segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

ANGOLA – CUBA – “OPERAÇÃO CARLOTA II” – A POSSÍVEL NOVA AJUDA INTERNACIONALISTA CUBANA EM PROL DA EDUCAÇÃO, FORMAÇÃO E SAÚDE DO POVO ANGOLANO



Martinho Júnior, Luanda

“Se todo o desenvolvimento da sociedade humana tem sido inevitavelmente caótico, desordenado, imprevisível e sumamente cruel e injusto, a luta por criar outro mundo diferente, verdadeiramente racional, digno da inteligência da nossa espécie, constitui neste momento da sua história, que em nada é parecido com qualquer outra etapa prévia da humanidade, uma coisa que não era possível e nem sequer imaginável noutras circunstâncias: uma tentativa de que os seres humanos, pela primeira vez programem o seu próprio destino”, extracto do discurso do Presidente Fidel de Castro, por ocasião do 45º Aniversário da Revolução Cubana.

A 5 de Novembro de 2005, farão trinta anos sobre a data decisiva do início da “Operação Carlota”, através da qual se procedeu com arrojo ao socorro internacionalista das “Forças Armadas Revolucionárias” de Cuba, às “FAPLA”, tendo como objectivo a defesa de Angola perante a silenciosa invasão levada a cabo pelo regime Sul Africano do “apartheid”, através da “Operação Savanah”, caucionada pela iniciativa encoberta da CIA, sob as ordens do então Secretário de Estado Norte Americano, Henry Kissinger, que tinha como fim último a tomada do poder por forças suas subsidiárias, em Luanda, a 11 de Novembro de 1975.

De facto a 5 de Novembro de 1975, o Presidente Fidel de Castro recebeu uma delegação Angolana, que veio-lhe dar conhecimento do plano Sul Africano e Norte Americano, bem como do seu desenvolvimento no terreno e, ao mesmo tempo, formalizava um urgente pedido de ajuda Internacionalista.

A ajuda Internacionalista Cubana a Angola, não era contudo um dado novo: desde meados da década de 60 que, no quadro do “Comité de Organizações Nacionalistas das Colónias Portuguesas” (“CONCP”), o “MPLA”, tal como as outras Organizações que lutavam contra o colonialismo Português em cada uma das então colónias de Portugal, sentiam o estímulo e o apoio directo das “FAR”, que haviam colocado em Brazzaville a 2ª coluna do Che, comandada por Jorge Risquet Valdês.

Muitas acções desencadeadas desde então em Cabinda (2ª Região) e Norte de Angola (1ª Região), foram estabelecidas com o apoio da prestimosa ajuda Cubana, que reforçou a lógica de Libertação que dinamizou desde essa altura a Direcção do próprio “MPLA”.

A ajuda que se pedia então perante a emergência, era a sequência dessa lógica de Libertação dinamizada a partir de Brazzaville, que se impunha fazer prevalecer pela força das armas.

A “Operação Carlota” foi, por outro lado, uma exclusiva decisão Cubana e, a confirmá-lo, estão as considerações do historiador Sul Africano Peter Stiff, em “The Silent War – South African Recce Operations – 1969 / 1994”:

“Fidel de Castro disse a Barbara Walters, durante uma entrevista realizada em 1977 – não pensem que os Soviéticos seriam capazes de pedir a Cuba, para que fosse enviado um único homem para Angola… uma decisão desta natureza, pôde exclusivamente ser tomada pelo nosso Partido e Governo… os Soviéticos… jamais pronunciaram uma única palavra sobre este assunto. Foi uma decisão exclusiva de Cuba… decidimos enviar a primeira unidade militar a Angola, a fim de combater as tropas Sul Africanas… se não tivéssemos feito esse esforço, era muito provável que a África do Sul assumisse os compromissos de poder em Angola”.

Muito recentemente, na Primavera de 2003, o Presidente Fidel de Castro, voltou a referir-se à decisão Cubana de desencadear a “Operação Carlota”, numa entrevista concedida ao realizador Norte Americano Oliver Stone, que seria publicada recentemente em Português e em exclusivo, pela revista “Visão”:

“Enviou um total de quase 400 mil efectivos para África. É imenso para um pequeno País como Cuba. Quem pagou? A União Soviética?

De modo nenhum. Esses homens foram transportados nos nossos navios e foram pagos pelo Governo Cubano, tal como os voluntários civis.

Quantos homens perdeu?

2.307 , incluindo 2.106 só em Angola. Ficámos 15 anos nesse País.

De certo modo as suas guerras Africanas, foram o seu pequeno Vietname. Mas foi bem sucedido.

Em Angola, a nossa vitória sobre os Sul Africanos, foi um factor determinante para o fim do apartheid.

Como assim?

Estavam cheios de medo que os invadíssemos. Os Americanos estavam muito preocupados, tal como os Russos.

Quer dizer que os Sul Africanos se sentiram muito vulneráveis?

Sim, psicologicamente foram derrotados… Mas o mais extraordinário foi irmos combater tão longe de Cuba e longe de Moscovo, contra um estado com armas nucleares.

É verdade que Kissinger se ofereceu para levantar o embargo contra Cuba, em troca da sua retirada de Angola?

Os Americanos fizeram essa oferta várias vezes, mas também em relação a conflitos na América Central, em que estivemos envolvidos”.

Quase trinta anos depois da “Operação Carlota”, num balanço que se oferece, há algo de muito essencial que ficou no entanto por realizar e completa o sentido de legitimidade histórica da própria missão.

A Libertação e a Independência dum Povo, pode passar por etapas muito importantes, que terão de ser realizadas com o recurso às armas, todavia jamais o verdadeiro sentido de Libertação e de Independência se tornaram completos, se esse Povo não soube resgatar em seu proveito e com o seu próprio esforço, capacidades de conhecimento que estimulassem por si, os parâmetros de sustentatibilidade do seu próprio desenvolvimento e lhe conferissem o lugar justo entre todos os Povos da Terra e perante os fenómenos do ambiente e da natureza.

Esta ideia, que aliás tem sido prioritariamente cultivada e estimulada em Cuba ao longo dos 45 anos da Revolução Cubana, está toda por realizar em Angola e, interpretando desse modo, parece-nos ter ficado até hoje incompletos, os termos estratégicos das potencialidades a longo prazo da “Operação Carlota”.

Dois anos e meio depois do fim da guerra no País e na Região, o sentido do que está por realizar, em termos de educação, formação e saúde, em benefício do Povo Angolano, um projecto que em grande medida só poderá ocorrer à margem dos processos típicos da Globalização neo liberal, conduz-nos a um verdadeiro desafio, crucial e decisivo.

A consciência da prioridade que deve ser conferida à educação, formação e à saúde do Povo Angolano, redunda hoje em muitos círculos importantes à escala do País e a nível Internacional.

Assinalando o aniversário da “LAC”, por exemplo, várias têm sido as entidades entrevistadas que consideram como prioritária as medidas que conduzam à educação de todo o Povo Angolano e, entre elas, professores universitários da envergadura dum Orlando Rodrigues , ou dum Mário Pinto de Andrade.

O Relatório do “PNUD” relativo ao ano de 2004, coloca Angola praticamente na cauda dos Índices de Desenvolvimento Humano, em 166º lugar, entre os 177 considerados, o que torna evidente o Subdesenvolvimento crónico em que o País e o Povo Angolano têm sido obrigados a (sobre) viver.

A educação, a formação e a saúde, tornam-se hoje de tal modo prioritárias e decisivas em Angola, quanto é urgente, através de políticas abrangentes e consensuais, envolvendo os leques Partidários e Institucionais mais variados, estabelecerem-se compromissos que elevem o grau duma ampla estratégia Nacional e, desse modo, encontrarem-se métodos e formas saudáveis, que visem pôr definitivamente cobro, a todo o tipo de manipulações que Angola, a começar pelo seu Estado, têm sido sujeitos, particularmente desde 1985 a esta parte.

Essa estratégia prioritária, pode até tornar-se na estratégia-chave para o Povo Angolano, mesmo que as leis típicas das economias de mercado, se tornem tão omnipresentes.

Iniciar esse projecto prioritário, é vital para Angola e, encontrar em Cuba um parceiro credível e resoluto, tal como nos anos decisivos da “Operação Carlota”, parece constituir hoje um caminho estratégico, solidário e culturalmente viável, que dá sequência aos ideais de Libertação e Independência que legitimamente assistem ao Povo Angolano e Cubano desde os já longínquos anos de 60 e 70 do século passado.

Ao que se tem feito ainda timidamente constar em Luanda, o Presidente Angolano José Eduardo dos Santos, visitará dentro em breve e oficialmente, Cuba.

Cremos que essa visita de Estado, mais do que reforçar os laços de amizade que historicamente unem os dois Povos, visa abrir um novo estágio de cooperação multi lateral entre Cuba e Angola, que dê ênfase aos investimentos nobres e prioritários na educação, na formação e na saúde.

Se assim for, uma parte muito substantiva de solidariedade humana, que se podem medir nas imensas tarefas do arranque de políticas de desenvolvimento sustentável, só possível com políticas à esquerda, poderá estar-se a desencadear e, saudavelmente, ocupar o lugar vazio que hoje ainda se apresenta.

Se assim for, podemos estar a inaugurar de forma honrada e comprometida a “Operação Carlota II”.

Que venha ela, por muitos e bons anos.

Martinho Júnior, Luanda

*Publicado a 2 de Outubro de 2004 no nº 414 do ACTUAL

- Ler mais de Martinho Júnior

Sem comentários:

Mais lidas da semana