quarta-feira, 29 de março de 2023

Portugal | PARA ALÉM DO IVA ZERO

Rafael Barbosa* | Jornal de Notícias | opinião

De pouco adianta tapar o sol com a peneira. Isoladamente, o IVA zero teria um impacto irrelevante no bolso dos portugueses que estão com a corda na garganta.

Recorde-se a conta que fizemos no JN: se um cidadão fosse hoje ao supermercado e se abastecesse com um cabaz que incluísse os 44 produtos alimentares, pagaria 127,35 euros. Retirando o IVA, pouparia 7,79 euros. Acresce que, ao longo do último ano, a subida de preços na alimentação ultrapassou os 21% (quase quatro vezes mais do que a descida agora anunciada). Mais ainda, não há "boa-fé" (para usar as palavras de António Costa) que resista às leis do mercado. Se for essa a tendência global, haverá aumentos, com ou sem IVA zero.

Mas, se não vale a pena tapar o sol com a peneira, é exagerado gritar que o rei vai nu. O IVA zero deve ser avaliado em conjunto com outras medidas. Seja porque há acordo assinado com produtores e distribuidores, que algum efeito de autorregulação e contenção nos preços terá; seja, sobretudo, pelos apoios financeiros às famílias vulneráveis (30 euros por mês a multiplicar por 12 meses são 360 euros por ano); seja, ainda, pelo apoio às rendas (até 200 euros mensais), ou a bonificação dos juros nos créditos à habitação (até 720 euros por ano).

Por muitos reparos que se possam fazer a cada uma destas medidas ou ao tempo em que são decididas e aplicadas, é evidente que, em conjunto, terão impacto entre os mais aflitos. No entanto, são medidas de emergência, conjunturais. Um alívio. Mesmo que assentem na redistribuição parcial de riqueza, não resolvem as desigualdades do país, nem as taxas de pobreza. Não aliviam o sufoco fiscal que aflige as classes médias, nem acabam com os baixos salários. Não evitam a fuga de jovens qualificados para o estrangeiro. Esta é outra discussão. Sobre o futuro, não sobre as aflições do presente.

*Diretor-adjunto

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