Orlando Castro*, jornalista – Alto Hama*
As prostitutas da Mouraria (Lisboa) estão a pensar bem. Querem organizar-se numa cooperativa. Creio até que a iniciativa terá a plena aceitação de uma outra congregação intelecto-prostibular da capital, conhecida por Parlamento.
Mas, reconheço, o que há mais em Portugal são actividades prostibulares – embora não assumidas como tal. O dito jornalismo é uma delas. Na verdade, o elegantemente chamado comércio do jornalismo (onde os profissionais não vendem, alguns, o corpo mas sim a alma) é hoje, em Portugal, uma rentável profissão.
José Rebelo, professor universitário que coordenou equipa do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES) do Instituto Universitário de Lisboa e que realizou o estudo "Ser jornalista em Portugal - perfis sociológicos", considera preocupante o facto de cada vez mais estagiários estarem a ser utilizados como jornalistas profissionais.
É como na prostituição propriamente dita. De pequenino é que se torce o pepino. E é sempre útil estagiar, ganhar como tal (quando não se trabalha de borla ou se dá todo o lombongo ao chulo) mas trabalhar com profissional adulto. É, aliás, uma forma de combate o desemprego juvenil.
Hoje (salvo muito poucas excepções) não se fazem jornais, fazem-se linhas de enchimento de conteúdos de linha branca em forma de papel, rádio, televisão ou Internet. E fazem-se à medida e por medida do cliente. E o cliente não é o público. É quem paga, é quem manda. Tal como na prostituição. O cliente diz o que quer e o resto fica a cargo de quem sabe da poda.
A coisa está brava? Não, não está. Estaria se falássemos de Jornalismo. Resta, contudo, a certeza de que é mais a parra do que a uva. Desde logo porque, ao contrário do que seria de esperar, os “macacos” não estão nos galhos certos. Tal como os políticos e as prostitutas. É tudo a monte e fé em que paga mais.
A convivência entre os diferentes poderes não tem sido fácil. O suposto Estado de Direito democrático em Portugal ainda é – na melhor das hipóteses - uma daqueles puritanas meninas que, apesar dos muitos vícios, deformações e preconceitos herdados ou estimulados, se apresenta como impoluta defensora dos nobres ideais das virgens.
É claro que, quase sempre, o cliente estabelece a regra do “quero, posso e mando”, instituída por essas linhas de enchimento fora, cabendo-lhe o direito de propriedade sobre o ou a artífice que tem à sua disposição, seja num jornal ou numa esquina da vida.
Tal como as putas das muitas mourarias de Portugal, também os jornalistas são comidos (física ou mentalmente) à grande e à francesa com a conivência activa de muitos que hoje conseguem andar de pé mas que ainda há pouco tempo vagueavam pela horizontalidade da noite.
Com a criação de uma cooperativa as trabalhadoras poderão pôr alguma ordem na casa. Dessa forma poderão, ao contrário do que por exemplo acontece na política, seleccionar quem é digna ou não de estar na profissão.
E quem sabe, aliás, se um dia não poderão integrar a confraria dos deputados, garantindo um lugar no Parlamento, como foi o caso da italiana Ilona Staller (mais conhecida por Cicciolina).
* Orlando Castro, jornalista angolano-português - O poder das ideias acima das ideias de poder, porque não se é Jornalista (digo eu) seis ou sete horas por dia a uns tantos euros por mês, mas sim 24 horas por dia, mesmo estando (des)empregado.
Título anterior do autor, compilado em Página Global: HÁ RAZÕES QUE A RAZÃO (DES)CONHECE
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