domingo, 4 de setembro de 2022

Angola | A DERROTA VITORIOSA E O EMPATE TÉCNICO – Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A UNITA está habituada a sofrer tremendas derrotas mas feitas as contas ganha muito. O colonialismo foi derrotado e essa derrota significou o fim do império colonial português. A UNITA fez a guerra ao lado dos derrotados. Integrou os dois melhores comandantes, treinados na República Popular das China (majores Pedro e Sachilombo), nos Flechas da PIDE. Feitas as contas, ganhou o estatuto de movimento de libertação e um lugar na mesa das negociações com a potência colonial, que culminaram com a assinatura do Acordo de Alvor.

Os derrotados da UNITA só tiveram direito ao estatuto de movimento de libertação quando Angola estava libertada. Lisboa fez tudo por isso, com a prestimosa ajuda do MPLA, que empenhou a sua diplomacia para que a OUA (hoje União Africana) fizesse o reconhecimento. Sem esse passo, Jonas Savimbi não podia participar no processo de descolonização. Grande vitória dos derrotados pelo 25 de Abril de 1974.

Os independentistas brancos lançaram, logo em Maio de 1974, esquadrões da morte que matavam as populações dos musseques. Criavam a violência e o caos em Luanda, para arranjarem um pretexto que lhes permitisse declarar unilateralmente a independência, marginalizando as autoridades progressistas de Lisboa. Jonas Savimbi e a UNITA alinharam com os ricaços de Angola. No dia 28 de Setembro de 1974, o golpe foi posto em marcha em Portugal. Se triunfasse, Angola e Moçambique passavam a ser governados pela minoria branca e o regime seria igual ao da África do Sul e da Rodésia de Ian Smith (Zimbabwe). Os golpistas foram derrotados em Lisboa, Luanda e Maputo. Spínola foi afastado do poder. 

Todos perderam menos a UNITA, que ganhou muito com a derrota dos seus aliados. Para não criar obstáculos ao processo de descolonização, o próprio MFA fez tudo para que Savimbi e a sua organização fantoche adquirissem estatuto de movimento de libertação para as negociações com vista à Independência Nacional. Os derrotados tiveram uma grande vitória.

A UNITA participou nas negociações e como movimento de libertação fez parte do Governo de Transição com ministros e secretários de Estado em paridade com a FNLA e o MPLA. Tremenda vitória dos derrotados!

Mobutu, Spínola e Nixon decidiram que o MPLA ia ficar de fora do processo de descolonização e Angola seria partilhada pela FNLA e a UNITA. O plano principal era criar uma Angola presidida por Holden Roberto e outra, a Sul do Cuanza, presidida por Jonas Savimbi. Depois os patrões de Washington e das grandes capitais europeias ditavam as suas ordens. O plano foi estrondosamente derrotado.

O Povo Angolano colocou-se maciçamente ao lado do MPLA e o projecto foi derrotado na Grande Batalha de Luanda, primeira fase. As tropas zairenses acobertadas pelo ELNA, braço armado da FNLA, foram derrotadas pelos luandenses em armas. Os ministros e secretários de Estado da FNLA e da UNITA abandonaram o Governo de Transição. José Ndele (UNITA) e Johnny Pinock Eduardo (FNLA) abandonaram o Colégio Presidencial. Só ficou o alto-comissário almirante Leonel Cardoso e o representante do MPLA, Lopo do Nascimento. 

A guerra alastrou a todo o país. Tropas zairenses, mercenários, militares portugueses que eram contra o 25 de Abril, e mercenários invadiram o Norte de Angola para imporem Holden Roberto no Poder. Pela fronteira sul, milhares de militares sul-africanos invadiram o país para impedirem o 11 de Novembro e criarem a república negra a Sul do Cuanza, que seria liderada por Jonas Savimbi. 

Em Cabinda os invasores foram derrotados na Grande Batalha do Ntó. Os invasores nunca chegaram a Luanda porque foram derrotados na Grande Batalha de Kifangondo. Os sul-africanos foram derrotados na Grande Batalha de Luena e na Grande Batalha do Ebo. O plano de Lisboa, Kinshasa e Pretória foi esmagado nos campos de batalha. Derrotados! Mas a UNITA, derrotada com os sul-africanos, ganhou largamente!

Os sul-africanos treinaram um grande exército que integraram na UNITA. Washington entrou com o armamento e largos financiamentos. Paris, Bona, Londres e Bruxelas deram trudo o que foi preciso para Savimbi fazer o papel de grande defensor da democracia em Angola! Os donos puseram a circular que ele lutava contra russos e cubanos para impedir o comunismo em África! Mário Soares distinguiu-se na execução da vigarice.

Savimbi e seus sicários, derrotados antes do 11 de Novembro de 1975, receberam milhares de milhões para fazerem o papel de libertadores ao lado do regime racista de Pretória! A aventura dos sul-africanos acabou no Triângulo do Tumpo e no Cunene. Uma derrota militar humilhante que levou o governo de Pretória e negociar em Nova Iorque. A capitulação do regime racista foi uma derrota para a UNITA. Mas os derrotados ganharam e não foi pouco. 

Órfãos do regime racista, os sicários da UNITA foram recuperados para não se tornarem um perigo para a paz em Angola, Namíbia e África do Sul. O movimento tinha mais de 25 mil homens armados, inclusive com mísseis terra-ar stinger, oferecidos por Reagan. Era perigoso fazer deles uns párias escorraçados por todos. O regime de apartheid tinha acabado. Mas osd criados sentaram-se na mesa de negociações em Bicesse. Grande vitória dos derrotados. 

A direcção da UNITA só sabe matar e destruir. Os seus dirigentes e militantes nunca fizeram mais nada. Nem sabem. Odeiam a liberdade e a democracia, Só descansam quando Angola desaparecer do mapa. Até lá sentam-se na Assembleia Nacional cobertos de mordomias e rendimentos milionários. Têm sido estrondosamente derrotados nas eleições. Mas ganham cada vez mais mordomias, mais dinheiro, mais prédios, mais fazendas, mais negócios escuros, mais diamantes de sangue.

Ao longo dos anos, a UNITA foi recrutando tudo quanto é banditismo político e social. Vejam onde estão dirigentes e figuras cimeiras dos partidos extintos por falta de votos. Contem quantas organizações da sociedade civil são a base de apoio do Galo Negro. Todos juntos contra o Estado Angolano. Contra o regime democrático. Contra Angola. 

A OMUNGA/UNITA acusa a Polícia Nacional de tortura porque prendeu desordeiros e vândalos no Lobito. Chama-lhes “jovens activistas” e exige a intervenção do Ministério Público! O delírio vai ao ponto de considerar que existe “uma onda de violência praticada pelas forças da ordem e segurança”. O Movimento Mudei/UNITA veio dizer, pela voz de Luaty Beirão (revu/galo claro) que contou os votos e afinal ninguém ganhou as eleições. Há um empate técnico entre quem ganhou, o MPLA, e os derrotados, a UNITA. Mais uma vez a UNITA averbou uma derrota vitoriosa. No mínimo, um empate!

A agência noticiosa Lusa, citando uma fonte anónima da UNITA, informou que “entrou no Tribunal Constitucional, na quinta-feira, um pedido de anulação das Eleições Gerais de 24 de Agosto”. Mauro Alexandre, director do Gabinete dos Partidos Políticos do Tribunal Constitucional, chamou os jornalistas para lhes dizer que a notícia é falsa.

Para a comunicação social portuguesa, Angola já não é colónia de Portugal mas é terra de ninguém. Em mais nenhum país do mundo as autoridades admitiam que uma agência noticiosa divulgasse uma notícia falsa. Em Angola é possível. Os derrotados ganham imenso.

Já sabemos que os derrotados vitoriosos não pediram a anulação das eleições. Só querem ganhar porque perderam. Como sempre.

UNITA e CASA-CE apresentaram dois requerimentos (um cada) ao Tribunal Constitucional nas vestes de Tribunal Eleitoral. Aguardam pela resposta. Ela há-de vir em 72 horas a partir da entrada dos documentos. Sem paragens. Os derrotados vão ser mesmo derrotados mas ganham imenso. Agora vão ter 90 inúteis na Assembleia Nacional enchendo os bolsos sem fazerem literalmente nada. São os novos marimbondos! Estavam a fazer falta. 

Os derrotados vitoriosos querem uma recontagem dos votos. O Tribunal Constitucional nada tem a ver com isso. A Comissão Nacional Eleitoral é a única entidade que pode aceitar ou rejeitar tal pedido. Já rejeitou. O MPLA ganhou. E hoje comemorou a vitória em todo o país. Sobretudo em Luanda. Os derrotados também comemoraram. Já começaram a distribuir mordomias e dinheiros pelos gangues que vão tentar destruir a democracia. Não passarão! 

As Comissões Provinciais Eleitorais encerraram todas as suas actividades. O processo eleitoral acabou. E nenhuma recebeu qualquer reclamação oficial das forças políticas concorrentes às eleições gerais de 24 de Agosto. Os derrotados sabem que foram derrotados mas tentam ganhar alguma coisa. E como sempre, vão ganhar. Que o digam aqueles generais que acompanhavam o Savimbi e quando estavam para levar o tiro de misericórdia foram salvos pelo Presidente José Eduardo dos Santos. Agora falam grosso e vivem melhor do que os generais angolanos que ganharam a guerra! Derrotados ou empatados altamente vitoriosos!

*Jornalista

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