quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

COMO DE FOGE DE UMA GUERRA




José Goulão – Jornal de Angola, opinião

A toda poderosíssima OTAN está com um problema, pelo menos um: como sair do Afeganistão? A resposta, à primeira vista, até parece fácil. Basta empacotar as trouxas e regressar a casa, isto é, a muitas casas pois estão por lá contingentes de dezenas de nacionalidades.

Fugir pura e simplesmente também não é uma dificuldade. As retiradas estão contempladas por inerência em quaisquer planos operacionais, se for preciso com soluções de A, B a Z.

O problema da OTAN não é esse. É sair de um problema que criou – se foi em nome próprio ou dos seus membros de maior peso não interessa para o caso – dando a sensação de que ganhou a guerra, resolveu os assuntos pendentes e deixa em funções um governo que governa, um exército com autoridade em todo o país e forças de segurança que segurem.

Ora como sabemos este cenário é absolutamente virtual. E sê-lo-á pelo menos até 2015, data que o senhor Obama, comandante em chefe da Aliança Atlântica, definiu como sendo a da saída das suas tropas.

O que está em causa não é uma saída digna, o que até seria respeitável. É uma fuga apresentada como uma vitória através de uma campanha de propaganda que dê como alcançados todos os objectivos quando apenas um se concretizou, assassinar Bin Laden.

Mesmo assim demorou dez anos e consumou-se trocando um aliado por um potencial inimigo, o Paquistão.

Mas se o prazo estabelecido por Obama é 2015, a que propósito é que o assunto se levanta agora – e mais uma vez? Porque o atrapalhado presidente francês, Nicholas Sarkozy, reclama que isto não pode continuar assim depois de mais quatro compatriotas seus terem sido assassinados, não por um talibã mas por um soldado afegão revoltado por ter visto o vídeo de soldados norte-americanos urinando sobre cadáveres de talibãs.

Com eleições presidenciais a menos de cem dias, sondagens a pedir milagres, este é o tipo de coisa péssima para uma campanha eleitoral. Prometer a retirada é o mínimo. O máximo seria chamar já os soldados, o que podia funcionar como pau de dois bicos, o eleitorado natural de Sarkozy é a direita e a sua jamais perdida alma colonial.

Esta foi a razão pela qual o problema da retirada emergiu agora com esta acuidade. Amanhã pode ser por outro motivo, depois de amanhã por outra razão e assim por diante porque está tudo por resolver no Afeganistão.

A OTAN retirou os talibãs de Cabul mas em mais de dez anos não liquidou o grupo nem consegue ser credível na estratégia de negociação. Instalou na capital um governo sufragado por várias eleições fraudulentas que nem com o apoio do mais poderoso exército do mundo consegue governar muito para lá do palácio presidencial e dos edifícios do governo.

Há quase uma década que a Aliança Atlântica procura tornar operacional um novo exército afegão capaz de garantir a soberania em todo o país. Isto é, os seus criadores pedem-lhe que faça o que eles próprios não conseguem fazer recorrendo à maior força jamais reunida para uma guerra.

Apliquemos a esta situação, como mero exercício de reflexão, o método científico de redução ao absurdo.Suponhamos que a OTAN decidia sair amanhã do Afeganistão.

Quanto tempo estaria Karzai no palácio presidencial? Quantos meses levariam os talibãs a destroçar o exército afegão, provavelmente assimilando parte dele? Conseguiria desta vez o país resistir aos movimentos separatistas que a invasão estrangeira tem ajudado a fortalecer?

É este o problema que a OTAN não sabe resolver, depois de para ele ter contribuído em várias fases. Não é preciso ter memória de elefante para recordar que os talibãs, como o próprio Bin Laden e tantos outros grupos e grupinhos que gravitam na constelação Al Qaeda, nasceram em laboratórios geridos ou tutelados por grandes potências da Aliança Atlântica.

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