domingo, 18 de dezembro de 2011

Gás lacrimogêneo fabricado no Brasil é usado para reprimir protestos no Bahrein




Carlos Latuff e Thassio Borges, Rio de Janeiro e São Paulo – Opera Mundi

Pais dizem que bebê de seis dias morreu intoxicado pelo gás enquanto dormia

Imagens divulgadas nesta sexta-feira (16/12) nas redes sociais denunciam o uso de gás lacrimogêneo fabricado no Brasil durante a repressão aos protestos que seguem há dez meses contra o governo do Bahrein.

Nas imagens é possível ver um artefato metálico com a bandeira brasileira impressa junto dos dizeres “Made in Brazil”. O produto teria sido produzido no último mês de maio. Uma terceira foto mostra 20 cápsulas de gás lacrimogêneo que estariam sendo usadas no Bahrein sobre uma camisa da seleção brasileira.

Segundo relatos dos manifestantes bareinitas, as bombas de gás lacrimogêneo brasileiras já teriam, inclusive, feito uma vítima fatal. Uma menina de apenas seis dias teria morrido depois que uma bomba com o gás foi jogada próximo à casa de seus pais, que não participavam dos protestos.

Sajida Jawad sofreu intoxicação após inalar grandes quantidades de gás enquanto dormia. A menina chegou a ser levada ao hospital, mas não resistiu, segundo a agência estatal iraniana Irna.

"Quando as pessoas marcham para as ruas exigindo seus direitos legítimos por que casas deveriam ser atacadas?", questionou Faisal Jawad, pai da criança.

Outro lado

O governo brasileiro ainda não se manifestou sobre o assunto, mas a empresa responsável pela fabricação do artefato negou, por meio de sua assessoria de impressa, que exportasse seus produtos para o Bahrein. A Condor Tecnologias Não-Letais disse também por meio de nota que “fornece produtos para mais de 35 países, inclusive países árabes”. No entanto, “por obrigações contratuais de confidencialidade, a empresa não pode informar detalhes de seus fornecimentos”.

A Condor sugeriu ainda que o material pode estar sendo utilizado por algum país da região para o qual ela exporta seus produtos e que estaria operando no Bahrein a pedido do próprio governo local.

Por fim, a empresa ressaltou que seus produtos “são projetados especificamente para incapacitar temporariamente as pessoas, sem causar-lhes danos irreparáveis ou morte”. “A posição da Condor é que o material não pode ser empregado fora desse propósito”, concluiu. Confira no final desta reportagem a nota da empresa na íntegra.

Sadija Jawad tornou-se, no entanto, a 11ª vítima fatal entre os civis do país por conta do uso do artefato. Segundo cálculos dos próprios manifestantes, a cada cinco civis que morrem nos confrontos no Bahrein, pelo menos um é decorrência do uso do gás lacrimogêneo.

O governo do Bahrein já admitiu ter usado força excessiva em alguns casos. Além disso, o país alegou que os protestos foram incentivados pelo Irã e pediu a ajuda militar da Arábia Saudita e dos Emirados Árabes Unidos para contê-los. Não havia, até então, nenhuma informação a respeito de uma participação brasileira nos conflitos.

Histórico dos protestos

Os protestos contra o governo do Bahrein começaram no último mês de fevereiro motivados pelos demais levantes de países árabes que aconteciam simultaneamente.

Depois de intensos confrontos entre as forças de segurança de país e os manifestantes, milhares de pessoas foram detidas e mortas. Os dados são de uma comissão independente criada por iniciativa do próprio rei do país, Hamad bin Issa al-Khalifa, para averiguar as denúncias de que as forças de segurança estariam usando força extrema.

No final de novembro, o rei anunciou reformas que, segundo ele, iriam contentar "todos os segmentos de nossa sociedade". Apesar disso, os conflitos entre as partes continuam.

Confira a íntegra da nota enviada pela Condor Tecnologias Não-Letais

A Condor fabrica há 26 anos exclusivamente materiais não-letais, projetados dentro do preceito preconizado pela ONU de uso propocional da força (VIII Congresso, realizado em Havana, 1990). As tecnologias não letais são alternativas às armas de fogo e têm como objetivo minimizar danos e preservar vidas.

A Condor fornece produtos para mais de 35 países, inclusive países árabes. Por obrigações contratuais de confidencialidade, a empresa não pode informar detalhes de seus fornecimentos. Entretanto, como é de conhecimento geral, tropas de pelo menos cinco países diferentes estão operando no Bahrein a pedido do governo desse país.

Todos as negociações da empresa são controladas pelo Ministério da Defesa e pelo Ministério das Relações Exteriores e seus órgãos correlatos.

Os produtos não letais são projetados especificamente para incapacitar temporariamente as pessoas, sem causar-lhes danos irreparáveis ou morte. A pesquisa e a produção desse tipo de material são incentivadas pela ONU (8º Congresso da ONU sobre Prevenção do Crime e Tratamento dos Delinqüentes, realizado em 1990) e é medida de salvaguarda dos Direitos Humanos. A posição da Condor é que o material não pode ser empregado fora desse propósito.

Os produtos fabricados pela Condor devem ser utilizados apenas e tão somente na forma indicada em seus manuais de instruções e fichas técnicas, e é imperativo que sejam operados apenas por pessoas treinadas e qualificadas.

*Foto: Zajil Delmon / Twitter

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