RTP
O encenador Celso Cleto afirma que Portugal não tem noção do valor de Eunice Muñoz, que hoje faz 70 anos de carreira e é agraciada pelo Presidente da República com a Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique.
Em entrevista à agência Lusa a propósito dos 70 anos de carreira da atriz, e quando questionado se Portugal tem noção do valor de Eunice, Celso Cleto é perentório: "Não, não tem", exclamou.
"Vamos ser muito claros e objetivos", prosseguiu o encenador, "estamos a comemorar 70 anos de uma atriz que vem agora ao seu teatro fazer comigo o aniversário, que não sabe o que vai fazer a seguir; não houve uma única televisão, um cinema, a contratá-la para fazer um filme, para fazer uma série", sublinhou.
Celso Cleto acrescentou que não houve "nada, rigorosamente nada" para assinalar os 70 anos de carreira da atriz. "Portanto, isto diz tudo. Não vale a pena a gente estar aqui a inventar, porque não há muita coisa para inventar", declarou.
O encenador está a dirigir Eunice Muñoz na peça "O cerco a Leninegrado", que hoje à noite sobe ao palco do Auditório com o seu nome, em Oeiras, exatamente 70 anos depois de a atriz ter pisado um palco pela primeira vez - o palco do Teatro Nacional D. Maria II -, onde se estreou contracenando com Amélia Rey Colaço, na peça "Vendaval", de Virgínia Vitorino.
"O cerco a Leninegrado" foi uma escolha de Celso Cleto por se tratar de uma comédia -- um registo, como afirmou, que Eunice faz pouco, embora o faça "muito bem" --, mas por ser também uma homenagem ao teatro.
"Fala de duas atrizes - a mulher de um diretor e uma atriz que vivem dentro do teatro -, e é um belo texto para celebrar os 70 anos de carreira da Eunice", de quem Celso Cleto é amigo, tal como do autor da peça, o espanhol José Sanchis Sinisterra, esclarece o encenador.
A peça foi também escolhida por ser "emblemática", uma vez que este ano também se assinalam os 70 anos do início do cerco àquela cidade russa, que durou de 08 de setembro de 1941 a 27 de janeiro de 1944, durante a II Guerra Mundial.
Sem querer entrar em grandes pormenores, Celso Cleto avançou que o texto da peça também fala da amizade, do que é ser ator num país ingrato para os artistas.
"De facto, nós vivemos num país ingrato para os artistas, muitas vezes", disse.
Eunice Muñoz é "uma caso único, há uma num milhão", assegurou o encenador que em 2006 a dirigiu, na mesma sala, em "Miss Daisy", do norte-americano Alfred Uhry.
"Nós, no século XX para o XXI, tivemos uma Eunice Muñoz e não sei se vamos ter uma atriz com estas características nos próximos anos", sublinhou.
Para Celso Cleto, a falta de aproveitamento do brilhantismo de Eunice Muñoz é também da responsabilidade dos diretores das televisões já que, nestas, "não há o sentido de cultura, do que é o teatro".
Até porque -- sustentou -- mesmo quando faz televisão, a atriz não o faz "com o estatuto que merece". "Vai fazer, faz muito bem grandes papéis, mas uma novela não é para ela. Acho que é evidente que ela devia ter tido uma grande série ou uma minissérie este ano. Era mais do que obrigação do Estado português", defendeu, acrescentando: "E o Estado português acha que dando uma medalha ou duas resolve o problema".
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