terça-feira, 10 de maio de 2011

ASEAN: A PEDRA NO SAPATO TIMORENSE




PAULO GORJÃO – i ONLINE, opinião – 10 maio 2011

Decorreu em Jacarta no passado fim-de-semana a 18.a Cimeira da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN), que se absteve de tomar uma decisão quanto ao pedido de adesão de Timor-Leste. Estamos perante um revés circunstancial ou uma derrota estratégica?

Desde a sua independência, a 20 de Maio de 2002, que Timor-Leste ambiciona integrar a ASEAN. Todavia, cimeira após cimeira, o governo timorense teve de se contentar com o estatuto não oficial de convidado do secretário-geral da ASEAN. Ano após ano, apesar de alguns progressos pontuais, o objectivo timorense continuou por assegurar. De certo modo, numa altura em que estamos a poucos dias de se celebrar uma década desde a sua independência, a ASEAN tornou-se a pedra no sapato da diplomacia timorense, pouco habituada a não conseguir alcançar os seus objectivos.

A apresentação formal de uma candidatura de adesão durante a presidência indonésia da ASEAN, em 2011, corresponde a uma fuga em frente. A Indonésia tem o estatuto de primus inter pares na ASEAN, daí que a sua presidência seja uma janela de oportunidade única. O governo timorense tem plena consciência de que dificilmente as circunstâncias lhe serão mais favoráveis nos próximos anos, o que dá acrescido dramatismo ao processo.

Ao longo dos últimos meses, o governo timorense tem vindo a apresentar duas linhas principais de argumentação a favor de sua candidatura. Em primeiro lugar, a sua adesão durante a presidência indonésia da ASEAN teria uma forte componente simbólica. Seria o fim de um ciclo e, de certo modo, ao assumir um papel preponderante na condução da candidatura timorense, o governo indonésio assegurava a sua absolvição dos pecados cometidos no passado.

Em segundo lugar, o governo timorense tem salientado a importância da sua inclusão regional, de modo a assegurar o seu crescimento económico e a sua segurança. Em última instância, ao contribuir para a segurança e a prosperidade de Timor-Leste, a ASEAN estaria também a garantir a sua própria estabilidade e a criação de riqueza no Sudeste Asiático. Como se constatou este fim-de-semana, todavia, a adesão de Timor-Leste continua a não ser uma prioridade para a ASEAN.

Mudará alguma coisa entre Maio e Outubro, altura em que se realizará a 19.a Cimeira da ASEAN em Bali?

Apesar das declarações formais de apoio à candidatura timorense, muito provavelmente uma vez mais o governo indonésio não passará das palavras aos actos. A verdade nua e crua é que a adesão de Timor-Leste não constitui uma mais-valia para a ASEAN. Acresce que não existe entre os estados- -membros da ASEAN um sentimento de urgência que imponha a adesão timorense. Por último, mas não em último, o impasse na adesão à ASEAN retira espaço de manobra a Timor-Leste na sua relação com a Indonésia, garantido assim a Jacarta que Díli manterá uma posição dócil no plano bilateral. Jacarta tem todos motivos para manter o statu quo. Afinal, por que motivo deveria a Indonésia assumir os custos inerentes à defesa dos interesses de Timor-Leste se é a Austrália quem fica com a fatia principal dos benefícios?

P. S. Igualmente sobre este tema, recomendo a leitura do artigo de Pedro Seabra, "A road far from finished: Timor Leste and ASEAN", disponível em: http://www.ipris.org/php/download.php?fid=455.

*Director do Instituto Português de Relações Internacionais e Segurança (IPRIS)

**Escreve à terça-feira

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