FV - Lusa
Macau, China, 29 jan (Lusa) - Macau pode ser uma cidade com agências literárias que trabalhem na mediação entre as línguas portuguesa e chinesa, substituindo a atual intermediação feita em Nova Iorque, defendeu hoje o escritor brasileiro no primeiro festival literário no território.
"Cada vez mais se publicam livros no Brasil, cada vez mais se vendem livros na China. E a tradução de livros em língua portuguesa para o chinês e vice-versa é mediada via agências literárias em Nova Iorque. E parece-me um desperdício. Não precisamos mais desse intermediário", explicou João Paulo Cuenca, à margem do primeiro painel do festival, "Países de Língua Portuguesa e China - um romance".
Ao frisar que atualmente "a China é o maior parceiro comercial do Brasil", João Paulo Cuenca salientou que "essa parceria não se reflete em cultura, não se reflete em importação e exportação de cinema, de livros", o que provoca implicações culturais mas também económicas porque "é um dinheiro que não está a ser gerado".
"Macau poderia ser uma cidade chave para esse encontro, Macau poderia ser uma cidade com agências literárias que trabalhassem nesse negócio, que fizessem a mediação entre essas duas línguas, pelo passado histórico, pelo que a Região representa em termos de diálogo entre o mundo lusófono e a China. É uma porta de entrada e uma porta de saída", sustentou.
Na perspetiva do autor dos romances "Corpo presente" e "O dia Mastroianni", para quem tudo na China é "em escalas gigantescas", "o português pode ser uma arma económica", mas vai depender dos esforços dos próprios países da língua portuguesa.
"Para estas coisas é necessária a ação governamental. Falta marketing à língua portuguesa, falta integração entre os países. E parece-me absurdo que o Instituto Camões não seja uma coisa internacional. Inventem um nome novo, mas devia ser uma iniciativa dos países lusófonos com o investimento de todos, e neste momento com o dinheiro do Brasil, que é quem tem dinheiro para isso", observou.
O escritor nascido no Rio de Janeiro comentou ainda que "o peso de uma nação não é só a pujança económica".
"Existe um 'soft power', um poder nas ideias, na língua, e um poder político através da cultura. O Brasil aos poucos começa a despertar para isso", concluiu.
Já a também brasileira Tatiana Salem Levy, - que em setembro vai lançar em Portugal o romance "Dois rios" -, reconheceu que "a globalização é sempre mais difícil quando chega a hora da cultura", mas vincou que o facto de o festival literário de Macau culminar com a publicação de um livro bilingue (português e chinês) "é uma janela" de oportunidade.
"A tradução é uma questão difícil que vai sendo resolvida com os anos. Não é uma coisa que se faça de uma hora para a outra, mas acho que é importante começar com eventos como este, que são pequenas coisas que às vezes achamos que não tem muita amplitude, mas que são fundamentais para daqui a uns anos termos uma troca muito maior do que a que temos hoje", sublinhou, à margem da abertura do certame.
Por sua vez, a escritora Xu Xi, residente em Hong Kong, e que abriu o festival literário de Macau com um workshop de escrita criativa disse à Lusa que mais do que estarem traduzidos em chinês, os autores de língua portuguesa devem começar pelo inglês.
"Agora o chinês é uma das grandes línguas, mas outras editoras de línguas de menor abrangência não vão traduzi-los até verem que (os autores) têm uma grande presença internacional. E, para o bem e para o mal, a língua inglesa é a língua mais global", sublinhou.
Xu Xi aconselhou ainda os escritores lusófonos a tirarem mais partido do "eletronic publishing", que veio fazer com que a literatura esteja a viajar muito mais depressa, nomeadamente através dos e-books.
"Por exemplo, eu estava a vir para este festival e consegui ver os livros de toda a gente que participa na iniciativa. Por isso eu acho que para países pequenos como Portugal e em que nem toda a gente fala a língua, a melhor forma de divulgação é garantir que têm uma forte presença na internet", sublinhou.
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