sexta-feira, 22 de julho de 2022

E LAGARDE, DEMITE-SE?

Domingos de Andrade | TSF | opinião

Há na política, portuguesa e europeia, uma permanente desresponsabilização quando a inação, ou a ação errada, tem consequências graves para as pessoas, encontrando bodes expiatórios em acontecimentos externos. A guerra na Ucrânia é um desses casos de passa-culpas da inflação, que come o salário dos portugueses a uma velocidade vertiginosa. Segue um drama em três atos.

A má avaliação. Recuar a maio do ano passado e olhar para os números do Eurostat, o serviço de estatística da União Europeia, é perceber o início da caminhada inflacionista até chegar aos 4,9% em novembro, acima da meta do Banco Central Europeu, que é de 2%. É o momento em que a instituição começa a levar as coisas a sério, porque até aí os sinais foram todos errados e contraditórios.

Atraso na terapia. Enquanto, em julho do ano passado, os Estados Unidos anunciavam políticas de controlo da moeda e aumento das taxas de juro, o BCE divulgava a sua nova estratégia situando nos 2%, nem mais nem menos, o limite da inflação, justificando que a anterior representava um viés deflacionista. Do lado de lá do Atlântico, acautelam, do lado de cá Christine Lagarde apontava uma trajetória para a correção da inflação que se revelava desastrosa, dizendo há meio ano que não previa a subida das taxas de juro antes de 2023, desdizendo-se agora quando com desplante afirma que tão cedo não vamos regressar aos níveis anteriores. A perda de credibilidade da presidente do BCE, perante o que está a acontecer e a hecatombe que se aproxima para as famílias, deveria levá-la a pedir a demissão. Mas não.

Das consequências. Não parece haver dúvidas de que o BCE avançará para políticas monetárias mais fortes, que levarão a uma recessão violenta e mais prolongada do que aquela que teríamos se as medidas tivessem sido tomadas em tempo. Nem parecem restar dúvidas de que a conflitualidade social e geracional, de novos a não quererem pagar os aumentos das pensões dos mais velhos, tem um pasto enorme para lavrar. Como não devemos ter dúvidas do que isso pode representar politicamente: um crescimento imparável dos extremismos.

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