domingo, 30 de outubro de 2011

A LEI (DA BALA) NA COLÓNIA DE CABINDA




ORLANDO CASTRO*, jornalista – ALTO HAMA*

Um jornalista da Voz da América foi vítima de um atentado, desta vez na colónia angolana de Cabinda.

Segundo testemunhos, o quintal da sua residência foi invadido por dois homens armados que, certamente, iam convidar o jornalista José Manuel (que não se encontrava em casa e que foi avisado pelos vizinhos do que se estava a passar) para jantar…

As autoridades coloniais (seja lá o que isso for) prometeram averiguar. Cá para mim vão apenas averiguar as razões pelas quais os facínoras não conseguiram fazer o mais importante: matar o José Amanuel.

Recordam-se da María Elizabeth Macías? Era jornalista no jornal mexicano “Primera Hora”. Foi decapitada por, dizia a mensagem que estava junto ao seu mutilado corpo, denunciar crimes nas redes sociais.

E se, em Portugal, a metodologia estratégica para silenciar quem pensa de forma própria é mais subtil, em Angola a coisa anda perto do que se passa no México.

O regime angolano, que não só é dono dos jornalistas como dono dos donos dos jornalistas (mesmo em Portugal, recorde-se), esquece-se que se o Jornalista não procura saber o que se passa é, com certeza, um imbecil. Esquece-se que se o Jornalista consegue saber o que se passa mas, eventualmente, se cala é um criminoso.

E como esta é uma regra que todos conhecem, em Portugal e em Angola existem cada vez mais jornalistas imbecis e criminosos.

Mesmo matando o mensageiro, os dois regimes irmãos de Portugal e Angola não conseguem esconder que há cada vez mais jornalistas comprados (viram assessores, consultores etc.), silenciados (prateleiras) e adiados (desemprego).

Ao contrário do reino lusitano, onde os jornalistas não morrem fisicamente (pelo menos por enquanto) mas vêem a dignidade ir desta para melhor, em Angola estão cada vez mais perto de serem “suicidados”.

E se é assim quando o assunto é Angola, quando ele respeita à colónia de Cabinda, então é que o dono do reino vai aos arames.

Como se tem visto nas recentes manifestações contra o regime, a ordem do “líder carismático” Eduardo dos Santos está, em Angola, na fase da porrada e em Cabinda na fase de limpar o sebo.

Mesmo matando o mensageiro, Eduardo dos Santos não consegue esconder que lidera a guerra aos Jornalistas, nem que seja por interpostas pessoas, entidades, empresas.

Depois de ter comprado, interna e externamente, os que achou necessários, entrou na fase de arrumar os que (ainda) não se renderam.

Em Portugal não é preciso dar um, ou quantos forem precisos, tiro no Jornalista. Basta fazer uma reestruturação empresarial (sinónimo óbvio de despedimentos). Quando o Jornalista descobrir que não tem dinheiro para pagar o empréstimo da casa ou os estudos dos filhos... dá um tiro na cabeça.

Em Angola a situação é diferente. Não se deixam comprar? Então toca a dar porrada neles. Não chega? Então é fazê-los chocar contra uma bala.

Porquê os Jornalistas? Porque a verdade é incómoda, seja na Rússia, em Angola, no Sri Lanka ou em Portugal. O que varia são os métodos para calar o mensageiro.

Em Portugal como em Angola, não faltam ministros, deputados e políticos em geral (todos de pistola no bolso) a dizer que a liberdade de Imprensa é um valor sagrado.

Sagrado sim desde que não toque nos interesses instalados, desde que só diga a verdade oficial.

Convenhamos que a verdade às vezes - quase sempre - é incomoda, seja em Portugal, na Rússia (Anna Politkovskaia), em Moçambique (Carlos Cardoso) ou em Angola (Alberto Chakusanga).

Vem isto a propósito das teses vigentes um pouco por todo o lado, que apontam para a necessidade de os jornalistas serem formatados consoante os interesses (económicos, políticos e similares) dos donos do Poder.

Se calhar, como me dizem ex-jornalistas que hoje são assessores, directores, administradores etc., o melhor é aceitar a derrota e na impossibilidade de os vencer…

Quem não aceitar a derrota continua adiado em Portugal, a ser preso em Angola e a estar na mira dos “democratas” angolanos em Cabinda.

* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.

Título anterior do autor compilado em Página Global: AINDA SE LEMBRAM DO CARLOS CARDOSO?

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