Dinheiro da TAP comprou a TAP. O que diz o relatório da Inspeção-Geral de Finanças
Cristina Santos | RTP
O Governo recebeu o documento na semana passada e enviou-o para o Ministério Público, seguindo a proposta da Inspeção-Geral de Finanças (IGF). O relatório da auditoria pedida pelo anterior ministro das Finanças, Fernando Medina, põe a nu um processo que contornou o código das sociedades comerciais. Esse código impede uma empresa de conceder empréstimos ou fundos a um terceiro para que este compre ações da empresa.
O relatório conclui que a compra de 61% da companhia aérea ao Estado, em 2015, por um consórcio (Atlantic Gateway) liderado por David Neelman foi financiada com um empréstimo de 226 milhões de dólares concedidos pela Airbus para que Neelman levasse a TAP a comprar 53 aviões à Airbus.A IGF sublinha que os 226 milhões de dólares de capitalização da TAP pela Atlantic Gateway de Neeleman, “coincide com o valor da penalização assumida pela TAP, SA”, no caso da transportadora aérea não cumprir “os acordos de aquisição das 53 aeronaves (A320 e A330)”.
Isto “evidencia uma possível relação de causalidade entre a aquisição das aeronaves e a capitalização da TAP, SGPS e os contratos celebrados entre a TAP, SA e a Airbus”. Até por causa da proximidade das datas de celebração de contratos acrescenta o relatório, “12 e 13 de novembro de 2015, o que suscita a existência de uma relação de causalidade entre a aquisição das ações da TAP, SGPS pela Atlantic Gateway, a respetiva capitalização e as obrigações assumidas pela TAP, SA, nos contratos celebrados com a AIRBUS”.
Ou seja, a IGF conclui que a TAP foi comprada com garantia da própria TAP e que este procedimento era do conhecimento da Parpública e do Governo, quando Pedro Passos Coelho era primeiro-ministro, Maria Luís Albuquerque era ministra das Finanças e Miguel Pinto Luz (atual ministro com a tutela da TAP) era, em 2015, secretário de Estado com a tutela setorial da TAP.
Já em 2023, no âmbito da Comissão Parlamentar de Inquérito à gestão da TAP, Miguel Pinto Luz defendeu o negócio da venda da TAP aos privados, como um processo exemplar e afastou dúvidas quanto ao negócio com a empresa Airbus, que terá vendido aviões à TAP, acima do preço de mercado.
Declarações de Miguel Pinto Luz, em maio de 2023, na Comissão de Inquérito à gestão política da TAP por ter estado esteve envolvido na venda da companhia aérea aos privados em 2015. Agora, Miguel Pinto Luz, ministro das Infraestruturas, tem novamente em mãos um processo de privatização da TAP.
E a manutenção no Brasil?
A Inspeção-geral de Finanças questiona as razões que levaram os gestores da TAP a decidir participar na manutenção no Brasil, sem partilhar riscos ou os contratos de serviços a empresas de Neeleman em 2016. O relatório sublinha mesmo que “não se encontra demonstrada a racionalidade económica da decisão da administração da TAP, SGPS”.
De acordo com a auditoria, “perspetivam-se
perdas muito significativas com aquele negócio pela não recuperabilidade
dos valores envolvidos, que, até 2023, ascendiam a 906 milhões de euros”,
sublinha o relatório da IGF.
Relatório já seguiu para o Ministério Público
Em janeiro de
A auditoria também critica o Governo de António Costa, por não ter tido acesso à informação sobre a compra do Estado, em 2020, de uma participação na TAP.
A IGF propõe ao ministro das Finanças o envio do relatório “após homologação, ao Ministério Público”. Entretanto, o ministro das Infraestruturas, Miguel Pinto Luz, revelou, esta terça-feira de manhã, que o governo já enviou o documento ao Ministério Público depois de o ter recebido na semana passada.
O relatório da auditoria tem data de agosto e foi notícia no dia em que o presidente executivo da Lufthansa veio a Lisboa conversar com o governo português sobre a eventual aquisição de uma percentagem da TAP.
Entre as seis conclusões do
relatório da auditoria da Inspeção-geral de Finanças, revelado agora, algumas já tinham sido notícia em 2023 (no início dos
trabalhos sobre a comissão parlamentar de inquérito centrada no período
posterior à renacionalização de 2020 e na indemnização de 500 mil euros paga à
antiga administradora executiva Alexandra Reis). Por exemplo, no Parlamento
entraram então também requerimentos para apurar as circunstâncias da
privatização da TAP, em 2015.
* Título PG
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