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Macau, China, 19 set (Lusa) -- O presidente da Associação dos Advogados de Macau está preocupado com a possibilidade do Ministério Público poder vir a impor medidas de coação sem necessidade de confirmação por um juiz de instrução criminal, e invoca violação da Lei Básica.
"Há motivo para preocupação quando se levantam pistas para se discutir a competência do Ministério Público ter poderes para impor medidas de coação sem necessitarem de confirmação por um juiz de instrução criminal", disse Neto Valente aos jornalistas, numa análise às propostas de alteração ao Código de Processo Penal, atualmente em consulta pública.
Na opinião do presidente da Associação dos Advogados de Macau, a alteração proposta é "muito discutível, porque, quando se redigiu a Lei Básica -- e nada disto é por acaso -, ficou escrito que teria de haver um juiz de instrução criminal".
"Era o sistema que estava em vigor antes da transferência de soberania e, portanto, era isso que os redatores da Lei Básica queriam e que a Assembleia Nacional Popular aprovou", justificou.
Neto Valente defendeu que se está a "violar a letra e o espírito da Lei Básica", porque "não passou pela cabeça dos redatores da Lei Básica manter formalmente a figura de um juiz de instrução criminal mas esvaziar-lhe as competências".
O responsável disse ainda que "o Termo de Identidade e Residência -- esse sim pode ser imposto pelo Ministério Público e por qualquer autoridade policial -- não está bem abordado no Código de Processo Penal, porque é usado com demasiado excesso e demasiada liberalidade".
O facto de o arguido não poder ausentar-se mais de cinco dias da Região Administrativa Especial da China sem ter de comunicar às autoridades "não é muito eficaz e vai empurrar muitas pessoas, por esquecimento, sem maldade nenhuma, ao incumprimento dessa disposição", justificou, ao criticar que "isso pode ter consequências gravosas".
O presidente da Associação dos Advogados observou que "tem de haver uma lógica no sistema", e defendeu também mexidas no Código Penal para acabar com a grande disparidade das penas aplicadas às várias infrações criminais.
"Há uma grande disparidade que não se justifica. Porque muitas vezes os crimes contra o património são punidos mais severamente do que os crimes contra a pessoa", salientou.
Ao declarar que "na escala de valores que prevalece na sociedade, a pessoa é mais importante", Neto Valente rematou com um exemplo: "Matar ou ferir alguém é mais grave do que roubar um relógio. Não se deve aplicar uma pena de 10 anos a quem rouba um relógio e aplicar 15 anos a quem mata alguém".
As propostas de alteração ao Código de Processo Penal estão em consulta pública de 14 de setembro a 24 de outubro.
As alterações incidem sobre um conjunto de 75 artigos.
O Processo Penal não está em revisão, mas Neto Valente considerou aos jornalistas que "é altura de se começar a falar no assunto".
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