segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

PRIVADAS JAPONESAS E O ACIDENTE NUCLEAR DE FUKUSHIMA




José Roberto Torero* – Carta Maior, em Debate Aberto

Governo japonês demorou um mês para ampliar evacuações da população que vivia perto de Fukuhsima. Não basta ter um grande arsenal tecnológico feito especialmente para administrar evacuações. É necessário apertar os botões, tomar as decisões. O mês de hesitação do governo pode ter custado muitas vidas.
Caro leitor, caríssima leitora, estou eu cá no Japão para ver a final do mundial de clubes. Pois bem, hoje pela manhã, sentado na privada (calma, não será um texto escatológico) me deparo com a principal manchete do The Japan Times, que fala sobre o acidente nuclear de Fukushima.

Eu vos pergunto: O que a privada e Fukushima têm em comum?

E eu vos respondo: Excrementos, dejetos e, principalmente, evacuações.

Explico melhor:

No Japão, as privadas são tremendamente tecnológicas. Nada da franciscana simplicidade daí. Aqui elas têm vários acessórios. O mais comum é o jato limpador, um caninho sai de dentro da privada e dispara um jato de água (com pressão e temperatura controláveis) para limpar as partes íntimas do usuário. Mas, se isso é já impressionante, pense ainda em assentos aquecidos, vapor secante, jato com perfume desodorizador, levantamento da tampa através de sensor de proximidade, etc...

Pois bem, nesta confortável situação li o texto de capa do Japan Times, que falava sobre a demora do governo para tomar atitudes depois do acidente nuclear de Fukushima 1, que aconteceu no dia 12 de março, em consequência do tsunami.

A Comissão de Segurança Nuclear (utilizando-se de modernos sistemas de detecção de radiação na atmosfera), no dia 23 de março informou ao governo que havia altos níveis de radiação na cidade de Iitate e em outros municípios a noroeste de Fukushima, fora da área de evacuação já prevista de 20 km.

Ou seja, deveriam ser ampliadas as evacuações da população para além dos 20 km da zona em torno da usina, e estas pessoas teriam que ter recebido iodo imediatamente (a ingestão do iodo não radioativo antes ou nas primeiras horas após o contato com isótopos radioativos de iodo impede que a radioatividade seja absorvida pela tireoide).

Mas o governo, alegando a possibilidade de uma nova explosão, achou que as pessoas ficariam mais seguras em casa ao invés de estarem se locomovendo (uma desculpa muito contestável), e adiou a decisão por um mês.

Hoje o governo admite que perdeu sua melhor chance de tomar medidas de evacuação.

Ou seja, não basta ter um grande arsenal tecnológico feito especialmente para administrar evacuações. É necessário apertar os botões, tomar as decisões. O mês de hesitação do governo pode ter custado muitas vidas.

*José Roberto Torero é formado em Letras e Jornalismo pela USP, publicou 24 livros, entre eles O Chalaça (Prêmio Jabuti e Livro do ano em 1995), Pequenos Amores (Prêmio Jabuti 2004) e, mais recentemente, O Evangelho de Barrabás. É colunista de futebol na Folha de S.Paulo desde 1998. Escreveu também para o Jornal da Tarde e para a revista Placar. Dirigiu alguns curtas-metragens e o longa Como fazer um filme de amor. É roteirista de cinema e tevê, onde por oito anos escreveu o Retrato Falado.

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