domingo, 22 de abril de 2012

França: Campanha presidencial «hiperpersonalizada» e «à margem da crise»



TSF, com foto EPA

Os franceses votam, este domingo, para a primeira volta das eleições presidenciais, depois de uma campanha «hiperpersonalizada», sem «discussões de fundo sobre os problemas da França» e «à margem da crise», disse à Lusa um especialista em comunicação política.

Dominique Boullier, investigador do Instituto de Estudos Políticos de Paris, considera também que a campanha para a primeira volta fica marcada por um fenómeno que se vem repetindo nas últimas duas presidenciais: a «emergência de um terceiro homem», resultado de um esforço dos media para contornarem o «aborrecimento» do público face à «bipolarização das eleições».

Na corrida ao Eliseu estão dez candidatos, da extrema-esquerda à extrema-direita. No topo das intenções de voto dos franceses estão o socialista François Hollande e o Presidente recandidato, Nicolas Sarkozy, da União Por um Movimento Popular. O primeiro lugar na primeira volta pertence ora a um, ora a outro, mas os estudos de opinião apontam o socialista como claro vencedor na segunda volta. Quatro sondagens recentes davam uma vitória confortável a Hollande, entre sete e 14 pontos de avanço em relação a Sarkozy.

Marine Le Pen, filha do histórico líder da extrema-direita francesa, Jean-Marie, concorre pela Frente Nacional. As sondagens, que chegaram a apontar para intenções de voto na casa dos 20 por cento, atribuíram-lhe, durante este mês, valores entre os 13 e os 16 por cento.

Jean-Luc Mélenchon, ex-socialista, é o rosto da Frente de Esquerda (aliança entre o Partido de Esquerda e Partido Comunista Francês). As sondagens atribuem-lhe entre 13 e 17 por cento dos votos. A imprensa chama-lhe "o terceiro homem". As sondagens mostram que este terceiro lugar, seja de Le Pen ou de Mélenchon, será renhido.

François Bayrou (Movimento Democrata), candidato à presidência pela terceira vez, regista intenções de voto entre os 10 e os 11 por cento.

Entre os chamados pequenos candidatos, cotados entre 0 e 03 por cento, estão Eva Joly (Europa Ecologista/ Os Verdes), Nathalie Arthaud (Luta Operária), Philippe Poutou (Novo Partido Anti-Capitalista), Nicolas Dupont-Aignan (Debout La Republique), e Jacques Cheminade (movimento Federação por uma nova Sociedade).

Na opinião do investigador Dominique Boullier, esta campanha passou-se sem que sequer se tivesse a impressão de que a França e a Europa atravessam «a mais grave crise desde os anos de 1930».

Os candidatos permaneceram «à margem» dos problemas, a «falar de outras coisas». «Os candidatos dos maiores partidos não entraram verdadeiramente no debate. Não temos a impressão de estarmos numa crise que requer liderança, reformas, uma visão», afirmou, argumentando que a campanha política não esteve «à altura dos problemas actuais», nem pôs «em cima da mesa soluções para sair desta crise».

É também isso que sustenta o editorial da edição desta semana da revista conservadora "Le Point", com Claude Imbert a criticar os dois maiores candidatos pelo discurso «a nossa receita para a crise é boa. Votem em nós, depois ver-se-á».

Esta campanha, considera ainda o investigador Dominique Boullier, foi também de «alta-frequência, como nas transações financeiras», devido ao recurso às redes sociais, sobretudo ao Twitter e ao Facebook: «Ouvimos múltiplas tomadas de posição, com frases curtas, fortes, que fizeram proliferar a reactividade rápida e, não só não geraram participação, como impediram um debate de fundo sobre questões essenciais para o país», afirmou.

Para além disso, tudo girou em torno de uma «hiperpersonalização», como resposta «ao modelo criado pelo mandato de Sarkozy».

Dominique Boullier regista ainda uma outra característica desta campanha, que repete o que aconteceu em 2002 e em 2007: «A emergência do terceiro homem», que é já «uma história constante da V República».

«Em 2002 foi Jean-Marie Le Pen (Frente Nacional), em 2007 foi François Bayrou (Modem), e agora é Jean-Luc Mélenchon (Frente de Esquerda). Não há nenhum ponto comum entre os três candidatos, já percorremos o espectro político. Esta encenação - a criação de uma esperança - é um fenómeno mediático para contornar o desinteresse das pessoas na campanha, devido à bipolarização, constante no sistema».

O «fenómeno do terceiro homem», como lhe chama, não vai, considera, «traduzir-se em termos eleitorais», mas vem lembrar que «os franceses querem pluralismo».

A segunda volta das eleições presidenciais em França está agendada para o dia 06 de Maio.

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