A NOVA ROTA DA SEDA CONTA COM A ROTA MARÍTIMA DO NORTE, GARANTIDA PELA RÚSSIA
Martinho Júnior, Luanda
A capacidade de manobra geoestratégica do império da hegemonia unipolar no Árctico é já de completa impotência: os Estados Unidos e os estados vassalos alinhados na NATO, ou por via do tratado UKUSA-Echelon, ou ainda os estados subservientes das “coligações” e “emparceiramentos” úteis e tácitos, não possuem recursos suficientes nem capacidades para ao mesmo nível estabelecerem contramedidas às actividades da Federação Russa naquela imensa região da Terra ao redor do Pólo Norte!
Essa fragilidade, numa altura em que com o aquecimento global se torna cada vez mais viável a navegação e a actividade humana durante todo o ano sem interrupção, o Árctico é uma das mais exclusivas Novas Rotas da Seda à disposição da emergência multipolar e a Federação Russa tornou-se reitora dos programas em curso, quinquénio a quinquénio.
Se nas duas décadas iniciais do século XXI (2000/2020) a Federação Russa lançou bases infraestruturais e estruturais ao longo de toda a costa norte do seu espaço transcontinental (inclusive nos arquipélagos que lhe são próximos) a partir sobretudo da península Kola a oeste e do estreito de Bering a leste, durante a 3ª década de 20/30 a Federação Russa está apta a uma actividade cada vez mais alargada e profícua, com a sua Frota do Norte à altura duma aplicação geoestratégica impossível de superar, com influência em todo o território marítimo e continental da Federação e muito para lá dela nas direcções do Atlântico, do Pacífico e do Índico, sincronizadamente com as direcções terrestres para a Europa do Leste, a Ásia Central, o Médio Oriente Alargado, o Sudeste Asiático e o Extremo Oriente!
O continente africano vai começar a sentir também os efeitos da intensidade das capacidades da Federação Russa integrada na emergência multipolar e como um dos factores geoestratégicos mais importantes das Novas Rotas da Seda transcontinentais e transoceânicas, sobretudo em função das que se distendem a partir da Euro-Ásia!
Já naquela altura era possível considerar conforme o que está plasmado naquela síntese-analítica que “para fazer face às disputas a sul do seu imenso território (Ásia Ocidental e Central), a Rússia está a concentrar o seu acervo e arsenal militar e de inteligência a norte, tanto quanto o possível junto ao Ártico, tirando partido da tendência para o aquecimento do planeta e dos seus reflexos ali
O Ártico, de fraca densidade populacional e com ambientes hostis, possui condições ideais para gerir as capacidades militares e de inteligência estratégica e, à medida que consolida novos programas científicos e tenológicos, a Rússia está a colocar nessas paragens um enorme potencial de persuasão e de meios, que por outro lado podem fluir, sempre que necessário, para os outros limites do espaço euro-asiático onde se inscreve a Rússia, tanto na direcção do Atlântico Norte, (desde o Báltico, ao Mediterrâneo e ao Mar Negro), como do Pacífico, como ainda do Índico Norte (e respectivos mares interiores)”…
…“Encontrada a fórmula da resposta geoestratégica face à hegemonia unipolar do império e do seu modus operandi capitalista e neoliberal, a Rússia sob regência de Putin vai investir em meios militares e de inteligência mais poderosos e sofisticados nas próximas décadas, até por que essa geo estratégia torna possível uma gestão dos meios reduzindo ao máximo os custos de exploração, face aos quesitos dos enfrentamentos nos vários cenários que contornam a Rússia.
As ambições da Rússia se estão o nível do seu espaço continental euro-asiático, nem por isso estão a desleixar as implicações noutras partes do mundo, tendo em conta que na América do Sul existe um Brasil e em África uma África do Sul, os outros dois BRICS!...
As articulações conseguidas trazem um sinal multipolar sem precedentes e isso beneficia a luta contra o subdesenvolvimento e as entidades que compõem o sul, particularmente os povos oprimidos da Terra!”
02- Um mês depois, a 8 de Março, publicou-se “A RÚSSIA NA BATALHA PELO ESPAÇO A NORTE DO MAR NEGRO” em função da observância da geoestratégia da Federação, quer dizer: que se levou em consideração o papel decisivo dos dispositivos de inteligência e militares a Norte (rota do Ártico) como insuperável factor de dissuasão, face à agressividade duma NATO sob comando do Pentágono, uma NATO que de há muito deveria ter sido dissolvida, tal como aconteceu com o Pacto de Varsóvia… (https://paginaglobal.blogspot.com/2014/03/a-russia-na-batalha-pelo-espaco-norte.html).
Escreveu-se entre outras considerações o seguinte:
… “Do lado do ocidente foram sempre utilizados desde o início da década de 90 do século passado, padrões fundamentalistas, fascistas ou mesmo nazis, muitas vezes a coberto de nacionalismos exacerbados, de religiões com práticas radicalizadas e rótulos atractivos, como as revoluções coloridas ou as primaveras árabes, no quadro das políticas e alianças, o que demonstra o carácter daqueles que procuram fazer valer a hegemonia unipolar e excludente, incapaz de procurar relacionamentos consensuais, dialogantes e equilibrados… e sempre em nome duma democracia representativa que serve apenas os interesses e a vocação da aristocracia financeira mundial e dos instrumentos mercenários de que dispõe!”…
De facto, ao longo da 2ª década do século XXI (2010/2020), a Federação Russa desempenhou um papel de dissuasão e contenção na IIIª Guerra Mundial levada a cabo pelo império da hegemonia unipolar contra o Sul Global, com episódios que se fizeram sentir sobretudo no Cáucaso, no Médio Oriente Alargado, em África e também na América Latina, aqui com suas próprias nuances!...
03- Dos dispositivos e actividades da Federação Russa no Ártico pouco se conhece, ou melhor, só se conhece o que o estado russo quer que se saiba nos termos da contenção e dissuasão sem manobras dilatórias e pouco mais, apesar da crescente actividade que inclui o uso da Rota do Mar do Norte (53% dos litorais do Ártico pertencem à Federação Russa), mesmo assim a curiosidade vai começando a atrair cada vez mais gente, incluindo não-russos!...(https://www.slideshare.net/victorolerskiy/northern-sea-route-news-headlines-march-2019; https://www.youtube.com/watch?v=VQReGCLCUX8).
No Ártico a supremacia russa é abissal em relação a outras concorrentes, quer no âmbito civil quer no militar… (https://www.csis.org/features/ice-curtain-russias-arctic-military-presence; https://www.adn.com/arctic/article/new-icebreaker-bolsters-russian-supremacy-arctic/2012/09/20/; GAC and Russia to develop Northern Sea Route (freightweek.org); https://www.youtube.com/watch?v=gg2bs8If26I&list=LLTZYEPrF9JOIA8-DQRTQ_kg&index=2156; https://tass.com/tag/russian-northern-fleet).
Toda a Rota do Mar do Norte (a norte do Círculo Polar Ártico), passa por dentro do sistema implantado como uma enorme redoma protectora, em águas territoriais da Federação Russa, desde o estreito de Bering, a leste, à península de Kola, a oeste! (https://www.cnbc.com/2019/12/27/russias-dominance-in-the-arctic.html).
Por vezes é o próprio Presidente Putin que abre um pouco a janela dessas capacidades russas, em ocasiões especiais, ou em entrevistas que plasmem as formas de viver, de estar, de sentir, de pensar e de agir próprias dos que com responsabilidade assumem a emergência multipolar capaz de preservar geoestratégias que lhe conferem supremacia!... (https://www.youtube.com/watch?v=nmG5JXfExwk; https://www.youtube.com/watch?v=m_cQn_zLWPw; https://www.youtube.com/watch?v=hAHbhl79cV8; https://www.youtube.com/watch?v=UpTuVemLXwE; https://www.youtube.com/watch?v=r60WwSIeaVc).
Uma das razões corresponde ao facto de ser no norte do seu território onde têm sido feitos os estudos e os testes de muitas das produções russas, em especial as de índole militar ou de inteligência: quando os projectos se tornam viáveis nas condições glaciares, então eles são passíveis de ser utilizados em qualquer clima e ambiente! (https://www.reuters.com/article/us-russia-arctic-missiles-idUSKBN1Y40BB; https://www.bbc.com/news/world-europe-49319160).
Outras vezes, é em função da realização dos projectos (daquilo que se dá a conhecer deles) que se percebe até que ponto a Federação Russa está avançando (e como está avançando) para se assumir nos relacionamentos internacionais apropriados a uma responsabilidade singular compatível com a responsabilidade de toda a humanidade. (https://www.aeroflap.com.br/vladimir-putin-apresenta-os-novos-misseis-hipersonicos-da-russia/; https://muitocurioso.org/arma-hipersonica-da-russia-esta-agora-operacional/; https://southfront.org/russia-revealed-look-of-avangard-hypersonic-missile-system-video//; https://southfront.org/role-of-russias-new-strategic-weapons-systems-in-providing-strategic-deterrence/).
Os projectos lançados no final de cada década são os expoentes maiores dos avanços científicos, tecnológicos e da vontade humana que os animam, pelo que os programas russos apresentados neste final de ano 2020, dão a dimensão dos propósitos da responsabilidade russa no planeta e para além dele! (https://br.sputniknews.com/ciencia_tecnologia/2020121216602056-russia-esta-desenvolvendo-rebocador-espacial-nuclear-para-voos-a-lua-jupiter-e-venus/; https://br.sputniknews.com/defesa/2020121016592300-russia-planeja-por-em-servico-3-quebra-gelos-nucleares-mais-potentes-do-mundo-em-2027-2032/; https://southfront.org/role-of-russias-new-strategic-weapons-systems-in-providing-strategic-deterrence/).
O Ártico serve também de espaço utilizado para testes do mais moderno e incrível armamento, uma parte do qual já é do conhecimento público… (http://www.military-today.com/navy/poseidon.htm; https://engineeringrussia.wordpress.com/2015/02/03/zvezdochka-to-begin-construction-of-new-transport-weapons-at-the-end-of-the-year/).
Nesse aspecto, sendo o maior espaço nacional da Terra e ao mesmo tempo o único transcontinental, o padrão das responsabilidades emergentes da Federação Russa é flexível pelas articulações que continua a desenvolver, mas eficazmente reitor particularmente no seu significado e peso energético! (https://www.reuters.com/article/us-russia-putin/putin-pledges-russian-superiority-in-the-arctic-with-new-icebreakers-idUSKBN27J2AU).
No humanamente desabitado Ártico (menos de 1 habitante por quilómetro quadrado), todos os programas são preparados para horizontes de décadas, incluindo os de implicação ambiental (https://br.rbth.com/estilo-de-vida/84562-russia-censo-aereo-renas-extremo-norte), aproveitando o avançar das revolucionárias tecnologias contemporâneas numa escala sem precedentes, sobretudo em função da extracção de petróleo e gaz conforme acontece hoje no Distrito Autónomo da Iamália (penínsulas de Yamal e Gydansk, assim como do mar de Kara), a norte da Sibéria. (https://www.wikiwand.com/pt/Iam%C3%A1lia-Nen%C3%A9tsia; https://pt.qaz.wiki/wiki/Yamal_project).
Os quebra-gelos atómicos russos (https://www.youtube.com/watch?v=BRRy6t5K3R4) representam já décadas de avanço científico e tecnológico em relação a outras presenças no Ártico, reais, eventuais, ou potenciais! (https://br.sputniknews.com/defesa/2020121016592300-russia-planeja-por-em-servico-3-quebra-gelos-nucleares-mais-potentes-do-mundo-em-2027-2032/; https://br.sputniknews.com/russia/2020102716285462-russia-vai-construir-3-quebra-gelos-nucleares-mais-potentes-do-mundo-foto/).
Eles são responsáveis pela
abertura de canais no gelo que permitem a navegação inclusive no inverno e em
condições climatéricas extremas; o recentemente inaugurado quebra-gelos nuclear
Arktika, capaz de romper placas com
A moderníssima frota de petroleiros e navios de transporte de gaz adaptados às condições do Ártico (alguns dos navios são eles próprio quebra-gelos), está a crescer exponencialmente, sendo responsável por uma percentagem importante do movimento da Nova Rota da Seda no Ártico (http://sovcomflot.ru/en/; http://www.scf-group.com/en/press_office/press_releases/item103401.html) em complemento dos oleodutos e gasodutos que correm na direcção da Europa e da China!
A fim de proteger a Rota do Norte, a Federação Russa está a implantar um colar de bases militares em condições extremas, tirando ao mesmo tempo partido das potencialidades de suas articulações a oeste e a leste!... (https://www.youtube.com/watch?v=miYfnQxeIo0; https://br.sputniknews.com/defesa/2018032810847698-artico-cacas-russos-treinamentos-kamchatka/).
Está também a aumentar o poderio militar em toda a região, tirando também partido da sua geoestratégica Frota Naval do Norte… (https://www.repository.utl.pt/bitstream/10400.5/14847/1/A%20Geopol%C3%ADtica%20do%20%C3%81rtico%20e%20pol%C3%ADtica%20externa%20da%20R%C3%BAssia%20para%20a%20regi%C3%A3o%20%282007-2017%29%201.pdf; https://www.youtube.com/watch?v=1ofksy8MsPk; thedrive.com/the-war-zone/31040/russia-is-eying-more-armed-icebreakers-after-launching-missile-toting-arctic-patrol-ship; https://en.wikipedia.org/wiki/Project_23550_patrol_ship).
A saga russa no Ártico e no Extremo Oriente, é determinante para a sua superioridades no norte e para sua proactiva força de contenção e persuasiva virada a sul!... (https://icds.ee/en/russias-military-capabilities-in-the-arctic/; https://www.bbc.com/portuguese/internacional-46311782; https://jamestown.org/program/russia-claims-total-military-superiority-in-the-arctic/; https://www.naval-technology.com/projects/ivan-papanin-project-23550-class-arctic-patrol-vessels/; https://ethz.ch/content/dam/ethz/special-interest/gess/cis/center-for-securities-studies/resources/docs/SIPRI%20Military-capabilities-in-the-Arctic.pdf).
04- O império tem tudo contra si no Ártico, inclusive em função do seu próprio carácter capitalista: não há gente, não há consumo e as condições de rigoroso frio impõem um grau de resistência e rusticidade humana que os Estados Unidos por si têm dificuldades em prover!... (https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2019/08/21/conheca-mais-sobre-a-groenlandia-novo-objeto-do-desejo-de-trump.htm).
A costa do Alasca no Ártico, comparativamente não possui, até pela sua curta dimensão, o valor geoestratégico ao nível da costa russa que possibilita a Rota Marítima do Norte à navegação entre o Extremo Oriente e a Europa Ocidental! (https://www.britannica.com/place/Alaska; https://www.alaska.gov/).
Por outro lado, enquanto a Rússia aumenta a população acima do Círculo Polar Árctico graças ao aumento incomensurável de actividade num horizonte de 15 anos, o Alaska actualmente assiste à diminuição da sua população!... (https://www.bbc.com/news/blogs-news-from-elsewhere-53431792; https://www.alaskapublic.org/2019/01/22/alaskas-population-is-down-for-the-second-year-in-a-row-why/; https://www.peninsulaclarion.com/news/state-population-decreases-while-borough-population-increases/).
Com o último exercício republicano do “empresário” Donald Trump as coisas ficaram tão grotescas que ele propôs a compra à Dinamarca da Groenlândia, inspirado na memória da compra do Alasca ao Tsar da Rússia: para ele, modelos de negócio do século XIX, são também exequíveis no século XXI… (https://vermelho.org.br/2019/08/29/compra-da-groenlandia-trump-nao-esta-tao-louco-quanto-parece/; https://pt.wikipedia.org/wiki/Compra_do_Alasca).
É claro que na corrida pelo Ártico os Estados Unidos que sob o ponto de vista físico-geográfico e humano estão diminuídos, procuram desesperadamente recuperar a qualquer preço o tempo perdido e o espaço de manobra que está desaproveitado, mas à disposição de estados vassalos que fazem parte da NATO, como o Canadá, a Dinamarca ou a Noruega, ao invés de apostar desde logo no Alaska!… (https://iopscience.iop.org/article/10.1088/1755-1315/27/1/012022/pdf; https://www.economist.com/europe/2020/05/10/america-and-britain-play-cold-war-games-with-russia-in-the-arctic).
Enquanto a Federação Russa vai sem entraves disseminando iniciativas, investimentos e cada vez mais comunidades migradas, sobretudo a partir de sua própria mobilização endógena, os Estados Unidos se conseguirem pôr o pé no Ártico com um território próprio para além do Alasca, correrão contra o tempo recrutando mercenários, conforme fazem em regiões consideradas com conjunturas “extremas” (nos negócios todos os factores são analisados pela aristocracia financeira mundial e seu manancial de “experts”)! (https://www.spglobal.com/marketintelligence/en/news-insights/latest-news-headlines/rising-temperatures-leave-russia-s-arctic-ambitions-on-thin-ice-59646990).
No extremo norte do planeta o império da hegemonia unipolar está cada vez mais anémico e com isso também se explica por que precisa continuar a alimentar a IIIª Guerra Mundial contra o Sul Global! (https://frenteantiimperialista.org/blog/2020/01/11/ahi-esta-la-iii-guerra-mundial/).
Martinho Júnior -- Luanda, 13 de Dezembro de 2020
Imagens:
01- GAC and Russia to develop Northern Sea Route – Putin said: “It is difficult to underestimate the significance of the most northern transport route in terms of geopolitics and geostrategy: it’s the framework of the whole infrastructure of the Russian arctic zone. The development and exploration of the Arctic is one of the priorities of the national strategy.” – GAC and Russia to develop Northern Sea Route (freightweek.org);
02- SOVCOMFLOT – https://www.slideshare.net/victorolerskiy/sovcomflot-fleet-overview;
03- O quebra-gelos nuclear Arktika é uma das mais modernas unidades de quebra-gelos que abre caminho nas Rotas Marítimas do Norte, uma das mais exclusivas Rotas da Seda ao serviço sobretudo da emergência multipolar – https://www.youtube.com/watch?v=KCTnOkHJLnI;
04- A Frota do Norte da federação Russa é de ordem geoestratégica – foto recolhida do Google Earth (base naval de Severomorsk, Murmansk);
05- Imagem parcial da nova Novy Urengoy, no distrito Iamália-Nenets, um dos maiores produtores de petróleo e gaz a norte do Círculo Polar Árctico – foto recolhida do Google Earth.
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