A agência reguladora sanitária dos Estados Unidos expressou nesta terça-feira (23) “preocupação” com a possibilidade do laboratório AstraZeneca ter incluído dados “desatualizados” nos testes clínicos neste país de sua vacina contra a covid-19, o que renova as dúvidas sobre a eficácia e segurança do fármaco
As suspeitas citadas nos Estados Unidos sobre uma das vacinas mais usadas no mundo acontece em um momento de agravamento da pandemia na Europa e América Latina, com novas restrições anunciadas para a Semana Santa em países como Alemanha e Brasil.
A gigante farmacêutica anglo-sueca defendeu nesta terça sua avaliação dos resultados de seus testes nos Estados Unidos e anunciou que vai publicar novos dados “em 48 horas” em resposta às preocupações levantadas pelo Instituto Americano de Alergias e Doenças Infecciosas (NIAID).
Horas antes, esse organismo mostrou sua “preocupação com o fato de que a AstraZeneca pode ter incluído informação desatualizada neste ensaio, o que pode ter levado a uma estimativa incompleta da eficácia”.
A AstraZeneca anunciou na segunda-feira que testes em mais de 32.000 pessoas nos Estados Unidos mostraram que a vacina tem eficácia de 79% para prevenir a covid-19 sintomática e de 100% para evitar as formas graves da doença e a hospitalização, além de garantir que não aumenta o risco de coágulos sanguíneos.
A vacina da AstraZeneca contra o coronavírus é mais barata e fácil de armazenar do que outras, mas vários países suspenderam temporariamente na semana passada a aplicação do fármaco devido a casos isolados de coágulos sanguíneos registrados em algumas pessoas que receberam a vacina.
A Agência Europeia de Medicamentos (EMA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS) a consideram segura e eficaz. A vacina voltou a ser administrada em vários países.
Mas a desconfiança persiste. Há uma outra suspeita sobre a AstraZeneca, já que as autoridades francesas disseram estar investigando a morte de um estudante de medicina de 26 anos dias depois de receber a vacina contra o novo coronavírus, embora tenham ressaltado que nenhuma ligação ainda tenha sido estabelecida.
Uma pesquisa do instituto YouGov, realizada entre 12 e 18 de março, mostrou que a maioria dos entrevistados nos principais países europeus têm dúvidas sobre a segurança da vacina da AstraZeneca.
Além disso, as autoridades europeias expressaram irritação porque o laboratório anglo-sueco cumpriu os prazos de entrega prometidos ao Reino Unido, mas não com a União Europeia, que recebeu somente 30% das doses prometidas para o primeiro trimestre.
“Uma nova pandemia”
A pressão é ainda maior porque a situação sanitária piora na Europa e no mundo, onde as mortes chegaram aos 2,7 milhões. A Alemanha, que enfrenta uma aceleração de contágios, reforçará o confinamento durante a Semana Santa, anunciou a chanceler Angela Merkel nesta terça-feira.
Após negociações de quase 12
horas com os estados federados, Merkel disse que a maioria dos estabelecimentos
comerciais permanecerão fechados e as cerimônias religiosas serão canceladas na
Alemanha de
A Alemanha entrou em uma “nova pandemia (…) claramente mais letal, claramente mais infecciosa e contagiosa durante mais tempo”, devido à propagação das variantes da covid-19, disse Merkel.
A França, que também tem novas restrições, vai abrir 35 grandes centros de vacinação “nos próximos dias” para acelerar o ritmo da imunização contra a covid-19, anunciou a ministra da Indústria, Agnès Pannier-Runacher, depois que o governo de Emmanuel Macron se tornou alvo de críticas pela lentidão da campanha.
Macron afirmou nesta terça-feira que o país deve vacinar “de manhã, tarde e noite” para vencer a covid-19. “Vamos mudar o ritmo até abril”, prometeu.
“Não há fins de semana nem feriados para a vacinação, que está no coração da batalha contra o vírus”, completou o presidente.
No entanto, a Comissão Europeia adotará na quarta-feira “uma revisão do mecanismo de autorização e transparência das exportações”, informou um porta-voz em Bruxelas.
A Holanda anunciou que estenderá suas restrições para enfrentar o novo coronavírus até 20 de abril, e a Ucrânia registrou o maior número de mortos desde o começo da crise na saúde, com 300 mortes nas últimas 24 horas.
O Reino Unido, por sua vez, recorda nesta terça-feira o aniversário do primeiro confinamento com um “Dia Nacional de Reflexão”, quando o Parlamento respeitará um minuto de silêncio em homenagem aos 126.000 mortos pela covid-19.
O Serviço Nacional de Saúde (NHS), submetido a uma enorme pressão devido à pandemia, recebeu uma boa notícia nesta terça-feira. Um quadro do artista britânico Banksy foi vendido por um preço recorde de 16,75 milhões de libras (23,1 milhões de dólares) em um leilão da Christie’s para arrecadar fundos para os profissionais da saúde.
Na Rússia, o presidente Vladimir Putin recebeu a primeira dose da vacina contra a covid-19, informou um porta-voz do governo.
Escassez de oxigénio no Brasil
Mais de 430 milhões de doses foram aplicadas em todo o mundo, sobretudo nos países mais ricos, enquanto muitas nações pobres ainda não receberam nenhuma vacina.
A América Latina sofre com a distribuição desigual e as restrições persistem na região devido ao aumento de casos de covid-19.
No Brasil, onde o quarto ministro da Saúde assumiu nesta terça-feira ao longo de um ano de pandemia, a preocupação mais urgente é o oxigênio: as reservas em seis dos 27 estados estão em níveis “preocupantes”, segundo a Procuradoria-Geral da República.
São Paulo, o estado mais populoso do país, registrou nesta terça-feira pela primeira vez mais de 1.000 mortes em um dia. E em Brasília, as unidades de terapia intensiva têm lista de espera, enquanto vídeos nas redes sociais mostram corpos nos corredores de um hospital, aguardando transferência para o necrotério.
A Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) alertou nesta terça sobre o “terrível” aumento de casos no Brasil e os vizinhos Venezuela, Bolívia e Peru.
A transmissão do vírus “continua aumentando em todo o Brasil”, disse em coletiva de imprensa a diretora da Opas, Carissa Etienne, considerando “crucial” que o país adote as medidas preventivas para frear a propagação do vírus.
No Brasil, que com 295.425 mortes e mais de 12 milhões de casos é o segundo país mais afetado do mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, o Rio de Janeiro anunciou 10 dias seguidos de feriado – de 26 de março a 4 de abril – para restringir ao máximo os deslocamentos, com toque de recolher noturno.
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, ordenou a prorrogação do confinamento durante a Semana Santa para frear o avanço da variante brasileira.
Etienne também apontou um aumento dos casos no Cone Sul, destacando a pressão que isso representa para o sistema de saúde do Paraguai, onde a maioria dos leitos de UTI está ocupada, e chamou a atenção para a “alarmante” situação no Uruguai, um pequeno país de 3,4 milhões de habitantes.
Plataforma | AFP
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