António Marinho Pinto – Jornal de Notícias, opinião
O governo deu o golpe na Comissão para a Eficácia das Execuções (CPEE), usando aliás, métodos que lembram os períodos áureos do PREC, em que se recorria a todos os meios para se ganhar as votações nos plenários e assembleias gerais. Desta feita tratou-se de afastar uma pessoa que tinha desempenhado um papel relevantíssimo no combate às fraudes que muitos solicitadores de execução faziam no âmbito de acções executivas. O que se passou, na semana passada, naquela comissão independente, demonstra que este governo não olha a meios nem a aliados para governamentalizar entidades que escapam ao seu controlo. Mas vamos aos factos.
No plenário da CPEE da passada 6ª feira, o governo apresentou para presidente o nome de Hugo Moreiras Marques Lourenço, um funcionário público do ministério das Finanças que desde 2006 desempenha as funções de director do Departamento de Cinema e Audiovisual do Instituto do Cinema e Audiovisual (ICA). O candidato do governo foi eleito com 5 votos - 3 do governo e 2 da Câmara dos Solicitadores (CS) -, enquanto a anterior presidente, Paula Meira Lourenço, proposta pelo Conselho Superior da Magistratura (CSM) e pela Ordem dos Advogados (OA), obteve 4 votos(todos os outros membros, excepto o representante das associações patronais que faltou). O nome de Hugo Lourenço apareceu ali como um dikat do governo e da CS, pois não foi previamente discutido ou sequer apresentado aos restantes membros da CPEE. Já na data marcada desde há meses para essa eleição (3ª feira anterior, dia 10 do corrente) o governo e a CS inviabilizaram-na por falta de quórum, tendo um dos representantes do governo sido obrigado a abandonar a reunião e substituído à pressa por outra pessoa na reunião seguinte. De destacar é a atitude do próprio presidente da CS que na véspera do plenário se substituíra ao vogal que ele próprio havia designado para a CPEE. Ou seja, assumiu funções para faltar logo no dia seguinte.
Refira-se que a CPEE é uma comissão independente da Câmara dos Solicitadores que é responsável pela disciplina dos agentes de execução, bem como pelo acesso ao estágio e pela avaliação dos agentes de execução estagiários. Foi criada em 2008 pelo DL 226/2008, de 20 de Novembro e é constituída por onze pessoas em representação do Conselho Superior da Magistratura (um), da Ordem dos Advogados (um), do Governo (três), da Câmara dos Solicitadores (dois), das associações de consumidores (um), das confederações patronais (um) e sindicais (um). Esses dez membros cooptam um outro que é o seu presidente. Desde a sua criação a CPEE foi presidida por Paula Meira Lourenço, uma docente na Faculdade de Direito de Lisboa eleita por unanimidade, que levou a cabo um combate sem tréguas contra as fraudes, as ilegalidades e a negligência dos agentes de execução. Por isso teve de enfrentar muitos obstáculos provocados sobretudo pela Câmara dos Solicitadores que sempre tentou boicotar o seu trabalho intentando acções e providências cautelares contra a CPEE e chegando mesmo a tentar que o Tribunal Constitucional a declarasse ilegal e inconstitucional. Apesar disso, a CPEE desencadeou várias acções de fiscalização aos agentes de execução, incluindo os dirigentes da CS, pois eram muitos os casos de solicitadores que ficavam com o dinheiro das penhoras pertencentes aos cidadãos e às empresas exequentes. Por tudo isso, a Dra. Paula Lourenço transformou-se num alvo a abater junto da Câmara dos Solicitadores que, agora, numa espúria aliança com o Governo, consegue, finalmente, os seus intentos.
Sublinhe-se que ascende a vários milhões de euros os montantes desviados por solicitadores em proveito próprio, entre os quais o anterior presidente da própria Câmara dos Solicitadores, o qual, só ele, se apropriou ilicitamente de mais de um milhão de euros. Frise-se também que neste momento a CPEE tem em andamento mais de 300 processos contra solicitadores dos quais 23 já foram suspensos por desvio de dinheiros. Porém, em vez de mandar fazer uma auditoria a esse regabofe de criminalidade e negligência funcional o governo (prefere outras auditorias) aliou-se aos solicitadores para afastar uma pessoa que durante três anos dera provas de estar empenhada no combate à corrupção e a outras ilegalidades existentes na acção executiva.
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