domingo, 7 de agosto de 2022

JORNALISMO ANGOLANO CORRE PERIGO DE MORTE – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A queixa dos accionistas da Sociedade Civil em consórcio com a UNITA entrou hoje no Tribunal Supremo. Os visados são o titular do poder Executivo, João Lourenço, a Entidade Reguladora para a Comunicação Social Angolana (ERCA) e os conselhos de administração da TPA, RNA e Jornal de Angola. Também foi metida a administração da TV Zimbo no pacote, ainda que não pertença ao sector empresarial do Estado. A ANGOP ficou de fora porque os queixosos não podiam invocar os mesmos argumentos mentirosos e falaciosos contra a agência noticiosa.

Motivos da queixa: Actuação desequilibrada dos Media do sector empresarial do Estado e “desinformação desenfreada que prejudica a consolidação de um Estado Democrático e de Direito”. Os Media públicos “são instrumentos de propaganda política do MPLA” E ainda a “Violação do dever de isenção, já que nem todos os intervenientes têm a mesma oportunidade de se pronunciarem sobre os factos, mediante contraditório”. Os accionistas da Sociedade Civil em consórcio com a UNITA dizem que “os Media públicos demonstram de forma inequívoca e assustadora a violação de todos os princípios consagrados na Constituição”. E são “um sepulcro das normas de ética e deontologia próprias da profissão jornalística”.

Ponto prévio. Nas eleições de 2017 o MPLA teve 61,05 por cento dos votos e elegeu 150 deputados. O maior partido da Oposição, UNITA, teve 26,7 por cento dos votos e elegeu 51 deputados. Esta realidade política e social tem obrigatoriamente de ser reflectida nos Media angolanos. Salvo os confessionais ou partidários.

Hoje escrevo para as minhas e os meus camaradas de profissão. Por dever de ofício. Por respeito à classe da qual faço parte há mais de 55 anos. Em solidariedade com todas e todos que começaram comigo a dar os primeiros passos no Jornalismo. Alerta, camaradas! Os accionistas da Sociedade Civil em consórcio com a UNITA revelaram-se perigosas e perigosos adeptos da censura. A sua atitude é, sem dúvidas, terrorismo censório. Intimidação. Falta de respeito pelos profissionais da comunicação social. Desprezo pelas instituições democráticas.

O terrorismo censório das e dos signatários da “acção popular” sim, é assustador. Se a UNITA ganhar as eleições já sabem o que aí vem: Um polícia por trás da secretária de cada jornalista. Invocando argumentos falaciosos, vão impor a cada profissional a sua agenda. Vão transformar as Redacções em sepulcros de notícias. Vão meter na cadeia quem não obedecer ao Carlos Rosado de Carvalho, ao Teixeira Cândido, ao Reginaldo da Silva e outros polícias do consórcio. Vamos ser submetidos ao pensamento único.

Quem define a linha editorial de um órgão de comunicação social é a sua Direcção. Só os jornalistas têm esse direito. As administrações das empresas não podem interferir na linha editorial. É proibido por Lei. Os jornalistas têm o dever ético e deontológico de recusarem qualquer ordem que não venha de profissionais investidos em cargos de edição, chefia e direcção. Os donos são donos. Os patrões são patrões. Mas não podem interferir na linha editorial dos Media e muto menos no trabalho dos Jornalistas. 

Os accionistas da Sociedade Civil em consórcio com a UNITA querem os donos a mandar nos Jornalistas porque são sua propriedade como as máquinas ou os móveis. Querem os patrões a impor-nos os seus interesses económicos, sociais ou políticos como se fossemos serventes, funcionários administrativos, técnicos ou gestores. Não. Somos Jornalistas e nenhum dono, nenhum patrão tem o direito de interferir no nosso trabalho. Só os nossos iguais, investidos em funções de edição, chefia e direcção.

 Isto quer dizer que os accionistas da Sociedade Civil em consórcio com a UNITA querem impor-nos o terrorismo censório, por via dos Conselhos der Administração. E o Sindicato dos Jornalistas prima pelo silêncio! Não sai em defesa da classe ameaçada como nunca. Sei do que falo. Nem no tempo do colonialismo os Jornalistas foram tão ameaçados individualmente. E o poder tinha as comissões de “censura prévia”. O último chefe dos censores, secretário do governador-geral, era o Dr. Tota. Nunca se atreveu a exigir de um Tribunal que os donos metessem os jornalistas na ordem. Como agora fazem os accionistas da Sociedade Civil em nome da UNITA e da sua secção de informação, o Sindicato dos Jornalistas.

Não preciso de vos recordar, caras e caros camaradas de profissão, que num parágrafo se pode passar uma mensagem mais importante do que numa página inteira. Em dez segundos de Rádio ou Televisão podemos passar uma mensagem informativa mais completa do que numa hora de conversa blá blá blá. Todos sabemos que há profissionais mais prolixos do que outros. Mais diligentes do que outros. Mais tecnicistas do que outros. Mais competentes do que outros. Não é ao segundo que se mede o acto de informar. É pelos conteúdos comunicacionais.  No audiovisual, tempo a mais destrói a mensagem informativa.

Para escrever este texto estive a analisar os noticiários da TPA e da RNA ontem e hoje. Vou ao exemplo mais recente. A TPA fez a cobertura do comício de João Lourenço no Uíge. Contei dez minutos da intervenção em directo do cabeça de lista do MPLA. Nesse período só falou de assuntos de grande interesse para os eleitores da província. Depois transmitiu uma mensagem política importante que interessava a todos os eleitores. Sabem o que aconteceu? Essa parte já não tinha ninguém com a atenção gerada pela expectativa. Toda a audiência estava desligada. 

Devido a essa falha querem prender os profissionais da RNA? Querem matá-los? Querem crucificá-los na praça pública? Nós não deixamos, senhoras e senhores accionistas! Sabem como se fazia isso segundo as regras? O comício podia entrar em directo mas apenas com imagens. O jornalista captava os fragmentos de informação essenciais e produzia a mensagem. Mas apenas enquanto tivesse à disposição a atenção gerada pela expectativa. Noutros serviços noticiosos passavam a mensagem de interesse geral, pela boca do candidato. 

Não fizeram assim. Prestaram um mau serviço ao candidato, ao MPLA e ao auditório daTPA. Paciência, nas próximas eleições vamos fazer melhor. Coragem camaradas! No Jornalismo é aprender até morrer. Não precisamos do terrorismo censório dos accionistas da Sociedade Civil em consórcio com a UNITA e a sua repartição de informação, o Sindicato dos Jornalistas.  E se os profissionais que fizeram a cobertura do comício na Uíge, que eu considero errada, acham que é assim mesmo que devem fazer? 

Quem sou eu para criticá-los. Cada qual tem o seu jeito e as suas técnicas. Os accionistas querem que lhes tirem o emprego. O pão dos filhos. Terroristas, censores e praticantes do banditismo político. Todas e todos os subscritores da acção popular. Sem excepção.

O senhor Reginaldo Silva foi indicado para a ERCA pelo Sindicato dos Jornalistas, repartição de informação da UNITA. Pelo seu comportamento insultuoso e contrário às regras da instituição, já há muito que lhe deviam ter retirado a confiança. A direcção sindical não o fez porque precisa dele para subverter o regime democrático. Desde logo porque temos uma organização sindical que em vez de defender a classe, coloca-se ao lado dos inimigos do Jornalismo Angolano, dos mentores do terrorismo censório, dos ditadores à moda da Jamba.

A Entidade Reguladora para a Comunicação Social Angolana (ERCA) é um órgão independente que tem por missão assegurar a objectividade e a isenção da Informação e salvaguardar a liberdade de expressão e de pensamento nos Media, em conformidade com os direitos consagrados na Constituição e na Lei.  

A Lei nº2/17, define a ERCA como uma pessoa colectiva de direito público, dotada de autonomia administrativa, financeira e patrimonial. O seu Conselho Directivo é um órgão colegial e tem 11 membros, sendo cinco indicados pelo partido com maioria na Assembleia Nacional, três pelos partidos da Oposição parlamentar, um pelo Executivo e dois pelas organizações representativas da profissão. O presidente da Assembleia Nacional dá posse aos membros do Conselho Directivo no início de cada legislatura e o seu mandato é de cinco anos.

Todas e todos os que pertencem ao Conselho Directivo da ERCA sabem que o partido maioritário na Assembleia Nacional indica cinco representantes. A Oposição três, o Executivo um e as organizações de classe dois. O senhor Reginaldo Silva, indicado pelo Sindicato dos Jornalistas, vem agora dizer que difama e injuria a instituição à qual pertence, porque tem de tornar as suas posições públicas “já que internamente há uma maioria política que é favorável ao Governo e ao MPLA e devido a esta composição, existe um bloqueio interno”.

Isto é muito grave. Reginaldo Silva, quando tomou posse em 2017 sabia qual era a composição do Conselho Directivo da ERCA. Mas agora vem dizer que há uma maioria favorável ao MPLA e ao Governo como se não soubesse antes. Isto é próprio de um leproso moral, indigno de representar os jornalistas nem que seja numa kibanga de porcos. Mas o sindicato não lhe retira a confiança. Porque ele está a trabalhar para os donos. E trabalhando para o terrorismo censório e o banditismo político, está a destruir o Jornalismo Angolano e o regime democrático. 

Este servente dos accionistas da Sociedade Civil em consórcio com a UNITA quer que a ERCA interfira na campanha eleitoral. Mas não pode! Como não pode interferir na cobertura de qualquer acontecimento. O problema é que estes serventes dos políticos à moda da Jamba querem que a ERCA seja uma esquadra da polícia, um esquadrão da morte treinado pelo Chivukuvuku, um grupo violento do Nelito Ekuikui. Querem intimidar os jornalistas. Querem destruir a liberdade de expressão. Já falharam. No dia 24 de Agosto os acciponistas da Sociedade Civil em consórcio com a UNITA vão ser reduzidos à sua insignificância.

*Jornalista

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