Carvalho da Silva* | Jornal de Notícias | opinião
O espaço da União Europeia é, desde há bastante tempo, o centro das políticas neoliberais que financeirizam a economia e subordinam o trabalho à finança.
Essa opção é confirmada nos passos do Banco Central Europeu (BCE) e, quase continuamente, através das políticas adotadas pela Comissão Europeia. Instrumentos preponderantes do Estado social de direito democrático estão a ser cilindrados por essas políticas. Este processo facilita a ascensão de forças ultraconservadoras e fascistas que, sorrateiramente, vão tendo parte dos seus programas executados.
Constata-se que a maioria dos governantes europeus, nomeadamente a Comissão, são capazes de ceder a reivindicações antidemocráticas e antissolidárias do senhor Viktor Orbán ou dos seus colegas polacos, mas quando se trata de responder a reivindicações dos trabalhadores e dos povos europeus que reclamam, com justiça, melhores salários e respeito por direitos laborais e sociais, respondem negativamente, de forma vincada.
Quando se diz a governantes (democratas) como os portugueses, que deviam esgrimir todos os argumentos no seio da UE em favor dos interesses específicos do país - testando os limites de tratados e disposições comunitárias - por forma a conseguirmos melhores condições para o nosso desenvolvimento, dizem-nos que isso não é possível; preferem a criatividade do fundamentalismo das "contas certas", que mais não é que a submissão àquela financeirização. Cheira à velha receita: "alimenta o tigre para ele não te comer". Normalmente esta via dá mau resultado. O bicho vai comendo os nossos recursos e acaba por fazer de nós a refeição seguinte.
A esperança que nos anima hoje é o crescimento das lutas laborais, das greves e da ocupação das ruas com fortes mobilizações em muitos países europeus, como é o caso de Portugal. Os sindicatos emergem na sua missão, que é historicamente de movimento social, mas, em democracia, também de instituição de intermediação. Será bom que este esforço dos trabalhadores e das populações se mantenha e reforce.
Estão errados alguns democratas que vão aconselhando moderação aos trabalhadores em luta, e às suas experimentadas organizações. Não se pode deixar o protesto e a rua entregues aos fascistas, para eles manipularem o desespero de quem há muito tempo não encontra respostas para os seus problemas. Vamos vendo, na rua e na Comunicação Social em regra hostil ao movimento sindical, que eles andam a tentar arregimentar. Urge, pois, secar o terreno propicio ao seu crescimento.
Esta semana, Luis de Guindos, o vice-presidente do BCE, antigo governante espanhol do Partido Popular, lá veio ameaçar, "Se entrarmos numa espiral entre os salários e os preços, o BCE vai ter de aumentar as taxas de juro, mais do que teria feito de outra forma". Isto é chantagem. Não foram nem são os salários que estão a provocar a inflação, mas a inflação já reduziu e continua a reduzir os salários. Entretanto, aumentando taxas de juros, o BCE degrada as condições de vida dos trabalhadores e da maioria dos cidadãos. E é o BCE que aposta na proteção da finança e dos lucros, em vez de apostar no investimento produtivo e no emprego.
As lutas laborais e sociais (feitas no respeito pelas regras democráticas) contra a pobreza e o trabalho quase escravo, contra a violação de direitos humanos, contra o desemprego, as desigualdades e as precariedades, pela proteção dos trabalhadores migrantes, pela melhoria da proteção social e por salários justos, reforçam sempre a democracia.
*Investigador e professor universitário
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