério da Saúde e
garantir que todas sejam cumpridas.
Não
estou a pedir que a polícia violente os cidadãos, mas que se sintam, a todo o
momento, pressionados, vigiados e, acima de tudo, obrigados a respeitar a lei
que é o decreto, uma vez chancelado pela AR.
O
papel da polícia não é só de prender as pessoas. Vai para além disso. Passa
também pela educação do cidadão.
Não
há cadeias suficientes para tantos violadores do Estado de Emergência. Por isso
é pertinente que a acção da polícia seja acompanhada pela componente educativa,
particularmente no que diz respeito ao uso da máscara que é uma das fraquezas
no país. Educar e, ao mesmo tempo, obrigar ao cidadão a usar a máscara em
lugares públicos.
Os
outros países como a China socorreram-se das tecnologias para mobilizarem o
público e fazê-lo cumprir com a decisão de que todos têm que usar a máscara.
Colocaram no ar dezenas de drones, equipados com alto-falantes, a veicularem a
mensagem sobre a obrigatoriedade do uso da máscara.
Moçambique
não dispõe desses equipamentos, mas pode usar a força humana como a polícia,
activistas dos direitos humanos, voluntários da Cruz Vermelha de Moçambique,
agentes da medicina preventiva, pessoal do Instituto Nacional de Gestão de
Calamidades, escuteiros e outras pessoas que possam se interessar em abraçar a
causa.
Nas
localidades, postos administrativos e distritos podem juntar-se os régulos ou
os líderes comunitários, pessoas influentes e respeitadas na comunidade que
podem ser ouvidas e acatadas pelas populações.
Não
temos os drones, mas um exército suficiente de pessoas para o que se pretende:
desencadear uma campanha nacional de educação cívica, com o apoio dos órgãos de
comunicação social, de modo a elevar a consciência dos moçambicanos perante a
covid-19 e acabar com casos de pessoas que ainda não acreditam na existência da
doença no país.
O
trabalho devia incidir sobre as áreas onde ainda há fragilidades no cumprimento
das medidas de prevenção de coronavírus. Nos mercados, paragens, terminais de
autocarros e na via pública, para garantir que é observado o distanciamento
social e o uso da máscara. Nos cemitérios, para assegurar que é respeitado o
número autorizado para assistir a um funeral. No transporte de carga, para
garantir que os camionistas provenientes de alguns países vizinhos estão sob
controlo e não representam nenhum risco de propagação da covid-19 em território
moçambicano.
Os
partidos políticos, na sua maioria ausentes deste processo da luta contra o
coronavírus, podem integrar o grupo e estenderem a sua mão aos seus membros e
simpatizantes. Produzir e distribuir máscaras aos necessitados e deixarem de só
se lembram destes quando é para lhes pedir o seu voto.
Os políticos têm aqui uma grande oportunidade de mostrar o quanto se preocupam pela saúde e bem-estar dos seus fiéis votantes. Os defensores das suas cores políticas. Os guardiões dos seus interesses políticos. Por essa razão, eles merecem uma atenção especial.
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