quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

Angola | Guerra à Civil dos Karkamanos -- Artur Queiroz

Artur Queiroz*, Luanda

A queda do regime fascista em Portugal pôs em risco os regimes de apartheid na África Austral, Salisbúria, hoje Harare, e Pretória, mais os seus satélites. A independência das colónias portuguesas era inevitável, com ou sem o 25 de Abril, 1974. As potências ocidentais, que colaboravam com o regime colonial português e com os regimes de segregação racial, ficaram preocupadas com a possibilidade das Independências, sobretudo em Angola e Moçambique. Foi assim que nasceu uma grande invasão militar para esmagar Angola.

A “Operação Savanah” começou em Agosto de 1975, após contactos entre Pretória e dirigentes da UNITA (Jonas Savimbi) e da FNLA (Holden Roberto). Os sul-africanos invadiram Angola e ao mesmo tempo distribuíram armamento e forneceram instrutores a estes dois movimentos e ao Esquadrão Chipenda. As primeiras bases foram instaladas no centro de Angola: Calombo (Caála) e Cuito (Silva Porto), capital da província do Bié.

O apoio popular ao MPLA nesse ano de 1975 era esmagador. Em Agosto o MPLA controlava todas as principais cidades entre Cabinda e Namacunde, do Lobito ao Luau. Angola estava com o MPLA. O povo era o MPLA.

O analista militar e escritor sul-africano, propagandista do regime racista de Pretória, HELMOED-ROEMER HEITAMAN, revelou ao mundo este facto: “A África do Sul decidiu agir directamente, com medidas drásticas e começou a instalar o comando da Operação Savanah”.

O objectivo era travar o MPLA e impedir que reforçasse a sua presença nas áreas de influência da UNITA (centro de Angola) e FNLA (no norte). 

O primeiro choque entre os tanques “Panhard” sul-africanos e as FAPLA ocorreu no dia 5 de Outubro de 1975 no Huambo. A intervenção sul-africana alastrou a partir dessa data. Foi o ponto máximo da Guerra de Transição ou II Guerra de Libertação Nacional.

O analista sul-africano revelou também que “a Operação Savanah começou a ganhar apoio de alguns países africanos (sobretudo Zaire de Mobutu e Gabão) e dos EUA que inicialmente estavam passivos. A primeira unidade a invadir Angola foi a Task Force Zulu, comandada pelo coronel Koos van Heerden, que passou a ser conhecido por Rommel”.

Revelação de HELMOED-ROEMER HEITAMAN: “As ordens que ‘Rommel’ recebeu à saída Pretória, foi conquistar o máximo de território angolano até 11 de Novembro de 1975, dia marcado para a independência”. 

O Grupo Alfa, do comandante Delville Linford, que tinha trabalhado como especialista na formação dos Flechas da PIDE/DGS/UNITA, entrou também em acção, mobilizando os bosquímanos (Khoisan) fugidos para o Sudoeste Africano (Namíbia). 

O Grupo Bravo, do comandante Balsinha, da FNLA, foi assessorado pelo coronel Ian Breytenbach, da força aérea e das forças especiais sul-africanas, que viria mais tarde a ser chefe das Forças de Defesa e Segurança da África do Sul (SADF). 

HELMOED-ROEMER HEITAMAN escreve: “Entre 19 de Outubro e 13 de Novembro de 1975 as SADF tomaram Pereira d’Eça (Ondjiva), Roçadas (Xangongo), João de Almeida (Chibia), Humpata, Sá da Bandeira (dia 24 de Outubro, 1975), Moçâmedes (dia 28 Outubro 1975), Catenge, Cubal, Nova Lisboa (Huambo), Benguela (5 Novembro 1975), Lobito e Novo Redondo (Sumbe), onde tiveram pesadas baixas e encontram as pontes do Queve e do Canza destruídas”.

As SADF foram travadas na Grande Batalha do Ebo pelas FAPLA e um destacamento cubano. Nesse momento começaram a readaptar as suas unidades Foxbat, Zulu, X-Ray e Orange. No Norte de Angola o regime racista de Pretória também tinha instrutores que trabalhavam com os oficiais da CIA, os mercenários de várias nacionalidades e o Exército de Libertação de Portugal (ELP). 

HELMOED-ROEMER HEITAMAN escreve mais isto: “A República Sul Africana (RSA) pretendia que a ‘Operação Savanah’ fosse secreta por isso começou a tornar-se desconfortável para o governo, quando surgiram denúncias publicas da invasão a Angola. Temia as implicações políticas da operação militar de grande envergadura. O Governo sul-africano decidiu então que não podia sozinho carregar o problema angolano. Começou a retirar-se de Angola a partir de 22 de Janeiro de 1976 e terminou a retirada no dia 27 de Março de 1976. As tropas tiveram dificuldades logísticas. A distância entre Grootfontein, na Namíbia, e a frente do Ebo era de 2.500 quilómetros”. 

As reportagens que alertaram o mundo para a invasão militar sul-africana foram da responsabilidade dos seguintes jornalistas: António Cardoso e Artur Queiroz por via de um grupo de jornais mobilizado por Neiva Moreira e Beatriz Bissio, na América Latina. Os mesmos jornalistas também publicavam reportagens em Portugal: Diário de Notícias, Diário Popular, Diário de Lisboa. O jornalista Luís Alberto Ferreira publicava as suas reportagens na RTP e RDP. O jornalista Ryszard Kapuscinski fazia despachos diários para a agência noticiosa polaca PAP. Óscar Gil e Artur Neves recolhiam som e imagens nas frentes de combate, que colocávamos nos Media internacionais.

A confrontação das FAPLA e o destacamento cubano contra os invasores estrangeiros na Grande Batalha do Ebo aconteceu no dia 23 de Novembro de 1975 e terminou no mesmo dia, ao entardecer.  

Às nove da manhã do dia 23 de Novembro, 1975, começaram os sangrentos combates. Este foi o primeiro embate das FAPLA depois da Independência Nacional, que tinha sido proclamada apenas 12 dias antes. Foi também a primeira grande vitória militar. Se os combatentes da liberdade tivessem perdido, hoje, Angola não existia como Estado livre e independente e em Luanda estariam no poder os serventes às ordens de Pretória. Estão lá serventes às ordens da Casa dos Brancos e Bruxelas: Kimoxi!

Sem a vitória dos angolanos na Grande Batalha do Ebo os democratas dificilmente comemoravam o Mandela Day. África e a Humanidade não estavam livres do regime de apartheid. Pelo contrário. Face aos avanços da chamada supremacia branca em países como os EUA, seguramente que hoje estava ainda mais forte ou seria mesmo hegemónico no continente.

Pergunta surpresa: Helmod-Roemer Heitman (livro “War in Angola The Final South African Phase”) ou Peter Stiff (livro “The Silent War”) são sul-africanos, escritores, apoiantes e propagandistas do regime racista de Pretória. Nos seus livros contam a guerra da África do Sul contra Angola. As nossas editoras, nomeadamente o Instituto Nacional do Livro e do Disco (INALD), nunca traduziram e publicaram estas obras, porquê? Para circular livremente a aldrabice da guerra civil angolana.

Na guerra à civil os karkamanos eram angolanos ou os angolanos eram karkamanos? Angola era a República Sul Africana ou a África do Sul era República Popular de Angola? Agostinho Neto era karkakamano ou PW Botha era angolano?

A guerra à civil dos karkamanos em Angola causou a destruição das instituições do Estado em praticamente todo o país. Quem ajudou a destruir? A UNITA, que também ajudou os colonialistas e se bandeou com os independentistas brancos logo a seguir ao 25 de Abril de 1974. A UNITA, que foi biombo à invasão das tropas do regime racista de Pretória. A UNITA, que rasgou o Acordo de Bicesse, cinco dias depois de assinado, escondendo milhares de militares e as suas melhores armas em bases secretas do Cuando Cubango, criadas pela Casa dos Brancos e a inteligência militar de Pretória.

A UNITA só aderiu ao regime democrático porque levou uma tareia militar e policial, que terminou em 22 de Fevereiro de 2022. Essa derrota memorável permitiu finalmente estender a Autoridade do Estado a todo o país. E a Reconstrução Nacional. Pergunta surpresa: Qual foi o papel que Bruxelas e a Casa dos Brancos deram ao Galo Negro depois da morte de Savimbi? Resposta óbvia ululante: Destruir a Autoridade do Estado nas mentalidades. Criar um clima nacional de rebelião entre a Juventude. Está em marcha com o apoio institucional de João Lourenço e sua quadrilha de bajulação e traição. 

Neste período das festas de Dezembro estão todos a comemorar. Que sejam felizes. Mas não se esqueçam dos milhares de angolanos mais os nossos amigos cubanos que no Natal de1975 em vez de festejar, choraram os seus mortos. Os nossos Heróis.

Não esqueçam também os reféns de João Lourenço, vítimas de prisão arbitrária e de julgamentos ilegais. Amem os vossos deuses, os vossos Jesus mas não se esqueçam de amar a liberdade. 

* Jornalista

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