domingo, 23 de junho de 2024

Portugal | CORRUPÇÃO: MENOS LEIS E MAIS ACÇÃO

Inês Cardoso | Jornal de Notícias | opinião

Se o sucesso de um Governo se medisse pelos anúncios de medidas, Luís Montenegro estaria no topo da eficácia. Em pouco mais de um mês o país conheceu um pacote de iniciativas destinadas à juventude, um programa para a habitação, dois planos de ação (saúde e migrações) e, esta semana, a agenda anticorrupção. Centena e meia de medidas com uma fragilidade em comum: muitas são relativamente vagas e carecem de um calendário que aponte um horizonte para a concretização.

Algumas das propostas agora anunciadas reúnem consenso alargado, da regulamentação do lóbi à valorização do Mecanismo Nacional Anticorrupção. Outras prometem mais polémica, como a delação premiada, a redução da fase de instrução ou o alargamento do confisco de bens sem condenação. Apesar de já estar previsto na lei desde 2002, o confisco marcou o debate público, por levantar imediatas reservas quanto à constitucionalidade. Certo é que apenas o detalhe dos futuros diplomas permitirá aprofundar posições e perceber até que ponto as medidas poderão passar num Parlamento dividido e imprevisível.

Seja qual for o resultado final de algumas destas ações, a agenda anticorrupção tem desde já a virtualidade de ter permitido a valorização do tema e a sua centralidade no palco mediático. É crucial que a discussão se faça com profundidade e equilíbrio, evitando que a luta contra a corrupção seja apropriada por partidos populistas que dela fazem bandeira.

Os relatórios comparativos na Europa mostram que a legislação portuguesa prevê mecanismos alargados de combate aos crimes cometidos em funções públicas. Não precisamos propriamente de multiplicar leis, mas antes de ser eficazes na sua aplicação, especializando a investigação e dotando-a de plenos recursos para exercer a sua função. Não somos, ao contrário do que é comum dizer-se, um país de corruptos. Ainda assim, a ineficácia na aplicação da justiça e o reduzido número de condenações abrem a porta à desconfiança e à demagogia. É essa a armadilha que temos de evitar.

* Diretora JN

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