Este mundo não é para os pobres. Este país também não
Margarida Cardoso | Expresso (curto)
Bom Dia!
Bem vindo a mais um Expresso Curto, 33 anos depois de os ministros da
Defesa da NATO anunciarem a redução de 80 por cento das armas nucleares táticas
na Europa
Sabia que há mais de dois milhões de pobres em Portugal, o país da
Europa que mais se afundou nas condições de vida, mas cada português deita fora meio quilo de comida por dia? Já leu no Expresso
que a meta de retirar 600 mil pessoas da situação de pobreza até
2030 fica comprometida quando a inflação encolhe o salário mínimo de
705 euros para 639 euros? Acompanhou a reportagem pelas noites de quem está só e sem casa nas
ruas de Lisboa? Na última edição do semanário, chocou-se com os relatos recolhidos em diferentes pontos do país sobre a
procura das urgências do Serviço Nacional de Saúde por utentes que simulam
doenças para garantirem um prato de comida e um pouco de companhia?
Para lá das fronteiras nacionais, há alertas lançados pelo FMI a revelar que 345 milhões de pessoas
passam fome no mundo e 860 milhões estão malnutridas, a alertar para a
fome em África, um continente onde 123 milhões de pessoas correm o risco de morrer de fome. Um apelo lançado por ONG´s de 75 países à Assembleia Geral da ONU recorda
que a cada 4 segundos morre uma pessoa no mundo por fome. O Banco Mundial diz que a pobreza na Ucrânia é agora 10
vezes superior à registada no início da guerra.
Neste Dia Mundial para a Erradicação da Pobreza que também é o Dia
Internacional dos Sem-Abrigo, basta uma busca rápida na internet para
encontrar histórias de vida, dados, notícias, a chamar à atenção para a fome,
para a pobreza, para quem vive na rua sem poder dizer “no conforto
pobrezinho do meu lar há fartura de carinho”, como canta Amália Rodrigues em Uma
Casa Portuguesa.
“É urgente colocar a fome na agenda. A situação é dramática”, diz ao Expresso o
padre Rubens Marques, da paróquia portuense de Nossa Senhora da Conceição,
no Marquês, onde funciona desde 2009 um restaurante solidário.
Com o apoio de voluntários e amigos, serve 390 refeições diárias a quem
tem fome na cidade. “A procura mais do que duplicou comparativamente
ao período pré-pandemia e abrange idosos que esgotam a reforma a pagar o quarto
e já nem têm dinheiro para os medicamentos, sem-abrigo, famílias com dificuldades,
crianças, imigrantes, em especial de Marrocos e da Argélia”, conta.
Quem vai à paróquia entre as 18h e as 20h come uma refeição e leva um kit-merenda
para casa, tudo preparado por um grupo de 60 voluntários “a que é preciso
juntar rapidamente mais mãos para responder à procura crescente”, admite.
A crise reflete-se aqui duplamente: “Os pedidos aumentam e, ao mesmo tempo, a
ajuda diminui”, resume Rubens Marques. “Com a inflação, as famílias que faziam
donativos começam a ter problemas para gerir os seus próprios orçamentos e
retraem-se nas ofertas. Com a subida de custos de produção e a quebra na
procura, as empresas que nos ajudam têm a vida mais difícil e também reduzem os
apoios”, explica.
Das histórias que vai ouvindo, percebe que “a fome é muitas vezes agravada
pela solidão”, por isso acredita ser “importante recuperar as velhas relações
de vizinhança”, “estar mais atento ao próximo” e “avançar urgentemente com
soluções estruturais”. Afinal, está a trabalhar apenas “para uma resposta de
emergência, por isso mesmo insuficiente”.
Tem-se apercebido “de um ciclo de pobreza que envolve famílias inteiras e já
começa a atravessar gerações”, “ de uma pobreza mais visível na paisagem
urbana, desde logo pelo aumento do número dos sem-abrigo”, em especial na baixa
do Porto, do Terreiro da Sé às ruas de Santa Catarina, 31 de Janeiro, Sá
da Bandeira e Alves da Veiga, assim como
Tem-se apercebido, também, que faltam cada vez mais respostas para quem
quer sair da rua porque “os quartos acabaram na cidade, os centros de
emergência estão cheios e não temos a oferta de segunda linha para
alojamento prolongado”. Na prática, isto significa que “a passagem pelo centro
de emergência, em vez de ser por um dia, se vai prolongando”. “Já temos
pessoas à espera de uma solução para sair da rua há meses”, nota.
E o que vai fazer hoje para assinalar este dia dedicado à pobreza e aos
sem-abrigo? Na agenda de Rubens Marques está uma peça de teatro promovida pelo
NPISA Porto - Núcleo de Planeamento e Intervenção Sem-Abrigo do Porto: Um
grupo de sem-abrigo frequentou uma oficina de formação e sobe ao palco às 17h,
na Casa do Infante, “para mostrar as suas qualidades artísticas e surpreender
quem quiser ir até lá vê-los atuar”, conta.
OUTRAS NOTÍCIAS
Brasil O presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, revelou num podcast ter sentido atração por adolescentes venezuelanas que
se preparavam para “ganhar a vida” e incendiou as redes sociais, onde foi
acusado de “nojento” e “pedófilo”. Quanto ao primeiro debate do “segundo turno”
das eleições presidenciais brasileiras entre os candidatos Lula da Silva e Jair
Bolsonaro, domingo à noite, terminou com um empate e ajudou a expor “calcanhares de Aquiles das duas candidaturas”, diz o
Estadão que analisou afirmações sobre covid, salário mínimo, bolsa de família
para concluir que os dois “erram dados”. Entre “troca de acusações,
algumas promessas e quase nada sobre economia”, Lula e Bolsonaro “chamam-se
mentirosos o tempo todo”, resume a Veja. “Lula foca em pandemia e Bolsonaro em corrupção” num
debate que teve menor audiência do que na primeira volta, sublinha o jornal digital
Poder360, onde também é dado destaque a um vídeo da revista The Economist sobre “a duradoura ameaça” do
“Trump dos trópicos”.
Combustíveis Preços ameaçam atingir esta segunda-feira o valor mais alto desde agosto.
Alimentação O novo Programa Nacional para a Promoção da Alimentação
Saudável, da Direção Geral da Saúde, define como metas até
Ameaça O vice-almirante Henrique Gouveia e Melo, chefe de Estado-Maior
da Armada (CEMA), recebeu ameaças e participou o caso às autoridades
policiais, que estão a investigar o sucedido. O líder da task-force da
vacinação contra a covid-19 admite que as ameaças podem estar relacionadas com
declarações sobre a morte por espancamento, em março, do polícia Fábio Guerra e
a prisão preventiva e expulsão da Marinha de dois fuzileiros. “Não quero
arruaceiros na Marinha”, disse então.
Ucrânia A Gazprom voltou a ameaçar cortar o fornecimento à Europa se
houver uma tentativa de impor um teto ao preço do gás russo. A embaixada da
Sérvia na Ucrânia fechou por motivos de segurança, enquanto China e Egito
lançaram apelos para os seus cidadãos saírem do país. Pelo menos 11
soldados russos morreram e 15 ficaram feridos numa troca de tiros num campo de
treino militar em Belgorod (Rússia) que o Kremlin classificou como um “ataque
terrorista”. O último balanço da Ucrânia indica que desde o início da guerra,
morreram 65 mil soldados russos. Pode continuar a acompanhar em contínuo estas e outras notícias
da guerra no Expresso e ficar a saber, por exemplo, que o primeiro
contingente russo já está na Bielorrússia.
França Milhares de pessoas manifestaram-se domingo, em Paris,
contra a subida dos preços, a exigir melhores condições de vida. Foi uma manifestação contra a vida cara, diz o jornal
Liberátion.
Irão Pelo menos quatro pessoas morreram e 61 ficaram feridas num incêndio
na maior prisão do Irão, onde estão detidos opositores ao regime. Na sequência
do incêndio e dos confrontos na prisão de Evin, um mês depois de Masha Amani, curda de 22 anos, ter sido presa por
violar as leis sobre indumentária, acabando por morrer, a UE exige “máxima transparência” ao Irão.
Reino Unido A rebelião dos conservadores contra a primeira-ministra
britânica, Liz Truss, sobe de tom e já há um deputado a pedir publicamente a sua demissão.
Japão Se tem interesse pela cultura japonesa, vale a pena ler este artigo do Le Monde, com 4 chaves para
compreender a mitologia nipónica.
Óbito Morreu Olímpia Feteira, filha única do antigo milionário
Lúcio Tomé Feteira.
FRASES
Trabalharemos com a maior sinceridade e faremos todos os esforços em prol da
reunificação pacífica [de Taiwan], mas não renunciaremos nunca ao uso da força
e reservamos a possibilidade de adotar todas as medidas necessárias
Xi Jinping, secretário-geral do partido do Partido Comunista Chinês e
Presidente da República, no Congresso do PCC
Se a retirada é difícil para mim, que tentei preparar-me da melhor forma, nem
quero imaginar o vazio de quem não se preparou
Tarantini, o 41º jogador com mais partidas (345) na história da I Liga,
treinador, licenciado, mestre, doutor e autor do livro O Caçador de Sonhos
(Uma palavra ao) Senhor Primeiro-Ministro Pedro Passos Coelho, para lembrar
quanto Portugal lhe deve no passado e quanto Portugal está seguro de lhe vir a
dever muito mais no futuro
Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, em Amarante, na comemoração do centenário de Agustina
Bessa-Luís, onde o ex-primeiro ministro esteve presente como amigo da
família da escritora
PODCASTS A NÃO PERDER
Eduardo Madeira: “Todas as piadas são válidas, mas é mais corajoso fazer piadas
para bispos, presidentes, diretores” Um dos mais relevantes nomes do humor
em português, conhecido pelas suas imitações e músicas hilariantes na banda
Cebola Mol. À conversa com Bernardo Mendonça no podcast A Beleza das
Pequenas Coisas revela mais sobre o seu percurso e para onde o futuro o leva.
“Não lhes perdoeis, Senhor, pois eles sabem o que fizeram" Miguel
Sousa Tavares escreve esta semana no Expresso sobre a polémica em torno dos
abusos sexuais na Igreja portuguesa. Uma realidade "sinistra e
submersa" durante décadas ocultada por homens “com responsabilidades que
não têm perdão”. Ouça o podcast De Viva Voz conduzido por Paula Santos.
Yusuf al-Qaradawi, clérigo islâmico “moderado”, um dos mais influentes do mundo
(1926-2022) Yusuf al-Qaradawi gozava de imensa popularidade no mundo
Islâmico devido ao seu programa na Al Jazeera e era considerado “moderado”
pelas fações mais radicais do Islão apesar de promover chicotadas públicas a
homossexuais. Ouça o seu obituário escrito e narrado por António Araújo neste
Desastres Naturais em podcast.
O QUE ANDO A OUVIR E A VER
Com privilégio de jornalista, é certo, ando a ouvir o último disco das
Vozes da Rádio, prestes a ver a luz do dia. Chama-se Brasil e
como o nome indica, reúne temas com sotaque e inspiração do lado de lá do
Atlântico. São 14 originais e uma versão de "Não vou engolir",
grito de alerta contra o racismo, a segregação, a pobreza e a ignorância
que, em tempos não muito distantes, levou a ditadura brasileira a silenciar o
grupo MPB4. Este Brasil das Vozes da Rádio e da era Bolsonaro
oferece-nos inúmeros retratos de um país em permanente tempestade interior e
conta com a colaboração de nomes grandes da cultura brasileira como Ivan Lins,
Tunico da Vila, Fábio Porchat - esse mesmo, da "Porta dos Fundos" -
Douglas Germano e Demónios da Garoa, entre outros. Enquanto o disco não chega
às lojas, deixo-vos "Não vou engolir" e "Samba de Sexta-Feira", já a rodar no Youtube.
Partilho também a sugestão do Tiago Serra Cunha, meu colega na Delegação
Norte do Expresso, para seguir as luzes até Serralves: “Até ao final do mês, as
noites de Serralves são produto da imaginação transformado em realidade. A exposição ao ar livre "Serralves em Luz", que
abriu as portas da segunda edição em junho, mantém-se acesa até dia 31. Ao escuro,
os jardins ressurgem iluminados com um verdadeiro espetáculo de luz que faz
destes caminhos, outrora escuros por esta hora, uma experiência
"sensorial" que permite ver a natureza com outros olhos. São 3km de
25 instalações luminosas, com direção criativa de Nuno Maya e desenhos de luz
do Coletivo OLAB, Sophie Guyot, Tamar Frank e Tilen Sepič. Além da visita livre
(com bilhetes entre os 10,50€ e os 12,50€), há também visitas orientadas, workshops de
fotografia e um ateliê infantil. Ilumine-se!”
Como hoje é 17 de outubro, dia em que morreu, aos 39 anos, o compositor e
pianista polaco Frédéric Chopin (1810 - 1849), termino com um convite
para ouvir um dos seus prelúdios. Eu escolhi o Prelúdio Op. 28 n.15., interpretado por Maria João
Pires.
Continue na nossa companhia no Expresso, na Sic, na Tribuna e na Blitz.
Tenha uma excelente segunda-feira
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