Chefe da diplomacia da Rússia não esteve na sala durante a intervenção do presidente ucraniano, que depois saiu antes de o ministro russo chegar. Poder de veto em cima da mesa.
A coreografia diplomática impediu o frente a frente entre o presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e o chefe da diplomacia russo, Sergei Lavrov, na reunião do Conselho de Segurança das Nações Unidas. Quando o primeiro fez a sua intervenção, criticando o poder de veto que Moscovo tem neste órgão e pedindo para que lhe seja retirado, o segundo estava fora da sala. E quando Lavrov entrou, para defender a legitimidade desta ferramenta ao abrigo da Carta da ONU, já Zelensky tinha saído.
O choque entre ambos - podia ter sido a primeira vez que o líder ucraniano se sentava à mesma mesa que um alto representante russo desde a invasão - ficou-se pelo registo das palavras. "O poder de veto nas mãos do agressor empurrou as Nações Unidas para um impasse", defendeu Zelensky. "É impossível parar a guerra porque todos os esforços são vetados pelo agressor e aqueles que desculpam o agressor", acrescentou, tendo defendido o seu plano de dez pontos para acabar com o conflito.
Mas esteve ao ataque precisamente por causa do poder de veto, de que a Rússia goza enquanto membro permanente do Conselho de Segurança - junto com EUA, China, França e Reino Unido. E que Kiev diz ter sido conseguido "ilegalmente através de manipulações de bastidores após o colapso da União Soviética", acabando nas mãos de "mentirosos cujo trabalho é encobrir a agressão e o genocídio".
Este poder de veto tem permitido a Moscovo travar qualquer resolução sobre a guerra, mesmo se na Assembleia Geral que reúne os 193 países se vote sucessivamente a condenar a invasão e a pedir que a Rússia retire as suas tropas. A Rússia atua "em detrimento de todos os outros Estados-membros", afirmou o líder ucraniano, defendendo também ele uma reforma nas Nações Unidas. "O uso do veto é o que precisa de reforma e esta podia ser uma reforma chave", defendeu.
Na sua intervenção, o chefe da diplomacia russa defendeu esse direito. "O uso do veto é uma ferramenta absolutamente legítima prevista na Carta das Nações Unidas com o objetivo de prevenir decisões que podem levar à rutura das organizações", alegou Lavrov, que do outro lado da mesa não tinha Zelensky, mas o embaixador da Ucrânia na ONU, Sergiy Kyslutsya, e o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken.
O ministro dos Negócios Estrangeiros russo aproveitou para acusar o Ocidente de fomentar os conflitos na Ucrânia, empurrando-a para a guerra com a Rússia. "O princípio da não -ingerência nos assuntos internos foi atropelado inúmeras vezes", afirmou, defendendo que qualquer governo antirrusso em Kiev é uma "marioneta" norte-americana e sugerindo que os EUA deviam "mandar" Zelensky negociar com Moscovo.
Blinken, na sua intervenção, acusou por seu lado Moscovo de "crimes contra a humanidade" na Ucrânia "quase diariamente". Disse ainda que é "difícil encontrar um país que despreze mais os princípios das Nações Unidas" do que a Rússia, acusando Moscovo de ter violado os princípios de soberania e integridade territorial com a invasão da Ucrânia.
Não houve choque entre Zelensky e Lavrov, mas houve entre o embaixador russo nas Nações Unidas, Vassily Nebenzia, e o primeiro-ministro da Albânia, Edi Rama, cujo país ocupa a presidência temporária do Conselho de Segurança. Moscovo criticou que Zelensky fosse autorizado a falar primeiro no encontro, dizendo que isso minava a autoridade deste órgão. Rama respondeu que havia "uma solução" para evitar que o líder ucraniano falasse primeiro: "Você põe fim à guerra e o presidente Zelensky não fala".
Susana Salvador | Diário de Notícias
Imagem: O presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, e o chefe da diplomacia russo, Sergei Lavrov, não estiveram ao mesmo tempo na sala. © Fotos AFP
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