David Dinis e Helena Pereira* - Sol
Passos Coelho não gostou das fugas de informação do Conselho de Ministros da semana passada em que o QREN esteve em cima da mesa. E na reunião desta quarta-feira deu um murro na mesa. O primeiro-ministro fez questão de deixar bem claro a todos os seus colegas de Governo que tudo o que se passa naquelas reuniões semanais do Conselho de Ministros é para morrer ali – uma obrigação decorrente da lei orgânica do Governo. Contactados depois disso pelo SOL, vários ministros repetiram, de forma coincidente, que «o que se passa no Conselho de ministros é sagrado».
A irritação de Passos Coelho começou logo na noite de quinta-feira da semana passada, quando soube que o ex-líder do PSD, Marques Mendes, relatou na TVI24 a discussão em Conselho de Ministros que obrigou ao adiamento da decisão sobre o novo modelo de gestão do QREN.
O primeiro-ministro faltou a essa reunião por estar em Bruxelas e, no regresso, quando discursa já na madrugada de domingo, após serem conhecidos os resultados das eleições directas do PSD, trata de esvaziar a polémica. E diz, de uma clara, que é o ministro das Finanças quem terá uma «palavra muito relevante, para não dizer decisiva» sobre a reafectação dos fundos comunitários. Dessa forma, desmente Mendes, que garantia que Gaspar não venceria a guerra.
Conversa ao telefone
Nesse domingo, Passos fala ainda ao telefone com Álvaro Santos Pereira e, no dia seguinte, após o jornal i ter noticiado que o ministro queria demitir-se, fala com ele em S. Bento durante três horas. Álvaro sai fazer aos jornalistas qualquer declaração sobre a polémica.
O ministro, sabe o SOL, estava incomodado, entre outras coisas, com as notícias que o envolviam. As desconfianças recaíam no CDS, que nos últimos meses disparou várias vezes na direcção de Santos Pereira. Passos haveria de reunir com Portas, precisamente depois do ministro da Economia sair de S. Bento.
Nessa segunda-feira, aliás, o Público noticiava que o Governo estava empenhado em tentar saber como é que tinha passado para a comunicação social as notícias do diferendo em Conselho de Ministros e, sobretudo, os dois documentos que estiveram em cima da mesa na reunião de quinta-feira, dia 1, e que tinham sido publicados pelo DN no próprio dia.
Passos Coelho não quis faltar de novo a uma reunião do Conselho de Ministros. Antecipou a desta semana para quarta-feira devido à deslocação prevista para quinta e hoje à Finlândia e Suécia. Deu o puxão de orelhas a todos os ministros sobre as fugas de informação e fez aprovar os dois diplomas que tinham ficado na gaveta e que, na prática, dão poderes reforçados a Vítor Gaspar.
Passos decide que, ao contrário do que é habitual, desta vez nem sequer há conferência de imprensa. Quer ser ele próprio a falar sobre o QREN mais logo no debate quinzenal no_Parlamento e não deixar os ministros enredarem-se em explicações.
Na Assembleia, garante que «não há guerras de capelinhas» no seu Governo e explica que Gaspar vai coordenar a reprogramação de todos os fundos com o objectivo de se «atingir as metas orçamentais a curto e médio prazo».
Gaspar alastra poderes
Se na versão inicial, Gaspar ia só controlar o QREN, na versão final aprovada esta semana, passa a ter direito de veto também sobre todos os fundos comunitários da Agricultura (Proder, Feder, Promar) ou do Ministério dos Negócios Estrangeiros, dois ministérios do CDS.
«Quando estamos a falar de dinheiros comunitários, estamos a falar de comparticipação nacional. E a comparticipação nacional tem de aparecer no Orçamento do Estado e temos de saber onde vai aparecer e para quê. É fundamental haver esta coordenação», explica a ministra da Agricultura, Assunção Cristas (ver entrevista no Confidencial).
Para agravar ainda mais a polémica, Passos viu as principais confederações patronais unirem-se para apoiar o ministro da Economia. Enviam uma carta ao primeiro-ministro, criticando o Governo por alimentar «ruído mediático» em torno do QREN e pedem que o Ministério da Economia mantenha «todas as competências» na gestão. Uma iniciativa inédita que avoluma o mal-estar em S. Bento.
Álvaro sai fragilizado de toda esta polémica, mas uma eventual demissão não interessa a ninguém. Tem uma missão difícil pela frente, para não dizer quase impossível. Tem vários dossiês para resolver até final do ano, tudo compromissos assumidos com a troika e que são decisivos para a boa avaliação do cumprimento do Memorando de Entendimento. É o caso da reestruturação do sector dos transportes públicos, do corte nas rendas nas energias, das Parcerias Público-Privadas e das novas regras laborais. Vai continuar a ser o alvo da contestação social nas ruas.
Equipa em ruptura
O clima de trabalho no Ministério da Horta Seca, contudo, é longe de ser fácil. A relação com o primeiro dos seus secretários de Estado, Almeida Henriques, é distante. Àlvaro privilegia a opinião dos secretários de Estado do Emprego (Pedro Martins) e do Empreendedorismo (Carlos Oliveira). O responsável pela Energia, Henrique Gomes, já ameaçou demitir-se por causa do recuo do Governo na criação de um imposto sobre as renováveis. Agora, viu-se de novo ultrapassado. O fim das rendas na energia está a ser tratado directamente entre o secretário de Estado-adjunto Carlos Moedas e o ministro das Finanças.
*com Sofia Rainho e Tânia Ferreira
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