Não existe nazismo na Ucrânia ou a sua presença é insignificante, garantem os dirigentes ocidentais, tentando disfarçar as mãos sujas da cumplicidade com uma realidade que compromete o seu discurso oficial.
José Goulão | AbrilAbril | opinião
As posições das autoridades portuguesas e da casta política dominante perante a guerra na Ucrânia, fundidas na matriz estrangeirada e inquisitorial, acéfalas, hipotecando até a segurança, a qualidade de vida e o direito dos portugueses a uma vida decente marcam uma viragem histórica e revoltante ao nível nacional.
Esta ruptura vinha-se adivinhando a partir do momento em que a fiscalização constitucional passou a ignorar a Constituição da República e o carácter fundamental antifascista das suas origens ao permitir a legalização de organizações aferradas ao passado salazarista.
A situação actual representa, contudo, uma alteração qualitativa na sociedade, aquela em que, sempre com base em «compromissos internacionais» nos quais os portugueses não foram tidos e achados, a clique oligárquica dominante tenta ostensivamente soterrar o 25 de Abril; não hesitando, para isso, em dar todo o espaço do mundo aos revanchistas que nunca desistiram de humilhar e aviltar a Revolução enxovalhando os seus valores fundadores e também os patriotas que arriscaram e deram a vida por eles. Com a agravante de esses mesmos revanchistas e os que se foram tornando seus cúmplices ao longo de quase cinco décadas não hesitarem em admitir a interferência nazi internacional na tentativa de esmagamento dos valores que formataram a democracia portuguesa com características únicas. Essas particularidades distinguiam-na ainda dos modelos corrompidos das democracias (neo) liberais funcionando dentro de um espaço político único que determina a exclusão de projectos diferentes, oprime a diversidade, apaga a História, trucida o patriotismo e assume cada vez mais tendências autoritárias com espírito totalitário. Agora, em Portugal, as diferenças esbateram-se mais um pouco e sobrevivem sobretudo nas memórias e na coragem de acreditar dos que ainda não têm a cabeça em formato de ecrã de televisão.
O golpe profundo no 25 de Abril foi dado durante as comemorações deste ano e os desenvolvimentos degradantes prosseguem com as atitudes que estão a ser tomadas pelos órgãos de poder, principalmente desde que entregaram o epicentro das comemorações – foi assim que a manobra funcionou – a um indivíduo comprometido com um aparelho nazi que domina a Ucrânia Ocidental e funciona como centro de expansão de correntes e organizações nazifascistas através da Europa, como vamos percebendo entre nós. E que serve o enraizamento ainda mais profundo do neoliberalismo globalista na desesperada tentativa de sobrevivência através de uma espécie de último recurso: o regresso às origens através do suporte da economia totalitária por poderes políticos ditatoriais. Exemplos também circulam entre nós.
Vamos a factos, e apenas a factos, sobre o indivíduo em causa, Volodymir Zelensky, e o seu regime de base nazi em vigor na Ucrânia desde 2014, muitos anos antes da invasão militar russa do país.
O poder político de Kiev é sustentado por uma nuvem de organizações e indivíduos nazis e assenta na identificação plena de um nacionalismo xenófobo com a herança nazi que remonta ao período da própria ascensão do nacional-socialismo na Alemanha. O seu desenvolvimento centrou-se originalmente na ideia de independência assumida contra o poder soviético em finais dos anos trinta e na primeira metade dos anos quarenta do século passado e teve então como alvos principais os polacos, judeus e resistentes soviéticos, vítimas de carnificinas em massa cometidas por várias organizações nacionalistas ucranianas em parceria com as tropas invasoras hitlerianas.
Os nazis ucranianos de hoje – nazis mesmo, não neonazis nem neofascistas porque as suas referências em termos de figuras veneradas e acções concretizadas remontam aos tempos da colaboração com Hitler – viraram as miras contra tudo o que seja «russo» ou «pró-russo» em nome da defesa de alegada pureza de sangue e da superioridade branca. Andriy Biletsky, fundador de várias das actuais organizações nazis, entre elas o partido Svoboda e o Movimento/Batalhão Azov, incorporado na Guarda Nacional, teorizou sobre essas matérias e também sobre a necessidade de promover uma «cruzada branca»; as ideias do «führer branco», como Biletsky é conhecido, servem de cartilha nos campos de juventude organizados por entidades estatais, geridos pelo Movimento Azov e nos quais é ministrado treino militar a adolescentes e pré-adolescentes. Os conteúdos xenófobos defendendo a suposta superioridade genética sobre os russos, considerados «sub-humanos», fazem parte dos livros escolares oficiais, transformados em instrumentos doutrinários do regime de apartheid.
Estas ideias, tornadas dominantes nos círculos do poder de Kiev através de mecanismos bem pouco democráticos, estiveram na origem da guerra lançada pelo poder resultante do golpe da Praça Maidan, em 2014, contra as regiões do Centro e Leste do país habitadas maioritariamente por ucranianos de origem russa. No espírito e na prática trata-se de uma tentativa de limpeza étnica que se prolonga há oito anos, por muito que a evocação desta realidade contrarie dirigentes políticos e diplomatas a quem compete «vender» uma imagem democrática ao Ocidente, uma preocupação que, afinal, nem tem razão de ser tal a compreensão perante tudo o que se passa a partir da capital ucraniana.
Na campanha eleitoral de 2019,
De então para cá não só as amarras nazis condicionam o comportamento do ex-comediante protegido do oligarca nazi Ihor Kolomoisky como também os tutores ocidentais o impedem de acabar com a guerra através de negociações. Trata-se de fazer cumprir a estratégia de Washington e Bruxelas de forçarem Moscovo a um conflito prolongado como forma de «enfraquecer a Rússia», afinal o grande objectivo imperial em nome da sobrevivência da unipolaridade. Os ucranianos, de Oeste ou Leste, são o que menos importa no seu papel de carne para canhão.
Não existe nazismo na Ucrânia ou a sua presença é insignificante, garantem os dirigentes ocidentais tentando disfarçar as mãos sujas da cumplicidade com uma realidade que compromete o seu discurso oficial. Além do cenário político já enunciado, a insuspeita agência Reuters testemunha que os corpos militares nazis e os mercenários estrangeiros que eles enquadram dentro das forças armadas ucranianas totalizam pelo menos cem mil efectivos. Além disso, qualquer unidade do exército integra elementos de controlo político pertencentes aos batalhões nazis, que se têm distinguido, por exemplo, na oposição a rendições baleando pelas costas os militares prontos a depor as armas; e também pela utilização de zonas residenciais e do sequestro de civis como escudos humanos (à maneira do Isis) para tentar evitar ataques inimigos, práticas que são proibidas pelas convenções internacionais.
A verdade é que o idolatrado Zelensky – imagem fabricada por 150 agências de comunicação internacionais pagas a preço de ouro – não se fez rogado na caminhada nazi: proibiu a língua russa, fechou os meios de comunicação em russo, ilegalizou todos os partidos da oposição, confirmando assim que as organizações nazis fazem parte da estrutura de poder ao deixá-las incólumes; montou uma operação militar de blitzkrieg para «retomar» as regiões Leste, frustrada pela antecipação da invasão russa; elimina regularmente adversários políticos; encerrou estações de televisão e obrigou as remanescentes a terem o mesmo padrão de informação, determinado pelo governo – uma coisa que, quando praticada noutras paragens, costuma chamar-se censura; faz circular uma lista de nomes (Peacemaker, Myrotvorets) incitando à perseguição de cidadãos considerados «inimigos do Estado» e expondo os seus principais dados de identificação. Para alguém passar a fazer parte dessa fonte para execuções extrajudiciais basta que critique a «revolução de Maidan» ou contrarie a agenda nazi.
Esta lista é administrada pelos serviços secretos ucranianos, SBU, também conhecidos pela «Gestapo de Kiev» e dirigidos pelo «Estrangulador», nomeado recentemente por Zelensky. Vários membros da lista vão desaparecendo paulatinamente, entre eles dirigentes políticos que não estão de acordo com o regime, jornalistas, blogueiros, até um membro da delegação da Ucrânia às negociações com a Rússia, considerado «traidor». É pena que o Ocidente, autoproclamado juiz em matéria de direitos humanos e valores democráticos, não tenha ou não queira tomar conhecimento destes casos extremos da perseguição política tão próprios de regimes nazi-fascistas.
O método da «lista de paz» parece, contudo, não se circunscrever à Ucrânia e existem indícios de que já foi exportado. Também a chamada «Associação de Imigrantes Ucranianos» em Portugal, em cujas manifestações, em locais públicos, se reclama a ilegalização do Partido Comunista Português, tem a sua lista de delação, melhor dizendo de bufaria fascista, adoptando a linguagem comum dos tempos negros em Portugal, que administra em conjunto com as secretas portuguesas na caça aos «amigos de Putin». O que nos leva a pôr a legítima hipótese de a dita associação funcionar como ramo do famigerado SBU, situação que diz muito sobre a permeabilidade das autoridades portuguesas, a começar pelo governo, às infiltrações nazis externas de que o regime de Kiev é um dos centros emissores.
Se em tempos se argumentou que não deveriam entrar refugiados sírios e de outras áreas do Médio Oriente na União Europeia para evitar a infiltração de membros terroristas do Isis, estranha-se que não se revele a mesma preocupação perante o ingresso de «refugiados de guerra» ucranianos com idades para estarem mobilizados nas fileiras do seu exército nacional. Há os que exibem automóveis de topo de gama com matrícula ucraniana por essa Europa fora, pelo que também podem existir os que trazem habilitações e missões conspirativas. É só uma hipótese, seguindo a lógica de comportamento do regime de Kiev. Pelo que já se percebeu, os métodos de infiltração e ingerência são bastante expeditos. No entanto, o venerando chefe do Estado acha que devem ser investigados os conteúdos da lista de delação da associação ucraniana em Portugal, o que parece efectivamente curto – restritivo, parcial e preconceituoso – em relação ao que está em causa numa situação de guerra para a qual as autoridades nacionais e os seus megafones arrastaram irresponsavelmente o país. No mínimo seria razoável que o presidente-militante mandasse averiguar também os comportamentos e ligações da citada associação de ucranianos. Em nome do respeito pela dignidade, a independência, o patriotismo e o papel democrático dos portugueses e de instituições que os representam e cuja história, mesmo que dizendo pouco ao venerando chefe de Estado, é impossível de apagar.
Imagem: O batalhão Azov, apoiado pela NATO e pelas lideranças da UE e dos EUA, e tratado pelos "mainstream media" ocidentais como «nacionalistas ucranianos» ou «admiradores de Stepan Bandera», usa o símbolo nazi "Wolfsangel" na sua bandeira e uma das tropas de choque preferidas do governo de Kiev, no Leste como no resto do país. / twitter
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