Um artigo do correspondente do El País no Brasil perguntando por que não há “indignados” por aqui, fazendo referência ao que ocorre nos países árabes, na Espanha, na Grécia…, levou colunistas e analistas a entrarem no debate e buscarem a resposta. Quase todos explicaram essa hipotética passividade pela estatização dos movimentos sociais e sindicatos a partir do governo Lula. Isso, no máximo, pode explicar a passividade destes grupos, da chamada sociedade civil organizada. Que nos casos aludidos, não tiveram importância.
Uma preliminar seria perguntar se a hipotética passividade existe mesmo no Brasil. A resposta é NÃO. E há exemplos de sobra. O caso dos Bombeiros do Rio é um deles. Um típico movimento que começa e cresce pelas redes sociais, e vai às ruas e se amplia progressivamente, até que incorpora outros indignados, como se viu na “praça” em frente à Assembleia Legislativa.
São inúmeros os movimentos desse tipo que surgem pelo Brasil afora, ativados ou multiplicados pelas redes sociais. Os institutos de pesquisa em universidades dos EUA mostram que a grande sinergia se dá quando internet e TV convergem num mesmo fato. A concentração de audiência na TV brasileira retarda essa sinergia, pois não tem como cobrir os movimentos que vão surgindo ainda sem a imagem de concentração de massas. Só quando esses movimentos ativados pelas redes sociais ganham expressão é que são cobertos. O que, aliás, é inevitável pela concentração de audiência.
Mas se isso apenas retarda: não obstrui. E não há que se imaginar que os indignados só tem expressão quando reúnem milhares de pessoas. Isso não é assim. Quando as redes sociais ativam um tema, propagam, e esse finalmente chega à imprensa, ganha expressão através dessa e impacta a opinião pública, o processo é o mesmo. A coreografia é que é diferente. E ainda há os casos de fatos divulgados pela imprensa sem maior destaque, que são multiplicados pelas redes e ganham força de opinião pública. E assim por diante, com ou sem interveniência da imprensa.
As redes sociais multiplicam milhares de vezes os “tipping points”, ou pontos de deflagração de um processo de opinião. O alcance desse multiplicador é, naturalmente, diverso. Quem pensa na lógica industrial dos movimentos de massa vai achar que só têm impacto os que têm a coreografia das grandes concentrações. Isso, hoje, não é assim. É muito diferente.
De repente, pesquisas de opinião acusam a relevância de um fato, e se destaca como surpresa. Na verdade é um processo -como uma corrente abaixo do nível do mar- que cresce, agrega, e uma grande onda num determinado momento se torna visível. A “teoria da catástrofe” de René Thom, adaptada por pesquisadores à política, explica muito bem isso. Existiu sempre, mas agora ganha um gigantesco impulso com as redes sociais.
Num vulcão, a erupção só se torna visível quando se fotografa a boca de fogo. Mas a erupção é um processo. Assim como a opinião pública. Isso, o sociólogo Gabriel Tarde – sociólogo e pai da micropolítica e da microssociologia – ensinou no final do século 19. Nenhuma teoria se aplica melhor às redes sociais que seu livro “As leis de imitação”, ainda não editada em português. E que a internet comprovou e potencializou.
*César Epitácio Maia nasceu em 18 de junho de 1945, é economista e professor universitário, foi exilado político e é um dos políticos brasileiros mais atuantes no momento, tendo ocupado diversos cargos públicos, dentre eles o de Prefeito da Cidade do Rio de Janeiro
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