quinta-feira, 20 de outubro de 2011

CPLP – POR QUE NÃO UMA ESTRATÉGIA COMUM PARA OS OCEANOS?




MARTINHO JÚNIOR

Todos os países componentes da organização CPLP estão em contacto directo com oceanos e mares e alguns deles, casos de Cabo Verde, de São Tomé e Príncipe e Timor, são mesmo formados exclusivamente por ilhas, sem território continental.

De todos só Angola, apesar de possuir uma costa de mais de 1.600 km, não possui territórios insulares (salvo os que se encontram na extensa rede hidrográfica interior) mas, sendo o petróleo e o gás quase todo explorado “offshore”, a sua plataforma marítima tem uma incalculável valorização estratégica.

Duma forma geral, todos os países componentes da CPLP têm o mar como dilatação de seu espaço nacional, com projecções dos seus interesses marinhos a muito longo prazo.

Portugal tem no espaço marítimo entre o território continental e os arquipélagos dos Açores e da Madeira, enormes possibilidades e recursos que muito contribuirão para o país ganhar outra dimensão e pujança na vasta região do Atlântico Norte e Europa Ocidental.

O Brasil, com a descoberta dos campos petrolíferos do pré sal, tem no Atlântico a sua Amazónia Azul.

A Guiné Bissau tem nas Bijagós e no espaço Atlântico circundante, potencialidades que muito poderão contribuir para alterar profundamente a situação de subdesenvolvimento crónico em que se encontra o país.

Moçambique é dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa o país que tem a costa mais longa e de todos eles o único que margina o Oceano Índico.

Angola e Timor têm no mar a maior parte de seus interesses e estruturas de exploração de petróleo e gás.

Angola praticamente ainda não formou a sua Marinha de Guerra e tem tudo a aprender em relação ao mar, tanto do Brasil quanto de Portugal.

Por razões de vária ordem os espaços marítimos na profundidade das 200 milhas têm merecido até há pouco menos cuidados de ordem estratégica do que é recomendável.

Mesmo quando se realizam exercícios militares junto às costas, os conceitos que são aplicados têm sido sempre no sentido mar – terra: a mão do “diktat” imperialista, instrumentalizada de diversas formas, determina a aplicação dos conceitos de conveniência.

Por essa razão com o exercício “Atlântico 2”, realizado entre os dias 17 e 29 de Julho de 2010, os estrategas militares do Brasil começam a pensar em desenvolver as capacidades anfíbias, mas com o sentido terra – mar, defendendo os interesses nacionais na “Amazónia Azul”, inaugurando um ciclo distinto de respostas militares nos mares próximos.

O arquipélago Fernando de Noronha desempenhou um papel chave no conceito do exercício.

Se acrescentarmos aos conceitos produzidos no âmbito da Atlântico 2 o facto do Brasil ser o único país CPLP que tem explorações em curso na Antárctida, compreende-se que o peso específico do Brasil é muito grande e deveria também ser aproveitado pelos outros componentes CPLP.

O padrão de medidas estimulado no Atlântico 2 tem possibilidade de ser absorvido por todos os países CPLP, mesmo por Portugal que está tão historicamente envolvido na Organização do Tratado do Atlântico Norte, um Tratado que é repudiado pelo menos por uma parte do Povo Português, pelas organizações de esquerda e que é visto com desconfiança em todo o espaço CPLP.

Portugal tem em carteira a construção dum navio anfíbio multi funções (NAVPOL) que se pode adaptar às estratégias dos conceitos de resposta e persuasão terra – mar, que devido às suas características e potencialidades poder-se-ia tornar num navio de interesse para todos os CPLP, Brasil incluído.

No seu território será um navio muito útil para ser utilizado entre o Portugal Continental e o Insular (Açores e Madeira).

Esse navio, fora do âmbito da OTAN, poderia entre outras coisas tornar-se num navio escola para os fuzileiros navais dos países CPLP, servir de base para operações de socorro, de resgate, ou de protecção, servir como plataforma para acções múltiplas no mar…

Um navio com essas características poderá ser estimulante pelo menos para quatro dos componentes CPLP: Portugal, Brasil, Angola e Moçambique e com isso quero sublinhar que o projecto pode ter a contribuição de todos da CPLP, tirando partido duma aprendizagem que seria comum.

O Brasil possui navios anfíbios de classes distintas:

- Três navios de desembarque de carros de combate – G28 Mattoso Maia, G25 Almirante Sabóia e G29 Garcia d’Ávila.

- Dois navios de desembarque-doca – G30 Ceará e G31 Rio de Janeiro.

Isso quer dizer que, de todos os CPLP, o Brasil é o único com desenvolvidas capacidades anfíbias próprias, uma experiência que poderá alargar aos outros.

O próximo exercício Felino ocorrerá no próximo ano na Guiné Bissau e poderia ser realizado a partir dos conceitos experimentados no Atlântico 2, ou seja, do continente para as Bijagós e mesmo até Cabo Verde, tendo em consideração o facto de ser necessário incrementar àquela latitude, o combate ao tráfico de droga, precisamente quando o tráfico de droga se tornou um flagelo que infesta toda a região circundante e as próprias Bijagós.

Apenas 17 das 80 ilhas Bijagós são habitadas pelos naturais do país, pelo que o espaço para esconderijos é enorme.

Integrar Cabo Verde na extensão dum exercício dessa natureza seria um reforço, enquanto para a Guiné Bissau poderia ser o início fortalecido do aumento da capacidade de resposta do país para fazer face à sua própria crise, tirando partido dum incremento da entreajuda com os outros CPLP, não se esquecendo que neste momento é a Guiné Bissau o elo mais fraco de todos.

Julgo que Cabo Verde, que faz parte dos exercícios Felino, não rejeitaria uma opção dessa natureza, pois o seu território até se aprestou ao 1º exercício da OTAN em África, (Steadfast Jaguar 2006), num contexto que preparou a entrada da OTAN no Afeganistão…

Em nome da paz há que substituir o Jaguar pelo Felino, até por que a OTAN sempre se fez sentir da pior maneira em África: por exemplo, foi o armamento da OTAN que reforçou as Forças Armadas Portuguesas para enfrentar o movimento de libertação nas então colónias portuguesas, fez agora 50 anos!

Em relação ao papel da OTAN em reforço de Portugal sob a ditadura colonial do regime de Salazar, recordo o testemunho de Basil Davidson em “Angola no centro do furacão”, citando Amílcar Cabral no prefácio de outro dos seus livros, “A Libertação da Guiné”:

“Desde 1961 Portugal tem utilizado na força aérea em África bombardeiros, caças, aviões de transporte e de reconhecimento, helicópteros, que lhe são vendidos, por vezes em termos de grande preferência, pelos seus aliados na NATO.

Alguns desses tipos são designados especificamente para a NATO, por exemplo, os FIAT G-91 NATO, tipo R4, caças a jacto.

A força aérea portuguesa obteve 40 desses aviões, que lhe foram fornecidos pela Alemanha Ocidental, em 1966, pela soma aproximada de 10 milhões de dólares.

O G-91 é um avião especialmente concebido para a NATO. A princípio foram construídos para os Estados Unidos nas fábricas alemãs, com licença italiana.

Os Estados Unidos tencionavam vendê-los à Turquia e à Grécia, que os utilizariam para os fins da NATO.

Mais tarde esses aviões foram transferidos para a força aérea alemã.

O avião é formado com uma armação italiana, um motor inglês, um trem de aterragem francês e um equipamento electrónico holandês.

Esses aviões são muito apropriados para as operações anti guerrilhas em África porque podem levantar voo em pistas pouco extensas”…

Portugal na OTAN, 35 anos depois do 25 de Abril, apresta-se para que se realize no Atlântico Sul, às claras e com base nos novos conceitos, o que Portugal de Salazar, enquanto regime fascista e colonial só podia realizar às escondidas em África!

A CPLP tem debatido a constituição de forças de paz intrínsecas e a oportunidade para fazer prevalecer esforços comuns, tirando partido sobretudo das experiências navais do Brasil enquanto emergente principal, (agora que o Brasil se manifesta cada vez mais à esquerda), é um factor a ser tido com toda a consideração.

Ao contrário das “propostas portuguesas” o Atlântico Sul não deve ser colocado na jurisdição da extensão dum Tratado ofensivo, agressivo e contra a humanidade como é o da OTAN.

Tudo o que colocamos sob os auspícios da CPLP, é a maneira mais construtiva e emergente de dizer NÃO À NATO!... e de forma a se cumprir, em Portugal, com a Constituição Portuguesa e defendendo os interesses legítimos do Povo Português!

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