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Rio de Janeiro, 21 ago (Lusa) -- As relações entre Brasil e África ainda são "vulneráveis e não autossutentáveis", disse à Lusa o historiador Jerry Dávila, que analisa o esforço brasileiro ainda "germinal" de aproximação com o continente desde o período da descolonização.
As iniciativas de aproximação do Brasil ao continente africano no governo Lula (2003-2010) não são inéditas na história brasileira, destacou Dávila, e remontam à política do governo Geisel, na década de 1970 durante a ditadura militar.
O especialista nas relações Brasil-África da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, dedica-se aos estudos brasileiros há quase 10 anos e foi ao Brasil lançar o livro "Hotel Trópico: Brasil e o desafio da descolonização na África" (Ed. Paz e Terra).
"A grande pergunta hoje é se essas relações estão orientadas de forma autossustentável. Mais cedo ou mais tarde, o enfoque do Governo pode não ser mais os países africanos. Será que o intercâmbio comercial, a troca de tecnologia, a colaboração mútua vão continuar sem o impulso do governo?"
Para Dávila, os diplomatas brasileiros, na década de 1970, apostavam nas relações com novos países africanos imaginando que a África independente seria "uma nova fronteira" e que o Brasil se expressaria como uma potência mundial.
A iniciativa de aproximação do governo Lula da Silva, "no seu conteúdo e na sua retórica", são semelhantes às iniciativas do governo Geisel, referiu o historiador.
Segundo o Dávila, o Brasil via a África no período da descolonização como um retorno ao passado brasileiro, "o verdadeiro Brasil no litoral ocidental africano, gerando uma sensação de unidade cultural entre as duas margens do Atlântico".
O reconhecimento da independência de Angola, em 1975, foi para o Brasil a última oportunidade para estabelecer um novo passo da política externa brasileira que, "na altura se baseava numa posição romântica de vínculo cultural".
A guerra civil logo após a independência de Angola, porém, "fechou a possibilidade imediata" de intercâmbio comercial, argumentou.
A "renascença" veio com Lula da Silva, após um período de vácuo nas relações entre Brasil e África nos governos de José Sarney e Fernando Henrique Cardoso, com uma redução do investimento na política externa nos países africanos.
Um dos objetivos fundamentais da política externa brasileira é conseguir uma vaga permanente no Conselho de Segurança da ONU, destacou Dávila, e "a melhor estratégia" é construir coligações procurando o apoio nas relações sul-sul. "Foi nessa área que o governo Lula realmente se destacou", argumentou.
Contudo, a China é uma grande concorrente: "A presença chinesa já é maior que a brasileira. Esse é um dos fatores que estão em jogo e a concorrência é brutal por parte de empresas chinesas nas licitações para construir edifícios, projetos de engenharia básica e de mineração", analisa.
Para o historiador, a onda dos chineses nos países africanos pode expulsar a presença brasileira, mas, por outro lado, há certas áreas como petróleo, agricultura e saúde, em que o Brasil está bem estabelecido.
"Há espaços de oportunidade que aos poucos estão a ser desenvolvidos e que o Brasil concorreria muito bem com os chineses", disse.
Dávila define hoje o cenário do Brasil referente aos países africanos como "um momento germinal e vulnerável".
O principal desafio, para o historiador, é que essa relação se torne autossustentável e que não dependa apenas da iniciativa do Itamaraty, sede da diplomacia brasileira.
"A diplomacia impulsiona, dá auxílio às empresas e ao intercâmbio educacional. Mas se o Itamaraty se ausenta será que a coisa fica em pé?", questiona.
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