quinta-feira, 25 de agosto de 2011

SALVAR A LÍBIA




MARTINHO JÚNIOR

Este artigo foi elaborado em Março de 2011 e publicado no Página Um. Trago-o de novo para ser publicado no Página Global, como estímulo para o balanço que se deverá continuamente fazer, chamando a atenção para o facto de estar em curso a IIIª Guerra Mundial, uma guerra não declarada que é decidida pela aristocracia financeira mundial e que vai eclodindo onde quer que seja e especialmente onde haja “desobedientes” que não cumpram nem com o “diktat” da Hegemonia, nem com os preceitos da “formatação global” que está em curso.

África continua a perder e mais parece um eterno perdedor: perdeu com a escravatura, perdeu com o colonialismo, perdeu com o “apartheid” e hoje não encontra outras soluções para poder fazer face à hegemonia senão “aliar-se” a ela, aceitar “em paz” com os termos da “formatação global”, ou fazer soçobrar seus regimes, ou “actores”, como o teimoso do Kadafi.

Mesmo aqueles países que “alinharam” com a “democracia representativa” não estão a salvo, pois nesses países a manipulação conseguida com as políticas de “portas abertas” do neo liberalismo há a força que dita as leis da “paz” e o “modelo a seguir” é a “alternância democrática”…

A “paz”dos ricos nunca trará justiça social, nunca trará equilíbrio e as próprias ciências só são conseguidas desde que elas correspondam aos estímulos dos investimentos e dos lucros, servirão apenas para que o elitismo se fortaleça “até ao infinito dos tempos”, conforme ao engenho, arte e a inspiração de Cecil John Rhodes e de escolas “da preferência” como as de Oxford ou de Cambridge…

Os “lobbies”do petróleo, do gás, do armamentos e da indústria mineira, não param de ganhar terreno em África, pela via da guerra ou da paz, sem alternativas e sem outras opções, como se o mundo estivesse a ser gerido por processos próprios da Idade Média!

Duas opções se desenham a partir do exterior para encontrar soluções para a crise líbia: uma pela via “humanitária”-militar sublinha os interesses imperialistas, a outra pela via do diálogo, procura aproximar as partes e, salvaguardando a soberania Líbia, impedir eventuais reflexos negativos nas frágeis soberanias e fronteiras africanas.

I.

A via imperialista tem à sua mercê todo o tipo de pretextos e justificações, tirando partido da panóplia de dispositivos que incluem destacamentos militares espalhados por todo o Mediterrâneo e unidades navais multifunções que embarcam forças importantes de intervenção. (1)

A sua geo estratégia é garantir o acesso ao petróleo indispensável para mover o tipo de sociedades “desenvolvidas” que foram sendo construídas desde os tempos da Revolução Industrial.

O estado decrépito das finanças norte americanas e europeias, no primeiro caso provocado pela continuidade das guerras do Iraque e do Afeganistão, não vai ser motivo suficiente para impedir a acção militar, pois a Líbia será obrigada a pagar caro o que se gastar nas operações. (2)

Na Líbia, ao contrário da maior parte dos produtores do Oriente Médio e ao que indicam os especialistas, as reservas garantem que não se tenha atingido ainda o pico de Hubbert, pelo que o potencial existente, às portas da Europa, não pode ser negligenciável. (3)

Nesse sentido, quer norte americanos, quer europeus, estão praticamente prontos para a intervenção, que penalizará o já enfraquecido Kadafi, sobre o qual pesa já a acusação do Tribunal Penal Internacional.

Para eles cada dia que passa resulta no incremento do risco do petróleo líbio diminuir de produção, apesar da possibilidade de compensação de remessas de outras origens.

As instalações de exploração de petróleo líbio, assim como as condutas e portos de exportação, tendem a parar e os riscos de serem atingidas pelas confrontações é cada vez maior. (4)

A volatilização de Kadafi permitirá a essa corrente de opções tirar partido da situação para impor sua vontade, buscando numa revolta fragmentada pelas mais diversas tendências, aqueles que se tornarão mais dóceis aos seus interesses, conveniências e desígnios.

A corroborar isso atente-se no que diz Sara Flounders, do Global Research:

“Un artículo de primera plana en el New York Times del 25 de febrero describió la diferencia entre Libia y las otras luchas que han estallado en todo el mundo árabe. A diferencia de las rebeliones juveniles posibilitadas por Facebook, la insurrección en este caso ha sido dirigida por gente más madura y que se ha estado oponiendo activamente al régimen dese hace cierto tiempo. El artículo describe el contrabando de armas a través de la frontera egipcia durante semanas, permitiendo que la rebelión escale rápida y violentamente en poco más de una seman”.

El grupo opositor que más se cita es el Frente Nacional por la Salvación de Libia [NFSL por sus siglas en inglés]. Se sabe que el NFSL, fundado en 1981, es una organización financiada por la CIA, con oficinas en Washington, D.C. Ha mantenido una fuerza militar, llamada el Ejército Nacional Libio, en Egipto cerca de la frontera libia. Una búsqueda en Google del Frente Nacional por la Salvación de Libia y la CIA confirmará rápidamente cientos de referencias.

También se cita ampliamente a la Conferencia Nacional de la Oposición Libia. Es una coalición formada por el NFSL que también incluye a la Unión Constitucional Libia [LCU], dirigida por Muhamad as-Senussi, pretendiente al trono libio. La web de la LCU llama al pueblo libio a reiterar un juramento de lealtad al rey Idris el-Senusi como líder histórico del pueblo libio. La bandera utilizada por la coalición es la bandera del antiguo Reino de Libia.

Evidentemente esas fuerzas financiadas por la CIA y los antiguos monárquicos son política y socialmente diferentes de la juventud privada de derechos y de los trabajadores que han marchado por millones contra los dictadores respaldados por EE.UU. en Egipto y Túnez y que hoy se manifiestan en Barein, Yemen y Oman”.

II.

A via do diálogo proposta por Hugo Chavez e suportada pelos componentes da ALBA, tem o privilégio de começar por respeitar as partes em conflito sem outros compromissos, de garantir a soberania nacional, de aprender com a nova situação que foi criada, tanto no que diz respeito a factos passados, como em relação aos balanços correntes, o que se reflectirá positivamente em África, um continente tantas vezes sujeito à barbárie e à “somalização”. (5)

Se Kadafi aceitou partir para o diálogo, todavia os rebeldes estão a recusar essa via, o que é contraditório ao argumento de que são favoráveis a que não haja intervenção militar externa nos assuntos internos da Líbia (pois se uma parte deles, pelo menos, foram aparentemente “lançados” com o suporte da CIA).

De facto, para se evitar a intervenção militar externa, urge partir para o diálogo e pôr de lado as armas, mas isso será automaticamente sabotado pelos rebeldes.

Para os países africanos: há primeiro que impedir que a actual divisão da Líbia dê oportunidade a alguma secessão, há que evitar o surgimento de mais uma“somalização”, há que procurar a retoma urgente das actividades económicas evitando mais catástrofes humanitárias do tipo das que o continente tem sido pródigo e há que ficar de sobreaviso, pois a partir deste exemplo quer a CIA, quer o AFRICOM estão prontos a disseminar a desestabilização em todo o continente e em especial onde há petróleo, mesmo que a presença de multi nacionais anglo-saxónicas seja “histórica” (Angola é um dos alvos).

A União Africana poderá sair do silêncio em que se encontra e seguir essa via proposta por Hugo Chavez, integrando o conjunto de observadores, mas tendo sempre uma palavra a dizer pelos eventuais reflexos que a situação líbia pode ter para com outras situações noutros países africanos.

É urgente que África reaja de forma construtiva à proposta de Hugo Chavez, pois a via do diálogo está em concorrência com a via imperialista favorável à intervenção “humanitária”-militar, que leva a vantagem do efeito surpresa e da preparação meticulosa que foi aparentemente feita pelas “oficinas” norte americanas.

III.

A encruzilhada em que se encontra a Líbia põe também em causa e mais uma vez a idoneidade da ONU e de algumas outras organizações internacionais.

A ONU foi célere em condenar Kadafi e o seu regime e em apontar um pacote de sanções, mas não deu oportunidade ao diálogo entre as partes, o que marca não só incapacidades institucionais próprias, mas também o peso da influência das potências a partir do Conselho de Segurança. (6)

A ONU torna-se assim num biombo que esconde o exercício da hegemonia por parte essencialmente da corrente dominante anglo-saxónica, que esperou a ocasião para provocar “deep inside” a presente situação na Líbia, com recurso à provável reposição da monarquia sucedânea do Rei Idris, já que a artificiosa revolta recorreu à sua bandeira.

Entre as Instituições internacionais, o Tribunal Penal Internacional uma vez mais evidenciou-se e pautou-se pela sua sujeição e instrumentalização: tem sido incapaz de acusar George W. Bush e Tony Blair pelos crimes cometidos no Iraque, mas foi lesto em acusar mais um africano, desta vez Kadafi, em função da situação corrente na Líbia. (7)

Os países do sul precisam de aumentar as suas integrações e os seus intercâmbios políticos e institucionais principalmente para fazer face a todo o tipo de pressões e de crises a que estão sujeitos por via de suas frágeis capacidades políticas, económicas, financeiras e outras, sob pena de se tornarem ainda mais pasto de manipulações, tensões e conflitos de todo o tipo.

Precisam também de capacidade para agir rapidamente quando surgem situações do género daquela que deflagrou na Líbia, que se distingue daquelas da Tunísia e do Egipto: até a hora em que escrevo, não há reacção significativa da União Africana, como se o continente estivesse sempre à espera de terceiros para seguir ou “alinhar”.

África continua ideologicamente enferma, neo colonizada, em estado de choque permanente e as suas elites estão tolhidas pelas políticas neo liberais que chegam impostas do exterior com as quais vão-se emparceirando sem melhor opção ou alternativa, sendo capturadas nas armadilhas e pisando as minas que ajudaram a instalar. (8)

Martinho Júnior - 5 de Março de 2011

Notas:
- (1) – El plan de la OTAN es ocupar Líbia – Reflexões de Fidel – Cubadebate – http://www.cubadebate.cu/reflexiones-fidel/2011/02/22/el-plan-de-la-otan-es-ocupar-libia/comment-page-1/#comment-175984 ; Washington está forçando uma Guerra Civil para justificar uma intervenção militar dos EUA e OTAN? – Mahdi Darius Nazemroaya – Global Research – Diário Liberdade – http://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=12863:washington-esta-forcando-uma-guerra-civil-para-justificar-uma-intervencao-militar-dos-eua-e-otan&catid=256:direitos-nacionais-e-imperialismo&Itemid=131 ; Mais de 2000 fuzileiros estadounidenses rumo a Líbia – Diário Liberdade – http://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=12851:mais-de-2000-fuzileiros-estadunidenses-rumo-a-libia&catid=256:direitos-nacionais-e-imperialismo&Itemid=131 ; Barcos de guerra cerca de Libia: crece el peligro de intervención militar imperialista – Sara Flounders – Global Research – Rebelion – http://www.rebelion.org/noticia.php?id=123632 - http://www.globalresearch.ca/index.php?context=va&aid=23472
- (2) – GUERRAS DO AFEGANISTÃO E IRAQUE SUGAM ORÇAMENTO DOS EUA – Amy Goodman – Democracy Now – Página Um – http://pagina--um.blogspot.com/2011/03/guerras-do-afeganistao-e-iraque-sugam.html
- (3) – Líbia no grande jogo: na estrada para a nova partilha de África –Manlio Dinucci – Diário Liberdade – http://www.diarioliberdade.org/index.php?option=com_content&view=article&id=12743:libia-no-grande-jogo-na-estrada-para-a-nova-partilha-da-africa&catid=256:direitos-nacionais-e-imperialismo&Itemid=131
- (4) – Instalação petrolífera no leste da Líbia está em chamas, diz agência –Estadão – http://economia.estadao.com.br/noticias/not_57637.htm ; Líbia fecha gasoduto que abastece a Europa – Tudo Global – http://tudoglobal.com/blog/capa/111195/libia-fecha-gasoduto-que-abastece-a-europa.html
- (5) – PRESIDENTE CHÁVEZ PROPONE CREAR COMISIÓN DE PAZ PARA LIBIA – ALBA – http://www.alianzabolivariana.org/modules.php?name=News&file=article&sid=7454 ; No al intervencionismo imperialista –ALBA – http://www.alianzabolivariana.org/modules.php?name=News&file=article&sid=7461 ; El reto de vivir sin OTAN – ALBA – http://www.alianzabolivariana.org/modules.php?name=News&file=article&sid=7464
- (6) – EUA decretam conjunto de sanções à Líbia – SIC – http://sic.sapo.pt/online/noticias/mundo/EUA+decretam+conjunto+de+sancoes+a+Libia.htm ; Nações Unidas aprovam pacote de sanções à Líbia – RTP – http://tv1.rtp.pt/noticias/?t=Nacoes-Unidas-aprovam-pacote-de-sancoes-a-Libia.rtp&headline=20&visual=9&article=421510&tm=7 ; Portugal preside a comité da ONU para sanções à Líbia – Jornal de Negócios – http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=471577
- (7) – Kadhafi será julgado por Tribunal Penal Internacional – Diário Digital– http://diariodigital.sapo.pt/news.asp?section_id=10&id_news=496868 ; Ouverture d’une enquête en Libye par le Procureur de la CPI – http://www2.icc-cpi.int/NR/exeres/3EEE2E2A-2618-4D66-8ECB-C95BECCC300C.htm ; Condena D’Escoto pronunciamento de la ONU contra Líbia – ALBA – http://www.alianzabolivariana.org/modules.php?name=News&file=article&sid=7457
- (8) – Jogos africanos de George Soros – Martinho Júnior – Página Um – http://pagina--um.blogspot.com/2011/01/blog-post_26.html http://pagina--um.blogspot.com/2011/03/salvar-libia.html

3 comentários:

Anónimo disse...

Chávez sobre Libia: “El imperio ha atacado a un pueblo que no puede hacerle frente”

http://www.cubadebate.cu/noticias/2011/08/24/chavez-sobre-libia-%e2%80%9cel-imperio-ha-atacado-a-un-pueblo-que-no-puede-hacerle-frente%e2%80%9d/comment-page-1/#comment-293391

Anónimo disse...

Kadafi afirma que continuará luta contra a agressão

http://pt.cubadebate.cu/noticias/2011/08/24/kadafi-afirma-que-continuara-luta-contra-agressao/

Anónimo disse...

Chávez é um FASCISTA que está fazendo um monte de comunistas de otários. E vai matar vários deles mais tarde.

E quando ao Kadafi .... que QUEIME NO INFERNO !!!

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